O Elo Perdido I em... obs. este livro esta em revisão.
Flor
Selvagem
Uma historia de vida.
Maria, de minhas filhas, filhos, netos, netas, bisnetos, bisnetas, tataranetos e tataranetas, De meus dois irmãos e de meus bons amigos que me gratificaram com as suas presenças e, as, mais dóceis lembranças. Foram estes os melhores presentes que ganhei em toda a minha vida, me fazem recordar o nascer do sol e as caricias do luar e das estrelas quando deitado em uma praia do rio Araguaia. Porque o tempo é tão ingrato tentando apagar tudo? Porque quis me fazer esquecer a minha família? De meus amigos? Às vezes até de Deus? Porque quer me jogar na cela escura da solidão? Muitas vezes com apenas uma palavra, em um minuto de recordação nos transportamos através do portal da eternidade e vivemos momentos de indescritível felicidade”.
Obrigado, beijos e abraços.
Seu esposo; Seu pai; Seu avô;
Seu bisavô,
e seu Tataravô e do amigo. 30 de dezembro de 2010
Dankmar
Recordações...
Coisas
que eu passei, ouvi e vi as quais jamais poderei esquecer...
Escutar os tiros dos rebeldes chegando a minha
cidade São Jose do Rio Pardo no Estado de São Paulo, isto em 1932 quando eu
tinha apenas três anos de idade e estava no colo de minha mãe na estação
ferroviária aguardando a chegada do trem da Mogiana. Escutamos vários tiros.
Lembro-me de minha mãe ter dito “Valha meu Deus os rebeldes estão chegando”,
entramos apressadamente no trem, sei que nosso destino final era Marília.
1. Lembro-me muito bem de ter visto o
Zepelin Hindenburg voando sobre a nossa cidade, São José do Rio Pardo, era uma
visão maravilhosa aquela coisa suspensa e quase parada no ar.
2. Lembro-me também de nossa empregada
domestica me banhando em uma bacia ela se chamava Virginia e dizia que eu seria
um grande mediúnico e que tinha dons especiais eu devia ter dois a três anos de
idade.
3. Lembro-me muito bem de estar sentado ao lado
de meu pai em uma cama e espremendo-lhe
espinha em sua costa devia ter quatro anos de idade.
4. Lembro-me muito bem de vê-lo morto em uma
cama e eu não acreditava que tivesse morrido e eu tinha apenas seis anos de
idade. Ele faleceu em 1935 de febre tifo;
5. Lembro-me muito bem do córrego que me escondi
dentro dele de meus primos Zezé e Walter, coisas de adolescentes.
6. Lembro-me muito bem de meu querido tio Olimpio
e sua maravilhosa família e do enfermeiro Zico que trabalhava no consultório de
meu tio em Campinas de sua esposa Maria Pinheiro e de seus dois filhos o Luiz
Antonio e o Eduardo (Totó e Duda).
7.
Lembro-me de ter visto, por duas vezes, a
figura de Jesus sentado em um simples trono de madeira e olhando-me de lado ele
sorriu. Recordo-me perfeitamente de sua feição que era bem diferente das que a
gente hoje vê por ai, era jovem, cor morena, cabelos meio curto e uma barba
preta bem rala e olhos penetrantes, não pude perceber se eram azuis, verde ou
mesmo castanhos. Eu O senti colocar a mão sobre a minha cabeça, mas não disse
nada apenas sorria.
8.
Uma vez eu enchi um tubo de pólvora e um
pedaço de estopim, coloquei junto a uma janela da oficina toquei fogo e corri,
quando ela explodiu, seguidamente eu ouvi ao longe “Foi o Dankmar”. Não sobrou quase nada da mesma.
9.
Na hora das refeições eu e minha irmã e
irmão tínhamos que estar atentos se atrasássemos ao chamado ficaríamos sem
comer.
10.
Minha avó Maria contava que durante a guerra
na Alemanha quem saísse a rua a noite poderia ser fuzilado, mas assim mesmo os
meninos se arriscavam e se arrastavam pelas ruas escuras a procura de cavalos
mortos para lhes arrancar um pedaço de carne para comerem em casa.
11.
Certa vez eu estava numa janela de vidro
matando mosca com uma borrachinha quando meu pai se chegou a mim e me chamou a
atenção:
Não faça isto, matar seja o que for é pecado. Não me chame de Senhor, me chame de você, pois, Senhor é o que está no céu.
--Senhor?
– respondi atordoado como
se eu não tivesse entendido.
12.
Meu avô Otto tinha um radio daqueles da
caixa de madeira todo modelada e ele ficava horas sempre ouvindo noticias da
guerra por uma radio alemã, quando o noticiador (lembro-me do nome Hans Fritz)
falava sobre vitórias como navios afundados ou aviões derrubados e ele dava um
sinal Tic... Tic... Tic e a cada Tic significava um afundado ou derrubado e meu
avo contava nos dedos quantos foram, ouvia o hino alemão muito entusiasmado,
mas minha família não tinha tanto amor assim pela causa da guerra, lembravam
apenas que haviam deixado na Alemanha alguns de seus primeiros filhos
inclusive um primo meu de nome Hugo
Hornschuch e que o mesmo estava na marinha, tivemos noticias dele há alguns
anos atrás ele veio ao Brasil e encontrou-se com minha Tia Maria e meu primo
Ricardo, ficou apenas um dia e depois desapareceu. Minha avó Maria lembrava que
quando ela saia à rua durante o dia, para buscar alguma coisa para comer,
escutava tiros seguidos, muitas vezes passava por cima de cadáveres e via um ou
outro tombar a seu lado, mas já não tinha mais medo da morte, era coisa banal
para ela, como se nada estivesse acontecendo.
13.
Quando chegaram ao porto de Santos, em
1921, vindo de navio, eles cristãos vinham fugindo do nazismo que despontava
violentamente, a primeira coisa que notaram foram às centenas de caixas de bananas
ali acumuladas, lembraram que na Alemanha só davam conta de comprar apenas uma
ou duas e as dividiam entre si no almoço ou na janta, resolveram matar a
vontade e compraram uma caixa de banana, logo estavam todos com a barriga ruim,
mas comeram.
14.
Recordo-me das viagens que fiz na Ford 29
do Tonicão chegava a atingir sessenta quilômetros por hora e eu punha a cabeça
para fora e ficava quase sem respirar devido à velocidade e meu pai uma vez me
ofereceu um presente para eu ficar calado
durante a viagem, pois fazia mais barulho do que uma arara flechada.
15.
A janela da cozinha da minha casa que dava
para a rua era muito alta e quando eu queria fugir tinha que pulá-la e cada vez
era um susto, mas nunca me machucava. Depois de adulto fui passear naquela
cidade fui até a casa que eu morava e vi que a janela da cozinha não era tão
alta assim, pois não tinha mais do que um metro e meio de altura Coisas do
tempo de criança.
16.
Recordo-me das historias contadas pelo
Bertulino sobre o Dioguinho que era um bandido famoso que tinha um dom, de
transformar em uma linha, ou, virava um toco, ou um cachorro na hora dos
tiroteios e cada disparo que dava um soldado tombava. A última vez que o viram
foi quando o cercaram no estreito do rio Pardo,onde ia em pé dentro da canoa e
os soldados da margem atiraram a valer até que a canoa sumiu no estreito entre
as pedras ele ainda estava firme respondendo aos balaços, quando a canoa saiu
do outro lado estava vazia nunca acharam o corpo dele, mas muita gente contava
inclusive o Bertulino, o terem visto depois dizendo que “Vou-me embora para
outra terra bem longe daqui”.
Memorial da Família
“Hornschuch”.
Tudo
isto começou assim...
Alemanha, Stutgarth, 13 de
agosto de 1921.
Uma família de alemães que moravam em
Stutgarth, perambulava pelo cais do então principal porto comercial marítimo da
Alemanha em Hamburgo, dezenas de navios cargueiros de todas as bandeiras
estavam ancoradas alguns com a flâmula verde amarela, nestes, aqueles estavam ansiosos
para embarcarem para o novo mundo, o Brasil os esperava. Aquela família simples
era composta de dez pessoas: Otto Hornschuch era viúvo do primeiro casamento
tinha os seguintes filhos: Teodoro, Hugo, Emilia e Rosa. Destes somente Teodoro
veio ao Brasil porem não junto com a família Hornschuch, veio posteriormente
como clandestino em um navio, e quando já na costa de Santos-SP. Atirou-se ao
mar e veio nadando para a praia. Hugo havia sido convocado para a Marinha de
Guerra, mas sobreviveu e engajou na marinha mercante e chegou a vir ao Brasil e
aqui passou por um dia e seus familiares o visitaram, mas nunca mais se teve
noticias dele. Rosa morreu na guerra quando uma bomba explodiu no quintal de
sua casa matando-a e a seus dois filhos. Emilia sobreviveu a guerra, mas nunca
mais se teve noticias dela. Do segundo casamento com Maria Wulfing tiveram os
filhos Rolf, Maria, Elizabeth e Elfride
A situação se complicava na Alemanha.
Otto Hornschuch trabalhara por
muito tempo na fabrica Krupp em Essen e
com o advento da guerra que se avizinhava a fabrica passou a fabricar armas e ele
era engenheiro mecânico, e tinha uma verdadeira aversão por guerras pois era um
Cristão fervoroso, também sofria de uma
grave acides estomacal sendo aconselhado a procurar um clima mais quente para
morar e ele elegeu o Brasil. Rolf recém formado Engenheiro químico e
eletricista e meu tio Teodoro sua especialidade era mecânica automotiva, este
último já havia lutado contra os franceses e costumava contar que certa feita
ele foi derrubado por um soldado inimigo que espetou a baioneta em seu ombro e
ele do chão tirou a machadinha e desferiu um golpe na barriga de seu atacante
prostando-o por terra e no mesmo dia ao passar perto de uma fossa quando um
foguete explodiu bem perto dele o jogando-o lá dentro em meio a aquele monte de
merda. Uma nova guerra se avizinhava a fabricação de amas novamente eclodiu em
ritmo acelerado. Por estas premissas acharam por bem que estava na hora de
mudarem de país, assim conseguiram os vistos em seus passaportes para todos,
dos mais chegados da família apenas quatro ficaram na Alemanha, os filhos de
sua primeira mulher, de nome Teodoro, Hugo, Rosa e Emilia. Possivelmente outros
familiares ficaram por lá.
O medo da rápida ascensão de
Hitler e os sofrimentos com a guerra mundial pela qual estava por passar os fez
embarcarem as pressas no navio mercante já determinado para os seus peculiares
exílio e, este, sua rota era para o porto de Santos no Brasil, e assim se
despediram da Alemanha, eram Cristãos alemães em busca da paz.
Otto Hornschuch durante sua vida de Cristão na
Alemanha foi abençoado por Deus que o protegia e fez muitas curas e milagres.
Era bastante notória a sua vida espiritual.
Foram muitos dias de viagem.
Ao chegarem ao Porto de Santos
foram diretos para a Hospedaria de Imigrantes em São Paulo e lá se hospedaram
em 27 de setembro de 1921.
Foram orientados a seguirem
para São José do Rio Pardo no mesmo Estado de São Paulo, uma pequena e
emergente cidade e ali se instalaram.
Montaram uma grande e complexa oficina
mecânica que levou o nome de “Oficina Alemã” ficava na esquina com a Avenida
João Pessoa nº 52, onde moramos.
Hoje é o Prédio do Correios.
*
De
Portugal para o Brasil - Anos de 1848.
“Família
Gomes Porto”
Por outro lado haviam também
chegado ainda em 1848 a aquela região da cidade de São Jose do Rio Pardo
membros da família Gomes Porto, Portugueses com origem da região do Porto,
Manoel Joaquim Gomes estava com dez anos quando aqui chegou, posteriormente
casou-se com Tereza Gonçalves Cardoso de Jesus que passou também a adotar o
nome Porto e tiveram muitos filhos entre este Eduardo Gomes Porto nascido em
Santa Alegria SP. Em 1893, casou-se com Mariana de Souza Dias, filha de Jose
Lino de Souza Dias e de Ana Humbelina Gonçalves da Fonseca. Ela Mariana faleceu
em Campinas a 02 de novembro de 1934. Ele, Eduardo faleceu em São Jose do Rio
Pardo a 23 de setembro de 1936 e tiveram 15 filhos todos nascidos em São José
do Rio Pardo. Eram estes: Manoel Alcindo Porto; Alfredo Dias Porto; Eudoxia
Dias Porto; Olimpio Dias Porto; José Dias Porto; Celisa Dias Porto; Oscar Dias
Porto; Maria Dias Porto; João Dias Porto, Vital Dias Porto; Jovita Dias Porto;
Nagib Dias Porto; Nagê Dias Porto; Eduardo Dias Porto; Aristides Dias Porto e Aracy Dias Porto.
A família Gomes Porto era bem
estruturada e compraram muita terra junto ao Rio Pardo e Limoeiro e tinham os
nomes de Fazenda Bela Vista, Fazenda Limoeiro e Fazenda do Estreito sua cultura
era o café, chegaram a ter mais de duzentos mil pés de variedades diferentes,
tinham maquinas beneficiadoras grandes terreiros e enormes depósitos, muitos
animais e gado
Quando o destino dita as rotas.
Duas pessoas diferentes, uma com família de origem
alemã Rolf Hornschuch a outra com
família de origem portuguesa Aracy
(Dias) Gomes Porto, os destino fez com que se encontrassem naquela pequena
e ainda perdida cidadezinha paulista São
José do Rio Pardo, se conheceram e em 1925 se casaram. Ele faleceu em São Jose do Rio Pardo em 1935
e ela faleceu em São Paulo a 03 de maio de 1943. Do resultado desta união
nasceram três filhos Rolf, Wolfgang Dankmar Gunther e Aracy, a partir de então
se seguiram uma seqüência inédita de pessoas que ajudaram a formar este Brasil
interiorano desde São Paulo, Goiás e Mato Grosso, pessoas com destaques como,
Prefeitos, Pastores Evangélicos, Missionárias, Advogados, Pilotos, Sertanistas,
Comerciantes, Vereadores, Dentistas, Presidentes de Sindicatos, Funcionários
Públicos de Altos Níveis, Professores, Letrados, Enfermeiros e Médicos alguns
lotados em Gabinetes de Autoridades Governamentais, inclusive no da Presidência
da Republica, e outros ainda estão por ai se preparando para assumirem cargos
tais como Ciências Contábeis, Engenharias diversas, Secretarias Governamentais
de Deputados, quiças de e ou Senadores e etc. etc. Para que esta sucessão de fatos
se realizasse precisou que viessem de muito longe as matrizes que geraram duas
simples pessoas e as fizessem se unir e assim a partir desta estóica união, se
deu inicio a uma nova e explosiva geração...
&
Entrando
na Vida...
A sementeira do Criador...
“Nós éramos e ainda somos as sementes do Criador, viemos para este
planeta “terra” de carona em meteoritos e asteróides de lugares muito distantes
neste imenso universo, como apenas bactérias adormecidas em forma de poeiras
estelares éramos e ainda somos compostos de minerais, água e sal e depois de
nascermos precisaremos destes para continuar vivendo,
Fomos nós no início,
gerados nas grandes águas e ainda somos gerados nas águas de nossas mães. E
estávamos repletos da Luz Criadora que habita em nós mostrando-nos os caminhos
da sabedoria ensinando-nos a virtude da prudência e do amor,
Mas também nos foi
dada uma alternativa o “Livre Arbítrio” evocando que deveríamos seguir o
caminho da Luz, Mas se nos desviarmos da nossa origem divina e andarmos em
desobediência aos preceitos do Criador, esta Luz se esvairá conforme nossas
transgressões dando lugar a trevas e nos destruirão por dentro. Portanto é
preciso andar na retidão dos ensinamentos do Senhor para sermos eleitos seus
filhos. e ainda fazendo transbordar SEU coração pelo amor que tem ás suas
criaturas. ELE enviou Seu filho Jesus para ensinar os verdadeiros caminhos do
amor e da verdade só assim então poderemos viver repletos de sua Luz enquanto
estivermos neste planeta, chegados o momento de partir tenha esta semente se
multiplicado e gerado bons frutos na seqüência da vida revelando assim o ciclo
da eternidade”.
Wdgh. *
Novos tempos... Novos rumos...
A 02 de fevereiro de 1929, Estado de São Paulo, São José do
Rio Pardo, Rua João Pessoa, n° 52, às 16,00 horas nascia um menino que tomou o
nome de Wolfgang Dankmar Gunther, filho de Rolf Hornschuch e Aracy Gomes Porto.
Foi o dia em que vi a luz do mundo pela primeira vez. E me registraram
esquecendo-se de incluir no meu nome o sobre nome de meu pai: Hornschuch, mas
eu não liguei para isto afinal era muito pequeno e teria a vida toda para me
preocupar com este detalhe, surgia assim uma nova linhagem, a “Família Gunther”.
Não totalmente desalinhada da estirpe Hornschuch/Gomes Porto.
Como cidade interiorana São
José do Rio Pardo, no Estado de São Paulo era um sonho, pequena, a margem de um
rio turbulento cheio de corredeiras e muito lambari e ruas cheias de altos e
baixos, no centro da cidade uma praça arborizada cujas sombras davam guarida
para um automóvel Ford 1929, capota de lona e quatro portas de aluguel cujo
motorista o Tonicão era um exemplo de cordialidade, o cinema “15 de novembro” ao
lado da casa Bragueta era uma construção antiga mais chegada a um teatro com
espaços reservados na lateral circundados por belíssimas grades trabalhadas em
madeira e cadeiras avulsas, a frente do cinema, do outro lado da rua, uma
simpática praça era enfeitada por um belíssimo jardim e arvores centenárias com
bancos de madeira moldados com armações de ferro todo desenhados e entorno brindavam
lindas casas no estilo português que delineavam a alta elite ou os barões do
café, inclusive a casa de meu avo Eduardo Gomes Porto que também tinha um
belíssimo e super novo automóvel Ford 1929. Minha mãe me contou que um dia ele
atropelou um homem que caiu com a pancada e passou por cima, mas a vitima nada
sofreu porque o carro era muito alto e o gajo passou incólume por baixo do mesmo, foi só um susto. Minha mãe havia
herdado com a morte de meu avô Eduardo uma área de terra com quinze mil pés de
café junto ao estreito do rio Pardo na Fazenda Bela Vista, mas tudo resultou em
nada, ela a mais nova da família e viúva, seus irmãos não ligaram pela sorte
dela e acabou ficando sem nada, melhor assim, quem sabe? Uma vez ela me disse
que o advogado, outros e seus próprios irmãos a deixaram a ver “navios”.
A nossa cidade tinha também o
beneficio da Estrada de Ferro Mogiana que ia de Passos em Minas a Capital de
São Paulo, era fabuloso ver a Maria Fumaça chegar resfolegando fumaça e brasas
por todos os lados e o seu apito estridente era ouvido de muito longe, era
espantoso ver o trem parando e tanta gente descendo e subindo na plataforma,
foi ali pela primeira vez que vi uma linda menina de cabelos cacheados que me
abalou com seu charme ela se chamava Íris Rondinelli, fiquei quase apaixonado,
mas ela nem ligou para mim.
Eu deveria e ainda devo herdar
o meu sobrenome Hornschuch. Fui crescendo dentro de uma oficina mecânica de
meu avo Otto, meu pai viajava muito pelos sertões ele era engenheiro químico e eletrônico.
Ele veio a falecer em 1935 contraiu febre tifo no interior de Goiás, mas, mais
por força da irresponsabilidade de nossa própria família que estando ele em
convalescença e sob cuidados do médico Dr. Cardoso, seus irmãos resolveram lhe
ministrar um purgante de nome Carabana. Me lembro de alguém ter dito que aquilo
era remédio para cavalo e lhe estourou seu fraco intestino causando-lhe a morte.
Eu o vi na cama morto, eu tinha então seis anos de idade e não acreditei que
tinha perdido meu pai. Lembrava-me que há poucos dias antes, eu estive junto a
ele na cama espremendo-lhes espinhas nas costas, esta imagem, como outras de
muito tempo antes, me ficaram gravadas na memória.
Lembro-me
da revolução de 1932 eu tinha apenas três anos de idade e estava no colo de
minha mãe na estação esperando o trem quando ouvimos tiros e alguém gritou
apressadamente para embarcamos que os rebeldes estavam chegando.
Recordo-me claramente de estar banhando dentro
de uma bacia e uma mulher chamada Virgínia, nossa empregada, me ensaboava,
conversava comigo dizendo, me lembro vagamente, que um dia seria um grande
mediúnico, (será que eu estava herdando algum carisma de meu avô Otto?) ela via
isto em mim, eu a adorava e gostava muito dela, era muito bonita, me recordo
daquela mulher a todo instante e até hoje vejo a sua imagem. Penso nela e no
Tonicão, motorista de praça, dono orgulhoso da belíssima Ford 29 e o pior é que
não consigo esquecê-los. Criei-me entre uma dezena de amigos, entre eles o
Toninho, Sérgio, Batata, Flavinho, e muito outros brincávamos de mocinho e
bandido nos corredores do Mercado Municipal ali junto do Grupo Escolar Tarquínio
Cobra (o grupo de baixo) e do Cândido Mariano (o grupo de cima). Gostava de ir
a fazenda de meu avô Eduardo Gomes Porto e passar na ponte do Limoeiro. Ver o
estreito do Rio Pardo e ouvir historia sobre o Dioguinho. Meu padrinho José
Gomes o João Batista de Lima Figueiredo lá de Itaiquara sempre me dava
presente, meu tio Teodoro trabalhava lá e tinha a esposa Grete e suas duas
filhas Érica e Ingrid e meu primo Teodorinho. Adorava dormir nos barulhentos
colchões de palha de milho, e ouvir os pisados secos de alguém que passava nos
corredores de tábuas da casa da fazenda Bela Vista de meu avô Eduardo sempre me
fazendo viver num mundo irreal cheio de almas penadas, mas não tinha medo pelo
menos talvez só um pouquinho;
Gostava
de ao cair da tarde ir para a casa do Bertulino, um trabalhador da fazenda de
meu avo Eduardo, que após a faina brava do dia, descansava sentado nos degraus
de madeira ali na porta rústica de sua morada e tocava sua viola de oito cordas
tal um artista a exibir maravilhosamente o seu dom, mas sua grande apoteose era
quando dedilhava umas musicas sertanejas com duas cordas da viola quase soltas
que dava um tinido todo especial e inebriante contagiando os ouvintes, era um
sonho que nunca mais, tenho certeza, eu irei ouvir novamente. Passava bons
minutos olhando a casinha de Euclides da Cunha, era ali que trabalhara nos
projetos da construção da ponte ferro enquanto que para mim era um sonho
passear naquela armação de aço, especialmente na ponte pênsil sobre o rio Pardo
onde eu era um assíduo pescador de lambari com anzol que eu mesmo fazia de um
alfinete e a linha era de rabo de cavalo e usava massa de farinha envolvida em
algodão como isca e tinha que ser habilidoso senão o lambari escapulia, pois
meu improvisado anzol não tinha fisga. Um dia eu comprei uma linha melhor e uns
anzóis na casa Bragueta por ordem de meu tio Oscar, lembro-me que um
funcionário daquela loja ainda disse bem
alto:
Pode vender, ele é
sobrinho do Dr. Oscar Porto.
Eu
fiquei orgulhoso.
Eu também era louco pelo
sorvete feito de gelo ralado e groselha que o seu Agostinho vendia no carrinho
em meio à rua, ele tinha um ralador roliço manual com uma manivela e pedras de
gelo ali mesmo ele ralava, enchia o copo de gelo e despejava groselha ou capilé
em cima e estava pronto o sorvete.
Meu avô sempre me dava uma
moedinha de quinhentos réis daquela vermelhinha aos domingos para ir assistir a
matinê no cinema 15 de novembro lá da praça, me lembra bem das moedas de prata
de dois mil reis. A Dona Clarisse era uma velha bondosa que morava na casinha
junto a nossa.
Meu
pai era quem concertava a maquina do cinema quando enguiçava por isto eu não
pagava entrada. Gastava o dinheiro tomando sorvete e refresco de capilé junto
com meus primos Cacaio e Batista, dois gêmeos idênticos, que sempre enganavam o porteiro do cinema, um comprava
a entrada e assistia à primeira sessão depois pedia para sair e o outro entrava
e assistia à segunda sessão, mas o porteiro sabia e fazia era rir.
Na oficina mecânica de meu avô
eu tive que trabalhar e aprendi muita coisa sobre fundição, enrolamentos de
motores elétricos, solda, instalações, torno e acabamentos que muito me serviriam
na vida futura..
Eu me lembro bem da oficina de
meu avô era conhecida como Oficina Alemã, lembro-me de quase tudo que tinha lá
dentro, aquele monte de maquinas, eram acionadas por um único motor elétrico
que ficava bem no fim da oficina junto à parede que já dava para o quintal, a
outra dava para frente da rua. A partir de uma polia o motor comandava um eixo
que praticamente atravessava toda a oficina e bem no meio acima do pé direito
das paredes dali partiam diversas polias e cada uma tinha uma função, uma era
para a máquina de furar que era bem grande e em pé. Outras para a serra de
cortar ferros, para a calandra aonde se faziam os tubos, para a plainadeira de
ferro, para o esmeril que de um lado era de pedra e outro uma grossa escova de
ferro, e para o torno mecânico, me lembro vagamente do nome ao que parece era (IMOL)
cuja regulagem de velocidade ou outras especificações de serviços era toda
manual com a troca quase sempre de três a quatro engrenagens, tinha que se
saber fazer a combinação para funcionar direito,
Sua
longa bancada onde se torneavam eixos de todos os tamanhos e comprimento era
sempre assessorada por um graminho para manter o nível horizontal cujo trabalho
e torneamento eram feito por ferramentas de aço diamante e era regada com água
de sabão caindo constantemente sobre o ponto aonde a ferramenta trabalhava no
eixo e assim mantinha a mesma sempre fria e faziam cair às farpas em forma de
uma tirinha de ferro ainda quente enquanto se lapidava o eixo para ficar na
grossura pretendida, acho que foi daí que inventaram a Bombril, cada maquina
tinha duas polias uma fixa e outra chamada de “louca” que rodava livremente e
quando queria se acionar a maquina se fazia através de um garfo de ferro
instalado que puxava a correia da polia louca para a fixa e assim a maquina
passava a rodar, mas o que mais me atraia era quando meu avô acionava o forno
de fundição, era um trabalho complicado vou tentar esmiuçar o sistema: dentro
da oficina bem junto à porta lateral havia um forno aberto no chão, tipo de uma
cisterna, com aproximadamente um metro de fundura e outros dois de largura, lá
em baixo uma grelha de ferro fundido sustentavam o carvão Koque como era
conhecido ou carvão de pedra, e este era alimentado por uma ventoinha elétrica
que mantinha o fogo sempre aceso. Antes de usá-lo meu avo colocava dentro de um
cadinho que era parecido com uma balde sem alças que era feito de um material que não derretia ao alto calor, muitos
pedaços de metais amarelos e cobre logo a seguir o cadinho era preso por uma
espécie de tenaz do cabo comprido e colocado no meio do braseiro e o metal
começava a derreter se misturando. As formas eram feita em uma caixa de ferro
que era dividida em duas bandas enchiam-se as mesmas com areia e argila e
colocavam-se os moldes de madeira também divido ao meio e abriam as caneletas
para entrada e suspiro do liquido quente, retiravam os moldes e espargiam
grafite sobre os as cavidades, fechavam-se as caixas que eram parafusadas e
então estavam prontas para receber o metal não sem antes jogarem breu em cima
do metal derretido para limpar separar as borras separavam-se e quando
separadas as borras que eram tiradas e o metal estava limpo puro e assim eram
despejados pelos furos que enchiam os vazios porque os moldes de madeira já
haviam sido retirados deixando as cavas e quando o metal apontava no suspiro
sabiam que estava tudo cheio, quando esfriava eram retiradas as peças que daí
para frente receberia acabamento.
Certa noite, eu, meu irmão
Rolf e meu pai estavam sentados na escadinha da casa que dava acesso para a
oficina que ficava retirada uns dez metros, quando meu pai deu uma ordem desta
que não se volta atrás:
--Dankmar vá lá à oficina
e me traga um martelo, ele deve estar em cima da bancada;
--Mas, pai esta tudo
escuro!
--Vá logo e não tenha
medo só por conta do escuro? Nada de luz, vai!
--Esta bem eu vou – e
voltando para meu mano quase implorei – você não quer ir também?
--Anda logo.
Lá se fui eu, desci a escada e
entrei no escuro da oficina, mas dava para enxergar alguma coisa por causa da
luz da rua, revirei tudo e achei o tal de martelo e voltei e o entreguei a meu
pai e ai ele mandou meu irmão Rolf ir buscar um alicate e ele foi e trouxe o
alicate, esta historia se repetiu por muitas vezes até que acabamos perdendo o
medo de tudo, pelo menos de quase tudo.
Eu tinha apenas cinco anos de
idade e o meu mano tinha seis e meio anos, foi ai que aprendemos não ter medo
de nada.
Na
seqüência dos acontecimentos...
Meu pai veio a falecer em 1935.
Tinha apenas 35 anos de idade vitimado pela febre tifo.
Em 1941 o meu Avô Otto veio a
falecer de câncer no Pâncreas resultado da queimação e acides do estomago razão
pela qual deixou a Alemanha, mas ainda viveu vinte anos no Brasil, e ai começou
a complicar tudo, minha avó Maria foi morar com a filha Maria e o Lucio na
capital em São Paulo até a sua morte com 83 anos de idade, mas sua vontade era
de ser enterrada junto com seu esposo Otto e assim foram a São Jose do Rio
Pardo buscar os restos mortais de meu avô, mas a coisa começou a complicar,
pois a exemplo da Alemanha, aqui na sua nova morada, ele também tinha feito
muitas curas e milagres naquele rincão e a administração do cemitério teve
problemas porque o tumulo de Otto teria se transformado em um local de
peregrinação onde as pessoas iam pedir
curas e isto realmente aconteceu
tendo em vista a romaria constante de
doentes e há noticias de muitas
realizações, mas finalmente recambiaram a ossada para São Paulo e a colocaram
junto com a de sua esposa, minha avó Maria.
Entre esta data e 1942
mudamo-nos, eu minha mãe e meus irmãos, para a capital de São Paulo e passamos
a morar bem ali na Rua São Luiz no centro da cidade em uma pensão que não
ficava muito longe do cinema Pedro II bem na baixada do vale do Hangabaú, onde eu
sempre ia assistir às sessões corridas que eram sempre um filme atrás do outro
e ficava lá dentro por horas seguidas, voltava sempre pelas dez horas da noite
debaixo de uma fina garoa e ruas desertas, de vez enquanto ouvia um apito de um
guarda civil que policiava as redondezas e o apito era respondido por outro, e
depois por outro, assim os vigilantes se comunicavam e sabiam estar tudo bem,
me lembro bem, pois me traziam tranqüilidade enquanto eu caminhava aqueles
quase dois quilômetros que me separavam da pensão, até então não se tinha
noticias de assaltos. Neste período estava trabalhando na firma Coccito Irmãos
bem na Rua São Bento nº 33 no 1ª, bem no centro da Capital, depois em uma
pequena firma de Letreiros a gás Neon.
Foi ali naquela pensão da Rua São
Luiz que pela primeira vez conheci uma jovem muito linda cujos olhos eram
iguais a duas estrelas brilhantes que mexeram com meus sentimentos me causando
uma forte atração física, eu já não sabia o que fazer, Terezinha era o nome
dela, mas minha mãe percebeu e chamou atenção da moça por que eu era muito novo
e ela um pouco mais velha, mas eu sempre tinha uma namorada, uma conhecida da
escola, Lidia era o nome da moreninha encantada, a minha prima Nadir que era a
minha preferida, minha prima Heleninha, só namoro de criança, mas eram muito
bonitas. No dia do Trabalho, 1º de maio,
minha mãe estava de folga do serviço dela no Hotel Real em que ela trabalhava
como copeira ou arrumadeira e, na pensão ao fazer um lanche resolveu abrir uma
lata de sardinha, mas não notou que estava estragada e foi intoxicada. Ela foi imediatamente hospitalizada no
Hospital das Clinicas, e eu e meus irmãos na pensão, aguardávamos noticias, era
o dia 03 de maio de 1945, pelas nove horas da manhã quando o telefone quadrado
de campainhas barulhentas que ficava pendurado na parede da sala tocou e eu
pressenti que minha mãe havia falecido, levaram o corpo dela para o Hotel e
fizeram um enterro muito triste, ou devo dizer muito bonito, pois muita gente a
acompanhou até o cemitério foi uma grande demonstração de carinho, eu não fui,
me sentia muito só, pela primeira vez na vida fiquei muito sozinho sem mais
ninguém.
Senti-me
abandonado e sozinho no mundo, lembrei-me da luta difícil pelo qual minha mãe
passará. Ela sofreu muito por nós e sempre foi rejeitada pelos seus ricos
irmãos que a maltratavam e tentavam desmoralizá-las, mas Deus estava conosco,
lembro- me que um dia em uma pensão em São Paulo ela nos chamou e disse:
--Algum de vocês tem um pouco de dinheiro? Eu sonhei esta noite com
uma lata de lixo e tinha um numero escrito nela e era 611 e eu quero jogar no
bicho sei que vai dar o “Burro” com 611 e seria muito bom, pois sairíamos desta
encrenca, pois estamos sem dinheiro. Que tal? O que dizem?
Cada
um de nos deu a ela os trocadinhos que tinha e ela jogou no palpite do sonho e
a tarde foi receber o dinheiro no guichê, havia dado o “611” na cabeça no
primeiro premio.
E
assim era tudo o que acontecia Deus dava jeito até este dia em que
a levou para descansar junto Dele. Afinal nos já estávamos criados Rolf com 18
anos, eu com 16 anos e Aracy com 13 anos.
Eu e meu irmão Rolf mudamos
para outra pensão mais barata e arranjei um emprego em uma fabrica de
metalurgia e mais tarde me dediquei a tubos de néon, dobrando vidros neutros
colocando gás néon, instalando os eletrodos e montando letreiros.
Minha mana Aracy foi morar
em casa de parentes e apesar de ter um monte de tios, irmãos de minha mãe, Tio
Alcindo, Tia Cacilda, Tio Eduardo, Tio Oscar, Tio Joãozinho e a Tia Sinhá mãe
do Walter, do Zezé e do Dadinho e muitos primos e primas espalhados em suas
fazendas, como O Cacaio e o Batista, o Milton, e suas irmãs, o Nilton havia
sumido não sei para aonde, outros em Campinas como o meu querido tio Dr.
Olímpio Dias Porto e seus filhos Luis Antonio e o Duda que sempre me dedicaram
muito respeito e carinho, em São Paulo tinha a Tia Maria e seu esposo Lucio,
Tio Manfred e sua esposa Tia Elfriede e seus filhos, tinha ainda o Tio Teodoro
e sua esposa Greta e seus filhos a Érica, Ingrid e o Teodorinho, resolvi tomar
as rédeas do meu destino, e no começo de junho de 1948 passei pela minha cidade
São José do Rio Pardo me despedindo dos amigos alardeando que “O meu destino era
o Mato Grosso, eu iria morar entre os índios, ou com eles”. Jamais adivinhei
que me tornaria um Bandeirante, em 2009 depois da morte de Osvaldo Guimarães e
de Aristides me tornei o último deles, nunca mais se ouvi falar de nenhum destes,
Quanto a mim? Não é para se admirar afinal de contas eu sou paulista de nascimento
e Mato-grossense por adoção.
Ingressando
na Bandeira Piratininga
16 de junho de 1948
Em 02 de fevereiro eu havia
completado 19 anos
Tudo começava a mudar, já estava preparado
para enfrentar esta nova etapa de minha vida. No trem que eu ia para a cidade
de Anápolis no Estado de Goiás, ia também a “Bandeira Piratininga”, uma organização oficial do Estado de São
Paulo, a última das Bandeiras mostrava realmente a saga de um povo que tinha
nas veias o sangue dos desbravadores tudo era muito arrojado, e minuciosamente
programado.
Éramos um grupo de jovens
paulistas comandados pelo rígido sertanista e jornalista Willy Aurelli.
Durante o trajeto fizemos uma
profunda amizade e ele acabou me convidando para fazer parte oficialmente da
equipe. Seu destino era São Felix do Araguaia no Estado de Mato Grosso, cuja
missão seria encontrar e manter um contato pacifico com os arredios índios
Xavantes, era isto o que eu queria, era o que eu gostaria de fazer, mas não
consegui fazê-lo a contento, o que fiz
foi gravar em minha memória todos os detalhes daquele mundo que eram terras de ninguém, mas... a minha
primeira prova seria ir a Goiânia, capital do Estado e arranjar junto ao DERGO
(Departamento de Estrada de Rodagens do Estado de Goiás) dois caminhões para
levar a carga da Bandeira de Anápolis a Leopoldina a margem do Rio Araguaia.
Com dois Oficio em mãos, não
tive dificuldade, naquela época a Bandeira Piratininga era muito famosa e
conhecida, fui muito bem recebido e atendido pelo Governo do Estado de Goiás e
logo voltava a Anápolis com dois caminhões.
Os carregamos e seguimos viajem
ao começo da aventura passamos por Goiânia a nova Capital que surgia depois por
Goiás Velho a antiga capital do Estado de Goiás. De lá rumo ao tão esperado rio
Araguaia, que em sua margem ainda no Estado de Goiás, cravejava a pequena e
linda cidade de...
Vila Santa Leopoldina do Araguaia... Hoje Aruanã.GO.
A
beleza exuberante do marco do pioneirismo, ao fundo rio Araguaia.
“Leopoldina”... A esmeralda do rio Araguaia
Ali, ás
margens do rio Araguaia, na divisa de Goiás com Mato Grosso sob a sombra de um
frondoso pé de Tamboril bem na barranca do rio eu olhava fascinado o tremular
das águas, e, em seu porto a velha vila guardava ciumentos os restos de três
embarcações a vapor, uma caldeira de ferro maior e duas menores, que pertenceram
aos barcos: Araguaia, Mineiro e Colombo que, teimosamente pareciam querer
resistir ao tempo, como a lembrar: “Viemos de Cuiabá para o Araguaia em
dezessete carros de bois para conduzirmos Couto Magalhães na sua pioneira
tentativa de priorizar a hidrovia no rio Araguaia” fechei os olhos e fiquei a
sonhar relembrando como tudo poderia ter acontecido, cheguei a ver aquelas
embarcações todas novas e inteiras resfolegando fumaça em suas chaminés, elas
faziam parte da Empresa de Navegação a
Vapor do Rio Araguaia, era por volta de 1890,
à chamada Hidrovia Araguaia - Tocantins, que fora criada para fins de navegação
comercial e sua criação remontavam as últimas décadas de XVIII, cem anos depois
se criou à referida empresa, que somadas a ela foi implantada uma estrada de
ferro que, partindo de Nazaré dos Patos ou Tucurui, às margens do rio
Tocantins, terminasse no ponto denominado Praia da Rainha ou em suas proximidades,
as margens do mesmo rio (trecho que margeava a Cachoeira de Santa Izabel) de
uma linha de navegação a vapor de Belém ao ponto denominado Praia da Rainha, de
linhas de navegação a vapor nos rios Araguaia e das Mortes em suas seções
navegáveis devendo estender-se aos afluentes desse rio bem como ao do
Tocantins. A Estrada de Ferro Tocantins e as linhas de navegações citadas foram
criadas no pressuposto de que seriam auto - sustentáveis e levariam certo
progresso às regiões por elas servidas porem, naquele tempo, a pequena
densidade demográfica e o subdesenvolvimento das regiões abrangidas, levou
essas iniciativas ao fracasso. No baixo Araguaia e Tocantins, a navegação teve
um relativo desenvolvimento, devido às plantações de cacau, café e castanha do
Pará que existiam na região, mesmo assim com o declínio das atividades uns numerosos
contingentes populacionais, procedentes dos castanhais localizados nas áreas de
Marabá e Tucurui, ainda permaneceram no Vale do Baixo Tocantins e Médio
Araguaia, vivendo da agricultura de subsistência, de uma limitada atividade
pecuária, da pesca artesanal e da Castanha do Pará.
Dos restos dos barcos a vapor,
só sobraram às caldeiras de ferro das embarcações e algumas peças e 120 anos após
ainda teimam em sobreviver. Hoje elas fazem parte de um belíssimo jardim a
beira rio na cidade da antiga Santa Leopoldina do Araguaia, depois Leopoldina e
hoje Aruanã no Estado de Goiás, onde se perpetuarão.
Tudo
começou assim...
Tudo era novo para mim, havia
chegado de São Paulo no dia anterior como membro da Bandeira, acordara cedo
naquele dia. No rio a movimentação já era grande, uns desciam para banhar,
outros para lavarem os rostos ou escovar dentes e alguns só para ficarem
olhando os barcos. . As mercadorias da Bandeira já estavam sendo baldeados para
dentro de dois barcos ancorados, a nossa turma e alguns índios Carajás
ajudavam. Estava embevecido, olhava os pássaros revoando, os peixes a riscarem
as águas, os botos arfando sobre a superfície e mais um pouco abaixo, acerca de
quatro mil metros, o roncarem das águas no travessão de pedra parecia gritar
uma advertência para que os homens não maculassem o que rio abaixo escondia. Do
outro lado, já no Estado de Mato Grosso, uma vegetação espessa como uma
barreira verde parecia esconder em seu seio misteriosos perigos de uma
fascinante violência, eu me perguntava “O que haveria por traz daquele muro
verde?” Certamente um mundo deserto e sem míngüem.
Muitas coisas passavam pela minha cabeça. O meu pensamento ia bem mais alem, e lá por traz, rumo ao pôr do sol, aonde chegaria? E o que eu acharia? Certamente muitas serras, matas, mistérios, lendas, índios? Era um mundo sem dono, eram realmente
“Terras de ninguém”.
Parei de pensar quando escutei
um bater ritmado de um remo no “beiço” de uma canoa acompanhada por um cantar
sofrido e monologo, mas bonito, era um índio Carajás que chegava ao porto,
desci o barranco e fui para a beira d’água encontrar-me com ele que logo
aportava bem perto de mim, e descendo puxou a “ubá” mais para fora da água e
com um largo sorriso me cumprimentou:
· --Ola Tori.
·
--Oi.
· --Você mora aqui?
· --Não – respondi - Cheguei ontem de São Paulo e onde você mora?
· --Djaram (eu) mora lá na Aldeia Carajás da barra do rio Tapirapés, é muito longe, cinco dias de viajem de barco motor.
· --Nos vamos descer para São Felix do Araguaia, eu estou junto com a Bandeira Piratininga, naqueles dois barcos ali que estão carregando - falei mostrando-os.
· --Huumm o piloto daquele motor é o Kurichira é um índio Carajás meio doido cuidado com ele.
· --Como assim? – perguntei.
· --Ele estava no morro de São Félix há muito anos quando os índios Kurussas (Xavante), bateram na cabeça dele com corroté (porrete) e ele, mesmo com a cabeça quebrada caiu na água do rio e nadou até a Aldeia que fica uma légua abaixo lá os outros índios o tiraram da água, mas nunca ficou bom de todo.
· --Obrigado pela informação, mas vou chegando até lá para ajudar carregar os barcos, nos vamos descer hoje ou amanhã cedo não sei ao certo - agradeci e sai, não sabia eu, aquele momento, que aquele índio de nome Savarú se tornaria um dos meus grandes amigos.
Todo nosso pessoal estava se
aprontando para embarcar, mas antes iríamos almoçar como sempre o
subchefe Darci falava mais que todo mundo e distribuía ordens:
· --Você, Nito, Aurélio, Kleber, Dankmar, Clóvis e – apontando para outros dois disse – vocês também vão neste Barco.
· --Espere Darci, interrompeu Willy o Dankmar vai neste barco, ele é bom mecânico e posso precisar dele.
· --Tudo acertado? Vamos comer e partiremos às 11.30 horas em ponto - OK?
· --Tudo bem - foi á resposta geral.
Foi uma correria atrás dos
pertences que os zelosos companheiros largaram pelas casas, ás 11.30 em ponto
partimos, nosso barco saiu na frente entre acenos e adeus, empurramos os barcos
para o meio do rio, a verdade é que o pessoal estava gostando da pequena vila e
de seu povo.
A esmeralda do Araguaia foi ficando para trás isto nos dava um pouco de tristeza, mas eu tinha um trabalho a fazer, comecei as minhas anotações e rascunhos, suspirei ao pesar na alma a imensidade de meu trabalho como também era apenas um expert em topografia, afinal era a minha oportunidade de fazer algo grande, como...
“A grande viajem”.
O começo da primeira aventura..
A viagem com destino a São Félix do Araguaia, 120 léguas rio abaixo, teve inicio, em tempo de estiagem, as praias alardeavam uma alvura sem mácula e estavam em toda a sua plenitude, o rio caracolava por entre elas parecendo querer encurtar o caminho, nosso barco, tal um dançarino habilidoso conduzido pela mão do piloto ia contornando os bancos de areia. Pássaros de todas as cores povoavam as margens e fiscalizavam as águas. Nossos barcos um tinham um motor de popa Archimedes de 12 HP a gasolina o outro um motor de centro Penta de 10 HP. O segundo barco que era o maior estava mais carregado e o nosso grupo estava dividido no barco menor iam a Chefia da Bandeira e também a Dona Jacy mulher do comandante Willy e eu ia sentado o tempo todo na proa olhando as maravilhas e tomando no rosto a brisa suave, no piloto o índio Kurichira todo tranqüilo.
Logo após a saída, ali por
volta do meio dia, uns quilômetros abaixo o travessão de pedra começava a
roncar mais alto logo estávamos em cima dele, o piloto habilidosamente jogou o
barco no canal central entre duas grandes pedras em meio um turbilhão de
borbulhas, quando menos pensávamos já tínhamos passado e o rio voltava a sua
calma. Novas paisagens foram aparecendo naquela tarde cheia de sol, passamos
por uma fazenda chamada Dumbasinho, e ao anoitecer avistamos a vila de Cocalinho na margem de Mato Grosso,
neste dia dormimos na praia em meio ao rio.
Fizemos um rodízio do plantão,
mas aquela calma do anoitecer, a brisa suave, as estrelas cintilantes como
nunca as havia visto antes, o riscar dos peixes sobre as águas e o canto dos
pássaros noturnos me fizeram ver outro mundo que eu não conhecia, mas lá no
fundo do coração batia uma saudade de casa, adormeci ali mesmo na cama de areia
que havia feito.
Alguns companheiros se
dedicaram a pescar.
No outro dia, mal a luz do sol
começara aparecer já estávamos de pé, tomamos nosso café com bolachas e
embarcamos rio abaixo, e logo a seguir passamos bem e fizemos uma pequena
parada junto a uns moradores, negros remanescentes dos quilombos, fugida da
escravidão, e os vi bem de perto, eram bem pretos com cabelos em caracol e
barbicha, outros tinham fisionomia e traços de homens pré-históricos certamente
seus tipos eram transcendentais e suas características antropométricas não se
identificavam a nenhuma outra que eu conhecia. O local era na margem esquerda
do rio, isto é do lado do Mato Grosso e se chamava Travessão Riuna, logo a seguir passamos pela barreira Anhanguera
onde morava o Henrique alemão,
mais abaixo avistamos umas moradas do lado de Goiás que se chamava Piedade
onde morava outro alemão de nome Alfredo e sua família, na mesma margem uns
quilômetros abaixo despontaram o povoado de
São José dos Bandeirantes, neste
segundo dia dormimos em uma enorme praia bem no meio do rio. Foi outra noite
maravilhosa, mas um inesperado susto quase me fez correr, já eram lá pelas
tantas da madruga e eu como sempre havia feito a minha cama na areia meio
retirado do acampamento, sempre fui muito solitário, de repente comecei a
escutar pisadas rangerem na areia, eram muitas, e viam no meu rumo, levantei a
cabeça bem de vagar, mas não conseguia ver nada e as pisadas iam chegando mais
perto e mais forte súbito senti que estavam quase em cima de mim ai me sentei e
dei um grito, foi pior, o grito delas foi bem maior, eram umas oito ou mais
capivaras que vinham pela praia rumo ao rio e como a noite estava escura elas
também não me enxergaram e nem havia me sentido, sei que vinham na minha
direção todos se espantaram e quase fui atropelado na disparada doida para se
jogaram na água, numa noite silenciosa como aquela foi um barulho infernal que
acordou todo o acampamento, mas depois do susto passado foi só risada, mas eu
quase me assombrei. Fui dormir mais perto do fogo. (anos mais tarde, junto com
meu irmão Rolf o mesmo fato tornou a se repetir, em outra praia).
Ao clarear do dia, pudemos ver
os rastros das capivaras, eram muitas, grandes e pequenas.
Zarpamos deixando gravada a
primeira aventura. Naquele terceiro dia de viajem passamos por Luiz
Alves, uma pequena vila no Estado de Goiás.
Logo depois Willy, lá na proa
do nosso barco junto comigo me chamou a atenção dizendo:
· --Dankmar daqui a pouco você vai conhecer a maior Ilha fluvial do mundo a Ilha do Bananal, ela começa bem naquela curva aonde se forma o braço menor do Araguaia que é o rio Javaé, a nossa direita, muita poucos brasileiros tiveram até hoje este privilégio.
Logo aparecia a curva e avistamos a forquilha do rio se separando, do lado esquerdo o Araguaia do lado direito o Javaé. Formavam uma ilha com 600 quilômetros de comprimento por 110 quilômetros em média de largura, um verdadeiro estado, metade da ponta sul era o Parque Nacional a outra metade da ponta norte uma reserva indígena dos Carajás.
Na praia, um casal de Cervos,
nos olhava passivamente como a não se importar com a nossa presença, centenas
de patos selvagens banhavam entre os marrecões e os colhereiros com suas penas
rosadas, gaivotas alardeavam com seus gritos e mergulhavam nas águas ricas de
peixe, daí para baixo o rio se estreitava um pouco e suas águas corriam mais e
começava uma sanha devoradora de assoreamento, as águas batiam contra as
barreiras e faziam rolar grandes arvores para dentro do rio, praias inteiras
estavam sendo carregadas, mudando de lugar para abrir um canal mais fundo para
o rio. Não era uma constante, mas, começavam aparecer, preocupado comecei
estudar aquele fenômeno e cada vez que parávamos analisava a cor da água e seu
componente, fazia gráficos, media profundidade do canal com uma vara e fui
anotando tudo, quanto mais descíamos o rio mais mudanças apareciam.
Fizemos uma parada na Barreira de São Pedro na ilha do Bananal, fazenda esta de criação de gado de propriedade de Ubaldino Rios, residente na cidade de Goiás Velho, antiga capital do Estado de Goiás. A barreira alta e firme pouco sofria com a força da água foi quando cheguei à seguinte conclusão: “Imaginei uma pequena mina em uma colina na nascente deste rio. Por todo ano, varias vezes, a chuva caia em forma de pingos sobre um declive, uns captados pelas raízes, outros formando pequenas poças, alguns penetrando por fendas no leito rochoso e se juntando a pequenas aglomerações formando um tênue filete de água em busca de uma forma de vida maior e alguns se evaporando, começa ai o ciclo inicial da vida do Planeta Terra. Nós sobrevivemos em razão deste simples toque divino. Esta nascente brotada naquela colina gera o filete de água que em algum ponto mais abaixo se junta a outras nascentes alimentando um riacho que desce em direção ao seu destino. Mesmo no período das secas estas minas dificilmente perecem e juntando-se a outros riachos já como rio continua seus caminhos em direção ao fundo do vale carregando água drenada de centenas de quilômetros quadrados de terra e finalmente, num abraço apertado, dão forma a uma bacia hidrográfica e juntos empurram e carregam 660 milhões de toneladas de fragmentos para os oceanos por ano, e ali estava ela, bem a minha frente e não podemos deixar de lembrar que muito mais que isto é o montante de terra retirado pelos rios e que são carregados por tempos a lugares indeterminados e novamente despejados sobre a terra formando os chamados deposito aluviais, e isto tudo aqui por baixo de nosso barco, passei a observar que a água só tem poder de sucção e de empurrar, mas, ela, por si só não pode talhar, para este trabalho ela depende principalmente dos fragmentos de rocha, assim como a mão usa o lima para moldar um ferro o rio usa a areia e as pedras para cavar seus canais, notei que enquanto pedaços de rocha e areia estão fazendo escavações à água empurra, golpeia e suga o produto deste trabalho para o fundo do canal ou para os lados. Assim ela dissolve os minerais da rocha e a lama e este rio não é exceção desta regra”. A natureza tende a fazer com que os rios endireitem seus canais tomando uma linha reta por tal motivo estamos vendo a águas golpeando com violência, escavando por baixo solapando os barrancos, derrubando arvores e abrindo novos caminhos e ao mesmo tempo formando lindas praias, é o seu trabalho, “mas, continuarei minhas pesquisas oportunamente por enquanto voltemos á nossa viajem, a coisa aqui na Fazenda São Pedro de repente melhorou muito quando passamos a conhecer seus moradores”.
Plantando o futuro...
A semente começou a germinar a
partir daquele dia em que a conheci...
Aleixo Paciente da Silva era o
gerente da Fazenda e tinha sua esposa Joaninha Paciente da Silva, e quatro
filhas de nomes Jerônima, Maria,
Raimunda (Mundica), Noemi e um filho ausente de nome Mariano. E ao lado da
casa, mais abaixo uma pequena aldeia de índios Carajás, nada mais do que duas
ou três casas, o cacique era um índio que tinha o nome “Cachoeira”. Pensei que
havíamos chegado ao paraíso e não fui só eu, todos pensavam assim, fomos bem
recebidos compramos umas rapaduras, conversamos muito com as meninas depois nos
despedimos e seguimos viajem. Sinceramente senti que deixava ali alguém muito
importante para mim e foi mesmo, pois, cinco anos depois, a 14 de março de 1953
eu me casava com a jovem Maria Paciente, foi o primeiro casamento civil de São
Félix do Araguaia, mas isto será contado mais adiante.
Neste terceiro dia dormimos na praia do
rebojinho, o barulho infernal das águas contra as pedras e a barreira, dava um
tom de inquietude, e os peixes pareciam estar em guerra uns a cata de outros e
a movimentação do redemoinho facilitava a caçadas dos peixes mais lentos, a
pescaria só não foi boa porque quase todo o peixe de superfície sempre tem
muitos espinhos e as “cachorras” predominavam. No outro dia partimos cedo era
nossa meta chegarmos a São Félix, passamos por Barreira de Pedra e pela barra
do rio das Mortes com o Araguaia e logo depois da grande curva avistamos a
pequena vila, ao fundo, muito longe no horizonte no lado de Mato Grosso,
vislumbrava-se a Serra do Caracol e mais para o oeste quase rumo norte a Serra
do Magalhães, naquele dia almoçamos a bordo, chegamos exatamente às 16.00 horas
da tarde.
Uma
verdadeira multidão já nos aguardava no porto, alias, eram muitos os lugares
para encostar barcos, foguetes estralavam por todos os lados e tiros eram
disparados às dezenas, de todos os tipos de arma, fora uma recepção e tanto.
Nosso barco bem manobrado aportou bem perto
de outro barco da região notei que o nome era muito peculiar “Frei Chico” era
um barco grande porem com um só motor de centro que era uma maquina estupenda,
grande e de um só cilindro, era um motor “Bolinder” a que chamavam de cabeça
quente, pois para ele funcionar era preciso esquentá-la a maçarico, a seguir um
enorme tubo de ar comprimido dava inicio a movimentação era impossível acionar
a sua partida a mão, só o volante devia pesar quase mil quilos, também para
movimentá-lo tanto fazia por óleo Diesel, óleo de jacaré ou óleo de peixe era a
mesma coisa, foi o primeiro motor a funcionar, naquele tempo (1948) com o hoje
tão prolatado biodiesel, sei disto porque inicialmente o observei por dois
dias, mas quando o Tônico Bosaipo, seu proprietário o funcionava, a cidade toda
parecia tremer tal um terremoto... Tuuuummm. Compassivamente, mas
continuadamente, fiquei apaixonado pelo barco eu teria que fazer uma viagem
nele, e para isto fui me entrosando com o Tônico.
Já estávamos na cidade há quatro dias e o
comandante Willy já havia nos apresentado a quase todos os moradores, e passei
a conhecê-los, na primeira casa o Zé Martins, depois seu irmão Leó, depois o
Lupercio, Maria Dias, Severiano Souza Neves que era o chefe fundador da vila,
seu genro Ateneu, Sindô, Bento de Abreu Luz, Tertuliano, João Irineu, Piassaba,
João Vermelho, Pedro Brito, Zé da Rocha, João da Luz, Anicetro, Juvenal,
Raimundo, Zé Ferreira, Anselmo Alves,
Amâncio de Melo, Zé Lagoa e seus filhos e muitos outros eram mais ou menos
treze casas a beira rio e umas seis casas na beira da lagoa.
Resolveu o comandante nos dar uma folga, por equipe de 15 dias cada, e aproveitei para ser o primeiro e me engajar na aventura daquele barco que mais parecia uma arca de
Tempestade se aproxima de São Felix do Araguaia.
Antônio de Mello Bosaipo... E seu barco “Frei Chico”. Ou a arca de
Noé...
Ele carregava de tudo,
passageiros, bode, cabra, porco, galinha, gente doente, mercadorias
comestíveis, peles de jacarés, pele de onça, sal, açúcar, café em coco, tábuas
de mogno, só dava confusão até funcionar o motor depois todos os bichos se
calavam com medo e ficava quietinho cada um em seu lugar, o Tônico, lá da proa,
tal qual um comandante, e era assim que ele era chamado Comandante Tônico
Bosaipo, sim senhor, e ai de quem não o respeitasse, ele era a imagem viva dos
grandes lideres, depois de ter hasteado a bandeira brasileira bem no mastro
final da popa, mandava um ou dois porcos - d’água (marinheiros) recolherem a
prancha e empurrar a proa do barco para fora, o Bolinder, dava marcha à ré e
depois ao comando a marcha à frente levantando um belíssimo bigode de água na
proa, riscando rio abaixo, rumo a Marabá, sua rota original era até Belém, lá
se fomos rumo ao norte e debaixo de uma foguetada danada, era foguete para
chegar e era foguete para sair. Era assim em todo lugar que aquele homem
chegava com seu barco, me disseram que faziam mais festa para ele por onde
andava do que para Barata (Governador do Pará) Tinha um maravilhoso poder de
arregimentação.
A previsão da viajem era de um
mês e eu não poderia ir com ele até o fim, voltaria em outro barco, depois de
uns oito dias de viajem.
Era Impossível esquecer algo assim, logo no
primeiro dia eu começava a ver um novo mundo, cheio de esperança não cabia em
mim tanta alegria e uma paz agradabilíssima tomou conta de meu coração me
fazendo entorpecer ante aquela maravilhosa paisagem.
Levantei a cabeça e olhando
para traz, lá da proa do barco eu via São Felix se afastando rapidamente,
quando a campainha acionada pelo piloto Juvêncio soou três vezes e fomos a toda
força a frente e um apito surdo e longo repetido varia vezes avisava que já
estávamos de viajem. Pouco mais rio abaixo passávamos pela aldeia Carajás de
Santa Izabel no lado da Ilha do Bananal.
O mestre Tônico veio para a
proa e sentou-se ao meu lado e começou:
--Afinal de onde você veio? Parece que entende de tudo um pouco, já sabe quase tudo a respeito do motor.
· --Eu sou do Estado de São Paulo, São José do Rio Pardo e fui criado pelos meus avôs que eram alemães e trabalhando dentro de uma oficina.
· --Isto explica tudo, o que pretende fazer por aqui?
· --Viver e aprender de tudo que puder.
· --Então comece aprendendo a pilotar, vá lá para a popa ajudar o Juvêncio.
Era por volta das cinco horas
da tarde e umas nuvens negras e carregadas vinda do norte pareciam subir pelo
rio acima, Juvêncio estava preocupado e eu também.
· --Comandante é bom aportarmos naquela praia alta em frente á barreira da Cotia o tempo esta fechando e o vento vem muito forte.
· --Atenção todos preparar para aportar.
O barco virou o rumo para a
praia alta e logo aportávamos, os marujos pularam em terra de corda e zinga na
mão para amarrarem o barco, desceram a prancha e os passageiros que eram ao
todo, dose com os dois doentes, vieram para a praia, os doentes ficaram dentro
do barco em suas redes.
· --Amarrem bem e não acenda fogo, apagar motor.
· --Motor apagado e cilindro fechado - grita o ajudante de maquinista.
· --Vamos aguardar o que vai acontecer.
E aconteceu mesmo, o vento
virava para o sul, depois para oeste, relâmpago iluminavam tudo em meia hora o
céu estava escuro e fechado e um enorme temporal com muito vento veio para cima
de nós.
· --Atenção, todos, segurando o barco – gritou Tônico.
O grande barco balançava igual
uma canoa de papel na fúria do vento, de repente ouvi um enorme estalo tal um
tiro de carabina, umas das zinga que seguravam o barco na proa se partiu em
duas e o barco abriu a proa forçando a popa a arrancar a outra zinga.
· --Vamos, pulem para dentro do barco, temos que funcionar o motor - gritava Tônico em meio aos estampidos dos relâmpagos.
Os raios que caiam mostravam
como estávamos nos afastando rapidamente da praia rumo à barreira se fosse de
encontro a ela estaríamos perdidos, mas ainda estávamos distante, e, eu e o
Tonico dentro do barco na casa de maquinas, no piloto Juvêncio tentava
controlar.
· Não dá para acender o maçarico para esquentar a cabeça, o vento não deixa, vamos tentar dar partida a frio, você Dankmar pegue sua camisa molhe ali na gasolina e de um cheiro na entrada de ar, vai dar certo o motor ainda esta quente você Juvêncio fica no piloto.
· --Em meio minuto eu estou pronto – gritei - Pronto, pode experimentar.
· --Lá vai – o mestre soltou a alavanca do ar comprimido, descomprimiu e abriu o pistão e quando o motor embalou soltou de uma vez foi uma pancada lá no fundo como quem não queria nada, mas prosseguiu se movimentando.
· --Tire o cheiro.
· --Pronto – gritei quando vi o tão perto que estávamos da barreira, e eu todo molhado da água que as ondas jogavam dentro do barco, mas o velho motor deu uma segunda batida, uma terceira e firmou a aceleração foi quando a campainha deu três batidas pedindo toda força e o mestre Tônico levou o acelerador ao fim bem de vagar o barco parecia ter criado vida foi quando ouvimos as vozes dos dois doentes:
· --Graças a Deus, Graças a Deus - foi ai que me lembrei deles, mas agora com a força do motor o barco enfrentava as ondas de frente cortando-as ao meio e já rumava de volta para a praia e todo orgulhoso enfiou a cara na areia até encalhar, estávamos salvos, mas eu estava tremendo, e não era só de frio.
· --Muito bem alemão, assim é que se faz - comentou o Comandante Bosaipo me dando uma tapa nas costa que parece doer até hoje, mas eu gostei e me senti orgulhoso, muito orgulhoso mesmo.
Acendemos uma bela fogueira,
com lenha molhada, deu trabalho, mas pegou e os velhinhos doentes se
esquentaram e trocaram de roupas, enxugaram as redes e só de madrugada estavam
dormindo calmamente, partimos assim que o dia amanheceu e logo passamos pela
Aldeia do Fontoura, depois Mato Verde, uma pequena vila fizemos uma parada e
seguimos para a Barra do Tapirapés, Fomos pernoitar em Santa Terezinha, o porto
não era muito agradável, mas fomos bem atendidos pelo Napoleão e pela sua
mulher Verônica. Soubemos que o Padre Pedro estava lá no casarão no morro de
areia.
Combinei passar uns dias em
Furo de Pedra uma pequena vila mais abaixo um pouco, eram umas poucas casas,
mas era também parada obrigatória dos barcos, para mim estava bom. O barco Frei
Chico seguiu sua viajem e eu fiquei. Foi ali que comecei aprender quase tudo
sobre o Padre Pedro em conversa com os moradores daquela localidade,
especialmente com o meu amigo Cavalcante embora eu viesse desde São Félix
acumulando dados sobre o mesmo acabei chegando à seguinte conclusão;
&
O Padre Don Pedro Maria Casaldaliga Plá...
Padre Pedro Maria Casaldaliga
Plá havia chegado da Espanha e começado sua vida de prelado por Conceição do
Araguaia, participou da famosa guerrilha do Xambioa da qual falaremos mais
adiante, assunto que trataremos neste livro, e viu que aquele sertão ali a sua
frente era um grande potencial humano adormecido e em estado latente, urgia
implantar naquelas mentes desavisadas e desprovidas de qualquer base filosófica
e de um melhor conhecimento da nossa história social “A Conscientização das
Massas”, a exemplo de Abraão o patriarca bíblico que é o patrono do MST. A história
nos conta que em Gêneses, logo no inicio do velho testamento que “acreditando ter ouvido ou tendo ouvido a
voz de Deus” (naquele tempo convinha a aqueles povos bárbaros que existissem
dois Deuses um bom e outro mau) que assim lhe falou: “Abrão saí da casa de teus
pais e das terras de teus parentes e vai para a terra que te mostrarei EU te
abençoarei e farei de ti uma grande nação tende a minha benção”, Abraão foi
para a Canaã aonde deveria correr leite e mel ou mais conhecida como Palestina
e ali chegando encontrou a terra prometida habitada por Caldeus, Filisteus e
Saduceus. A tribo do patriarca
incentivada por Ismael o filho da escrava Agar travou batalha com os
habitantes e tomaram-lhes as terras, foi
o primeiro movimento MST na historia Universal, mas voltando para eles, os
nossos sertanejos, homens simples do campo, sem conhecimento de nossa historia
social não se importavam com ideologias políticas fossem elas de esquerda ou
direita, importavam sim fosse seu objetivo alcançado e este era simplesmente a
sua fixação a terra. E Casaldaliga viu ali seu potencial de marginalizados, e
nestas mentes desprovidas e abertas e lançou a sua semente de “Conscientização
das massas”.
Ninguém melhor do que a
habilidosa e gentil raposa progressista da Prelazia de São Felix para explorar
esta situação. Ele se auto promoveu a Bispo, passou a ser Don Pedro Maria
Casaldaliga Plá o Bispo da Prelazia de São Felix do Araguaia, o nome Maria em
homenagem a Virgem Maria, e a pastoral de sua Igreja Particular delineava a
atualidade do tema “Viver” entre os pobres, com eles e sendo um deles,
reivindicar uma repartição mais justa e igualitária dos bens particulares e das
riquezas, pretendendo que todos os homens nasçam iguais e conclamá-los a luta
pela classe na defesa de suas posses era a sua tríplice missão: “Evangelizar A ðqlavra de Deus, administrar
os sacramentos, e servir de pastor e pai dos marginalizados”.
Sabia-o bem o Bispo que nem todos os homens
nascem iguais, uns nascem cegoc,`gutros aleijados, mudos e surdos ou outras
doenças e destas diferenças necessariamente se seguirão às diferenças sociais,
mas era ele, o Bispo, a única esperança dos marginalizados. Uma cruzada
apocalíptica teve início u 5ei Gqerra violenta foi declarada/ Ára o poder
econômico latifundIáòyo apadrinhado pateticamente a leis absoletas e do outro
ladn ës posseiros regidos"pmma batuta de Casaldaliga e seus agentes
pastorais. Muita gente foi maósa!rada nesta luta desigual e sem quartel/ Ôadres
e posseiros foram sacrificados, grileiros e fazendeiros tombaram. Erravam-sd
àos dois lados, mas eram os ossoó d- oficio. Antes os posseirgs pemiam os
fazendeiros, hoje estes os temem. Antes aqueles lhes ofereciam guerra, hoje
pedem paz. Leis foram sendo renoratcs inteligentemente protegendo os pioneiros,
mas a confusão se generalizou quando começaram a chegar levas de nordestinos, mineiros
e de outras bandas do Estado de Mato Grosso, gentes na maioria sem tradição de
agricultura, mas que buscavam ansiosamente um pedaço de terra para
qe(dstabelecer e se misturaram aos pioneiros nativos da região.
Semente o Bispo passou a organizar"smts
desesperançados seguidores os orientado a não recebeve}"títulos de terras
definitivos fossem de particulares ou do Estado sob a afirmação de que eram
falsos e instruía-os através de seus agentes pastorais, a lu|aeberta contra
seus pretensos benfeitores. De simples homem do camxok sertanejo passou a
condição de rebelde e revolucionário e eral ðreinadoc 4ibc isto numa situação
que a própria sociedade impôs ao marginalizá-los. Èoj' são umar âorças crescentes
em buska`e uma libesdåde quase evangélica e sabe muito bem que são as pólvoras
do$bqpril reacionário as esperas da mecha ardente, foi assim que
começaram. Eu senti isto na pele, pois
era muito chegado a muitos deles, e passei a viver entre eles só não conseguia
entender porque se deixavam manobrar pelos clérigos, mas, pensando bem eram
aqueles os únicos que tinham coragem para direcioná-los.
&
A
viagem de volta a São Felix do Araguaia.
Fiquei em Furo das Pedras por dois dias depois peguei carona com o barco do adventista Antônio Pereira Macedo e comecei a voltar rio acima, no mesmo dia chegamos a Barra do rio Tapirapés, nosso piloto era o índio Carajás Savarú aquele lá de Leopoldina, foi uma festa quando nos encontramos no porto do Furo das Pedras, ele não se esquecera de mim.
Barra do Tapirapés era um local
bonito, o nome rio Tapirapés quer dizer “caminho de anta”, logo na entrada era
o Posto Indígena Heloísa Torres dos Índios Carajás, e quem tomavam conta era o
negro Valentim e sua mulher Joaninha, ao contornar a curva entrava-se em um
lago e ali moravam a Dona Inês e seus filhos, João Pinheiro, José Célio,
Luciana, Natividade, Oleriano, Raimunda e o Francisco, gente boa e amável
passamos três dias com eles e bem perto ficava a aldeia dos Índios Tapirapés,
lá as freiras irmãzinhas de Jesus e o padre (Chico) François Jaques Jentel e
Focault eram os missionários franceses que zelavam dos índios Tapirapés.
Aportamos na aldeia dos índios
Carajás e fomos para a casa principal que era a sede do Posto onde o negro
Valentim morava com sua família, ainda me lembro daquele sorriso eterno que o
negro tinha no rosto e da magia humilde de pura bondade gravada em sua esposa,
eles não sabiam o que fazer para nos agradar, eu fui logo intervindo:
· --Calma meus amigos ainda vamos ter muito tempo para conversarmos e falarmos de outros mundos lá de fora.
· --Eu mesma estou com uma saudade louca de passear em Leopoldina, Goiás Velho, Goiânia, faz tanto tempo que não vamos lá fora - murmurou tristemente a esposa Joaninha.
Tomamos café com um bolo
chamado “Mané pelado” feito de mandioca.
O Antônio Pereira terminando
seu café vendeu um bocado de coisas para o Chefe do Posto, os índios também
compraram algumas miçangas e a maioria trocava por enfeites, boneco de barro,
cocares, arcos e flechas, enfim tudo que fosse arte indígena o Antônio Pereira
as comprava a troco de mercadoria, era este o seu negocio, ele vinha de Goiânia
com suprimentos e os trocava por enfeites que levava para Goiânia e os
revendia, era, ao que parecia, um negocio rendoso. Da casa de Valentim fomos a
pé para a casa dos Pinheiros. Eu ouvi a história daquela pioneira...
Cheguei a este lugar em 1926,
eu e todos os meus.
Em agosto de 1926 chegaram à
barra do rio Tapirapés com o rio Araguaia o pioneiro Pio José Pinheiro e sua
mulher dona Inês, com eles vieram Sebastião Pereira e outros, no inicio se
instalaram junto ao morro da barra, mas a grande enchente do ano de um mil
novecentos e vinte e seis fizeram com que na junção dos rios Tapirapés e
Araguaia a água corresse entre os morros vazando por dentro e os obrigaram a se
mudar e, então habitaram ás margens do lago Tapirapés aonde se formou um grande
mangueiral que mais tarde se tornou a aldeia daqueles índios, daí, ele
Sebastião, partiu para o rio Gameleira no alto rio Tapirapés, Siríaco e Pedro
Madalena ficaram no porto “Beira Rio” hoje Porto Alegre do Norte, Inês e Pio se
encravaram entre os morros na barra. Os índios Carajás moravam no então lado do
Estado de Goiás na ilha do Bananal e no verão mudava-se para a praia da ponta
sul da Ilha Grande e em 1941 mudaram-se definitivamente para a barra no lado do
rio Araguaia no Mato Grosso, trazidos por Antônio Wanderley Chaves e em 1943
chegou para assumir o posto o grande contador de histórias o negro Valentim Gomes e sua esposa.
A casa daquele povo era no máximo uns
mil metros distantes, de longe ouvíamos o som de um violão e alguém cantando “Foi na casa de Mané Pedro - numa noite de
São João - Toquei moda de viola e cateretê lá do meu sertão – cantei modas paraguaias
para alegrar um coração – eu fiz muita veia chora e muita moça sentir
paixão...”.
· --Oi de casa? - gritei.
· --Vamos entrando minha gente, por favor - Convidava o cantor ainda com o violão na mão.
Entramos naquela humilde, mas
bem zelada casa e seus moradores foram aparecendo um a um e sempre nos
cumprimentando. Ficamos muitas horas conversando, nos éramos dois, eu e Savarú,
o Antônio Pereira ainda estava na Aldeia Carajás, e só ao escurecer aportou o
barco na improvisada enseada da Dona Inês e foram todos para a casa da
pioneira.
Foi quando fiquei conhecendo
aquela família que era comandada pela Dona Inês. Era seus filhos a Raimunda Pinheiro que tinha
os filhos, José Célio, José Lúcio, José Augusto e José César, a exceção de José
Célio que era filho biológico de Eloi Pinheiro os outros eram filhos de Lucio
Pereira Luz, depois vinham o Oleriano que era solteiro, a Natividade era casada
com Raimundo viviam e uma eterna e gostosa briga, a Luciana, até então estava
solteira e o João Pinheiro se casou com a minha futura cunhada Raimunda
(Mundica) era filha do Aleixo da Ilha do Bananal irmã de Maria. Ambos morreram
prematuramente, mas deixaram três filhos, Ronaldo (Hoje Pastor Evangélico em
evidencia), Pretinho teve uma vida complicada e hoje amargura as recordações,
Ronilda que sumiu no mundo deixando para traz uma pequena herança de algumas
cabeças de rezes e nunca mais deu noticias, ela era nova forte uma bonita
morena.
Estivemos quatro dias
hospedados na casa da velha pioneira.
O nosso herói Valentim Gomes era também um exímio pedreiro, construtor, eletricista e encanador, e um fabuloso dom de contar historias tanto mitológicas, como algumas jocosas mas sempre comum fundo de verdade, era o maior folclorista que conheci O homem era pau para toda. Construiu o Posto Indígena Heloisa Torres da Aldeia Carajás fabricando artesanalmente tijolos de adobe, madeira serrada no “gurpião”, cobertura de palha, e tudo mais foi feita ali mesmo na barra do Tapirapés. Os índios mais conhecidos eram os Tapirapés, Pranchui, Cantariô, Marco, Cantidio, Leonidas, José Cabelo Ruim e Penacho. Os mais conhecidos eram os índios Carajás Savarú, Wererremhy e Manoel Tucano. Em 1948 o Bispo Don Luiz visitou aquela região indo até a fazenda São Pedro onde morava o Coronel Lúcio Pereira Luz. *
A Bandeira Piratininga...
E os índios Xavantes.
Enquanto isto, em São Felix do Araguaia, o Comandante Willy Aurelli e os membros da Bandeira se preparavam para realizarem a missão a que vieram...
Programava-se uma viagem pelos
sertões para entrar em contato com os arredios índios Xavantes, era esta a
verdadeira missão da Bandeira Piratininga.
Os sertanejos, Severiano Neves,
Ateneu Luz, Amâncio de Melo e José Lagoa, se incumbiram de arrumar os animais
para a viagem e também o interprete.
Eles mesmos seriam os guias. No
dia seguinte, á tardinha, os animais dormiram fechados em um piquete.
Reunimos no acampamento para
traçarmos o roteiro de nossa viajem, era ainda cedo da tarde, mas estávamos
todos apreensivos.
--Partiremos
amanhã, o mais cedo possível, todos devem levar estritamente o necessário, não
esqueçam os cantis, vinte tiros para cada um, e a tralha de acampamento nas
cargas das duas mulas, corneteiro toque alvorada às cinco horas. O Dankmar será
o coordenador, procurem com ele os seus apetrechos. Plantões na escala. Boa
noite.
Tínhamos um corneteiro, e por
incrível que seja ele tinha uma corneta velha e barulhenta e como tocava mal,
mas o caso dele não era ser um artista, fazia barulho porque gostava.
Parece que nem cheguei a
dormir logo a dita corneta estava no ar, nos reunimos todos e de cabresto na
mão e fomos para o pequeno pasto pegar os animais. Foi uma confusão dos diabos,
ninguém conseguia pegar ninguém, Severiano teve que intervir senão a revolução
começaria ali mesmo. Trouxeram-me um cavalo castanho, bem desarnado e manso.
--Este
cavalo tem um andar muito bom é marchador.
--Obrigado
João Irineu.
--Vamos
arriá-lo.
Levei o animal até onde estavam
os arreios, escolhi um bom que tinha suador (tipo de almofada entre o arreio e
o lombo do animal) e a curva do arreio era alta e não iria ferir o lombo do cavalo, arranjei um peitoral e um pelego de lã
de carneiro surrado mas macio, amarrei
minha tralha na garupa bem forrada e depois fui ajudar os outros.
Já
eram quase oito horas da manhã quando estávamos prontos para partir. O Willy a
frente, a guisa de um herói tirado dos filmes
americanos levantando a mão Gritou:
Todos
em fila indiana, Em Frente...
Até
que eu gostei, mas fiquei lá pelos últimos lugares, éramos uns 22 cavaleiros. A
partida até que foi bonita teve corneta e aplausos dos ribeirinhos. Saímos em
fila indiana, na frente iam o Severiano e o Chefe, emparelhados e logo atrás o
interprete, e o resto do pessoal, éramos 22 pessoas ao todo. Eu fiquei quase no
fundo da fila, era melhor para se observar os acontecimentos, junto comigo
estava o Ateneu, João Irineu, o húngaro Harpad que se juntara a nos, o
Manoelzinho filho do Zé Lagoa e o João
Irineu vinha por último tocando as duas mulas com as cargas.
Criado no sertão de São Paulo
em cidade pequena e fazendas eu tinha bom costume de andar a cavalo, mas as
maiorias dos meus companheiros ainda não estavam acostumados e, poucas horas
depois eu já os via atravessados em cima de suas celas poupando os fundilhos.
Ao meio dia paramos para comer. Foi um alivio, afrouxamos as selas e fomos dar
de beber aos animais, estávamos bem na beira do rio Xavantinho, comemos alguma
coisa a sombra das arvores, enchemos os cantis e prosseguimos a nossa
cavalgada. Foi mais dois dias ziguezagueando pelo sertão, sempre com a mata do
rio a vista. Eram umas duas horas da tarde quando um dos guias mandou parar e
foram observar as touceiras de piaçabas que estavam com as folhas cortadas e
havia muitos rastros pelo chão.
--Estamos
perto da aldeia olhem onde tiraram as palhas para cobrir as casas e os rastros
estão frescos no chão, daqui para diante vamos calados e a pé puxando nossos
animais.
--Tudo
bem, agora vamos todos apear dos animais, fiquem calados e siga-me, ninguém
faça coisa alguma sem minha ordem – comandou Willy.
Bem a nossa frente ainda junto
ao rio Xavantinho, dentro de uma clareira limpa do cerrado, estava à aldeia
Xavante. Eram umas trinta casas feitas de varas e cobertas de palha. Até então
não haviam notado nossa aproximação. No interior da aldeia só estavam às
mulheres, meninos e os velhos, uns quatro cachorros muito magros e umas araras
gritalhonas. O interprete mais dois homens junto com Willy entraram na aldeia e
os tentavam acalmá-los falando em Xavante, pouco adiantou, foi uma corredeira
maluca, mulheres arrastavam as crianças pelos braços gritando as velhas e os
velhos gesticulavam, mas corriam, e, em pouco tempo estávamos sozinhos dentro
da aldeia. Os guerreiros estavam fora, mas não por muito tempo, em menos de
meia hora estávamos praticamente cercados dentro do limpo da aldeia. Os
guerreiros começaram a chegar todos pintados de vermelho e arco e flechas
outros com borduna na mão e batiam o pé ameaçando nos atacar, nos estávamos
preparados com um monte de fuzis velhos e descalibrados para resistir se fosse
preciso, bem?, eu acho que estávamos, bastava atirar em qualquer rumo
certamente acertaríamos em alguma coisa em que não fôssemos nós mesmos. Mas o interprete e Willy desatando as bruacas
das mulas tiraram lá de dentro, panelas luminosas, facões, machados, rapaduras, enfim um monte de coisa e colocaram no chão ao
alcance dos índios e se afastaram o interprete explicou para o chefe deles
que estávamos ali em missão de paz e que éramos amigos e havíamos trazido
presentes para dar e trocar. Logo foram se aproximando dos presentes no chão,
os pegavam e os examinavam e pediam mais. O nosso interprete se aproximará e
junto com Willy e Severiano, já começavam a se entender. Pouco depois estávamos
todos descontraídos e trocávamos canivetes por flechas, ou outros enfeites que
começaram a aparecer e os índios davam a impressão que estavam entendendo tudo
e em pouco tempo já queriam até nossas roupas, mas não os deixamos tocar em
nossas armas, ficamos lá dentro por mais de uma hora quando a corneta tocou nos
assombramos e os índios também e Willy gritou para o corneteiro.
--Tocar
retirada imbecil - Pare com isto.
--O
Senhor mandou tocar retirada? (o corneteiro havia dado o toque de atacar só que
ninguém conhecia tanto fazia tocar qualquer coisa o que queríamos era sair
dali)
--Mas
agora já chega todos montados e em retirada, saiam em filas duplas e se ajuntem
lá fora no varjão.
Com esta confusão nos retiramos
e os índios nos acompanharam um bom pedaço, nossa viajem havia deixado um saldo
positivo, o contato fora pacifico e os índios prometeram ir ao nosso
acampamento.e realmente foram.
Após cinco dias e meio, ao
todo, de viagem chegávamos de volta a São Félix do Araguaia, parecíamos
remanescentes de uma guerra civil, todos mutilados mais por baixo do que por
cima, mas valeu à pena. Poucos dias
depois aproximadamente setenta índios
vieram passaram cinco dias em perfeita harmonia entre os bandeirantes e os
moradores de São Felix do Araguaia.
Doze dias após o retorno da
missão, os índios visitantes já tinham retornado a sua aldeia o que a Bandeira
se propusera a fazer estava realizado e consolidado, ato seguinte seria
retornar para São Paulo, O que foi feito e a Bandeira se despediu dos sertões,
pois havia sido a sua ultima e saudosa expedição.
Voltarão quase todos, uns
tristes e outros alegres, eu mesmo estava morrendo de saudades daquela morena
trigueira lá da barreira de São Pedro na Ilha do Bananal motivo pelo qual eu não
voltei, pois havia plantado meu coração naquelas paragens, Barreira de São
Pedro, pois aquela morena estava lá e ela havia mexido comigo. Passei o resto
do ano viajando entre Mato Verde e Barreira de São Pedro e finalmente resolvi dar um pulo em São Paulo encontrar
com meu irmão Rolf e minha mana Aracy, levei uns cinco chifres de Veado Cervo,
umas peles de onças e Jaguatirica e óleo
da banha de tartaruga para vender e fui bem sucedido
Foi um período cheio de
dificuldades, mas muito emocionante depois de passar uns dias com meus irmãos
já estava pronto para voltar ao sertão e seria para ficar por lá, levava vários
presentes para minha “noiva e seus parentes” e lá se fui eu rumo a Mato Grosso
e ainda com uns bons troquinhos no bolso..
Meu irmão Rolf só poderia vir comigo no
final do ano, assim voltei sozinho e até a cidade de Goiás não foi muito
difícil, mas daí para frente estava quase impossível prosseguir viagem, pois
era mês de fevereiro de 1949 e era um período com muita chuva.
Hospedei-me no Hotel Carrascosa
que era o prédio de um antigo presídio agora transformado em hotel.
A estrada para Leopoldina
estava totalmente alagada e, veiculo algum passaria pelo trecho conhecido como
“os currais”.
O único jeito de chegar a
Leopoldina seria ir a pé, afinal eram apenas cento e quarenta quilômetros de
lama e água e um rio para atravessar, ainda bem que tinha uma ponte conhecida
como “ponte do Ferreira”.
Foram três dias e duas noites
de uma longa, calma e solitária caminhada, na saída peguei uma carona até a
vila de Tapirapuâ, depois foi no pé e numa morada perto da ponte do
Ferreirinha, ofereceram-me uma farta janta e canto para repousar. Passei pelas
águas de São João onde brotava uma água quente que cheirava a enxofre e tornava
o chão muito liso e escorregadio mesmo assim tomei um salutar banho. Cheguei a
Leopoldina ao escurecer do terceiro dia, estava cansado e com fome. Hospedei-me
na pensão da dona Chiquinha, uma mulher muito gentil e bonita, jantei bem e
dormi melhor.
No outro dia cedo fui até a
barranca do rio e encostei-me ao velho e saudoso pé de Tamboril. O porto estava cheio de barcos, desci e fui
perambular entre eles foi quando um senhor bem forte e moreno que ajeitava a
carga em um pequeno barco me perguntou:
--Procurando alguma coisa?
--Sim, um jeito de descer o rio.
--Até aonde?
--São Felix ou Luciara.
--Eu vou para lá, você sabe funcionar o motor?
--Acho que sim.
--Se quiser ir conosco terá ir tomando conta do motor de popa e
não se incomode com a pilotagem, afinal o rio está cheio e vamos levando um
índio Carajás que te mostrará o caminho.
--Eu topo, quando saímos: perguntei.
--Depois do almoço,
O nome dele era Raimundo
Ferreira o Raimundão era nortista de Pernambuco e comerciante ambulante,
aproveitei a manhã para conhecer o motor de popa que era um motor de quatro
tempos marca Archimedes de doze cavalos com dois pistões laterais e uma hélice
para 50 % peso e 50% velocidade, logo aprendi a lidar com a máquina afinal
tinha nascido e me criado dentro de uma oficina mecânica e motores para mim não
eram surpresa. Fiquei conhecendo uma quarta pessoa que também ia naquela viagem
seu nome era um jovem chamado Mariano, nos éramos, ao todo, o dono do barco, o
Carajá de nome Kutiri eu e o Mariano, como o barco deveria parar em todo
vilarejo ou porto a viagem iria demorar alguns dias, talvez oito.
Às duas horas da tarde, todos
embarcados, o barco bem carregado, o Carajá empurrou a proa para fora e deu
sinal e eu funcionei o motor virando aproa rio abaixo observando o índio que
mostrava sempre o rumo a seguir para evitar os lugares perigosos, logo aprendi
o que era o canal mais fundo, passamos pelo travessão de pedra, seis léguas
abaixo por uma fazenda beira rio chamada Dumbasinho, depois passamos pelo
quilombo do Travessão Riuna e já escurecendo aportamos em uma praia em frente à
vila de Cocalinho que ficava a margem do rio do lado de Mato Grosso. Amarramos
o barco em duas zinga de madeiras, ascendemos uma fogueira, passamos um café e
assamos uns peixes que o Mariano e o índio pescaram. Dormimos bem e de manhã
acostamos ao porto da Vila e o patrão foi vender mercadorias. Ele já tinha uns
fregueses cuja família era muito conhecida como “Dico Naiva ou Naves”
Assassinato
cruel.
Naquela manhã um fato inédito e
terrível havia acontecido naquele lugarejo, certo individuo chamado Beneditão
matou um homem com cinco tiros e sentou-se em cima do cadáver com uma faca
peixeira na mão e continuou furando o corpo da vitima quando ele se mexia e
assim ficou por varias horas e o sol já estava quente.
Fiquei sabendo que finalmente o assassino
cansou-se de ficar sentado em cima da vitima, levantou-se e foi encher a cara
de pinga e que fora detido quando um único soldado militar daquela vila que
assistia impassível o andamento do crime se aproximou e o algemou levando-o
preso para uma pequena cela.
Fiquei conhecendo a família
Naves que tinha um grande comercio de mercadorias em geral e o pessoal do
Benedito Sardinha e ainda a Professora dona Tonica.
O que sempre me causava certa estranheza era ver o meu então patrão que de
vez enquanto se mostrava violento.
Na parte da tarde prosseguimos viagem
passando pela casa do Alfredo Alemão, depois avistamos São José dos Bandeirantes
que também ficava do lado de Goiás, era uma boa vila onde passamos a noite e o
dia seguinte até ao meio dia.
Seguimos viagem até a Vila de
Luiz Alves onde fiquei conhecendo um simples cidadão que se chamava Major,
gente muito boa e educada, já era o terceiro dia quando avistamos o braço do
rio Araguaia o rio Javaé em cuja forquilha começava a Ilha do Bananal. Dormimos
em uma praia junto à volta grande, no quarto dia pela manhã chegaríamos a
Barreira de São Pedro.
Durante a viagem eu vinha
conversando com Mariano:
--Você vai ficar no São Pedro?
--Sim vou morar e trabalhar lá, por quê?
--Bem, é só você não se engraçar por uma morena que mora lá.
--Quem é ela?
--Maria, seu nome é Maria.
--É, vamos ver o que acontece.
Logo depois da pequena curva
avistamos a Barreira de São Pedro, manobramos e aportamos no único porto
existente.
Quando desembarcamos e subimos
o barranco do rio, as moças, todas elas, abriram os braços e vieram correndo a nos
encontrar gritando:
--Ele chegou... Ele chegou - vieram correndo no meu rumo e eu
fiquei extasiado e me preparei para recebê-las, mas passaram direto por mim e
foram abraçar o Mariano, foi ai que percebi tudo, o meu companheiro de viagem
era irmão delas. Ainda bem que controlei minha língua durante a viagem.
Passei um dia bem alegre, foi o
começo de uma grande amizade com aquela família, que dura até hoje,
Dormimos naquela fazenda que era de Ubaldino
Rios um fazendeiro que morava na cidade de Goiás Velho, o Aleixo era o vaqueiro
e gerente que cuidava de aproximadamente quinhentas cabeças de gado bovino, a
maioria da raça Nelore e tinha de entremeios muitas “Curraleiras” que eram
vacas originadas da raça Holandesa e já adaptadas ao nosso clima eram muito
boas de leite e de uma excelente carne, e gostavam de dormir dentro do curral,
daí a origem do nome curraleiras, mas eram muito mansas, mas teimosas e
ardilosas como todo estrangeiro.
Prometi voltar em breve e voltei mesmo, assim
que chegamos a São Felix do Araguaia, pela segunda vez, fui bem recebido, já
tinha muitos amigos exclusive o Severiano Neves e toda sua família.
Em menos de um mês eu já tinha
arrumado um motor Penta de 4 HP e uma canoa grande que podia carregar até dois
mil quilos. O motor era lento, mas econômico e era apropriado para peso. Comecei
a arranjar uns poucos fretes e corridas entre São Felix e Luciara ou Santa
Isabel na Ilha do Bananal.
Voltei por muitas vezes durante os dois anos
que se seguiram para aquela fazenda e a amizade se transformou em compromisso,
pedi a mão da moça em casamento, mas neste meio tempo precisei voltar a São
Paulo para buscar meu Irmão Rolf que veio comigo, mas preferiu ficar em
Leopoldina, anos depois ele se elegeu prefeito por duas vezes seguidas e
construiu um belíssimo Hotel, enquanto isto acontecia resolvi me casar.
O casamento e a família Gunther.
Na última viagem que eu havia feito para ir visitar a Maria, lá na ilha do Bananal, marquei o casamento para o dia 14 de março de 1953 e seus pais concordaram. No dia marcado estávamos todos reunidos em São Felix do Araguaia, havíamos chegado um dia antes apenas com um inconveniente a minha futura sogra estava doente e teria que ser recambiada para Goiânia, no dia seguinte após o sucesso do casamento em cujo evento compareceu a cidade toda, afinal era o primeiro casamento civil realizado naquela Vila de São Felix do Araguaia e até hoje o Livro do Cartório ainda mantém aquele registro com muito zelo e orgulho, casamento gravado a tinta escrita pela caneta do então escrivão Guilherme Pereira Luz numa caligrafia de fazer inveja. Assinaram vinte e seis testemunhas.
Fui para a minha pequena casa,
afinal casado tem que ter casa.
Eu havia construído um pequeno
barraco, foi à primeira construção fora da margem do rio, ficava quase dentro
do curral onde Severiano tirava lgi|d de suas vacas. Acontece que eu não tinha
uma cama e somente uma rede de dormir e naquela noite de núpcias deitarem de
dois em uma rede não foi fácil, assim que deitamow u"estávamos nos
agasalhando à corea¤se arrebentou e fomos para o cèãobe lá ficamos. Minha
estréia na vida de casidO&fgh um tanto tumultuada. Dias após o casamento durante certa noite,
um índio xavante estava olhando para dentro debcasa pela janela, quando
ele me percebeu correu e eu cautelosamente tranquei a janela, pois era uma
visita indesejada.
( $
Para prOvétenciarmos o avião que deveria leviriinha sogra para Goiânia
nos Apå|amos"pisa o radio do SPI – Serviço de Proteção aos Índios em SantaIúqbel
que zelava da Tribo Carajás, no outro dia cedo, ali pelas 11 horas um som rouco
e surdo se fez ouvir e a cidade inteira viu lá n !dto, muito alto no céu,
aquela figura que parecia um avião que começou a dar voltas e a descer, até que
num vôo rasante sobrevoou a pequena pista de pouso feita junto das primeiras
casas e em diagonal com o rio Araguaia. Finalmente pousou e estacionou junto ao
povaréu. O piloto desceu do avião passando a mão na testa exclamou:
--Aaaaqui que é São Felix? – (Era muito gago.).
--Aqui mesmo – respondi.
--Puxa pensei que tinha me perdido, é muito longe.
--Quem é o passageiro a que vim buscar?
--Meu sogro tomou a frente da conversa e logo depois do almoço
embarcaram no teco-teco do Alan Kardec Borges e sumiram rumo à capital do
Estado de Goiás.
Como presente de casamento o
meu sogro me fez um pedido:
--Dankmar me prometa que nunca irá morar aqui em São Felix do
Araguaia.
--Mas, qual a razão?
--Nenhuma é que a minha natureza não se dá com este lugar.
--Tudo bem, assim será – garanti e nunca morei naquele lugar
depois de casado.
No outro dia ajuntei meus pertences,
abandonei minha casinha e rumei em meu barco com a mudança para Mato Verde.
Eu já havia deixado muitos
amigos naquela vila e quando cheguei fui recebido pelo Coronel Lucio Pereira
Luz em pessoa:
--Ora se não é o jovem paulista, ouvi dizer que se casou?
Parabéns e se querem morar na nossa cidade venham morar na minha casa enquanto
ajudamos você a construir uma morada.
--Obrigado Seu Lucio nos precisamos aceitar.
Na parte da tarde já estávamos bem
instalados, fui até a cozinha e encontrei o Lucio colocando um relógio entre
uma brecha da chapa do fogão a lenha.
--Mas, para que isto seu Lucio?
--Entrou água no relógio e vou ver se consigo secá-lo.
Neste meio tempo o relógio
esquentou e escapuliu da mão do dono e foi bater no meio das brasas.
--Este já era um relógio, agora não é mais – comentou - vamos
dar uma volta pelas ruas?
--Vamos.
E lá se fomos conversando com uns e com
outros, ficamos batendo papo até o escurecer.
Os filhos do Coronel se tornaram meus
grandes amigos especialmente o José Liton. Ai começou a nova família “Gunther”.
Um fato que me constrangeu
muito foi quando numa manhã de sol ardente lá se ia o Cel. Lucio andando na rua
frente a um grupo de gente, ia com musica e tudo, atrás do homem ia um
sanfoneiro tocando sua sanfona de 16 baixos, me cheguei ao Lucio e perguntei:
--O que esta acontecendo?
--Tenho um assunto a resolver?
--E precisa desta parafernália toda?
--Recebi uma queixa que a Cotinha filha do Jardim estava
“Comendo um Carajá atrás da moita”.
--E o que você vai fazer?
--Expulsá-los desta cidade
--Só por isto?
--Só.
Chegamos à casa do tal de Jardim que era um
senhor dentro dos setenta anos e sua filha uma morena muito feia estava na casa
isto é se puder chamar aquela choupana com um só cômodo de casa.
--Jardim, - começou o Coronel – este índio foi me dar parte que
esta dona -mostrando a Cotinha – estava comendo
o filho dele atrás de uma moita e isto não pode acontecer.
--Mas que jeito eu posso dar Lucio? - Indagou agoniado o velho
de cabeça branca.
--Mande ela embora, não pode mais morar nesta cidade.
--Se ela tem que sair eu também me vou embora – respondeu
agressivamente o velho.
--Então tem até amanhã para se mudarem.
Saímos todos dali deixando uma
triste situação para trás.
No outro dia o velho e a filha já tinham se mudado não sei para aonde, mas nunca mais os vi. Eu achei que foi uma barbaridade aquela atitude de uma pessoa que se dizia fundador do lugar, mas o mundo de ontem era assim mesmo.. &
Anos 1953
O começo da família “Gunther”.
Como já relatei, eu me casei a 14 de março de 1953, foi o casamento numero um do registro civil de São Felix do Araguaia e o escrivão era um baixinho nervoso chamado Guilherme Pereira Luz, foi tudo registrado a mão em uma linda caligrafia, quase toda a cidade serviu de testemunha, naquela oportunidade o pai de minha esposa me recomendou que cuidasse muito dela, pois ela teria tido problemas quando ainda menina com água no pulmão e que ele mesmo e um vizinho Alfredo Alemão tiraram a água com um aparelho de injeção e ela realmente tinha nas costas a marca desta audaciosa, mas bem sucedida intervenção, e naquela oportunidade passei a morar em Mato Verde, hoje Luciara, minha esposa Maria grávida já de nove meses estava na casa de sua mãe a Joaninha Paciente na fazenda São Pedro, na ilha do Bananal. Eu havia deixado o meu barco em São Felix para calafetar e dali eu iria para onde se encontrava minha esposa para passar o Natal e ano novo com seus pais era por volta de 15 a 18 de dezembro, quando cheguei naquele porto mais ansioso do que nunca, afinal o meu primeiro filho ia nascer.
Despedimo-nos de sua família e
embarcamos no meu pequeno barco com um toldo improvisado, eu, Maria, o menino,
um Carajasinho que nos ia ajudando, um papagaio e o cachorro Batom.
O rio estava cheio por isto dei
o piloto para o jovem índio e fui conversar com a patroa e ver o cachorro Batom
e um papagaio que também eram passageiros, foi uma viajem maravilhosa até que
ao chegarmos a São Felix já a noite já estava
escura e desobedecendo as recomendações de minha sogra resolvi seguir viagem
para Mato Verde, eu fui pilotando afinal já conhecia bem aquele rio e seus
canais fomos bem até a barreira da Cotia, mas, abaixo da entrada do lago de
Pedra um vento forte nos pegou de surpresa e as ondas começaram a subir e a
jogar o bersm que chegava a disparar o motor quando a hélice saia
águe,0pelâmpago estrondeava a miúdo, o vento piorava e também as ondas, no
piloto e mandei o índio tirar(áGqa do barco, o vodeo improvisado foi arrancado
de uma só vez e jogado longe pelo vento forte,
Maria embrulhou o menino que estava com
qwif{e dias de nascido em um pano e o segurava fortemente junto ao peito,
comecei a ficar nervoso, não podia ir para a margem"e{puerda porque era
uma barreira alta e naufragaríamos, não podia virar para a direita porque se
ficássemos de atravessado as ondas nos tgmBeriam. As àgñas das ondas invadiam o
barco(fOm quando um forte relâmpago iluminou noite que eu enxerguei uma grande
ilha de capim e mururé, ou aguapí,0fescendo o rio junto à margem da ilha há
poucos metros a minha direita e sem pensar em mais nada joguei o barco contra
aqee,i$gbcnde moita nlUpuante. O barco entrou pelo balseiro adentro até onde
fIcïe ençan!hado.
Já não balançava tanto, o
balseiro amortecia a fúria das águas. Tomei um profundo suspiro e fui até onde
estavam á minha esposa e filho, todos molhados, mas vivos. Sequei a água do
barco e tive a alegria de ver o cachorrinho e o papagaio vivos escondidos no
bico da proa. Não demorou muito a águas e os ventos se acalmaram.
Limpando o retorno a facão me desembaracei do
nosso salvador, a moita de mururé e rumamos calmamente para a nossa casa, três
horas depois já estávamos acomodados lembrando o perigo que passamos, foi muita
imprudência minha viajar naquela noite, se o pino da hélice do motor quebrasse
estaríamos perdido.
Continuei a morar em Mato Verde ou Luciara como passou a se chamar àquela pequena cidade.
Anos difíceis...
Tragédias que marcaram a então “Mato Verde”
Retornando no tempo...
Adauta Baptista Luz era filha
do Coronel Lucio Pereira Luz e esposa de Flavio Baptista, eles tinham um único
filho e quando já rapaz cometeu o desatino de colocar uma bala de calibre 38
dentro de outro cartucho na espingarda e ao disparar o impacto foi tão grande
que a arma descanhotou e o tiro saiu para trás entrando cartucho bem na testa
do jovem que teve morte instantânea.
Um senhor de idade e nome Minelvino, como
não tinha privada em sua casa sempre fazia as suas necessidades no mato e neste
dia fatídico, se adentrou em uma moita no meio de uma área limpa junto à praia
e lá se agachou, acontece que dois garotos andavam com uma espingarda calibre
22 caçando qualquer bicho ou ave que encontrassem foi quando um deles viu o
vulto dentro da moita e alertou o companheiro:
--Olha...
Lá na moita tem uma capivara, atire.
O jovem não titubeou, atirou
acertando o homem bem no peito que apenas levantou-se para cair morto fora da
moita.
Tínhamos um trabalhador que
fazia serviços para nos em uma pequena posse e este homem tinha um filho de
aproximadamente 16 anos que tinha o habito de furtar besteiras e um dia que
isto aconteceu resolveu castigar o rapaz e amarrando-o começou a espancá-lo o
que resultou na morte do jovem. Maria, minha esposa mandou buscar o corpo do
jovem na chácara que estava jogado no chão infestado de formigas e todo cheio
de manchas roxas pelo corpo, o levamos para nossa casa e o enterramos e
denunciamos o pai, mas nada aconteceu com ele, esteve recluso apenas poucos dias.
João Vaqueiro era muito
conhecido de todos. Era realmente um homem simples que não incomodava a ninguém
e um grande amigo meu. João criava uns porcos na beira da lagoa em um chiqueiro
que havia construído e todos os dias tratava seus porcos. Um dia o acharam
morto com a cabeça quebrada e jogado dentro do chiqueiro e os porcos o estavam
comendo.
Ninguém nunca soube quem o matou.
Lúcio saíra cedo naquele dia quando
ao descer do cavalo para urinar uma cascavel lhe picou um dedo da mão, Lucio
não titubeou, arrancando o facão cortou o dedo ofendido. Era um comportamento
um tanto hostil, próprio de sertanejos daquela índole, eram homens que antes preferiam
morrer do que serem envergonhados.
Meu filho Daniel quando brincava
furou um olho em uma cerca de arame farpado, Maria se desesperou e procurou
todo tipo de recurso, entrou em contato comigo que estava em Cuiabá, e eu pedi
ao Liton para trazê-lo até Barra do Garças para tratamento, Maria havia lavado
o olho dele com o sumo de uma erva o que parece ter segurado mas não teve
efeito curativo algum, eu o levei pelo Brasil todo, passando por Campinas, São
Paulo, Goiânia e finalmente Brasília onde ele foi operado perdendo um olho, e implantaram
um olho de silicone, eu lamento este acidente até hoje, Daniel sempre foi muito
humilde e um bom filho.
Um acidente que abalou minha
vida e conseqüentemente de minha família que já éramos cinco sendo três filhos,
eu e a patroa. O que eu mais admirava era a coragem e a disposição de minha
patroa Maria ao enfrentar tantas loucuras minhas e tantas diversidades da vida
era uma nobre mulher, muito humilde, mas era forjada com a tempera de aço e da
dureza do diamante, como demonstrou certa feita em que Paulo e a Ruth estavam
mexendo na cozinha certamente procurando o açúcar que minha esposa sempre
guardava dentro das latas vazias de leite ninho como também guardava a soda
caustica para fazer sabão na lata em que era vendida e eram muito parecidas.
Paulo tinha apenas cinco anos pegando uma vassoura derrubou a lata lá de cima
da prateleira, mas a lata caiu e continuou tampada, mas ele não se deu por
vencido e com o cabo de uma colher destampou a lata quando a menina Ruth de
seis anos o advertiu:
--Paulo
isto ai é soda não vá comer que você morre a mamãe me falou para não mexer
nela.
--Você
não sabe de nada é açúcar quer ver?
Dito isto enfiou a colher
pegando um pouquinho e colocou na boca a soda agiu depressa queimando os lábios
e começando a queimar a língua, ele cuspiu fora gritando e a Maria ao ouvir os
gritos foi até a cozinha e viu o que tinha acontecido, pois o menino estava
sangrando nos lábios, imediatamente ela pegou uma mão cheia de sal e encheu a
boca do Paulo e depois a lavou por varias vezes o que deu um bom resultado, o
menino parou de sangrar e pudemos ver que apenas um tênue filete da queimadura
da soda começou a descer pela língua e rumo à garganta, mas não teve
conseqüência alguma. Paulo ficou com a boca mais fechada o que deu origem à meninada
o chamar de “sodinha” e “boca de papagaio”, e para zombar ainda acrescentavam
que ele havia nascido num oco de um pau na mata e que Maria o havia achado e
criado que ele era filho de papagaio, desesperado e chorando foi até a sua mãe:
--Mãe,
meus irmãos estão dizendo que eu sou filho de um papagaio e não da senhora e
nem de meu pai, é verdade mãe?
--Você
acha que é filho de papagaio? Até que parece – brincou Maria.
Ai que o menino se desesperou
e desconsolado saiu a correr e seus dois irmãos foram atrás dele e o trouxeram
até sua mãe que remendou chorosa:
--A
mamãe estava brincando, você não nasceu num oco de pau e é o filhinho mais
querido da mamãe e do papai – abraçou e beijou-o.
Meses depois eu o levei para
Goiânia e mandei fazer uma pequena cirurgia e os lábios voltaram ao normal. O
que valeu nesta historia foi à pronta e sabia intervenção de minha esposa e
quando eu perguntei a ela porque ela tinha usado o sal a resposta veio simples
e lógica:
--Usei
o sal porque quando estou fazendo sabão de sebo se colocar ou alguma peça tiver
sal à soda corta na hora tirando o efeito e adeus sabão.
O comício
eleitoral...
Liton havia programado um comício
eleitoreiro que seria realizado bem no centro de Luciara, mas o seu opositor
Manoel Martins Costa não estava gostando nem um pouco porque ficou sabendo que
os adversários iriam descer o sarrafo, e organizou um contra ataque,
isto é, revidariam na bala se o pessoal do palanque os atacasse com palavras.
Antes de começarem o comício eu fui até a
praça para ver o que estava e o que iria acontecer, estava encostado em uma
porta da casa comercial de Antonio Sousa, protegido pela sombra de uma arvore
que impedia a luz do poste me iluminar já"q}d era ali pelas ohtë horas da
noite, para mkn`` surpresa dois indivíduos encostaram-se a arvore, não me
viram, e comentaram:
--O Manoel disse para
metermos bala no pessoal do palanque se o agredirem com baixarias.
--Estou preparado disse o
outro – e seguiram uma rua abaixo o outro rulo¤rua a cima.
Sai de
meu esconderijo e fui procurar m Dhton e lhe contei o que ouvira, mas ele
retrucou:-
--Vamos ver se eles têm
coragem para fazerem isto, você vai subir no palanque também?
--Não, eu vou ficar de
fora não quero servir de !lvN para esses bandidos.
Achei
que a milhi!parte estava feita, Liton!e÷tava determinado a fazer o comício e
assim sendo procurei minha família, encontrei minha esposa e os filhos que já
%st@vam lá ee Maio a uma pequena multidão para assistir o comício e os levei
para casa.
--Maria leve os meninos
para casa agora mesmo, iwt"aqui nã 6ii prestar- e contei a ela o que
vira e ouvira. -oJá
avisou o Liton?
--Sim, mas ele não
acredita.
--Então vamos para casa
agora mesmo – e chamando as crianças determinei: todos - Agora mesmo vão para
casa.
Já estávamos deitados quando
escutamos um vozeirão vindo do comício e não demorou muito ouvimos uma
saraivada de tiros e gritos e muita correria, me levantei para ver o que estava
acontecendo foi quando Liton parou o carro na minha porta gritando:
--Tem muita gente ferida
e morta, vou levando uns aqui para o hospital em São Felix, vai lá ajudar
aquele povo.
--Eu te avisei, mas você
não escuta, agora não há mais nada a fazer a não ser enterrar os mortos.
Liton saiu em disparada e eu
fui até a praça ver o que tinha acontecido, o que vi e ouvi me deixou
estarrecido, durante o comício, na hora em que atacaram verbalmente o outro
candidato, vários homens armados começaram a atirar contra o pessoal que estava
no palanque e estes revidaram e descendo traçaram um corpo a corpo apelando
para as facas e revolveres, o tumulto era tão grande que ninguém sabia mais
quem era o outro se amigo ou inimigo tendo um deles derrubado o outro e
levantando a faca ia desferir o golpe mortal, mas o crime não se consumou
porque antes a vitima se virou para seu agressor e viu que era seu pai e o
mesmo viu que era seu filho.
Resultado: ficaram oito feridos, dois
morreram no local e três foram hospitalizados morrendo mais um depois.
Foi uma carnificina e ninguém foi preso.
O caso do Romildo
Um jovem capixaba que havia chegado recém em Luciara era primo de Flavio
Batista esposo de Adauta filha do coronel Lucio. Logo de inicio entrou em
conflito com Jose Liton irmão de Adauta tendo como pivô uma moça em uma festa e
foram aos tiros pela segunda vez Romildo acabou baleando uma mulher e um menino
que morreu, Na terceira vez após ter fugido da prisão em Barra do Garças ele
voltou acompanhado de um amigo e mataram um jovem Raimundo Pereira, por
vingança, à noite quando jantava em casa, ato continuo fugiu e foi perseguido e
finalmente encontrado em uma praia no rio Araguaia junto a Aldeia do Fontoura
foi morto pela policia ele e seu companheiro
O caso de Osmar Kalil Botelho
Osmar Kalil Botelho era casado
com a jovem Daily Luz Irmã por parte de pai de Jose Liton, O fato teve origem
por quase nenhum motivo, naquele bar, naquela tarde fatídica, certamente
bebendo e jogando sinuca estavam um grupo de jovens todos residentes em Mato Verde
ou Luciara, Osmar começou a discutir com outro jovem de nome Manoel mais
conhecido como Manoel do Narciso que era um velho morador, durante a discussão
Osmar que era meio esquentado sacou de uma automática Bereta de calibre vinte e
dois e disparou varias vezes contra o Manoel que se protegeu atrás do balcão,
mas a arma de Osmar pareceu enguiçar e neste lapso o Manoel sacou de seu
revolver calibre trinta e oito e disparou quatro vezes contra Osmar
atingindo-lhe o peito. Osmar morreu na hora e Manoel foi trancado em uma cadeia
improvisada, até que se tomassem outras providencias encaminhando o mesmo para
a delegacia mais próxima, mas durante a noite um pistoleiro invadiu a cadeia
foi até a cela e assassinou o preso Manoel do Narciso, todo mundo sabe quem foi
o mandante e sabe também quem era o criminoso, mas ficou elas por elas
enterraram os dois e acabou a briga.
Fatos pitorescos com alguns
inconvenientes.
Período de 1953 a 1968
Aconteceram
alguns fatos pitorescos, mas com alguns inconvenientes á época do
nascimento da vila Mato Verde e posteriormente já como Luciara.
O caso do Manduca...
Este fato aconteceu nos idos de
1934 na época da fundação de Mato Verde. Manduca jovem, devia ser simpático
porque se engraçou dele duas viúvas e como estavam indo as turras, Lúcio mandou
improvisar um ringue no meio de uma praça onde no mastro, ao centro, tinha dois
cortes de seda, duzentos cruzeiros em dinheiro, e dois vidros de perfume e um
par de sandálias e talco. Intimou as duas disputarem nos tapas o homem cobiçado
e quem ganhasse levava tudo, o homem e os presentes. E logo teve início uma
luta sem quartel, era tapa, coice e mordida de todo tamanho até que uma se
cansou e entregou os pontos e a outra saiu de braço dado com seu homem, os
presentes e muita palma e viveram bem por muitos anos.
O caso da dança.
Fatos inéditos marcaram o nascimento
daquela cidade, a exemplo a dona Francisca Miranda, mãe do Lúcio é quem ditava
as ordens e os costumes das novas terras e no dia de sua chegada na terra
prometida fez as mulheres dançarem de saia arribada batendo as nádegas umas nas
outras, era uma simpatia da “mística do congado africano”, para com isto evitar
ataque dos índios.
O caso da pescaria.
Uma noite eu adormeci pensando
em ir pescar uns “pacus” no outro dia cedo e levaria a patroa comigo, eu queria
mostrar a ela quem era o bom de pescaria. Assim que acordei a convidei, tomamos
o nosso café da manha, arrumamos a tralha de pescaria, pegamos dois remos e os
chapéus de palha, as iscas de massa de farinha e isca de semente da mamona e lá
se fomos para a nossa canoa que deveria estar amarrada lá no porto da minha
sogra. Descemos um bom pedaço o rio Araguaia que naquela época do ano estava
meio seco, fomos até um pontal um pouco abaixo junto a uns pés de “Saram”,
apoitamos a canoa a certa distancia de lance da linha para cair junto às
plantas ribeirinhas que estavam soltando as sementes e os pacus não a
dispensavam e assim isquei meu anzol e joguei e fisguei um belíssimo exemplar,
Maria deu de ombro como a dizer “espere para ver”. Jogou sua linha e veio outro
peixe maior do que o meu, ao menos só um pouquinho maior, e ai a coisa quebrou
dentro ficamos ali por umas duas horas e o resultado foi o seguinte: Eu peguei
quatro pacus ferradas e ela vinte e uma e para que a coisa não desandasse pedi:
--Vamos
voltar já temos peixe suficiente para uns dias.
--Esta
bem eu já estava mesmo enjoada de tanto puxar peixe.
--Os
peixes não gostaram da minha isca – exclamei.
--Eu
só pesquei com fruta do Saram que eu tinha guardado lá em casa
--Porque
não me disse?
--Porque
você é o sabichão, não é?
Voltamos felizes para casa, mas
eu vinha pensando: “Eu tenho que descobrir como ela faz para pegar tanto
peixe”. “Sempre
ela me passa para traz”. Ela
adivinhando resmungou:
--E
só aprender comigo.
Afinal era Maria Paciente...
As Operações
Um dia notei que minha patroa se preparava para
alguma coisa diferente, mais parecia uma operação, ou algumas delas, mas em quem? Para minha
surpresa quando perguntada:
--O
que vai fazer com estes apetrechos?
--Nos
temos uma galinha com o vôo quebrado, vou ter que operá-la e vou aproveitar
para desempapar dois pintinhos e capar um galo para engordá-lo.
--Você
tem coragem de cortar os bichinhos?
--Se
eu não os fizer eles morrem, então vou operá-los.
E não é que
escaparam todas, bem... pelo menos por uns tempos...?
Da menina boa de tiro.
No dia seguinte Maria pediu que eu
matasse uma galinha e eu peguei o revolver e sai para o terreiro foi quando a
minha filha Miriam me pediu o revolver e eu dei e ela me perguntou?
--Qual
é a galinha?
--Aquela ali - mostrei e não é que ela mirou na galinha e atirou arrancando fora à cabeça da coitada. Eu fiquei pensativo, ainda bem que era minha filha. *
O caso dos meninos e da sucuri.
Outros acontecimentos dignos de registros são os encontros de meus
filhos e sobrinhos com sucuris, parecem sentirem uma atração mutuas dois fatos
se passaram durante este período: Certa feita eu e meus filhos e pessoas de
minha família fomos passear no Rio Xavantinho para um banho e pescaria, entre
estes estavam Miriam a mais velha com apenas dez anos, Dankmar, Liton, Antonio
Alfaiate, Enilda, Daniel, Leodilce, Leonilda e Lucena, enfim uma boa ternada de
gente. Assim que chegamos ao rio Xavantinho, na passagem que liga Luciara a
Porto Alegre do Norte a meninada caiu na água para brincarem. O rio estava
quase seco com apenas meio metro de água. Para animar a festa Miriam e Enilda atravessaram
o rio para o outro lado com uma vara na mão para cutucar o fundo do rio para
espantar as arrias, quando elas se aproximaram da outra margem viram em uma
loca no barranco e o que elas presumiam ser um peixe grande morto e começou a
chamar as outras crianças para verem o achado e com o pau tentou puxar para
dentro d’água aquela coisa estranha, e assim a cutucava com a vara para ver se
ela descia rio abaixo, Daniel chegando começou também a agredir a varadas o tal
bicho foi neste momento que Lucena do outro lado rio (estreito no Maximo 100
metros) conheceu que o tal ‘tucunaré’ que tanto alardeava Miriam era na
realidade uma grande sucuri e alertou as crianças:
--Saia
já daí, isto ai é uma sucuri muito grande.
As crianças se afastaram e nós, os três homens fomos até lá, era na realidade uma grande sucuri com quase oito metros, ela havia engolido um animal e estava no estagio de degustação dormente. Liton estava armado e atirou na cabeça da cobra que rolou para a água abaixo e titulo de brincadeira jogaram o nosso companheiro Antonio Alfaiate em cima da cobra que se contorcia nos estertoras da morte, mas nunca se viu tanta ligeireza o jogado mal triscou na água em cima da sucuri já estava em pé na praia que beirava, ele nem molhou as roupas. E pensar que a meninada estava cutucando uma enorme cobra que depois de aberta a barriga encontrou-se dentro dela um pequeno jacaré que ela havia engolido pequeno, mas com quase dois metros. *
O caso do ganso e a sucuri e as
estilingadas
Quando eu morava em Porto
Alegre do Norte, por um tempo minha residência era numa chácara que fica a dois
quilômetros do centro de nome Santa Lucia, ali eu criava de quase tudo, vacas,
bodes, cavalos galinhas, porcos, patos, gansos e peixes e m uma pequena represa
retirada da casa não mais do que duzentos metros só menos de quase a mesma
faixa etária uns seis, e, embora a patroa não gostasse todos eles tinham um
estilingue e sumiram para as redondezas a caçar qualquer coisa, mas que não
fosse uma sucuri, pois foi o que eles encontraram vejam com aconteceu;
--Vô,
olha aqui um ganso morto, nos estávamos passando perto da represa e vimos uma
sucuri enrolada neste ganso e mandamos pedras pra cima dela até ela largar a
presa, nos o pegamos e o trouxemos para o senhor ver, não foi assim turma?
--Foi deste jeito
confirmaram todos.
Os adultos presentes começaram
a rir e um deles disse:
--Confessa meninada,
vocês mataram o ganso a pedrada e agora vem com esta historia de sucuri.
--Foi
mesmo uma sucuri nos não estamos mentindo.
Eu fiquei a pensar e creditei na molecada
por que sabia que isto seria possível, pois bem perto da represa há um enorme e
fechado brejo e sei que lá há muita delas. Uma pode ter saído até represa par
comer os peixes.
--Esta
bem me dê o ganso que eu vou até lá me certificar. Peguei o ganso e um rifle 22 lá fui a lagoa,
mas não vi nada, assim mesmo enganchei o ganso em um arame de cerca que adentrava
para a represa, só para ele segurar o ganso e voltei para casa e continuamos a
conversa;
--Não
vi nada de cobra lá certamente ela estava no fundo da lagoa com medo de vocês
molecada- Todos riram
Passado uns quinze minutos
chamei um rapaz que trabalhava comigo lhe dei o rifle e ordenei.
--Vá
ate à represa e veja se o ganso ainda esta lá enganchado na cerca.
Lá se foi ele, e apenas
minutos depois escutei um tiro, não demorou nada lá vem o rapaz trazendo o
ganso de novo.
--O
que foi agora?
--Quando
eu cheguei lá na represa a sucuri estava enrolada no ganso, eu dei um tiro nela
e ela largou o bichinho e caiu na saróba no rumo do brejo.
Não é que esta molecada e
maluca mesmo tomaram o ganso da sucuri na base da estilingada...
No outro dia cedo eu comentava
o acontecido quando a minha filha Ruth e o Aleixo chegaram dizendo:
--Olha
o pastel... Olha o pastel.
--De quem é isto menina?
--A mamãe que o fez e nos mandou
vender, disse que era para lhe ajudar, quer comprar pastel pai?
--Quando é um?
--Só cinqüenta centavos
--Quanto tem ai?
--Eu tenho vinte e o Aleixinho
também tem vinte.
--Eu
vou comprar os teus, mas não contem a sua mãe, senão ela vai se zangar ta?
--Tá.
- Guardou o dinheiro no bolso do vestido e saiu para ir ajudar o Aleixo para
vender. Eu e meus amigos comemos os pasteis estavam ótimos.
Um dia ela arranjou uma vaga na
Escola e foi servir de Professora na primeira serie, e, não é que deu certo? Os
alunos a adoravam, mas onde foi que ela aprendeu tanto assim? Ela tinha uma
colega chamada Laurita que também era Professora em Mato Verde ou Luciara e com
esta fatos inéditos aconteceram. Contam que certa feita ela estava ensinando a
soletrar o B-A.BA e perguntou a um aluno de nome Filinto:
--Soletre
o seguinte B-A-BA-IO o que é?
--Cavalo – versejou o filho de João Vicente.
--Menino
preste atenção BA é BA e IO é BA-IO – baio.
--Pois é professora e baio num é
cavalo não?
De outra feita ela estava
dando aula de história e um de seus alunos estava lá no fim da classe dormindo
na carteira e ela se aproximou e com a régua deu uma lambada na mesa o que fez
menino acordar surpreso e perguntar:
--O
que foi Professora?
--Quero
saber quem foi que descobriu o Brasil?
--Não fui eu não Professora, eu num
mexi cm nada - respondeu apavorada a criança.
Pegando o aluno dorminhoco pela
orelha levou ate o seu pai que trabalhava na Prefeitura, era o vice prefeito,
bem ali pertinho da escola e lá chegando disse:
--Seu Pedro eu estava dando aula de
historias e perguntei ao seu filho “quem foi que descobriu o Brasil” imagine
ele me respondeu que não tinha nada a ver com isto que não tinha sido ele!
--Professora
– respondeu aquela autoridade meio escabreada com a pergunta – Eu acho que a
Senhora deve apertar mais ele, o moleque é muito malandro pode ser até que foi
ele mesmo.
Dona Laurita quase desmaiou.
&
A Bolandeira e o Cupim.
Quando eu ainda era namorado da Maria, um dia peguei meu barco o qual eu o chamava de “ilha do Bananal” porque era uma canoa de um só tronco, mas muito comprida e resolvi passar uns dias na fazenda São Pedro para visitar minha namorada Maria e segundo ela eu havia chegado em boa hora pois estavam trabalhando fazendo farinha de mandioca e faltava gente para ajudar e logo ela me deu um bom serviço “rodar a bolandeira” que era uma espécie de roda de madeira com uns dois metros de diâmetro que acionava o ralador de mandioca, a roda grande girava transmitindo para a pequena moenda uma velocidade incrível que era conseguido na base do “Tutano” e lá fui eu agarrar no eixo da manivela da tal roda e fazer ela girar constantemente e muito rápido, não foi mole não mas eu agüentei por uma hora e pouco e dei graças a Deus quando as raízes faltaram e assim tiveram que parar para descascar mais mandioca e enquanto isto fui até onde estava Maria a encontrei junto a um enorme cupim, ela estava tocando fogo dentro dele, havia sido aberto um buraco semelhante a uma pequena porta e cavado para dentro tomando a forma de um forno, era ali que assavam os bolos, os pães e as carnes, era um forno muito especial e porque não dizer na moda de hoje não agressivo ao meio ambiente.
Eu acabei acreditando que
apesar dos esforços me dei muito bem e acabei gostando muito da viagem que
acabou por me trazer muita alegria e prazer, só espero que no futuro usem o mesmo
tipo de forno, mas não a tal de “bolandeira”, aquilo era serviço para gente
doida.
Para me demorar mais uns dias
inventei “uma pane no carburador” o que acabou acontecendo, passei a manhã toda
andando atrás da noiva e na parte da tarde quanto fui ao rio para realmente
arrumar o tal de carburador, o meu futuro sogro já estava lá com ele desmontado
tentando arrumar ai sim tive que ficar mais dois dias quando finalmente o
arrumei, muito vagarosamente, mas arrumei.
Meu futuro sogro me pediu para
levá-lo ate a povoado de Luiz Alves um pouco acima da ponta da ilha do Bananal,
antes sair eu lhe informei que a gasolina que íamos levando era pouca, mas ele
retrucou:
--Eu
arranjo outra gasolina para voltarmos.
--Mas
esta aqui é pouca para chegarmos ao Luiz Alves
--Pode
ficar tranqüilo que da de sobra.
--Então
tudo bem, mas eu só vou levando a rede e uma coberta
--Nos
chegaremos lá ainda cedo e nos agasalharemos nas casas de amigos, toque em
frente.
Puxei o cordão e o Penta reagiu
e lá se fomos nós vagarosamente rio acima.
Ali pelas cinco horas da tarde
estávamos a menos de um quilometro da ponta sul da ilha quando o motor se calou
e eu desgostosamente olhei o tanque e a gasolina tinha se acabado e ainda
faltavam noventa quilômetros para percorrer.
Aleixo se quedou calado e
quando falou foi para sugerir uma alternativa:
--O
jeito é ficarmos esperando outro barco passar por aqui e se isto não acontecer
ate amanha cedo eu vou a São Pedro buscar gasolina não da para chegar a Luiz
Alves porque o rio Javaé está muito cheio como está também o rio Araguaia assim
só me resta buscar gasolina lá na fazenda.
--E
porque não descemos rodando?
--Porque
vamos levar mais tempo ainda.
--Vamos
dormir aqui no barco?
--Olhe
ali tem um ranchinho de palha vai nos agasalhar lá dá para atar ao menos uma
rede e o outro dorme embaixo no chão porque só temos um mosquiteiro e fora dele
ninguém consegue dormir com tanta muriçoca
Puxamos a canoa ate chegar na
beira do torrão seco, era apenas uma ilha de terra e ao redor, beirando o
barraco, estava tudo alagado, mais adiante outro capão de mato seco, o Aleixo
atou a rede com o mosquiteiro com as abas no chão e mandou eu forrar com a
minha rede, já havia desconfiado que quem ia para o chão era eu e não deu
outra, embora começasse uma chuvinha leve o calor era de rachar e muriçoca era
tanta que não podia se abrir a boca que ela entravam pela goela a dentro,
depois de tirar umas ripas e uns paus secos ao lado da chocha acendemos uma
pequena fogueira adentro dela mas o mosquito era de matar e assim o Aleixo
arrancou um bocado de palhas secas da cabana acendia uma delas no fogo e passava no ar em fazendo um circulo de fogo que queimava as
empesteadas muriçocas que chegavam a estalar tanta eram e vendo que não
adiantava e já estava escuro resolvemos
nos esconder embaixo do mosquiteiro.
--Eu
entro primeiro e deito na rede, você entra em seguida, mas bem rápido senão nos
vamos encher o mosquiteiro de mosquito.
E assim fizemos, alguns que
entraram caíram na tapa e morreram, mas não se podia encostar o braço no pano
do mosquiteiro que éramos picados as centenas. Acomodei-me bem quietinho no
meio do espaço e em baixo do Aleixo, mas a altura era mais ou menos afinal
naquele tempo eu era muito magro, conversamos um pouco e depois antes de dormir
fomos presenteados com uma visita muito incomoda, uma onça começou a esturrar
que parecia estar em baixo de mim, o chão tremia a cada esturro, ela estava bem
perto de nos.
--Fique
tranqüilo ela não vem aqui nos pegar, não enquanto o fogo estiver acesso e
demais a mais você ainda tem uma carabina bem perto ai no chão.
Mas, duas duvidas tomaram conta
de mim, a primeira era que não tínhamos lenha suficiente para passar a noite e
a segunda era que se ela resolvesse nos atacar como é que eu ia fazer, estando
embaixo de um mosquiteiro e no chão? Foi quando ela esturrou bem do lado de
fora do rancho acho que estava a menos de cem metros.
--Agora
vamos ficar bem calado e sem se mexer – entendeu?
--Entendi.
Assim ficamos por umas duas
horas até que escutamos o seu esturro bem mais longe.
--Tudo
bem, ela já se foi embora disso o amigo.
--Mas,
e se for outra?
--Se
fosse outra ela teria respondido.
--É
isto faz sentido – finalmente dormimos um pouco ao som das “pernilongolândia”.
Afinal era terra delas, fazer o que?
No outro dia cedo acordamos, o
chuvisco havia parado e os insetos diminuíram razoavelmente, foi quando Aleixo
olhando para o interior pegou o facão e disse:
--Já
vou indo, você passe o dia dentro do barco mais lá fora um pouco e fique
atento, eu quero voltar ainda hoje se possível.
E sumiu no capinzal e eu fiquei
preocupado e com fome afinal já estava inteirando dois dias sem comer nada. Fui
para dentro do barco, deixei as redes no mesmo lugar, pois poderia ter que
voltar para ela e ai começou o meu sofrimento ficar sozinho em um mundo
distante, sem nenhum morador por perto e sem gasolina, mas estava decidido se a
coisa apertar eu solto a barco e desço de borbulha (rodando), mas uma coisa me
incomodava mais, era aquela bruta e bonita melancia ali em cima do banco de
proa que o Aleixo ia levando para alguém em Luiz Alves e eu com uma fome doida
e ai ela me aparecia mais apetitosa e quanto mais o dia passava e chegava a
tarde e nada do homem ai sim que a melancia ficava bonita, mas eu agüentei o
que pude, escureceu e a muriçoca voltou de pelotão e tocando corneta ia começar
uma batalha na qual eu seria o devorado, correr para dentro da rede ou ficar na
canoa. Não tive duvidas a rede já estava armada, corri e entrei nela, peguei a
carabina coloquei uma bala na agulha depositei aquele molho de ferro em cima da
minha barriga, dentro da rede e seguro na coronha com dedo no gatilho. Agora
seria o que Deus quisesse. E ao que parece Ele queria que eu dormisse sossegado
porque só acordei pelos gritos de umas araras que passaram voando baixinho
sobre mimo dia já tinha amanhecido.
A canoa estava no mesmo lugar,
a melancia também, só que os roncos continuaram, mas não era ronco da onça e
sim minha barriga que entrava no terceiro dia sem comer nada, ai não teve
jeito, corri para a canoa entrei balançando a mesma para ver se melancia caísse
de cima do banco donde estava e se esborrachasse no fundo da canoa, ai eu teria
uma desculpa, mas que nada a tal nem se moveu, fui ate ela e empurrei a tal propositalmente,
sabia que estava cometendo um crime querendo arrebentar a fruta, mas nada ela
continuava intocável e inatingível, quase desisti, mas afinal o que era uma
melancia? Nada mais que uma simples e corriqueira fruta arredondada e cheia de
água que certamente teria o mesmo fim que eu estaria desejando para ela com
outras pessoas. Tomei coragem e dei um murro nela e a coitada rachou bem no
meio, agora o mal estava feito eu teria que comer a dita cuja e depois me
ajeitar com o dono e assim fiz.
A
devorei quase toda e enchi o fato de água, já me sentia melhor quando
escutei o roncar longe de um barco que deveria estar subindo o rio, de vez em
quando o barulho sumia e depois voltava, mas uma hora depois apontou na curva
do rio, era uma voadeira com um motor Penta de 12 HP. a gasolina, ela vim
ligeiro e logo se encostou a minha canoa, era o seu Aleixo e um outro rapaz,
após os cumprimentos ele foi até o barraco, desatou mosquiteiro e rede embolou
tudo e trouxe para a voadeira e foi me dizendo:
--Eu
vou nesta voadeira ate o Luiz Alves, você pode voltar aqui esta a gasolina para
você chegar ate o São Pedro pegue a sua rede e me de a melancia.
--A
melancia rachou e eu a devorei.
--Mas,
como, eu tinha prometido a uma pessoa levar esta melancia e você a comeu.
--O
senhor devia se lembrar que hoje esta inteirando três dias que eu estou sem
comer, e por falar nisto trouxeram alguma comida por ai?
--Num
chega ter comido uma melancia daquele tamanho?
--Então vou me arrancar agora mesmo
– falei após ter enchido o tanque e guardar a reserva desamarrei a canoa e dei
no cordão e o motor roncou e eu acenado um adeus e me arranquei, aquela
historia da melancia já estava me aborrecendo, mas que ela estava gostosa isto
estava.
Cheguei cedo da tarde na
Barreira de São Pedro, aportei o barco e subi o barranco eu estava com vontade
de comer o doce de abobora que a dona Joaninha tinha feito, mas o que eu queria
mesmo era ver a minha morena.
Depois de contar a Maria toda
minha odisséia eu cochichei com ela e lhe falei da minha fome e vontade de
comer o doce. O resultado foi que não pude viajar naquele dia e nem no outro,
eu havia comido muito doce de abobora e estava com uma dor de barriga
insuportável ao que a Maria falou bem baixinho no meu ouvido:
--Fartou?
Tão cedo você não vai querer comer doce de abobora seu esfomeado - e saiu
rindo.
Ainda bem que ninguém escutou.
Voltei para São Felix com a data do casamento aprazada para o dia 14 de março daquele ano de 1953.
Visitando o Padre Jentel...(Padre Chico).
Para que isto acontecesse teria que ir até a barra do rio Tapirapés com o rio Araguaia, ali ficava o Posto Indígena Heloisa Torres à aldeia Carajás e a pouco mais de dois quilômetros ficava a aldeia dos índios Tapirapés onde morava o Padre Chico e as irmãzinhas de Jesus.
Para esta viagem contei com o
apoio do sertanejo...
Domingos Medeiros ali
chegou junto com Lúcio e foi um dos pioneiros fundadores deste sertão. Moreno,
alto, cego de um olho, aquele homem de aparência calma e tranqüila, não era bem
o que mostrava, seu espírito era violento, não tolerava provocações, mas também
não provocava ninguém, respeitador, não mostrava uma idade definida, e foi com
este homem que combinei para descermos o rio Tapirapés de canoa até a barra com
o rio Araguaia. Nosso destino era chegarmos à casa de Dona Inês, Valentim e do
Padre Chico.
No dia marcado para descermos o rio
Tapirapés, eu e Domingão, após ajeitarmos nossas tralhas dentro da canoa fui
escalado para ir na proa e ele na popa, no piloto, a saída até que não foi
difícil, mas logo uns quilômetros abaixo o rio se acabou e virou tudo em
empuca, tínhamos que passar cortando os galhos com facão e puxando a canoa, foi
uns longos e sofridos trechos com os galhos cheios de formigas de fogo, e formigas
perigosas, aranhas, carrapatos e sanguessugas, saímos do outro lado todo
riscado de tiririca, mas entramos outra vez em águas limpas.
De pé na proa, empurrando a
canoa com uma zinga
(vara) eu podia observar os milhares de peixes
a passarem dentro da água limpa do rio, vi uma grande mancha preta no fundo que
devia ter mais de cem metros eu passava devagar por cima dela sem a tocar com a
zinga, mas, de repente resolvi cutucar a mancha e quando o fiz ouve um estrondo
fazendo a água balançar era um enorme cardume de peixes surubins ou pintados,
mas logo se acalmaram novamente, os jaraquis, papa-terras e piranhas passeavam
bem na flor da água e passavam juntinho da canoa sem se incomodar, de quando em
vez um pirarucu enorme arfava acompanhado de outros dois ou três, os botos
apareciam fazendo uma verdadeira guerra encantoando os peixes que para escapar
muitos pulavam caindo no seco da praia era incrível demais ver as arraias
enormes as tartarugas, e pensar que tanto os homens como os índios estavam
acabando com aquilo tudo, nesta época os índios eram os maiores predadores do
baixo Araguaia pegam tartarugas com isca e anzol, arrancam os ovos para fazerem
sabão e para vendê-las nos vilarejos bem nas praças e avenidas como eu os vi
fazerem muitas vezes em São Felix e em Confresa e a FEMA vendo tudo nem se
importava.
Após o segundo dia de viajem,
já pelo meio da tarde, chegávamos às imediações da barreira de Pedra onde o rio
se fechava em mata dos dois lados. Era tudo tão selvagem, intocável e parecia
inacessível, me senti um desbravador em um mundo ainda primitivo, ali tudo
valia tudo não havia meios termos, pois só os mais fortes conseguiriam
sobreviver, e eu estava a me fundir desta tempera especial.
Calado como sempre, o sertanejo ia à popa
da canoa remando, de repente parou de remar segurando a canoa com o remo, olhei
para traz e vi que estava tentando ouvir qualquer coisa, um som cavo e baixo
que mais parecia um roncar de mil motores ainda longe ia se aproximando.
--Escute... É porcada
queixada e são muitos e vem descendo, vou encostar a canoa, vamos descer e
esperá-los, pois eles vão passar aqui perto de nós.
Virando a canoa, encostei-a no
barranco eu desci e amarrei-a em uma raiz e peguei meu rifle 44, Domingão
também desceu e com o seu rifle na mão e juntos subimos o barranco, o barulho
se aproximava mais.
--Estão chegando, se
tiver que atirar deixe a manada passar e atire só nos últimos porcos. Espere
aqui que eu vou esperar mais em cima e quando eu atirar cuidado que o tropel
vai ser grande, queixada é bicho perigoso.
Uma agonia tomou conta de mim,
fiquei ansioso esperando, depois de uns minutos escutei o estampido e a
correria da porcada, era porco para todo o lado, mas mal eu via algum, pois
estava bem no barranco do rio, e em cima de uma arvore baixa, finalmente um
passou mais perto e eu atirei e vi que ele caiu do quarto traseiro, mas saiu se
arrastando e entrou em uma moita e eu pulei no chão e ia entrar atrás dele
quando...
--O que esta fazendo?
Perguntou Domingos, que ia chegando.
--Eu atirei num porco e
ele está ferido e escondido aqui dentro desta moita.
--Não entre assim, se não
ele te corta todinho, vá devagar abrindo o mato com o cano.
E assim o fiz, mas quando menos esperava o
porco escondido partiu mesmo de arrasto para cima de mim, atirei com o cano já
encostado na cabeça dele, mas levei um bruto susto. Domingão entrou na moita e
o puxou para fora.
--Já chega dois porcos
são o suficiente e também ainda temos que pegar umas duas tartarugas senão não
vai caber na canoa, vamos embora, traga seu porco.
Arrastei o bicho pela perna me
enganchando em tudo quanto era mato, mas embarcamos os porcos e descemos rio
abaixo, logo escureceria, portanto escolhemos uma praia alta e grande e
encostamos para dormir, não sem antes desfatar os dois porcos. Eu estava
fatigado, mas satisfeito,
--Vamos ajuntar lenha e
tratar destes porcos e veja se arranja um espeto para assarmos uma carne.
Depois da fogueira acesa
tiramos umas palhas e tratamos de tirar os couros salgamos a carne e tudo isto
no meio da canoa.
--A lua vai sair tarde,
vamos dormir um pouco depois que comermos e bem de noite no escuro nos
caçaremos umas duas virações (tartarugas grandes e que saem à praia para botar
seus ovos na areia aonde chocam), o nome de viração tem origem porque os índios
vão à caça de tartarugas nas praias e quando as acham vão as virando de costa e
como elas não podem se desvirar ficam ali ate virem buscá-las.
--Bem agora que comemos
uma carne assada vamos descansar e daqui umas quatro horas e vamos atrás das
“bichas”.
--Domingão - eu perguntei
– porque você me disse para não atirar nos porcos que vinham na frente ou no
meio, só nos últimos?
--Porque na frente da
manda vão os porcos das queixadas bem brancos são os mais velhos e valentes, no
meio vem a porcadinha nova com as mães magras e no fim vem ás novilhas e os
machos novos e gordos.
--Bem organizados hein?
--É a luta para
sobreviver e se protegerem, por isto só mato o que preciso enquanto que os
índios quando localiza uma manada destes eles se juntam e a cercam, e gritando
e batendo com paus nos matos e assim fazendo as conduzem para a beira do rio e
lá as obrigam a entrarem na água e então dezenas de outros índios que os estão
esperando com canoas os cercam em meio ao rio e às bordoadas matam um por um,
não escapa um só porco.
--É,
eu mesmo já vi os Carajás fazerem isto, matarem uma manada de quase oitenta
porcos e depois levam para aldeia e os mosqueavam na fumaça de fogo, mas vi que
perdem mais da metade da carne porque apodrecem.
--É
bem assim e agora vão acabar com as tartarugas e depois vão querer brigar com
os Tori para lhe tomarem suas comidas.
Dormimos um pouco e logo acordávamos.
--Pegue
a carabina e vamos.
--Carabina para que?
--Não somos nos dois os
únicos caçadores de tartarugas, a praia deve estar cheia de onça por ai caçando
também.
--Não gostei.
--Vamos traga a lanterna.
Com algumas centenas de metros
andado na praia já havíamos capturado duas tartarugas uma delas foi dispensada
pelo Domingão.
--Deixa
este ai em paz ela esta botando vamos achar uma que já esteja voltando para o
rio é porque já botou.
--Muito
bem, vamos lá – comentei.
E assim o fizemos, capturamos a
segunda a apenas uns cem metros adiante.
No outro dia cedo pegamos as
duas tartarugas e continuamos a viajem. Eram mais ou menos duas horas da tarde,
eu presumia, porque naquele tempo não se usava relógio, foi quando avistamos o
morro da barra do Tapirapés.
--Estamos
quase chegando - comentou Domingão.
De fato em menos de duas horas depois,
aportávamos na enseada do retiro de Dona Inês.
João
Pinheiro, o filho mais moço e já meu conhecido estava banhando.
--Domingão,
Dankmar, mas que coisa gente, de onde vem?
--De Porto Alegre - respondi.
--Vamos
chegar minha gente – falou o rapaz e puxando a canoa para o seco ajudou a tirar
nossos pertences e as caças e fomos para sua casa.
Fizemos a distribuição da caça
e das tartarugas que foram divididas entre todos, até o Valentim recebeu um
pedaço e o Padre Chico também.
Passamos a noite na casa da
dona Inês, João gostava de cantar e tocar violão, Natividade esbanjando beleza
gostava de brigar com o Chico seu marido, e a toda hora o mandava pisar um
pilão de arroz, vai Chico, vai Luciana, era só atendimento, Oleriano as voltas
com o gado e o Célio e sua mãe Raimunda ajudando a tratar das caças. Ali não se
perdia nada, do gado nem o berro.
Minha finalidade era visitar o Padre
Chico.
Queria me encontrar com o Padre Chico,
pois tinha noticias que uma nova companhia aérea estava se instalando em Santa
Terezinha e eu precisava entronar com os chegantes, por este motivo procurei o
Padre Chico, meu já conhecido e que era o responsável por aquele vilarejo.
Aquele homem magro, de andar
ligeiro, queimado de sol e simples como um peão do trecho era o Padre Chico e
aquelas três mulheres, eram as irmãzinhas de Jesus, freiras abnegadas que
dedicavam junto com Padre suas vidas aos índios Tapirapés e Carajás, eram
educadas como uma flor e humildes como só os simples sabem ser.
As três casas, duas, eram de
pau a pique e outra de madeira, todas cobertas de palha, eram a igreja e duas
residências, sendo que uma servia de ambulatório e dormida das irmãzinhas e da
francesinha Denise, e a outra para os dois padres, isto quando Focault ou outro
aparecia e ainda nos fundos um galinheiro e dois canteiros de verduras, destes
feitos com forquilhas e suspensos.
No ar, uma tranqüilidade
incrível, parecia que o resto do mundo nunca existira ali tudo cheirava a amor,
carinho e abnegação e até os pássaros alegres pareciam festejar aquela benção
divina, nunca mais senti um torpor tão maravilhoso em minha vida como aquele
ali.
Como eu havia dormido na casa
de Dona Inês, ainda estava cedo para fazer uma visita a meu amigo, mas, ali
estava eu.
--Padre...
--Dankmar, que surpresa agradável,
entre, irmãzinhas olhem quem esta aqui?
--Bom dia seu Dankmar –
cumprimentaram a três de uma só vez e muito alegres.
--Como vão às coisas por
aqui Padre?
--Com exceção do caso do
Valentim que quase morre o resto está bem, mas fiquei sabendo de algo de anormal
lá por ”Saint Terezin”, mas vou lá depois de amanhã para ver o que esta acontecendo.
--Eu
vim aqui para conversar um pouco contigo e se possível irei junto.
--Devemos
nos levantar de madrugada para sairemos cedo daqui até lá é bem longe.
--Melhor, assim dá tempo
de conversarmos a vontade e eu queria falar com o Pranchui, sei que ele tem uma
historia bonita sobre a igreja de Pedra e eu quero ouvir dele mesmo.
--Denise chame o Pranchui
- pediu o Padre a uma francesinha de fazer inveja a qualquer top
model – não era freira era apenas uma agente pastoral, mas que
agente!!!...Ulala...
--Enquanto conversamos as
irmãzinhas vão fazer um almoço bem cedo e você fica conosco.
Pranchui, o índio Tapirapés
acabava de chegar e nos cumprimentou.
--Agora
que o índio chegou padre eu tenho uma noticia para você, o Liton esteve voando
lá por Santa Terezinha e me disse que tem uns aviões grandes trazendo gente e
falam que são os donos daquelas terras?
--Então
é isto, mas é impossível aquela terra é da Prelazia de Conceição do Araguaia,
mas eu vou lá ver isto, Pranchui mostre ao Dankmar a sua pedra.
--Aqui
esta seu Dequimá veja que beleza - disse o índio tirando uma pedra de cristal
de sua sacola de couro de anta junto com outros apetrechos, um pedaço de lima,
uma ponta de chifre, cheia de algodão queimado e a pequena pedra de cristal,
admirei a beleza da mesma, pura e sem uma rachadura, limpa mesmo.
--Onde
a encontrou – perguntei
--Lá
no pé da Serra do Roncador, a serra desbarrancou e uma pedra muito grande rolou
e enganchou em uma arvore, a pedra é da minha altura e muito bonita a gente
pode ver a cara da gente dentro dela e eu peguei este pedaço pequeno que estava
no chão, eu a uso para tirar fogo. Assim quer ver?
Segurou a pedra entre os dedos
da mão esquerda colocando por baixo o algodão dentro da palma da mão a ponta de
chifre e com a mão direita riscou a pedra com o pedaço de lima, uma centelha de
fogo caiu dentro do chumaço de algodão, soprou a seguir criando uma pequena brasa,
que logo passou fogo para uma palha de milho seca.
--Muito
bom mesmo, mas fica muito longe daqui?
--Quatro
dias de viajem é perto a Igreja de Pedra.
--Conte
como é esta igreja de pedra eu quero ouvir de sua boca, o negro Valentim já me
a contou, mas por alto.
--Lá
na serra, existe um paredão cheio de buraco, lá aonde o vento assobia parece
janela e porta, e em cima de uma porta tem umas coisas escritas que eu não sei
o que é?
--Porque
chamam igreja de pedra?
--Porque
o escrito de cima da portas parece escrito de padre, um dia eu levo vocês lá, agora
não, os Caiapós estão andando lá e tem roça deles lá perto, um dia eu levo
vocês lá, agora não.
Voltei para Mato Verde prometendo regressar uns quinze dias depois. E assim o fiz.. A cilada e o negro Bilau.
O primeiro lugar que eu pretendia explorar o marisco ou a caça aos pirarucus era na Barra do Rio Tapirapés distante de Mato Verde em trinta e cinco léguas rio Araguaia a baixo rumo ao norte. Preparei uma viaje, eu iria sozinho em uma canoa a remos e lavaria a tralha necessária e assim o fiz. Ao amanhecer do dia preparei tudo, mas resolvi viajar depois do meio dia quando então empurrei a canoa e desci as águas, já era por volta das seis horas da tarde quando avistei a praia denominada “Crisostemos” onde os índios Carajás estavam acampados de verão, pois no período das chuvas mudava-se para terra firme no lado de Mato Grosso chamado Lago dos veados, encostei a canoa e vieram uns índios que eu já conhecia de vista e começaram a me pedir coisas como rapadura, farinha e outros e como não podia arranjar porque já levava o mínimo deixei a praia e segui rumo abaixo, pouco depois já havia escurecido e uma forte neblina tomou conta do rio e eu resolvi parar d remar e me deitei dentro da canoa, subitamente escutei a pancada de um remo no beiço de uma canoa, fiquei atento e desconfiado, a neblina não deixava se enxergar quase nada, resolvi remar silenciosamente ate a margem que estava bem próxima e entrei com a minha canoa em meio as galhadas de saram e fiquei bem escondido com a carabina engatilhada, eu pensava:
“Aquilo foi a batida de um remo no beiço da
canoa, os Carajás sempre quando remam é típico baterem seguidamente o remo e
porque agora só uma batida foi escutada? Certamente eles estavam se escondendo
a procura de alguma coisa no rio que só poderia ser eu pois ele viram a minha
mercadoria”, aguardei calado sem me mexer. Não demorou muito apareceu o vulto
de uma canoa com três índios dentro e um deles, na proa, com uma lanterna acesa
vasculhavam o rio e assim passaram a menos de cem metros de mim sem me verem e
sumiram rio abaixo. Eu pensei em atravessar para o outro lado, mas me aquietei
onde estava e camuflei mais a canoa com galhos e esperei por longas duas horas
quando então ouvi o ritmar dos remos na canoa e eles passaram subindo de volta
e conversando animadamente, sem me ver. Não demorou muito a se distanciarem o
suficiente para eu poder reiniciar a minha jornada o mais rápido possível e em
maior silêncio e assim o fiz até chegar ao amanhecer na Barra do rio Araguaia
com o rio Tapirapés, me arranchei na casa de João Pinheiro e passei duas
semanas mariscando e fui bem sucedido, para a volta um amigo meu que passou com
seu barco me levou para casa com a canoa atravessada na proa do barco. Desta cilada eu escapei por pouco graças a
minha perspicácia.
Resolvi dar uma mariscada,
convidei o João Pinheiro e o negro Bilau para darmos umas voltas pelo rio
Tapirapés até o lago redondo para matarmos uns jacarés.
Quando voltei à casa de Dona
Inês eu tive a grata satisfação de me encontrar com o nego Bilau, era um velho
amigo.
--Bilau,
você por aqui?
--Seu
Dequimá á quanto tempo à gente não se vê.
--Pois
meu amigo vai passar uns dois dias aqui com o João, dar uma mariscada e depois
volto para Santa Isabel do Morro.
--Se
precisarem de um piloto de canoa nisto eu sou bom.
--Você
é bom para tudo Bilau - cortou João Pinheiro.
--Então
fica combinado vamos arrumar as coisas e partir ainda hoje, porque tenho que
voltar até amanha noite, pois depois de amanhã eu irei com o Padre para Santa
Terezinha
--Nos
vamos mariscar lá no lago redondo – concluiu João.
Saímos cedo rumo rio Tapirapés
acima, íamos os três e nossa tralha de mariscar.
Chegamos ao lago já bem à tardinha
preparamos as arpoeiras enquanto o Bilau juntava lenha, pois a noite chegaria
logo, saímos para a caçada ao pirarucu (badulaque nome indígena), João ia à
frente e eu no piloto da canoa, já conhecia as regras de seguir as instruções
do arpoador que indicava manobrando a arpoeiras (uma vara comprida cerca de
três metros com um arpão encastoado em sua ponta amarrado por uma corda fina
que ficava enrolada dentro da canoa) quando ele levantava a vara era para parar
a canoa, quando abaixava era para ir em frente, quando levantava a ponta era
porque a caça estava longe e quando abaixava era porque estava quase em cima
dela e assim fomos indo, de quando em vez um peixe aboiava em diversos pontos
do lago até que o arpão voou rápido e a corda esticou e saiu arrastando o
pequeno barco lago a fora, logo o peixe arpoado cansou e foi puxado para junto
da canoa João desferiu uma pancada com a costa do facão na altura do encaixe e
o peixe morreu, foi uma dificuldade colocá-lo dentro da canoa devia pesar uns
sessenta quilos por ai, encostamo-nos ao porto improvisado do acampamento e chamamos o nego Bilau:
--Bilau,
vem tratar deste peixe - mandou João.
--Já vou indo.
Era um enorme peixe, o negro o escamou tirando
o couro e o retalhou dentro da canoa e tirando bastante folha verde jogou as
mantas em cima e o salgou, cortamos um pedaço do entrecho parte da barrigada, e
a assamos e como a noite já vinha chegando tomamos um cafezinho tropeiro, eu
nunca tinha visto fazer café daquele jeito Bilau colocou água açúcar e pó de
café tudo de uma vez e quando a água ferveu, ele pegou um tição de fogo, tirou
a vasilha do fogo e limpando o tição com sopro o enfiou dentro da água
fervendo, o pó foi para o fundo e o café ficou uma beleza de bom.
Deitamos na praia a guisa de
descansar um pouco, pois logo mais a noite chegaria à vez de matarmos um jacaré
grande para tirarmos o óleo, a carne e o couro.
A lua já havia se escondido e a noite era
escura, acordamos Bilau e dissemos para colocar as mantas do peixe em um varal
improvisado para escorrer a salmoura e fomos à caça, desta vez eu era o
arpoador e João o piloto, não rondamos quase nada logo ali a uns duzentos
metros dois pares de olhos enfrentava audaciosamente a luz da minha lanterna e
pela distancia entre um olho e outro vi que era muito grande, dei sinal ao
piloto para contornarmos, pois teríamos que tomar chegada de lado, de frente
nunca o conseguirá arpoar aquela cabeça dura, mas toda vês que tentávamos
chegar perto ele se endireitava e nos olhava de frente, foi difícil, resolvi
bater com a aroeira no beiço da canoa, e com isto o jacaré mergulhou, mas logo
aboiou e nesta vez estava de lado, mas meio longe chegamos perto bem devagar
sem fazer o menor barulho, não quis esperar mais e joguei a aroeira, o sopapo
foi grande chegou a balançar a canoa, estava arpoado e agora arrastava a canoa
para o meio do lago, subitamente a linha começou a se soltar e eu a fui
recolhendo e, em vês do jacaré vir para a canoa a canoa é que ia para aonde ele
estava. Paramos a canoa a linha apontava bem beirando a borda e apontava para o
fundo, o jacaré havia se alojado no fundo do lago, comecei a puxar a corda, mas
o jacaré não se soltava, usando mais força puxei a corda já preparada com o
rifle 22 bem junto da mão e lanterna que era amarrada no pescoço colocada e
segura na boca, o jacaré se soltou e subiu bem rente a canoa a sua cabeça ficou
mais alta que a borda, eu aproveitei para disparar um tiro na nuca, logo a
seguir desencaixei sua cabeça junto à espinha com uma machadinha especialmente
preparada para isto, agora sim estava morto, nos o arrastamos para a praia e
fomos dormir junto da fogueira. No outro dia cedo nos espantamos quando vimos
os rastros de uma onça em volta de nosso improvisado acampamento, ela havia
pegado uma manta do peixe e a arrastou praia a fora para ir comer longe dali.
O negro Bilau quase se
assombra.
--Ainda
bem que onça não gosta de gente preta.
--Já
está tudo arrumado vamos embora para casa - falou João.
Voltamos e na parte da tarde
já estávamos na casa da Dona Inês.
Fiquei sabendo, tempos depois,
que o Bilau morreu atropelado ao conduzir
uma boiada pela BR 158, à noite ele ficara de vigia em uma ponte para o gado
não voltar e sentado no meio dela acabou dormindo quando uma caminhonete em
alta velocidade passou por cima dele. Deve estar fazendo a sua “Grande caminhada” e tomara que seja de
canoa, pois ele é bom piloto.
Aproveitei fui visitar a família do negro Valentim
que estava muito fraca e se recuperando da tragédia do envenenamento, João
Pinheiro me emprestou uma égua arriada para a viagem. .
Eu voltei bem cedo do outro
dia para Aldeia Tapirapés.
O Padre Jentel já estava de
pé.
--Vamos tomar um lanche e
seguir viajem Dankmar.
--Mas aonde esta o seu
animal? Você vai a pé?
--Vou sim desça logo;
Desci, tomei um lanche rápido
e montei e o padre Chico já estava andando no rumo da trilha e eu o segui e lá
se fomos nós o Padre ia à frente de mochila nas costas e marcando o caminho e
com sua sandália de látex ponteando o trilheiro. Francamente nunca vi ninguém
andar tão ligeiro, às vezes eu tinha que trotar a égua para acompanhá-lo. Quase
matou a égua de cansada. Chegamos a Santa Terezinha já era tarde do dia e o
Padre parecia que nem tinha andado e a égua quase chega empurrada, afinal eram
sete léguas ou 42 quilômetros como quiserem e no meio de trilha e arbustos misturados
com lagos, pantanais e areões um verdadeiro rály.
Durante a viagem fiz uma retrospectiva da vida
de Padre Chico “O Padre Chico, como era conhecido, morava a muitos anos junto
da aldeia dos índios Tapirapés, simples, humilde, e muito pobre, ele e as
irmãzinhas se dedicavam exclusivamente aos índios Tapirapés e Carajás cuja
aldeia não distava mais do que dois mil metros. Era o Posto Heloísa Torres,
aonde o nego Valentim e sua esposa Joaninha eram os encarregados, bem perto
morava Dona Inês com sua família, eram uma só e feliz família. Nas noites
limpas de lua cheia podia se ouvir as índias Tapirapés ao redor de uma fogueira
a cantarem cantigas indígenas lindas e suavemente melodiosas nunca mais eu
escutei nada igual, os índios Carajás faziam suas festas Aruanã e com estes
procedimentos aproximavam-se culturalmente as duas raças, porque não dizer as
três raças, eu mesmo aprendi a fazer arco e flechas. Não parecia às turbulentas
cidades de pedra do mundo lá de fora. O padre Focault tentando levantar um
canteiro colocava três forquilhas de cerne e uma de pau branco, eu e os índios
o ensinamos que com uma forquilha ruim o canteiro ia cair, ele entendeu foi até
o mato e trouxe uma boa, era assim a vida, tudo harmonia” Mas estavam para
começar as modificações, e o Padre Chico viu isto assim que chegamos a Santa
Terezinha.
&
Os casarões no morro de areia...
Ali em cima daqueles morros de areia os casarões construídos pelos padres da então Missão Salesianos de Conceição do Araguaia impressionavam pela sua imponência realçando a grandeza do rio Araguaia velha missão ficava junto ao rio, e pareciam resistir às intempéries dos tempos, pois eram bem antigos. Um movimento alienígena e inusitado parecia ter transformado aquele monte de areia quente em algo inexplicável.
Às quatro horas da tarde fomos
á casa de Napoleão que era o encarregado daquele conjunto de casarões da Prelazia
de Conceição do Araguaia para zelar a missão.
Batemos na porta, demoraram a
atender, finalmente Verônica a esposa de Napoleão aparece bocejando, estava
dormindo.
--Padre Chico!
--Estava dormindo irmã?
--Deitada, padre,
cochilando.
--E Napoleão esta? Sim,
já se levantou, mas entrem - e continuou.
--Seu Dankmar esta aí
também? Á quanto tempo não lhe vejo.
--Padre?
--Boa tarde a todos. –
falou Napoleão aparecendo.
--Mas o que esta
acontecendo Napoleão? Indagou Jentel.
--Padre... – gaguejou
Napoleão – Sua benção.
--Ulala – vamos, conte
logo depois te abençoou.
--Chegaram aqui uns
homens dizendo que são os donos de todas estas terras e que vieram de Conceição
com uma ordem do Bispo, eles estão lá na casa grande.
--Vamos até lá agora.
--Mas o que esta
acontecendo aqui?Tornou a se
impacientar o Padre-quase gritando.
O calor do meio dia explodia
sobre aquelas areias quente e as poucas árvores não faziam sombra alguma. O
rosto do Padre Chico se transformou como de água para o vinho, via-se
claramente a indignação à raiva e a revolta em seus olhos. Já não era mais o
pacifico Padre Chico, agora era o rebelde Padre François Jaques Jentel.
O encontro inesperado com a
civilização vinda sobre as asas de aviões, o movimento de gente estranhas em
seu território acendeu-lhe na alma uma chama apagada há muito tempo.
--Vamos ver o que esta acontecendo – explodiu enquanto
caminhava na areia quente rumo ao casarão.
No casarão um homem alto e simpático muito bem
vestido e com um sorriso no rosto apareceu à porta cumprimentando
--Ola, - estendendo a mão
ao Padre que não correspondeu - Meu nome é Humberto Machado e sou o
proprietário da Linha Aérea Nacional.
--Tem uma carta para mim
– cortou o padre – por favor, me entregue logo quero vê-la.
--Aqui está Padre.
Jentel procurou uma cadeira leu
a carta umas quatro vezes e parecia não acreditar.
--Como é que vão chegando
e se apossando da missão sem antes ter falado comigo, aqui tinha muita coisa
importante guardada – zangou.
--Eu tive ordens de
chegar e me arranchar com minhas coisas afinal as terras são minhas e eu não
podia ficar no tempo ou embaixo de uma arvore com tanto instrumento.
--Muito bem veremos o que
vai acontecer - terminou o Padre, virou as costas e saiu.
No dia seguinte ainda cedo dois
aviões Douglas sobrevoaram e desceram na pista, com eles vieram muitos homens,
e também Wilton Machado um dos mais fortes proprietários da empresa e trouxeram
muitas ferramentas, começavam a colonizar.
Deste dia em diante o Padre
Jentel tumultuou a vida de todos, organizou cooperativas, associações e
promoveu uma pequena revolução. Lutou muito para defender os antigos pioneiros,
organizou grupo de posseiros fundou sindicatos e passou a congregar centenas de
trabalhadores rurais que chegavam de todos os cantos do país, estava declarada
a luta aberta pela terra que não era de ninguém.
Mas o Padre era muito habilidoso,
e amigavelmente se misturou com os proprietários com a finalidade de saber qual
seriam seus próximos movimentos.
--Muito bem – resmungou a
Wilton Machado - Já que o Bispo recomendou que lhes desse todo apoio é o que
farei.
--Inicialmente só precisamos
desta casa, logo vamos construir dentro de nosso projeto. Discutiram por varias
horas, mostraram os mapas e falaram a vontade de tudo que o padre queria saber.
--E ai padre tudo bem –
perguntei.
--Nem triste nem alegre -
foi á resposta lacônica.
Mas em seus olhos continuavam
brilhando uma nova chama, sua voz se tornou firme quando me segurando pelo
braço disse:
--É chegada a hora!
Certamente começarão a chegar os grileiros, pistoleiros, garimpeiros e mulheres
vadias, isto aqui vai se tornar um inferno acabou-se a nossa paz, estes
pioneiros que moram aqui há muitos anos certamente serão expulsos de suas
terras haverá pilhagem e morte, já vi isto antes e não é nada bonito, agora é
preciso unir os posseiros eles são os verdadeiros donos destas terras é preciso
uni-los seja da forma que for, em cooperativas, sindicatos, associações, mas de
qualquer jeito temos que dar o troco.
O Padre já parecia não me
escutar mais.
--Alguma coisa precisa
ser feita imediatamente.
--Você pensa que pode
acontecer o pior?
--O melhor eu tenho
certeza que não.
--Então é só cuidar.
Era o começo de uma nova era,
com ela o progresso sobre a forma de latifúndio avançava rapidamente como um
enorme trator esmagando tudo a sua passagem.
O Padre partiu para o sertão eu voltei o para
o Tapirapés de lá retornei para Mato Verde. Neste mesmo ano, tirei umas férias
e fui a São Paulo visitar meus irmãos.
Retornando a atualidade...
Rolf no Araguaia,
um destino marcado.
Era ano de 1954, eu já havia me
casado e trabalhava com meu barco denominado “Ilha do Bananal” porque era
comprido e grande e já tinha adquirido um motor Penta de 12 HP a gasolina, meu
irmão Rolf veio comigo de São Paulo resolvido há morar no sertão, ele parece
ter se dado muito bem em Leopoldina ou Aruanã, fez muitas amizade. Descemos o rio, ia eu, o Paulista e a Maria
com o Aleixinho. Rumo a Luciara. No decorrer da viagem um couro de onça pintada
que eu ia levando e estava em cimo do toldo para secar subitamente foi
arrancado por um vento forte que o jogou nas águas do rio, mas o couro não
afundou ficou aboiando, eu pedi para virarem o barco para pegarmos o couro, mas
o piloto ao mudar o rumo passou bem por cima do mesmo e eu de um lado o
agarrei, mas meu mano do outro lado o agarrou também e ai não sobrou nada para
ninguém simplesmente o belo couro de onça passou por baixo do barco e afundou,
sumiu, fiquei fulo de raiva, mas logo me acomodei. Rolf viajou conosco um
bocado de dias, mas senti que seu coração estava em Leopoldina hoje Aruanã, ele
havia deixado alguma coisa por lá nos poucos dias que ali paramos. Resolveu
voltar para Leopoldina.
Foi bastante feliz aquela decisão, pois se
casou com uma jovem, de boa família de nome Gersina com quem vive até hoje, se
tornou Cartorário do Registro Civil, se candidatou a Prefeito e por duas vezes
ganhou. Durante este período em que foi Prefeito eu nunca o visitei e nunca lhe
pedi nada e nem ele ofereceu. Simplesmente nos esquecemos um do outro, eu o
esqueci menos. Mas teve a infelicidade de arranjar uma doença de mal de
Parkinson e estava bastante agravada, quando voltei a visitá-lo me hospedei em
seu belíssimo hotel cheio de gente, Rolf não se conformava com aquela doença
incomoda que não deixava o braço ficar parado quieto e resolveu fazer uma
intervenção cirúrgica com raio lazer. Não teve sorte, pois deu tudo errado e
voltou para casa quase totalmente paralitico e até esta data, mais de dez anos
depois ainda esta sofrendo em uma cadeira de roda vivendo a guisa de barbitúricos,
e para piorarem as coisas sua esposa me confessou a cerca de poucos dias atrás
que ela está com Câncer no pulmão e em dois lugares no intestino. Veio a
falecer dois meses depois Um triste final para quem consegui tanto e não tem o
direito de levar nada, a única herdeira é uma filha adotiva de nome Vanda que
vive separada do marido que mora em Portugal com seus dois belíssimos filhos,
mas Deus cuidara destas criaturas, pois sempre foram muito humildes e muito
humanas que Deus os abençoe e os guarde
Gersina e Rolf faleceram em 2010, ele em 28/09/2010.em Aruanã
O Retorno...
O tempo passava e eu fui me adaptando a aquela situação, já estava me tornando um verdadeiro sertanejo.
Com o meu retorno a aquela
pequena vila continuei a trabalhar em meu pequeno barco e um motor Penta de 12
HP e em março de 1955 tive que ir até Santa Terezinha ver se arrumava uma
passagem nos Douglas da Linha Aérea Nacional cujo dono Hilton e Wilton Machado
já era meus amigos e o motivo da viagem era levar meu filho Aleixo para Goiânia
para tratamento medico, pois eu havia dado a ele como lombrigueiro umas pílulas
de Quinino e ele botou muito verme e ficou muito fraco que nem a cabeça conseguia
sustentar por muito tempo e nem ficar em pé. Fui a Goiânia tratei de meu filho,
de minha esposa e de mim mesmo que lá cheguei com uma malaria muito forte, em
poucos dias regressamos e eu para pagar a duas viagens de ida e volta eu assumi
o compromisso de transportar materiais da serraria e do locomóvel pertencentes
à companhia que estariam no porto em Leopoldina que distava em 155 léguas de
distancia. Fiz três viagens pesadas, mas paguei o meu compromisso. Afinal eu
tratei de minha família e tinha que pagar. Para tanto viajava a noite toda
sozinho no piloto, eu e Deus.
Numa destas viagens eu ia
levando o volante e uns eixos da caldeira só o volante pesava mais de mil
quilos, se o barco batesse em algum toco e afundasse nunca mais sairia do fundo
rio e para terminar meu compromisso passei a navegar a noite.
Eram altas horas da madrugada
quando na escuridão da noite avistei uma luz muito longe, era uma pequena
fogueira acesa em uma praia e assim resolvi dar uma parada para aliviar a
tensão.
Rumei direto para a luz, sempre
desviando dos baixios, pelos muitos anos na região e sempre navegando pelo rio
eu já era um profundo conhecedor do canal e sabia onde tinha pedras ou tocos
espalhados pelo canal, assim desviando de tudo e encostei o barco na areia da
praia bem perto de onde o fogo estava aceso, aportei encalhando a proa da
embarcação e desci para me encontrar com o outro viajante e caminhando pela
praia fui ao encontro do mesmo e o reconheci:
--Pedro
Rico?
--Ele
mesmo – respondeu e foi até a minha pequena embarcação e quando viu sua carga
se espantou e continuou - você é doido varrido? Se este barco afundar você vai
junto com ele e ainda mais tem muita coragem em viajar numa noite escura como
esta!
--São
os ossos do oficio – respondi e passei o resto da noite conversando com meu
amigo e olhando o céu estrelado e escutando o suave murmurar das águas. No
outro dia, ao clarear, partimos um rio acima e outro rio abaixo.
&
Mudando de vida e
profissão.
De barqueiro... a caçador e mariscador.
Em 21 de abril de 1955, na cidade de Luciara
nascia meu segundo filho, era uma filha mulher e seu nome é Ruth.
Com uma família para sustentar,
nunca até então tinha deixado faltar alguma coisa e não seria de agora em
diante que isto iria acontecer. A profissão de barqueiro deu uma queda, quase
não aparecia um frete ou uma viagem assim resolvi me dedicar ao marisco, ou
caçador de jacarés e onças, eu era novo e tinha coragem e a família crescia e
com isto as minhas obrigações, se fosse preciso eu enfrentaria até onças e
assim o fiz e aconteceu, matei uma centenas de jacarés de até seis metros e
onze onças, vejamos...
Eu podia contar com a prática
de meu cunhado Mariano.
Planejamos explorar a Ilha do Banana
“Índias Carajás da
Ilha do Bananal“
A Ilha do Bananal”.
Anos de 1955...
Era o mês de maio, naquela manhã de sol em que um leve vento de verão açoitava o meu rosto eu estava atravessando o rio Araguaia em uma pequena canoa, saíra de Mato Verde, na divisa de Mato Grosso, buscando uma pequena enseada no porto no outro lado do rio na ilha do Bananal, onde havia deixado um animal, melhor dizendo uma burra que ali ficara a minha espera para seguir viagem aonde meus companheiros Mariano Paciente e Rafael me esperavam ás margens do Lago do Mamão, no interior da ilha, eu deveria levar suprimentos para nossa estadia de caçadas, e isto eu ia levando. Durante a travessia fiquei a pensar como aquilo tudo começara...
“Foi ali naquela casinha junto
ao porto da cidade de Mato Verde morava a minha sogra Joaninha Paciente, hoje
falecida. O café que tomávamos com bolo "Mané pelado“ vinha a calhar enquanto
eu conversava com seu filho e meu cunhado Mariano Paciente as idéias foram
surgindo...
--Nos
devíamos ir caçar jacaré, em vez de só pensar em matar onça.
--É
uma boa idéia – concordei – mas de entremeio matamos algumas também.
--É
isto vai acontecer, mas precisamos decidir aonde e quando e ainda prepararmos a
viagem.
--Vamos
para a Ilha do Bananal – interrompi – estive sabendo pelo Manoel Basílio,
aquele que é vaqueiro do Manoel Firmino, que no lago do Mamão está cheia de
jacare-assú, só dos grandes.
--Já
falei com ele para nos levar até lá e deixar uma junta de bois conosco ou pelo
menos levar a canoa e a nossa tralha - interveio meu companheiro.
--Nossa
tralha e mais o sal.
--Precisamos
levar três arpões, dez cargas de pilhas, duas lanternas de dois elementos,
foquitos (lâmpadas das lanternas) três sacos de sal de 30 quilos, 15 quilos de
farinha de puba, cinco rapaduras, dois quilos de açúcar, um quilo de café, as
redes de dormir, mosquiteiros, corda de arpão, facas e pedra de amolar e uma
lima, uns comprimidos de quinino e melhoral.
--Não
podemos esquecer-nos de levar umas cinco latas vazias de vinte litros para
guardarmos o óleo da gordura do jacaré, do toicinho de porco salgado, e duas
lamparinas, dois litros de querosene.
--É
uma boa mistura, querosene, sal, farinha e rapadura e tudo isto deve ir dentro
da canoa que vai de arrasto no pescoço dos bois até na beira do rio Jaburu e
nos vamos a pé, eu, você Dankmar e o Rafael “garrafa seca”.
Naquele mesmo dia fizemos as compras e
embalamos tudo em sacos, e como cobertura, em uma capa feita de leite de
“mangaba”. Conversamos com o Manoel Basílio que se comprometera de no outro dia
cedo estar com a junta de bois no porto do lado da ilha bem em frente a Mato
Verde esperando-nos.
Quando o dia marcado chegou,
madrugamos com a canoa carregada e um companheiro nos ajudou a atravessar o
rio, mal clareara o dia já estávamos no curral bebendo leite do gado do Lucio.
Manoel Firmino que era o dono
da fazenda Jaburu nos emprestara pelo seu empregado Manoel Basílio uma junta de
boi nova e mansa. A seguir amarramos a canoa na canga dos dois bois, colocamos
tudo dentro e lá se fomos os quatro, Mariano, Dankmar, Rafael e o Manoel
Basílio que ia montado, pois teria que voltar rumo para sua morada no meio da
grande ilha.
Saímos da mata da beira rio e
entramos no campo aberto e como o capim era alto tivemos que seguir as trilhas
do gado e das antas, o sol começava a esquentar quando avistamos ao longe a
mata do lago dos Cavalos, seria a primeira etapa de descanso. A canoa arrastada
deixava uma trilha inconfundível, pois estava pesada, mas como era destas feita
de um só tronco de cerne de Landi, o fundo era grosso e não sofreria nada ao
ser arrastada sob o capim. Procuramos a sombra de um enorme Jatobá, bem na orla
do capão e aliviamos a canga soltando os bois atrelados para pastarem não sem
antes lhe oferecermos água na lagoa.
Eu havia me casado já fazia
dois anos e já tinha um filho de nome Aleixo, como o nome de meu sogro, o pai
de Mariano, e uma recém nascida de nome Ruth, minha esposa Maria ficara em Mato
Verde, e eu vindo de São Paulo para Mato Grosso com a Bandeira Piratininga em
junho de 1948, ainda tinha no sangue o espírito de ‘Bandeirante e aventureiro,
assimilava tudo muito rapidamente, parecia que havia nascido naquele sertão
bravio, mas a curiosidade sempre foi minha companheira, à vontade de aprender,
interpretar e registrar, me impulsionavam violentamente navegando no espaço e
gravando na memória tudo ao meu derredor.
Neste almoço só comi um pedaço
de rapadura com farinha e carne, seca que já a trouxemos bem assada, era a
nossa matula.
Seguimos viagem até o pôr do
sol e a nossa segunda parada foi á margem do Riozinho, na fazenda do Oleriano,
um sertanejo bom da família do Mundico Sabino. Já havíamos atravessado os
ribeirões 23 e 24. No outro dia
chegaríamos cedo ao nosso destino o Lago do Mamão.
Foi uma das noites bem dormida
e com uma comida caseira quente, fomos muito bem recebidos pelo morador e sua
família.
No dia seguinte antes de clarear já
estávamos arrumando para partir margeando rio acima até o lago, fomos encontrando
as mais diversas situações possíveis começando pelas centenas de patos
selvagens banhando nas águas limpas do pequeno rio que margeávamos, peixes
riscavam a superfície como a festejar a liberdade, encontramos dezenas de
capivaras que ao nos verem adentravam no rio bem devagar para não suscitarem a
sanha devoradora das piranhas, veados campeiros corriam um pedaço depois paravam
admirados a nos olhar, logo desviamos um pouco da rota e entravamos nas
imediações do lago e o vaqueiro Manoel nos levou uma clareira bem a beira de
onde podia ver a imensidão das selvagens águas infestadas de jacarés. Contei
quinze enormes cabeças, até a altura dos olhos, fora da água a nos espreitar.
Já era meio dia. Começamos a nos instalar, peamos os bois atrelados, armamos as
redes com os mosquiteiros, empurramos a canoa para dentro do lago e fomos
preparar as arpoeiras. O vaqueiro depois de merendar tomou rumo á sua morada,
teria que viajar um pedaço da noite.
--Mariano?
– perguntei – eu vou tirar as varas para as arpoeiras enquanto você ajunta
lenha e faz um café. Certo?
--Tudo
bem, mas cuidado não se afaste muito – recomendou.
Não foi fácil arranjar umas
varas com um mínimo de três metros de comprimento, bem firmes e retas e de bom
peso para arremesso. Depois de descascadas escolhi duas delas e as levei ao
fogo para “assar” (um método que torna a madeira mais rígida e praticamente
inquebrável). Escolhi dois arpões cujos cônicos que serviam de base para a vara
eram mais profundo, modelei com uma faca amolada a ponta da vara em forma
também cônica até se encaixarem perfeitamente, cortei cinqüenta metros de corda
quase da grossura de um lápis e com um nó “pé de porco” lacei a base externa do
cônico do arpão e encaixei a vara e puxando a corda dei outros dois nós na
ponta extrema e mais fina da aroeira, esticando a corda o que prendeu duramente
o arpão na mesma, enrolei a corda e na outra extremidade amarrei uma bóia feita
de madeira de buriti, estava pronta. Fiz o mesmo com a outra arpoeiras e fui
preparar as lanternas.
Uma ferramenta indispensável na
caçada ao jacaré é o machado, e este nós tínhamos, era um machado para abrir
buracos nos moirões de cerca e por esta razão não tem o “gavião” grande, é
quase reto e assim sendo não engancha no couro do pescoço quando desferimos um
golpe mortal para desencaixar separando a espinha dorsal da cabeça. Cortei um
pedaço do cabo para ficar mais maneável.
Começava a escurecer e os jacarés a
ficarem mais atrevidos, pois estavam se aproximando de nosso acampamento,
quando um deles chegou mais perto ao alcance de um lance de arpoada tive
vontade de fisgá-lo, mas sabia que as conseqüências seriam graves, pois lutar
com jacaré em terra seria bem mais perigoso, na água a vantagem era dos dois,
resolvi aguardar a noite chegar, mas não sem antes sussurrar:
--Aguarde-me,
breve teremos um encontro.
E
tivemos mesmo.
--Vamos
á luta Mariano, já esta tudo pronto ai dentro da canoa, e não vamos precisar ir
longe, temos alguns deles bem grandes a menos de trinta metros.
--Quem
vai arpoar primeiro? – perguntou.
--Eu
vou, mato dois e você outros dois.
--Combinado.
Quatro jacarés grandes para uma noite era
muito trabalho.
Entrei na canoa que
balançava porque minhas pernas tremiam muito, não tinha jeito por mais que
estivesse acostumado a aquela luta o medo sempre estava presente no começo da
caçada, depois que o sangue esquentava a coragem aparecia. Peguei a arpoeiras,
testei o balanço da mesma e vi que estava bem rígida, conferi a situação da
corda de arpão, lanterna pendurada no pescoço, o rifle 22 em cima do banco com
a bala no pente, o machado de gavião estreito destes que servem para abrir
buraco em moirões de porteiras porque tendo o formato quase reto não engancharia
no couro do jacaré, no fundo da canoa junto com um facão, não faltava mais
nada. Mariano já havia se ajeitado na popa da “ubá” e eu empurrei lentamente a
canoa para o meio do lago e de lanterna acesa na altura dos olhos buscava
focalizar os jacarés, fiz um mapeamento de todos que se somaram onze e todos
adultos e bem perto de nós estavam três nos olhando de frente o que me dificultava
arpoá-los e usando o sistema de indicação de rumo virei à ponta da vara para a
esquerda e há abaixei um pouco o que valia dizer para virar a canoa e ir mais
ligeiro, o piloteiro afundou o remo e a canoa avançou tentando contornar o
animal, mas ele velhacadamente acompanhava a lanterna e nunca deixava o flanco à
disposição, pois só poderia acertá-lo no pescoço lateralmente, mas não adiantava.
Dei sinal para frear a canoa e fiquei a focá-lo diretamente nos olhos sabia que
só haveria um meio que era espantá-lo, pois, ao tentar afundar rapidamente
teria que virar para um lado e eu não poderia perder a oportunidade e assim o
fiz, tomei um fôlego e bati com o pé no fundo da canoa, o animal se assustou e
pinoteando virou-se para fugir e eu o acertei bem no lugar ideal que é atrás da
cabeça no couro mole do pescoço. Foi um sopapo enorme que jogou água em nós, a
fera afundou e foi puxando a corda que lentamente eu soltava até que parou e a
canoa continuou a avançar e eu fui recolhendo a corda até encontrar a vara da
aroeira e desfiz o nó da ponta livrando a vara a coloquei dentro da canoa e com
a lanterna acesa na boca peguei o rifle calibre 22, eu a manobrei colocando uma
bala na agulha e comecei a puxar o jacaré que estava se segurando no fundo do
lago misturado à lama, fiz muita força, mas não conseguia desprendê-lo a ponto
da canoa se abaixar tanto que quase entra água pela borda, eu tinha certeza que
ele não agüentaria tanto tempo no fundo sem respirar, resolvi esperar um pouco,
minutos depois tornei a puxar a corda e o jacaré começou a subir para a tona,
era a hora do perigo, eu fui puxando devagar e a corda vinha raspando a canoa e
logo a cabeça do jacaré apareceu e eu continuava focando seu olho com a
lanterna segura ainda na boca e com uma mão controlava a corda e com a outra
peguei a 22 e esperei a cabeça aparecer toda foi quando quase me apavorei, pois
a cabeça estava mais alta que a borda da canoa não pôde esperar mais e
desfechei um tiro certeiro à queima roupa bem na nuca, o animal se entregou e
ai colocando a espingarda dentro da canoa peguei a machadinha e com um golpe
certeiro desencaixei a espinha dorsal junto à cabeça, agora eu sabia que estava
morto, mas eu esta quase em crise nervosa, mas fui me acalmando e a seguir com
a faca furei o couro na altura da nuca e passando um grosso arame de ferro e o
arrastamos até a margem e o amarrei em um galho grosso de uma arvore, no outro
dia cedo viríamos buscá-lo para tirar o couro, saímos atrás de outro jacaré. A
fase mais difícil é quando o jacaré vem à tona e quando os dois se juntam canoa
com a fera, não se pode esperar muito tempo é preciso agir rápido e acertar o
tiro na nuca, é uma única chance, em caso contrario se debate e vira a canoa e
ai as piranhas estão esperando as centenas. Constantemente estes pequenos e
vorazes peixes acompanham a canoa mordem no fundo e no remo, aonde eles
encostam a boca (beiço) o dente ataca (ela morde por contato seja em que for e
o que for). Naquela noite matamos dois
grandes jacarés. Era muito atrevimento lutarmos contra tamanhas feras não sei
onde achávamos tanta coragem, pois se caíssemos na água seriamos devorados
pelas piranhas ou atacados por outros jacarés que normalmente eram uma vez e
meio maior do que a canoa em tamanho, e éramos apenas dois contra dezenas deles
Agora, de contra partida, teríamos também que nos cuidarmos da presença das
onças, elas certamente viriam para banquetear os jacarés, por tal motivo
arrastamos as carniças mais para longe do acampamento e amarrávamos os bois bem
junto da fogueira no centro do acampamento.
Rafael havia feito um café bem
cheiroso e nos serviu, fomos dormir cansados e molhados.
No outro dia cedo fomos buscar
os dois jacarés e os trouxemos para o porto do acampamento, mas não
conseguíamos arrastá-los para a terra e tivemos que usar a junta de bois para puxá-los
fora da água. Tinham aproximadamente uns cinco metros de comprimento da ponta
do queixo até os anus, e ainda mais um metro até a ponta do rabo e deviam pesar
uns duzentos quilos.
Quase todas as noites, já nas
altas horas, escutavam os dois cachorros latirem nos alertando da presença de
coisas estranha e nos os fazíamos calar, não era boa coisa ir atrás de onça
naquela hora da noite, deixaríamos isto para o dia.
Quando comecei a tirar o couro
encontrei uma dezena de piranhas mortas dentro do corpo do jacaré elas haviam
entrado pelo corte no pescoço comendo a carne e depois não puderam voltar.
Salgamos a pele e derretemos a gordura que fica entremeada no rabo escondida
dentro da carne e somaram os dois jacarés, quarenta litros de óleo que
guardamos em lata.
Rafael tinha umas centenas de verrugas
nas duas pernas o que lhe dava muito trabalho, pois constantemente sangravam,
as verrugas secam a pele e, as vendo assim, resolvi dar um palpite para o nosso
ajudante:
--Rafael
passe gordura de jacaré nas verrugas se ele é usado para amaciar couro vai te
ajudar.
--Vou
experimentar – e dizendo isto rebocou as pernas com óleo do jacaré.
Quinze dias depois não tinha mais nenhuma
verruga o que nos alegrou, estava completamente curado.
Durante estes quinze dias matamos mais
trinta e dois jacarés, mas nosso abastecimento estava no fim e decidimos que eu
deveria ir a Mato Verde buscar suprimentos, açúcar, café, farinha e
toicinho.
Passaria pela fazenda do Oleriano e pegaria
uma mula do Mariano que estava lá com sela e tudo e assim o fiz. Neste dia fui
dormir na casa do fazendeiro. No outro
dia cedo parti para Mato Verde. Cheguei ainda cedo da tarde na margem do rio
Araguaia, deixei a mula com o vaqueiro do Coronel Lucio, meu amigo João
Vaqueiro, peguei uma canoa dele e atravessei o rio, fui até a minha casa ver a
minha família.
Minha esposa não estava em casa,
havia saído para visitar uns amigos, me acomodei e como já tinha banhado no rio
eu me joguei numa rede de labirinto
destas que se pode dormir de atravessado. Acordei pelo chamado da patroa.
--Olha
quem esta aqui? Perguntou ao menino que andava mais ela e a pequena Ruth estava
em seu colo.
--Aleixinho
já tinha dois e em dezembro completaria três anos de vida.
--Oi...
Vocês estão bem?
--Graças
a Deus estamos bem, mas foi bom você chegar para ajeitar as coisas, e tenho uma
surpresa para você, adivinhe?
--Vá
falando- subitamente apareceu na minha frente meu primo Nilton e filho de uma
tia minha de nome Elisinha e ele veio acompanhado de uma mulher – Ora vejam só
o meu primo Nilton por aqui!
--È
isto ai primo me de um abraço. Esta aqui é minha companheira de viagem e é
enfermeira.
Cumprimentei a jovem e
trocamos muitos abraços de boas vindas e o papo se generalizou.
--Devo
voltar para a Ilha em dois dias, mas até lá temos muito tempo para conversar.
Os dois maravilhosos dias se
passaram e eu teria que iniciar a minha volta, comprara os suprimentos e os
embalara em dois embornais para carregar na burra comecei a atravessar o rio
naquela manhã de sol e vento de verão, mas para minha surpresa meu primo também
queria ir. E lá se fomos, caçamos jacarés, onças e todo bicho que aparecesse,
na caçada de jacaré à noite meu primo se agasalhou no meio da pequena canoa e
por sorte arpoei um dos maiores jacarés de todas as minhas caçadas ele tinha
cerca de seis metros de comprimento, era um belo espécime de jacaré-açu.
Lembrando que era a primeira vez que Nilton se metia nestas perigosas caçadas e
achei que ele se comportou muito bem e com muita coragem, pois não é nada fácil
você ficar de cara a cara com um animal daquele tamanho ferido pelo arpão e
respaldado por milhões de piranhas que nos acompanhavam a espreita de um descuido
nosso. Dei nota dez para ele. Junto nos matamos quarenta e sete jacarés, uma
onça vermelha, uma pintada e uma onça canguçu È, ele foi um dos bons caçadores
que já conheci, era arrojado e decidido.
Mas, ele teve que retornar e
nos deixou muita saudade.
Á volta ao Lago do Mamão...
Despertei de meus pensamentos e continuei remando para vencer a distancia que nos separava da outra margem.
Atravessei o rio, mais de um
quilômetro de água e encostei a canoa no lugar de costume, e a amarrei em uma
raiz,
Subi o barranco e fui até a
pequena casa do João Vaqueiro.
--O
de casa? Chamei.
--O de fora... Vamos
entrando.
--Cadê a burra? João – perguntou
--Esta peada, mas cuidado
com ela é muito velhaca para ficar no
pasto tive que peá-la os três pés, toma café enquanto vou buscá-la.
--Obrigado.
Quando o vaqueiro chegou com
o animal fui logo arriando e joguei os sacos com o suprimento na garupa,
amarrei na cela, me despedi e montei, vi que era um animal perigoso, mas deduzi
que logo o cansaço da caminhada abateria o seu animo, pois deveria ir direto ao
lago do Mamão sem passar pela fazenda do Oleriano, mas a tarde chegou e eu
ainda estava cerca de meio dia longe, a viagem não encurtara caminho e sim o
tornara mais difícil andar entre o alto capinzal, teria que dormir na orla de
um capão de mata que avistava ao longe.
Já escurecia quando cheguei à
beira da mata, escolhi um lugar para atar a minha rede e desarreei a burra,
pendurei o arreio e os sacos com os suprimentos, peie o animal de três pés e em
cruz, e deixei sair para pastar, mas o capim estava muito alto e logo ela sumia
de vista, fui umas quatro vezes atrás dela e já a encontrava longe e com
dificuldade, pois tinha que usar a lanterna para encontrá-la, eu resolvi
deixá-la dormir amarrada pelo cabresto.
Não dormi direito sempre
prevenido escutando se a burra espirra-se seria sinal de algum perigo, deixei o
meu revolver calibre 38 bem a mão e cochilava de vez em quando, logo o dia amanhecera
e resolvi seguir viagem. Joguei o arreio no lombo da burra, amarrei os sacos de
suprimentos na garupa e ia montar seguro no cabresto e na rédea quando me
lembrei das peias que estavam no chão, estendi a mão para apanhá-las, mas não
alcançava, puxei o animal, mas ele endurecia e não vinha para frente, por uma
fração de segundo coloquei o cabresto no chão lentamente e apanhei as peias,
neste instante de milésimos de segundos a burra pulou para trás e disparou
capim adentro correndo com o arreio e a carga de suprimentos e logo sumiu de
vista, disparei atrás dela e zangado eu ia atirar nela, mas não a vi mais, só
fui achando pelo caminho os suprimentos caídos, mas ela se foi com arreio e
tudo mais. Tive vontade de chorar e gritar, mas o jeito foi jogar os pesados
sacos à costa e seguir viagem. Enfrentei o sol quente, o capim alto, os
mosquitos e os mutucas, mas eu tinha que ir em frente. Cheguei ao começo da
tarde, cansado e estropiado com os pés em brasa.
Quando Rafael me enxergou se
espantou e gritou para Mariano que cochilava na rede:
--Mariano
o Dankmar chegou.
--Cheguei
mesmo? Brinquei ironicamente.
--Uai...
O que foi que aconteceu? Você veio a pé?
--Sim,
a maldita burra me pregou uma peça – contei toda história para ele.
--Está
tudo bem só vamos ter prejuízo do arreio, a burra esta acostumada na fazenda do
Oleriano que é aqui perto, e ela irá ficar lá depois eu a pegarei, como está
todo mundo lá em casa? Perguntou.
Batemos um papo prolongado até a hora
da caçada, depois partimos para mais uma odisséia.
Já estávamos com 20 dias no
lago do Mamão e havíamos matado apenas 35 jacarés grandes o maior media 28
palmos do queixo até a ponta do rabo (não se aproveitava o rabo todo só a parte
mais macia), era muito grande.
Durante o dia fazíamos
explorações para descobrimos novos lagos, encontramos um lago bem grande, longe
do Riozinho em cerca de seis quilômetros, mas nossos compromissos nos obrigavam
a voltar e assim o fizemos.
Cinco dias depois estávamos em casa
na nossa bela cidade de Mato Verde, mas eu já tramava voltar ainda estávamos em
junho e tínhamos ainda quatro meses pela frente para mariscar jacarés.
Pará e de lá não sei para aonde
iam.
Vendemos os nossos couros ao Telesforo Moreira que era o comprador que pagava melhor, dali ele levava para Belém do Pará.
Descontei o preço do arreio, pois Mariano achou a burra limpa igual o dia em que nascera. .
Anos de 1956...
No ano seguinte resolvi continuar as caçadas e assim decidi explorar os lagos: Das Três Bocas que ficava junto do Riozinho com o rio Imoty e o rio Jaburu, Lago do Coqueiro Solitário que era no varjão e afastado das Três Bocas e o Lago dos 47 afastados do Riozinho em três mil metros.
Mariano não poderia ir, assim, chamei o “Paulista” Osvaldo
Guimarães para companheiro e o Rafael, como sempre para cozinheiro e braçal, só
que esta viagem seria bem mais dura e difícil, pois teríamos que seguir até a
margem do Riozinho com um ou dois animais de carga e lá arranjaríamos uma canoa
para nossa caçada, já sabíamos que o Mundico Sabino nos emprestaria uma canoa,
mas era pequena, mas esperávamos arranjar outra canoa maior com os índios
Javaés que estavam perambulando pelo interior da ilha. Assim aconteceu.
Preparamos a nossa viagem
cautelosamente para não faltar nada, inclusive um bom pedaço de lona plástica,
isto porque setembro e outubro já eram meses de chuvas.
Marcamos o dia da saída, seria
no mês de agosto de... 1956, a única diferença é que eu iria passar o aniversário de minha esposa dia 27 de
agosto de 1956 no mato e ainda por cima estava grávida, no dia 06 de agosto de
1956 no mesmo mês, nasceu meu terceiro filho que levou o nome de Paulo, estava
com boa saúde, não empataria a nossa viagem afinal à vida era assim mesmo e ela
compreendia muito bem.
No dia 22 de agosto
atravessamos o rio onde Mundico Sabino enviou um peão de sua fazenda com duas
mulas de carga para nos levar até as margens do rio Jaburu. Nos fomos a pé. Neste
dia posamos de novo na fazenda do Oleriano na margem do ribeirão 23,
madrugamos, pois teríamos que atravessar o ribeirão 24 e a macega estava muito
alta o que dificultaria o nosso avanço.
Chegamos no dia 23 antes do
anoitecer ás margens do lendário rio, nos arranchamos, no porto uma canoa
estava a nossa espera com dois remos dentro. Quatro cachorros nos acompanhavam,
o menor se chamava “Batom” era o cachorro de vigiar a casa, ele não quis ficar,
tive que levá-lo, o segundo chamava-se “Pretinho”, era um pra nada, o terceiro
se chamava “Javali”, era bom caçador e acuador de onça, o quarto era uma
cachorra mestiça metida mais a policial e se chamava “Veneza”, muito obediente
e valente. Estavam todos cansados e dormiam a solta pelo novo acampamento.
Neste dia apenas descansamos.
No
dia seguinte, o peão voltou com os animais e nos fomos até a “cachoeirinha’
·aonde possivelmente, arranjar-nos-ia uma canoa maior com os índios Javaés”.
A cachoeirinha ficava apenas
algumas horas no remo e logo escutamos o barulho das águas, quando fomos
aproximando ouvimos também vozes de índios, eram apenas quatro deles, aproximei-me
calmamente e encostei a canoa junto das outras.
--Taterianbo
(Bom dia).
--Tateri
– foi á resposta curta.
--Mombani
caí? - (Como se chama?) perguntei ao índio mais velho.
--Raul,
nome de tori – respondeu rindo – e continuou -Vocês vem de onde? (num belo e bonito português).
--Nos
estamos aqui para mariscar jacaré.
--Hum,
nos só mariscar peixe e ariranha.
--Eu
queria era alugar uma canoa sua destas maiores, a nossa, aquela ali, é muito
pequena e perigosa.
--Tá
bom, empresta canoa àquela grande - mostrou a ubá - quando ocê volta deixa canoa na casa de
Oleriano.
--Quanto
vai custar?
--Nada
meu amigo, ocê Dequimá?
--Sim, eu sou Dankmar.
--Todo
Javaé conhece ocê e Carajás também, fala bom do amigo.
--Vou
precisar de pelo menos um remo.
--Está bem, eu arranja remo, mas ocê demora mais e um dia vão até o “Canoanon”
visita nossa aldeia, eu arranja mué bonita
para ocê.
--Muito
obrigado Raul, mas eu tenho que voltar.
Ficamos mais umas duas horas
por ali e comemos um peixe assado e iniciamos a viagem de subida nas canoas, eu
vinha na grande e vi como era pesada, mas fazer o que? Não havia outro jeito, o fundo da canoa era
muito grosso, mas não tinha nenhuma rachadura.
Pousamos pela segunda noite no
mesmo lugar.
No dia seguinte, ajeitamos as
coisas dentro das canoas e seguimos viagem rio acima rumo às três bocas na
canoa grande, Rafael ia ao piloto e eu ia á frente usando a zinga ou o remo
levando dois cachorros e parte maior da tralha, na outra canoa pequena ia o
Paulista, mais dois cachorros e alguma tralha, sentados no piloto remavam e
alternavam com a zinga nos lugares mais rasos, íamos ganhando espaço.
Já havíamos passado da
cachoeirinha e não vimos os índios, deviam estar fora caçando, e enfrentamos um
longo trecho raso, tivemos que descer das canoas e empurrá-las, num certo momento
senti qualquer coisa me roçando o calcanhar de meu pé dentro da água rasa, eram
umas dez piranhas vermelhas ou “chipitas” ainda pequenas que nadando quase de
lado pela falta de água tentavam morder meu pé, me virei e com a vara da zinga
as espantei com varias pancadas fortes e elas que fugiram, prossegui viagem
arrastando a canoa por mais uns cem metros logo a água foi ficando mais funda e
eu entrei na canoa e fui para a proa impulsionar com a zinga. Havíamos andado
quase uns trezentos metros quando eu vi uma cobra Sucuri emparelhada com a
canoa nadando no mesmo sentido, a vara do arpão que esta sempre encastoada e
pronta estava bem à mão e apanhando-a joguei contra a cobra, mas o arpão não
entrava, tentei umas poucas vezes, mas não adiantava e teimosamente a cobra
acompanhava a canoa naquela água transparente, algumas vezes ela punha a cabeça
para fora da água e ameaçava atacar a canoa, ela estava enraivecida e eu
comecei a me assustar foi ai que me veio à idéia, atirar nela com o rifle 22 e
assim o fiz, agachei e apanhei o rifle o manobrei colocando a bala na agulha e
esperei, quando ela subiu atirei na cabeça, fora um tiro mortal. Paramos a
canoa, pulamos na água que devia ter não mais do que meio metro de fundura e a
arrastamos para a praia. Ela tinha aproximadamente uns quatro a cinco metros,
não era grande, mas estava gorda. Tentamos tirar o couro, mas não foi fácil,
mesmo morta ela se encolhia e não deixava racharmos o bucho com a faca.
Finalmente depois de a estaquearmos na ponta do rabo e no pescoço com as duas
varas enfiadas na areia consegui cortar o couro da barriga e para minha
surpresa contamos exatamente cento e cinqüenta filhotes de um palmo de tamanho,
vivos a se contorcerem na areia quente, antes que eu mandasse Paulista depois
que os contou os joga-se dentro da água do rio e eles sumiram todos, era esta a
razão de sua agressão.
Chegamos ás quatro horas da
tarde na boca de lago solto e dali um esgoto que leva ao lago dos quarenta e
sete, e nos arranchamos em uma bela praia. Estávamos enfadados, pois já era o
terceiro dia de penúria. Usando o arco e a flecha eu fisguei dois belíssimos
Tucunarés, jantamos bem e dormimos cedo.
Algo me fazia desconfiar,
estava tudo muito quieto para o meu gosto, seria a presença dos cachorros?
Acordamos com o cantar de dois
Jacurutus, se fosse ao lado do Mato Grosso eu iria suspeitar da presença de
índios Xavantes, o sol já havia saído, era por ai seis horas da manhã. Fizemos
café, eu havia levado um vidro com 200 pílulas de adoçante dietético, e assim
carregávamos menos coisas, apagamos o fogo e rumamos para as três bocas. Chegamos cinco horas depois.
Ali se encontravam o Rio Imoty
com o Riozinho e a terceira embocadura era o lago chamado Três Bocas, era uma
beleza de lugar, o silêncio, somente o cantar dos pássaros nas arvores, o
riscar dos peixes sobre o espelho límpido e sem macula das águas, tenho certeza
que possivelmente alguma onça, pintada, preta, vermelha ou canguçu nos olhavam
e nos espreitavam intrigadas, talvez pensando: “O que eles querem aqui? O que
vieram fazer?".
Encostamos a canoa em uma
clareira limpa na mata bem a beira rio e com muita sombra.
--Aqui
parece um bom lugar - comentei.
--Vamos
arranchar aqui mesmo é melhor ficarmos mais afastados das bocas - advertiu
Paulista.
Poucas horas depois estávamos
com um belíssimo acampamento montado. Esperávamos ter que passar ali pelo menos
30 dias. A tarde chegara com o barulho dos pássaros e o bater forte das asas
dos patos selvagens que pousavam por todo lados. Repetimos as operações
iniciais como preparar as arpoeiras, lanternas, linhas armas, machado, facão
etc.
A noite caíra escuro feito breu, de
barulho somente as rabanadas de um ou outro jacaré ou peixe, e o grumexe dos
cachorros que estavam meio escabreados com o ambiente hostil, de quando em vez
rosnavam, mas não latiam.
--Rafael
te cuida fica perto da fogueira – recomendei.
Paulista era um grande piloto e
exímio arpoador, mas eu teria que ir á frente, pois tinha mais pratica naquela
luta entre homem e fera.
--Paulista? Tudo pronto?
--Tudo.
--Você
pilota a canoa e eu arpou.
--Como
queira.
E a historia se repetia a guisa
da primeira viagem ao Lago do Mamão, tudo aconteceria de novo, mas eu não
conseguia me acostumar, sempre no inicio as pernas tremiam muito, empurramos a
canoa para dentro da água e fui para a proa e me coloquei em pé e com a
lanterna de dois elementos (Rayovac), segurei a arpoeira na altura dos ombros,
dei sinal com um leve balançar do corpo que era um sinal para avançarmos e
foquei a lanterna, quase me assombro mais parecia uma arvore de Natal de tantos
reflexos que eu via, mas pela altura dos olhos da água e da distância entre os
dois olhos percebi que tinha muito jacaré de segunda e terceira, isto queria
dizer que os jacarés grandes seriam poucos uma vez que a miuçalha estava solta,
teríamos que achar primeiro os grandes e assim que localizei um dei sinal com a
arpoeira, porque o piloto não tem a menor noção do que esta acontecendo, e lá se
fomos, bem devagar, o remo entrava e saia da água sutilmente sem fazer um menor
ruído fomos passando entre vários jacarés de segunda até que me aproximei do
grandalhão, tomamos uma cautelosa chegada e ele nem se deu conta, mas quando o
arpão se encravou no couro e carne do pescoço ai sim foi um Deus nos acuda, o
primeirão deu uma rabanada que nos encharcou dos pés a cabeça e balançou a
canoa, mas aquela embarcação era segura muito grande firme e pesada, mas mesmo
assim minhas pernas ainda estão tremendo, foi um barulho lago afora que mais
parecia uma revolução e que todo mundo estava contra nos, o jacaré correra um
pouco e entrou numa moita de mururé (planta que dá na superfície das águas) até se
enganchar, eu corri a lanterna ao nosso
redor e pude contar mais de vinte jacarés de todos os tamanhos bem perto nos
olhando agressivamente e de rebate as piranhas estavam de plantão junto a nossa canoa.
Deixe a coisa acalmar um pouco, foi quando o Paulista muito calmamente
falou:
--Vamos
encostar a canoa em um pé de Saram e vamos puxar este porcaria para fora e
matá-lo logo e depois vamos continuar sem escolher vamos pegar os que estiverem
na frente.
--Certo.
Eu fui soltando a corda da arpoeira
e nos agarramos em Saram (arvore de beira de lago), puxamos o jacaré, mas não
deu resultado e assim comecei a recolher a corda e lá se fomos para junto da
moita de mururé, eu começava a me esquentar e já estava zangado, passei a mão no
facão fui cortando as plantas junto da corda e puxando a canoa até entrar bem
dentro, foi eu senti o encastôo da corda (parte de amarrar que fica junto do
arpão), e esfriei ao sentir o couro do animal logo nas pontas dos dedos, mas eu
não sabia para qual lado estaria à cabeça então tive que cutucar a fera com o
facão para ela se mexer do lugar, num movimento tremendo que chegou a levantar
a canoa, o jacaré passou por debaixo dela e voltou para o espelho do lago e nos
fomos juntos, claro que eu havia dado corda.
Agora estávamos em igualdade de
condições, recolhendo a corda aguardava com o rifle ao lado quando a cabeça começou
a despontar bem junto da canoa e chegou a encostar, fui puxando a corda para
aparecer bem a cabeça fora da água, era de assombrar o tamanho da mesma que
ficou mais alta que o beiço da canoa, estava quase olhando para dentro, entre
eu e a fera não tinha mais do que um metro de distancia, mas ele permaneceu
quieto e assim segurei a lanterna na boca e com a mão esquerda mantinha a corda
esticada e com a direita encostei o rifle calibre 22 na nuca e disparei. Nem me
lembrava mais dos outros jacarés e das audaciosas piranhas que nos acompanhavam
roendo o fundo da canoa e do remo. A primeira fase estava cumprida, mas seria
necessário usar a machadinha para seccionar a espinha dorsal junto à cabeça o
que eu fiz com dois golpes seguidos, agora sim estava morto, o arrastamos junto
da canoa até a margem, furei o couro com minha faca junto ao corte na nuca e
passando o arame o amarramos num forte pé de Saram, cansado pedi para voltarmos
ao acampamento.
--Paulista
nós vamos voltar ao acampamento.
--É
bom e eu quero tomar um café.
Encostamos a canoa e eu saí um
pouco aliviado, afinal terminara tudo bem embora estivéssemos dentro de uma boa
canoa não seriamos páreo para o resto da família daquele tremendo animal se
quisessem nos atacar.
--Agora
é a sua vez Paulista eu vou pilotar.
--É
bom mesmo, esta canoa é muito pesada, mas eu vou arpoar o primeiro que
aparecer.
--Tudo
bem vai lá.
Neste resto de noite correu tudo bem, caçamos mais três jacarés grandes.
Dankmar e os 3 jacarés-açú.
Fui dormir de madrugada, passei boa parte da noite pensando em minha família e nos riscos que corríamos com as piranhas prontas para nos devorar em segundos ao menor deslize, onças na espreita pronta para atacar, sucuris, cobras venenosas, apenas dois seres humanos em meio a uma centena de jacarés de todos os tamanhos será que valia a pena correr aquele risco todo, logo no começo da vida? Ou era uma loucura?!.
Nos não tínhamos uma junta de
bois para puxar aqueles enormes animais para fora da água para tirar o couro e
assim o jeito eram tirar o couro bem na beira da água quase junto com as
piranhas que durante a noite haviam adentrado para dentro do corte feito na
nuca e devoraram boa parte da carne do pescoço e muitas morreram presas sem
poder voltar, depois tirávamos o rabo para tirar a gordura que em um jacaré
grande chega dar vinte litros, e seguidamente arrastávamos o resto da carniça
para mais longe possível do acampamento.
Assim se passaram os dias, os
couros começaram a aparecer e iam se amontoando e a gente se acostumando ao perigo,
mas o nosso estoque de alimentação estava no fim, trinta dias haviam se passado
desde que saíra de casa, e tínhamos que mudar acampamento para o lago do
“Coqueiro Só“, mas só quando eu regressasse - Assim decidi.
--Paulista
e Rafael, eu vou a Mato Verde buscar suprimentos, não saiam do acampamento e
nem inventem de caçarem sozinhos, dentro de dez dias estarei de volta, vou
descer na canoa pequena até o Oleriano de lá eu pego um animal e vou a Mato Verde,
assim volto mais depressa e continuaremos a nossa caçada, vou levar todos os
couros que puder e já deixo guardado com o velho, vou levar só o meu revolver a
carabina 44 e a 22 ficam aqui no acampamento.
--Quando
você vai - perguntou Rafael
--Amanhã
cedo, hoje eu vou explorar o outro lado rumo leste eu já vi ao longe uma mata
fechada e pode ser um lago grande, vou lá verificar.
--Leve
os cachorros contigo, tem muita onça rondando por aqui por causa das carniças
dos jacarés, todas as noites elas rondam o acampamento, já ouvimos muito
barulho delas e parece que estão se acostumando com a gente e isto pode ser
perigoso – comentou sabiamente o Paulista.
--É,
eu já reparei que elas estão pegando as carniças bem aqui perto e arrastando
para dentro do capão, vou levar os cachorros e a minha carabina 22.
--Tome
cuidado.
Entrei na canoa grande, chamei
os cachorros que logo estavam todos dentro, não deixei o Batom entrar, ele era
muito pequeno e muito gordo alem de cabeludo, logo cansaria embora fosse muito
cedo do dia, vagarosamente rumei para o outro lado
Quando escutei:
--Volte
Batom.
O cachorrinho entrou na água e
vinha nadando atrás da canoa que se encostava ao barranco do outro lado do rio,
fiquei de pé e pude ver centenas de piranhas todas no espelho da água quietinhas
com o rabo para baixo e a cabeça para cima, como se tivessem querendo tomar sol
da manhã e o cachorrinho nadando entre elas que se afastavam a sua passagem,
nunca mais verei algo assim novamente, a natureza é realmente sábia, até as
piranhas tem suas horas de paz. O Batom saiu ileso do outro lado eu quase
agradeci as piranhas, dali seguimos rumo ao rio Javaé, com o sol nascente em
meu rosto. Não havia andado mil metros quando os cachorros que sempre andam na
frente encontraram um veado Cervo e correram atrás dele até sumir o latido, não
adiantou eu gritar para eles largarem, fiquei sozinho por um bom pedaço, mas
quando eu estava atravessando um capinzal alto, seguindo por uma trilha batida
deixada por gado ou anta, escutei pisando bem atrás de mim, pensei “os
cachorros estão chegando” e continuei a caminhar, mas logo desconfiei, pois os
cachorros quando chegam eles vão logo atropelando e passando a frente e estes
não queriam passar, desconfiado me virei com o rifle pronto e dei de cara com uma
enorme onça Suçuarana (Vermelha) a menos de dez metros atrás de mim me seguindo
no trilheiro, ela estava pronta para saltar sobre mim, mas quando a fitei nos
olhos e ela firmou a vista em mim eu levantei o rifle para atirar, num piscar
de olhos, e em menos de dois segundos ela deu um pulo para o lado direito e
sumiu dentro do capinzal, não cheguei a atirar e nem fui atrás. A minha
natureza sempre me mantinha frio e insensível quando enfrentava o perigo em
especial as muitas onças e jacarés que passaram pelo meu caminho e ao que
parece as feras respeitavam esta atitude. Esperei mais um pouco calado e
atento, ouvi-os acuando alguma coisa, mas muito longe quase no rumo do
acampamento, mas nem os cachorros e nem mais a onça davam sinal de vida, fui em
frente rumo ao capão que se aproximava, logo que entrei num varjão de capim
baixo e limpo foi quando ouvi um tiro longe, pouco depois os cachorros chegaram
Tomei uma decisão, queimar o capim para ficar mais fácil de andar e assim o
fiz, fui para junto da mata do lago e aguardei o fogo avançar rumo oeste para
aonde o vento de verão o empurrava, quando fui chegando ao capão rodeando uma
moita topei de cara com uma onça que estava sentada e se levantando de um pulo
correu para dentro da mata quando dois cachorros chegaram e correram atrás
dela, entraram no capão e sumiram latindo ao longe, resolvi contornar o capão
pelo outro lado, mas quando ia passando junto de numa moita de tucum, o
cachorro “Pretinho” acuava violentamente alguma coisa escondida na moita, me
abaixei lentamente e vi a onça Canguçu deitada sobre as mãos abanando o pedaço
de rabo (era toco) e olhando fixamente para mim a menos de três metros, se
enfrentar a morte for assim eu estava preparado, pois não senti o menor receio
e nem tremor calmamente sem deixar de fixar os olhos dela levantei o rifle e
mirei bem na testa e apertei o gatilho, morreu sem se mexer do lugar, não senti
nem prazer e nem remorso, eu estava frio e parecia que não tinha feito nada de
mais, quando vi que estava morta a arrastei para fora da moita de espinhos.
Pensei em dar mais um tiro, mas não havia necessidade, descansei um pouco e
joguei a bicha nas costas e voltei ao acampamento, quase não aguentei o peso.
Quando cheguei ao acampamento o Paulista foi falando:
--O
que aconteceu? Eu escutei os cachorros acuando lá do outro lado e fui ver o que
estava acontecendo e não é que eles haviam acuado uma Suçuarana e ela subiu num
pé de murici baixinho e eu larguei fogo nela, já tirei o couro, e você onde
estava?
--Matando
esta aqui – respondi tirando a Canguçu de dentro da canoa - é... Eu vi a tua
onça ela andava atrás de mim botando tocaia para me pegar, eu só dou um tiro e
é bem na testa.
--É hoje parece que foi o dia das
onças, e eu só atiro dentro do olho que é para não estragar o couro – respondi
ironicamente. Já faz tempo que elas vêm perturbando a gente
--E
o lago, tem jacaré?
--É
pequeno o espelho e é muito sujo, pode ser bom, mas é difícil e perigoso, não
tem lugar firme para encostar a canoa, só muito lama.
--Deixa
para lá, já temos muito lugar para mariscar, vou tirar o couro desta canguçu e esticar.
Dei uma boa merendada e fui
descansar um pouco. Dormi até a boca da noite. Nesta noite eu não trabalhei,
pois teria que viajar cedo no outro dia.
Acordei com o barulho da passarada, a noite
foi calma, não houve aquela apreensão com o barulho e briga das onças
disputando as carniças acredito que elas sentiram os cheiros das duas onças
mortas. Tomei um cafezinho, tornei a recomendar que não fossem caçar especialmente sozinhos e tudo mais
necessário.
--Quero
que não esqueça remédio para dor de cabeça. – pediu Rafael.
--Para
mim eu quero uma garrafa de pinga, uma lata de leite moça e dois pacotes de
fumo. – pediu Paulista
--Já
estão na lista, você quer fazer “Um leite de onça” (Cachaça misturada com leite
Moça) Paulista?
--Adivinhou.
Pode ir tranqüilo, ninguém vai mexer com nada até você chegar.
Arrumei os couros e quando
surgiu o primeiro clarão do dia acordei o pessoal e embarcamos quase todos os
couros, tomei um café e acenei partindo.
Rio abaixo era bem mais rápida a viagem, mas
mesmo assim eu ia bastante pesado e teria que descarregar a canoa para poder
passar a cachoeirinha, e cheguei ao Oleriano já quase escuro da noite, dormi
entre aquela boa família, contamos casos e ao amanhecer do dia já estava com o
animal arreado e pronto para partir, não sem antes agasalhar a courama no
paiol.
Pouco depois das quatro horas
da tarde eu já estava atravessando o Araguaia e pensando como estariam todos,
mas a patroa e as crianças estavam bem.
.
Fiquei cinco dias visitando os
amigos, e dando uma força para minha sogra Joaninha, pois meu sogro viajava
muito e assim as mulheres sempre ficavam sozinhas, comecei a me preocupar com
meu estilo de vida, seria a última caçada prolongada que eu faria, e foi mesmo.
Quando inteirava os doze dias
eu chegava de volta ao acampamento com um suprimento para mais trinta dias, fui
logo notando algo muito estranho, Paulista estava muito calado e o Rafael
também, mas logo descobri o motivo, um couro de onça preta esticado de novo bem
no fundo do acampamento eu fui até perto para examiná-las e contei seis buracos
de bala, logo gritei:
--Isto
aqui é um couro de onça ou uma peneira?
--Calma
Dankmar eu vou te contar tudo.
--Pois
conte logo – sentei-me junto ao fogo e peguei uma caneca para tomar café
esperando a explicação do Paulista.
--Há
três dias esta onça amanheceu o dia esturrando em volta do acampamento e os
cachorros a pressentiram e correram para o mato a acuaram ai não teve jeito
tive que ir lá matá-la senão ela matava os cachorros.
--E
foi preciso dar tanto tiro assim, vamos lá rapaz conte esta historia direito,
venha cá Rafael me conte você?
--Patrão
foi quase assim só que foi o Paulista que resolveu ir caçar e saiu sozinho, não
levou nenhum cachorro, não sei por que carga da água ele resolveu subir numa
arvore e com a cabaça começou a esturrar chamando onça e não é que veio uma
onça preta e parou bem embaixo do pau que ele estava, ai não teve jeito ou ele atirava
ou a onça subia lá e o pegava, ele estava muito baixo, atirou e o tiro pegou
bem mal e a onça que correu, ele atirou de novo, não sei se ele acertou, mas
com o barulho dos tiros os cachorros correram e foram para lá e ai o pau
quebrou a onça ferida corria traz dos cachorros os cachorros corriam atrás da
onça, ai não teve jeito o Paulista desceu da arvore e foi até onde estava à
briga, era melhor enfrentar a onça do que enfrentar o senhor quando voltasse,
foi chegando perto e deu outros dois tiros na onça que correu para cima dele ai
ele correu, virou um corisco, mas se enganchou em um cipó e a carabina caiu da
mão dele e se agarrou no cipoal e subiu bem para o alto, e ai os cachorros
fecharam em cima da onça bem embaixo do Paulista, que me gritou, mas eu não
escutei, era muito barulho junto, só sei que a onça tornou a correr e os cachorros
depois de um tempo voltaram e ai o Paulista teve coragem desceu do cipoal e foi
procurar a carabina que demorou a encontrar, pois é caiu longe, foi muita
coragem ele descer da arvore só de facão na mão ai ele veio aqui pro rancho e
depois de umas quatro horas resolvemos os dois voltar lá para ver o que
aconteceu, mas logo os cachorros a encontraram, ela esta morta, ai nos
amarramos numa vara e a trouxemos para cá, o resto é aquilo ali – terminou
mostrando o couro.
--Viu
no que dá não escutar meus conselhos?
--É,
passei um bocado apertado, mas a bicha morreu.
--Paulista,
com uma carabina 44 tem que atirar seguro, é preciso ter calma.
--Você
já está acostumado a matar onça, mas eu não, esta é a primeira.
--Ainda bem que teve um final feliz,
e os jacarés? Ainda há algum por aqui?
--Só
jacaré pequeno e os jacaré-tinga que começaram a aparecer.
--Não
é bom sinal, vamos mudar para o lago do Pé de Coco Só
--Já
estamos em fim de setembro, bem perto de outubro, logo teremos muita chuva ai
às coisas vão ficar difíceis para nós - vaticinou o Paulista.
--Rafael
ajude a arrumar as tralhas começaremos a nos mudar amanhã cedo.
--Vamos
caçar jacarés hoje?
--Não,
hoje dormiremos em paz.
No outro dia fizemos um jirau alto dentro do mato e escondemos os couros de jacarés e de onça e juntamos o resto da tralha embarcamos na canoa e começamos a parte mais difícil da odisséia, arrastar uma canoa grande pelo campo por mais de dois mil metros, levamos quase seis horas para colocar a canoa no outro lago, mesmo vazia era bastante pesada, fizemos um cabresto de corda e amarramos uma vara forte de atravessado no bico de proa e dois homens, um de cada lado arrastamos um pedaço, depois voltávamos atrás das tralhas e assim por diante ate chegarmos ao novo lago, fizemos um acampamento provisório. Passamos oito dias caçando jacarés e só matamos onze, levamos os couros para o jirau da mata e começamos a nos mudar para a o nosso ultimo lago que pusemos o nome de Quarenta e Sete, e jamais o esqueceremos, foram os trinta dias mais difíceis da minha vida. Arrastamos penosamente a canoa por mais de três mil metros, desviando dos baixios, agora estávamos, em linha reta aproximadamente a dois mil metros da margem do Riozinho.
“Lago dos 47”;
Ali moravam, os perigos, o sofrimento e a
dor...
Eu tive um mau pressentimento...
Era o dia oito de outubro, já estávamos com 42 dias de caçadas e nosso resultado eram apenas 19 couros de jacarés de primeira, 01 couro de onça preta, 01 couro de onça vermelha e 01 couro de onça canguçu, também, passamos a maior parte do tempo em explorações e o pior era que as chuvas estavam para chegar, assim que chegamos ao lago, alias, no único lugar limpo em que poderia encostar uma canoa e montar um bom acampamento, fomos recebidos pelos esturros de um jacaré muito grande que fez a terra tremer embaixo de nossos pés.
--São
as boas vindas-comentei.
--Aqui
não vai ser mole não – concordou Rafael.
--Vamos
ver. – monologou o Osvaldo Paulista
Passamos o resto do dia
arrumando o acampamento e eu aproveitei para tocar fogo no capim entre o lago e
o rio, pois estava muito alto e seria muito perigoso, e embora já tivesse dado
umas duas chuvas ralas o fogo queimou até raspar o chão mostrando uma visão bem
diferente. Na parte da tarde fui dar uma volta de reconhecimento pelo lago, era
muito comprido e fazia uma curva em sua ponta norte onde o varjão praticamente
encostava-se ao e uma montoeira de paus altos e era ali o ninho de milhares de
pássaros, fiquei horas a observá-los, os Jaburus, as dezenas em seus vôos rasantes
posavam sobre a parte pantanosa do lago, os colhereiros cor rosa e seu bico
achatado mais parecendo uma colher alimentavam seus filhotes nos ninhos numa
barulheira infernal, os mergulhões em seus vôos acrobáticos subiam e desciam
dando piruetas e cambalhotas no ar e mergulhavam nas águas para aparecerem mais
longe com um peixe no bico, as garças enfeitavam de um branco sem macula tal um
modelo na passarela, as gaivotas escandalosas voavam riscando as águas com o
bico e sempre pegavam um peixinho menor, tudo cheirava a peixe, e a mosca de
ferrão abundava, era capaz de furar um cobertor para atingir a pele dentro da
rede, acredito que dali veio à mosca de chifre que hoje atormenta o gado eu as
vi aos milhares nos lugares em que os pássaros povoavam, voltei entre admirado
e pasmado, admirado ante tanta beleza da espécie viva, pasmado pelo
comportamento social ao verem que também os pássaros viviam em comunidades para
melhor se protegerem, era uma lição de vida, amor e dedicação. Voltei para o acampamento
cumprimentado pelos os crocodilos que vinham à tona para me estudar.
Ao escurecer fizemos uma
reunião para traçarmos nossos trabalhos, obrigações e cuidados que teríamos que
tomar:
--Vamos
arrastar as carniças o mais longe que pudermos depois que chegamos aqui já vi
muitos rastos de onça, não vamos facilitar, especialmente você Rafael, a noite
fique sempre acordado enquanto estivermos no lago, mantenha os cachorros juntos
da fogueira e arma na mão, qualquer sinal de perigo de dois tiros para cima,
lembre-se só dois tiros, entendido?
--Entendido.
--Hoje à noite nos só vamos matar
apenas dois jacarés para tomarmos conhecimento do lago.
--Por
mim está bem, estou um pouco cansado acho que podíamos descansar hoje e caçar
amanhã.
--Pode
ser, então vamos jantar e conversar um pouco e dormir.
--Uma
coisa esta me incomodando – censurou o Paulista.
--O
que é?
--Quando
você se dispõe a falar com reservas de certo lugar eu começo a ficar com medo.
--Afinal,
o que lhe aflige?
--Você
quando tem uma predição de coisa que podem ou vão acontecer saiam da frente,
acontece mesmo e eu gostaria de saber o que esta te perturbando agora.
--Por enquanto nada, mas vamos
tomar cuidados, quando a minha natureza fica perturbada algo esta por
acontecer.
--É,
eu me lembro de alguns casos teus, lembra-te também? Perguntou.
--Sim,
quando o meu sogro foi assassinado na Barreira de Pedra eu estava em casa
deitado na cama ao lado de minha esposa Maria, quando uma vós que eu conheci
como a dele me falou “Dankmar fale para a Joaninha que eu vendi o motor Penta
novo para o Alfredo Alemão, na Piedade para ele pagar para ela, e diga que
estou bem”. Meio atordoado acordei minha esposa Maria e lhe contei sobre a vós
que eu ouvira.
--Deixa
isto para amanhã cedo vamos à casa de minha mãe e você conta para ela.
Dormimos e ao clarear do dia
deixei Maria ainda deitada e fui à casa de minha sogra e contei o fato para
ela, e enquanto eu contava ouvimos o roncar de um barco a motor chegando,
olhamos para o rio e vimos o barco do marido dela se aproximando para atracar e
não sei por que eu falei a ela:
--Dona
Joaninha aquele é o barco do seu Aleixo, o mataram vá ao porto.
Minha sogra saiu correndo e
pouco depois voltava com alguns homens trazendo o corpo do marido morto dentro
de uma rede. Muitos outros casos eu tenho previsto parece que tenho o Don de
ver as coisas antes de acontecer.
Como foi que aconteceu?
O finado Aleixo quando veio de Aruanã, trouxe
consigo um passageiro que aparentava ser turco, homem da cara ruim sobrancelhas
encontradas, e parece que era meio maluco, ele trazia uns objetos estranho por
baixo do blusão que nunca o havia tirado, o finado Aleixo segundo me contou o
índio já estava sobressaltado com o comportamento de seu passageiro e quando se
aproximaram de uma vila beira rio de nome Barreira de Pedra, o tal maluco lançou
mão de uma carabina 22 de repetição que o finado havia deixado na cabine e
vendo o homem na proa do barco simplesmente apontou e atirou três vezes na
cabeça de Aleixo que caiu morto, o piloto Carajás de nome Domingos se espantou
e rumou a proa do barco para o barranco onde ficavam as casas e pulou na água,
o bandido ainda lhe deu um tiro baleando-o não gravemente e também pulou na
água e ao chegar à margem saiu correndo em disparada rumo ao centro da Ilha do
Bananal Ninguém foi atrás. Dias depois
organizaram uma busca e, segundo me contaram, encontraram junto ao rio 23 que
corta a ilha ao meio de rumo sul ao norte, ali mesmo o aprontaram e devem-no
ter jogado no rio e as piranhas fizeram o resto.
--Puxa
que drama, então foi aqui perto de onde nos estamos porque, o rio é este em que
nos estamos e Barreira de Pedra lá na margem do Araguaia não fica muito longe
daqui, ‘fica de grito’ eu grito aqui e eles escutam lá.
--Puxa,
vai mentir assim no inferno.
--E
por falar em inferno é este aqui que nos estamos. E agora, nesta situação o que
esta vendo?
--Um
pouco de sofrimento, mas no fim há de vir alguém nos ajudar, eu vi um homem
chegar cantando. Quando chegar à hora eu sei direitinho pode ficar tranqüilo.
No outro dia cedo eu dei outras
voltas pelo lagos e achei outros dois lugares com a margem limpa, mas era lama
pura. Os jacarés não se assombravam, com a gente, alias, nem ligavam.
Chegando à noite, saímos para a
caçada, às pernas tremiam mais do que antes, as piranhas roçavam o fundo da
canoa com os dentes e o remo ficava agredido de tanta mordida. Pegamos o que
estava mais perto, não havia como escolher era uma verdadeira cidade quando se
passava a lanterna pelos olhos dos animais. Os jacarés naquele lago eram mais
violentos, de vez em quando um batia com o casco no fundo da canoa e se
aproximavam perigosamente. Arrastamos para a margem e o amarramos com corda da
própria aroeira numa moita em uma pequena ilhota. Voltamos ao lago arpoamos um
segundo jacaré e o matamos desencaixando a espinha junto à cabeça, e o puxamos
para o porto e o amarramos com arame em um toco grosso, era o começo da nossa
Via Crucies, pois neste exato instante o Paulista quase que profetizando falou:
--Dankmar...
Devemos retornar ao acampamento, estou sentindo um vento frio e vejo relâmpagos
ao longe é chuva na certa e precisamos agasalhar as nossas tralhas, afinal já
estamos em outubro.
--É
a voz da profecia, quando Paulista fala é melhor escutar, sempre acerta, vamos
voltar – concordei.
Quando aportamos a canoa
Rafael já vinha ao nosso encontro dizendo:
--Parece
que vamos ter chuva, mas não se preocupem, já agasalhei quase tudo, fiz um
jirau e coloquei a tralha de comida e o sal, só não achei jeito de armar as
redes, a lona é pequena.
--É só quatro por oito metros, mas
dá para a gente se esconder embaixo com os cachorros e as muriçocas que agora ...
Empestearam o lugar, vamos ver
como estão às coisas e dar uma melhorada, amanhã tiraremos umas palhas para
fazer uma cobertura.
--Vamos
lá.
Trabalhamos umas duas horas,
mas improvisamos melhor, parecia que daria tudo certo, mas não foi o que
aconteceu.
Já devia ser por ai nove horas
da noite quando nos sentamos ao redor da fogueira para comer um peixe assado
com farinha de puba e tomarmos um café, nem bem tínhamos terminado quando um
forte vento foi chegando e aumentando cada vez mais jogando cinza e brasa para
todos os lados, as redes flutuavam no ar, galhos das arvores próximas começaram
a estalar e cair e relâmpagos iluminavam a noite e as lamparinas foram para as
“pupuias” ou simplesmente sumiram somente as lanternas funcionavam, nos
agarramos a beirada da lona que começava a rasgar, pois eram destas lonas de
plásticos pretas que não aguentam nada, e este inferno durou uns vinte minutos
até que caiu água para valer, os cachorros estavam escondidos embaixo do jirau,
nossas mochilas e sacos de rede se molharam todos e veio água para dar com pau,
choveu forte durante uns quarenta minutos, depois foi diminuindo, mas só veio
parar ali pelas duas horas da manhã quando então deitamos nas redes molhadas,
com muriçoca e tudo e dormimos.
Quando o dia amanheceu, pudemos
ver o estrago da chuva, mas metemos as mãos à obra logo estávamos com o acampamento
limpo e a roupa esticada para secar, e do jacaré que amarramos só achamos os
pedaços de cordas que o amarravam e o chão todo revirado por outros jacarés ao
puxá-lo para dentro da lagoa, mas ele se fora com um bom pedaço de corda
amarrado no pescoço e tinha na ponta um pedaço de “buriti” que servia como
“bóia”, fomos procurá-lo e logo o achamos. Ele ainda estava lá com a corda e no
fundo do lago, morto, cheio de piranhas por dentro que entraram pelo corte
grande feito pelo machado atrás da cabeça, bem na nuca. O arrastamos até o
porto e tiramos o couro, era muito grande mediu 24 palmos até passar um palmo
do “anus”, com rabo e tudo daria 28 palmos.
Naquele dia tivemos vários
problemas, Rafael foi tirar uma abelha e meteu o machado entre os dedos dos pés
foi um corte profundo, mas tínhamos levado uma pequena farmácia de emergência e
logo lhe fiz um curativo, e lhe dei uns comprimidos e enfaixei o pé.
Uma das lanternas não queria
funcionar e tivemos sérios problemas para arrumá-la e ainda por cima o açúcar
havia se molhado e estava secando, diminuiu muito, teríamos que apelar para as
pílulas de sacarina que ainda tínhamos cerca de duzentas delas.
Nas cinco primeiras noites
matamos aproximadamente dezesseis jacarés grandes, mas cada dia que passava
ficava mais difícil, decidi que teria que ir à beira do Riozinho, onde havíamos
deixado canoa pequena bem amarrada, minha intenção era ver se encontrava alguns
mariscadores que por ali passavam, mas o caminho era apenas um pequeno
trilheiro, e com tanta chuva a minha botina já havia se estragado e eu ia
descalço, quando eu pisava fora do trilheiro, os talos de capim entravam nas
frieiras de meus dedos dos pés e furavam a carne, era um sofrimento terrível,
tinha muita dificuldade para caminhar até que improvisei umas alpercatas que
não se seguravam bem dentro dos pés. Quando cheguei à beira do rio, tirei a
água da chuva que havia alagado a canoa e atravessei para o outro lado, num
barranco alto e fui dar uma volta mais por curiosidade do que por necessidade e
para minha surpresa encontrei uma velha roça de mandioca, ainda existiam muitos
pés, certamente seriam dos índios Javaés, mas estava abandonada, arranquei um
bocado de raízes e fui carregando para a canoa, os veados campeiros se
levantavam bem junto de mim, caminhavam para meu encontro e quando sentiam meu
cheiro pulavam de lado e corriam um pouco depois voltavam, ao que parece nunca
tinham visto gente antes, poderia ter matado um bocado deles, mas de nada serviria,
não os poderia carregar e assim me limitei às mandiocas.
Voltei para o nosso lado do rio
e tirando a camisa a guisa de sacola carreguei um bocado de raízes, dividi-as
em duas partes a primeira eu levaria para o acampamento as outras raízes
colocaria dentro da canoa com bastante água para elas pubarem e assim eu
poderia voltar e fazer um “grolado” ou uns “beijus”, e colocando a carabina 22
no ombro e a sacola de mandioca nas costas me dispus a voltar para o
acampamento no lago. Não havia ainda andado dois quilômetros naquela campina
limpa quando voltei o rosto para o lado esquerdo e vi duas onças, a menos de
cem metros, brincando em uma poça de água que restara da chuva em meio ao
varjão, sutilmente joguei a camisa no chão e lançando mão da carabina 22,
manobrei e apontei, foi uma temeridade enfrentar aquelas feras em campo aberto,
pararam de brincar e ficaram a me fitar, foi quando mirando uma das duas bem na
cabeça atirei, o animal deu um urro e pulou por cima da outra e correram rumo à
mata de beira do esgoto que ia do rio para o lago, não tornei a atirar, estavam
longe, antes decidi ir ao rancho buscar os cachorros para caçá-las e assim o
fiz, acelerei o passo e logo chegava ao rancho gritei os cachorros fui à minha
sacola peguei uma caixa de balas Winchester 22 e falei:
--Espere
aqui Paulista vou atrás de duas onças já baleei uma e vou ver se a acho.
Cuidado
duas onças é perigoso, te cuida.
Voltei correndo até o pequeno
poço onde estavam banhando as duas e os cachorros que haviam chegado à frente
pegaram o rasto e saíram a balroando entrando na mata, fui atrás, a mata de
beira do esgoto era muito fechada, mas o barulho dos cachorros não estava longe
eles haviam acuado as feras, fui em frente e quando comecei a enxergar os
cachorros vi que acuavam com a cara para cima olhando em cima do cipoal do
esgoto, cheguei perto e vi uma delas trepada numa galha e olhando para mim e
para os cachorros, a cabeça da onça estava bem visível, mas meia de lado,
atirar assim seria uma estupidez porque pegaria no osso a que chamam de
“torpedo” um osso forte e grosso da temporal do cérebro e bala não entraria, eu
precisava pegá-la bem de frente, bem no meio da testa aonde o osso é fraco e
fino, aguardei alguns segundo e logo me dispus a apelar, gritei para ela que
olhou direto para mim atirei sem pestanejar, a onça despencou de cima do cipoal
no meu rumo, eu estava quase embaixo dela, ela na queda me levou junto para o
chão e os cachorros por cima de mim, gritei afastando-os e me afastei um metro
da fera que deitada ainda tomava um fôlego profundo, tirei a bala CBC-22,
coloquei uma amarelinha e encostei o cano bem no meio da testa e atirei. Foi um Deus nos acuda, a onça estrebuchando
na ânsia da morte jogava o corpo de um lado para o outro, ficava em pé,
arranhava as arvores, mas rapidamente rolou para o chão e se aquietou, vi que
tinha morrido.
Eu estava quase sem fôlego encostado por
trás de um tronco seco, cansado mesmo, tentei mover a fera de lugar, mas não
conseguia, era um corpo muito pesado e mole, deixei do jeito que estava e ai me
lembrei que eram duas. Mas não vi a outra nem seus rastos, já era tardezinha,
voltei para o acampamento.
No outro dia cedo, eu e o
Paulista fomos até lá e o Paulista tirou o couro com a cabeça inteira. Voltamos
ao rancho e fomos retirar a ossada da cabeça de dentro do couro para a colocarmos
dentro do lago para os peixes fazerem a limpeza da ossada, mas, o que me chamou
a atenção era que havia apenas um buraco de bala no couro e na ossada da cabeça
e eu dera dois tiros, ficamos intrigados, mas não descobrimos o que realmente
aconteceu. Amarrei a ossada da cabeça e joguei a beira da água.
Quando a retiramos ao
entardecer já estava limpa e brilhando, os peixes fizeram um bonito trabalho e
o chumbo da bala, uma só, balançava dentro da ossada do crânio, a retirei e a
guardei como lembrança. E a outra onça? Será que foi realmente baleada?
Naquela noite foi diferente das
outras todas e marcou o meu fim como caçador de jacarés.
No lago havia muitos jacarés, mas pequenos,
havíamos matado quarenta e seis grandes, mas também as nossas pilhas estavam
exaustas, chovia muito e estava na hora de irmos embora. Mas antes teria que
acertar minhas contas com um enorme jacaré-açu que ainda restava, e ele nos
desafiava, quando o imitávamos ele respondia esturrando tal um marruá que fazia
a terra tremer, e dificilmente deixava nos aproximarmos dele. Como as pilhas
estavam fracas, cortei uma lanterna Rayovac (de metal) e emendei no fundo de
outra e com o foquitos (lâmpada) de três elementos coloquei cinco pilhas fracas
o que resultou em uma ótima luz. Parti para o lago a procura do animal, de
longe o avistei junto a uma moita de Mururé, fomos nos aproximando bem lentos e
sem fazer barulho com a lanterna focada em seus dois olhos que nos encaravam
frente a frente, tentamos dar a volta para pegá-lo de lado, mas ele sempre nos
acompanhava, quando estávamos a menos de vinte metros, ele afundou e foi
aparecer a mais de quinhentos metros em meio do lago, fomos para lá, mas a fera
era muito arisca e tornou a afundar e apareceu junto à margem do lago,
contornamos o meio e fomos para a margem em que ele estava acima de nos uns cem
metros, de repente ele sumiu e eu em pé na proa da canoa o procurava com a
lanterna quando o animal passou por baixo da canoa bem no meio dela e a levantou
com as costas me jogando dentro da água com lanterna e o rifle na mão que foram
parar no fundo do lago, mas ali, naquele lugar a margem não era muito funda
tinha apenas uns dois metros e a lanterna acesa continuou iluminando no fundo
bem junto da carabina e eu já estava dentro da canoa, o medo que eu tinha de
piranhas não me deixaram quase molhar, em fração de segundos eu já estava
dentro da canoa.
--E
agora Paulista – falei desapontado com a situação.
--Agora
é pegar a lanterna e a carabina.
--Com
estas piranhas por ai?
--Ora,
deixe que eu vá - e dizendo isto o Paulista escorregou pelo beiço da canoa,
mergulhou e voltou com tudo nas mãos.
--Cuidado, não deixe cair
de novo, agora vamos acabar com este intrometido, jogue o arpão de qualquer
distância aonde pegar nele que se dane.
--Terminou
Osvaldo meio zangado.
--Vamos
lá.
Foquei a lanterna desta vez com
o cordão passado no pescoço, e o enxerguei a menos de quinze metros, tomei um
fôlego e apontando a arpoeira bati com o pé na canoa, com o barulho o animal
deu uma rabanada e virando de dorso começou a sumir no espelho do lago quando o
arpão o encontrou bem por traz da mão esquerda, era um péssimo lugar para se
puxar um animal daquele tamanho, mas ele não correu muito, logo senti a corda
da aroeira afrouxar eu fiquei desconfiado e gritei:
--Paulista
ele vem para cima de nós.
--Então
sente na canoa e prepare o machado - mal acabara de fechar a boca o animal
surgindo da escuridão das águas e da noite abocanhou o beiço da canoa e ato
seguido mostrando seus dentes violentamente a empurrava para a margem do lago,
quando estávamos bem perto do barranco tornei a gritar.
--Vamos
para terra, pule.
Pulamos bem na beira da terra,
mas era só lama e entramos nela até quase a cintura, com dificuldade nos
arrastamos para fora do lago deixando a canoa solta com o jacaré agarrado no
beiço dela, mas lá dentro só ficou o remo e a carabina, o machado veio conosco.
Pouco tempo depois à canoa estava bem perto de nos e o jacaré sumira,
embarcamos novamente e voltamos para o porto do acampamento, por aquela noite
já chegava. No outro dia cedo resolveríamos a parada, pois o arpão estava
amarrado em uma bóia de buriti e seria fácil o acharmos.
Conversamos muito naquela noite
e decidimos voltar para casa, mas não sem antes ver o que aconteceu.
No outro dia cedo voltamos ao
lago, de dia era bem melhor e logo achamos a bóia quando comecei a recolher a
linha e vi que o jacaré ainda estava preso ao arpão e fui puxando devagar com o
rifle preparado logo vi aparecer o lombo do incrível animal, vinha quieto e sem
se mexer, mas eu não tinha jeito de atirar porque a cabeça estava mergulhada
dentro da água e eu mal a enxergava, pedi para o piloto remar a frente e talvez
assim a cabeça aparecesse e apareceu mesmo, mas bem junto do Paulista lá na
proa do barco que quase correu para frente, a cabeça do jacaré ficava por cima
do beiço da canoa e olhava vingativamente para o nosso piloto, passei a ele a
22 e ele audaciósamente encostou o cano na nuca do enorme animal e atirou, foi
mortal, passamos uma laçada no focinho, levantamos a cabeça fora da água e com
o machado a desencaixamos a espinha junto à cabeça, agora sim já não ofereceria
mais perigo.
O arrastamos para o porto e com muito sacrifício o rolamos a ponto de poder tirar o couro o que o Paulista e Rafael fizeram com muito trabalho. O jacaré estava magro de fazer dó, pois a sua papada em baixo da língua estava comida e uma crosta amarela a circundava, não sei se foi doença ou piranha, mas aquele jacaré não tinha mais como comer qualquer coisa, pois o que pusesse na boca vazaria para baixo, talvez isto fosse a razão de sua impetuosidade, medimos o couro, tinha seis metros e dez centímetros de comprimento, da ponta. Do queixo a ponta do rabo.
Iniciando a volta para casa...
As chuvas se acentuavam e o
varjão amoleceu depois de amarramos os quarenta e setes couro em fardos de seis
cada um e tentamos voltar à canoa para o Riozinho, mas Paulista havia estourado
os ouvidos que purgavam e tinha febre, o Rafael tinha o pé inchado do corte que
acontecera ao tentar tirar um mel de abelha com o machado e eu cheio de
frieiras, estávamos fracos e desanimados. Seria muito difícil tirarmos a canoa
arrastada em mais de dois mil metros por sobre um varjão mole e atolador que
colava a canoa na lama. Inventamos de cortar uns roletes, mas só atolava,
desistimos e eu resolvi ir até a barranca do riozinho, fomos nos os três e
quando ali chegamos pudemos ouvir alguém cantando e remando uma canoa batendo o
remo no beiço a moda índia.
Logo na curva do rio acima
aparecia uma canoa e seu condutor, ele vinha cantando bem alegre e ao nos ver
encostou acanoa no nosso porto improvisado e puxando-a para encalhá-la subiu o
barranco e foi conversar conosco:
--E
ai rapaziada, que cara feia e esta?.
--Estamos pregados de cansaço,
--Me
contem o que esta acontecendo...
Fizemos um relato completo das nossas
tribulações e ele deu uma risada bem gostosa e emendou:
--Vamos
buscar esta canoa, vamos todos os que não podem fazer muita força faça ao menos
um pouco, tudo serve.
Quando chegamos ao lago ele foi
logo dizendo.
--Primeiro
vamos dar uma viagem cada um levando os couros, depois voltamos e levamos a
canoa. Quando chegamos ao lago o nosso novo amigo foi logo amarramos oito
fardos de pele de jacaré afinal havíamos caçado quarenta e sete jacarés quase
todos de primeira, isto é com mais de três metros e meio do anu ao queixo e
isto significa que teria na realidade até o fim do rabo cerca de quatro metros
de comprimento. Cada fardo tinha em média seis couros secos e salgados eram
oito fardos e depois de amarrados foi jogado nas costa de cada um e ele reafirmou
--Quando
cansarem joguem os fardos no chão eu vou atrás e torno ajudá-los a colocar em
suas costas – vamos embora, vamos dar a primeira viagem.
As duas viagens foram rápidas
logo estávamos em redor da canoa a que o amigo logo determinou:
--Arranjem
um pau para amarrarmos de atravessado aqui no bico da canoa outro para
enfiarmos na popa por dentro desta corda – terminou amarrando uma corda em
volta da canoa na popa e colocou o pau entre a corda e o fundo da canoa de
comprido o que fazia sobrar uma boa parte da vara pelo o lado de fora na traseira
da canoa e continuou: – Eu e o Dankmar pegamos na vara da proa e levantamos o
bico da canoa e vocês dois enfiem os ombros por baixo da vara e empurrem para
frente.
E assim o fizemos os dois da frente
levantavam a canoa pelo bico e os dois de traz levantavam um pouco para
descolar a canoa do chão e a empurravam para frente e antes do meio dia estávamos
com a canoa e todos os nossos pertences na beira do rio e pronto para
viajarmos. O nosso salvador sempre animado entrou na sua canoa dizendo
--Até
outro dia meus amigos - e empurrou a ubá para o meio do rio e cantando de novo
sumiu rio abaixo deixando um sentimento de amizade e muito agradecimento e nem
ficamos sabendo seu nome, como já era meio tarde do dia resolvemos pousar e
partir no outro dia bem cedo, e assim o foi feito, e mal o dia clareara já
estávamos de viagem e logo nas primeiras remadas escutamos uma onça esturrar,
certamente seria a companheira da que matamos.
--Pode
ficar por ai minha amiga um dia eu voltarei para nos encontrarmos. Mas na
realidade eu já estava resolvido a encerrar a carreira de mariscador de jacaré
e onça.
Caçar jacarés?Onças? Nunca mais...
Três dias depois estávamos em
casa na amigável Mato Verde.
Nos meios deste período eu fui com o
Liton até Goiânia acertar uns negócios e resolvemos comprar um avião monomotor
era um PA22 destes do corpo de tela e asa de alumínio, com uma bequilha
dianteira comandada. Foi um negocio muito barato, nos devíamos ter desconfiado,
mas estávamos sem avião para voar então qualquer coisa que tivesse motor
serviria. Quando a encomenda chegou fomos para o campo da Escolhinha que fica
na saída de Goiânia para Trindade e lá estava o bichão, passamos a mão nele o
abastecemos, conferimos óleo e tudo mais, estava certo e pronto para partir,
mas o Liton estava aguardando uma pessoa para ir junto e quando esta pessoa
chegou conheci que era Jose Taveira um comerciante de São Felix do Araguaia e
nosso amigo, ele trazia uma mala grande e uma pasta que faltava estourar o
fundo de pesada, tanto é que para por dentro do avião foi preciso o motorista
do taxi que o trouxe ajudar. Era uma quinta Feira Santa, lembro-me bem, depois
que o Taveira embarcou, Liton tomou posição e pediu para eu dar partida na
hélice, quando eu coloquei a mão no nariz do avião ele levantou a frente e
bateu a cauda no chão, estava com a trazeira muito pesada e eu reclamei:
--Liton,
assim não vai dar para decolar ele está muito pesado de cauda, olha – dizendo
isto levantei o nariz e ele tornou a bater a cauda no chão da pista.
--Viu?
--Sim, mas não tem nada não quando
você entrar ele estabiliza , vamos de hélice.
Dei a partida e o motor pegou,
subi no avião, assentei e falei.
--Vamos
parar com esta viagem, estamos muito pesados, nos vamos cair bem ai.
--Vira tua boca pra lá alemão, está
com medo?
--Não,
não estou com medo, mas que nos vamos cair ai isto vamos.
Motor foi todo acelerado, foi dado meio
flap, e soltamos a fera que roncou e correu na pista, começava a descolar e
voltava ao solo por duas vezes e a pista estava se acabando foi quando Liton
deu o resto flap e ai o avião inchou e subiu, mas estava com toda potencia e
depois de ganhar uns cento e cinqüenta metros tentamos tirar o flap e o avião
afundou neste momento eu notei que a pressão do motor estava caindo e a
temperatura aumentando e avisei o Liton;
--Vamos voltar enquanto temos motor,
pois ele esta pifando.
Liton quando viu a coisa preta
falou:
--Não
podemos voltar estamos muito baixo.
--Nem
tente fazer uma curva, pois se ele entrar em curva vai frear e estolar e nos
vamos de bico para o chão, é melhor seguirmos e cair em frente.
E lá se fomos passando raspando
por cima de uma casa de palha, puxamos para cima e antes que estolasse
colocávamos o nariz do avião para baixo e mergulhávamos e assim fomos levando
enquanto isto acontecia o nosso amigo lá traz já tinha me ensinado pelo menos
uns dez nomes de santas e santas. Não tínhamos alternativa e assim desligamos a
bateria, fechamos torneira do combustível e mergulhamos em meio a um terreno
baldio cheio de arvores altas bem na beirada de um cemitério, a primeira asa
que arrancou foi a do meu lado, depois do outro lado depois eu só vi o nariz do
avião ir ao rumo do chão. Eu me apaguei. Quando acordei estava de cabeça para
baixo, com o rosto ensangüentado e dentadura quebrada os lábios partido e
sangrando, mas vi que o pára-brisa havia saltado inteiro e a frente estava
livre com muito custo soltei o cinto de segurança e cai para o lado de fora
rolando no chão numa grama muito espinhosa e o cheiro de gasolina estava por
toda parte. Um bocado de gente começou a aparecer eu fui recomendando para que
não ascendessem isqueiro e não fumassem por causa da gasolina que estava toda
espalhada pelo chão. Liton saiu do avião todo encurvado, caminhou um pedaço
para perto de mim e caiu ao chão de comprido, eu pedi aos que ali estavam para
retirá-lo para mais longe do avião e ele foi arrastado pelos braços embora eu
alertasse que fizesse com calma sem muito esforço para não deslocarem a espinha.
E o mesmo fez comigo, só que cada vez que me arrastavam um pedaço eu desmaiava
e volta logo, não demorou muito tempo chegou um fusca e queriam nos levar para
o hospital só que eu não concordei:
--Gente
pense bem, nos estamos com possíveis fraturas na espinha, se vocês nos
colocarem dentro de um carro pequeno igual a este não terão espaço para
proteger nossa espinha sem a encurvar a e isto será muito ruim para nos, mande
o fusca ir buscar uma ambulância com macas e eu e o Liton só vamos sair daqui
em macas.
Nestas alturas o Zé Taveira ia
saindo lá de traz de seu banco no avião estava inteirinho só com uns arranhões
no rosto e foi logo perguntando:
--Gente aonde é que eu estou?
--Esta
no inferno seu miserável. – Foi a resposta de Liton Todo mundo riu.
Zé Taveira pegou suas tralhas e
o Fusca e sumiu antes que a Policia chegasse.
Logo apareceu um caminhão de carregar boi da Matingo, eu vi que daria
certo e pedi para tirarem a tampa trazeira do caminhão a colocarem ao lado de
Liton e o rolassem para cima dela e depois o colocassem dentro da carroceria e
fizessem o mesmo e assim foi feito com ele e comigo, mas daí para frente é que
a coisa fedeu mesmo, o caminhoneiro estava apavorado e saiu em disparada, a
carroceria do caminhão estava cheia de palha de arroz e bosta de vaca e com o
vento quase morremos sufocado em meio aquela tempestade de merda.
Quando o caminhão parou o nosso
amigo o sempre gozador e sorridente;
--O
que foi meus amigos, vocês brigaram com algum boi? – brincou Miranda que já
estava lá em cima da carroceria.
--Brigamos
com tua avó.
--O
pessoal do Hospital já vem para atendê-los, e eu vou voltar lá para pegar os
seus pertences antes que roubem tudo. E lá se foi aquele prestativo e saudoso
amigo.
Foi uma luta para nos retirar
daquela sujeira toda eu acho que usaram até guindaste, pois fomos levantados em
macas por cima da carroceria do caminhão.
Nunca agradecemos o motorista, também num estado daqueles.
Fomos internados, passamos
pelos Raios-X e depois engessados do pescoço até as virilhas. O médico encarregado
do tratamento elogiou os cuidados tomados na trazida nossa, pois se não assim
fosse poderíamos estar aleijados para o resto da vida. No primeiro dia de
internado tivemos a surpresa de ver nosso amigo Miranda entrar no nosso quarto
com uma radióla na mão, era mesma que Liton levava no avião, não teve nada de
defeito e nem os discos ele colocou alguns bem baixinhos para nos ouvirmos, me
lembro eu era o “Rio de Piracicaba”. Ele tinha trazido uma garrafa desta de
dois litros de Coca Cola e o Liton estava agarrado bebendo, comecei a ficar
desconfiado e pedi um copo o que o Miranda me entregou rindo e dizendo “Tome
logo seu sacana” era coca com muito uísque, logo estávamos quase de porre e com
era noite o enfermeiro Zico veio fazer as visitas e desconfiou também, mas o
Miranda empurrou logo uns dois dedos da bebida nele e ficou tudo bem passamos
quatro dias no hospital e tivemos alta, Mas não sem antes tivéssemos as visitas
da FAB que abrira sindicância a respeito da queda do avião e não sei por que
carga d’águas eles só falavam comigo, pois achavam, alias sempre acharam que o
piloto era eu, Foi aberto um inquérito policial e o Juiz tendo em vista a declaração
do Jose Taveira me condenou a um ano de prisão domiciliar por “Imperícia na
operação da aeronave”, mas quando recebeu o laudo técnico da FAB revogou a
prisão tendo em vista o resultado da perícia como “Danos ocorridos no motor
causando o deslocamento de um mancal de biela ocasionando a falta de
lubrificação trancando a maquina e conseqüente queda da aeronave” Não houve
imperícia de pilotagem e sim danos no motor
Retornamos em outro avião para
Luciara e vinte dias depois eu havia arrancado o gesso e já estava trabalhando,
fiquei meio torto, mas até hoje sofro os resquícios daquele acidente. Pois
sofri esmagamento de dois elos da espinha dorsal e um leve esmagamento de uma
terceira vértebra que veio a prender o nervo o que me causa pequenos dissabores
até hoje.
Abril de 1957
Meses depois resolvi sair uns tempos de Luciara
Resolvemos nos mudar para uma localidade chamada Barreira de Pedra, para
passarmos uns dias por lá, era apenas um agrupamento de casa a beira do rio
Araguaia e um pouco abaixo da fazenda São Pedro, apenas trinta léguas. Ali
morava a família do Zé Pretinho, sua mulher dona Áurea, seus filhos e parentes,
Miguel, Domingos, Cantidio, Raimundo, Raimundo Cachaça, Julião, Zilda, e um
monte de gente todos descendentes do Zé Pretinho que era a imagem do Pai João
com seu eterno cachimbo da raça negra e cabelo pichaim. Eu sempre levava um
radio a pilha, Motorola daquela caixa grande pesada afinal tinha quase umas
sessenta pilhas comuns umas agregadas às outras, mas aturavam por bom tempo,
foi uma pandega quando eu o liguei pela primeira vez naquele vilarejo,
ajuntaram-se quase todos os moradores que não acreditavam que uma caixa pudesse
falar a rodeavam a procura do autor daquela voz e das musicas.
Em Mato Verde quando foi ligado
um radio que o fundador Lucio havia mandado dezenas de amigos o rodearam e
dizem que uma voz do rádio assim falou:
--“Agora
vamos ouvir o Cardeal Lucio da Basílica de São Pedro falar”...
--Um dos ouvintes gritou:
--Escutem
minha gente é o Lucio que vai falar lá da Fazenda São Pedro.
Lucio era o fundador daquela região e naqueles dias estava ausente em
sua Fazenda na margem do rio Tapirapé de nome São Pedro. Foi muita
coincidência, mas sem semelhança alguma, afinal fazer o que?
Durante o tempo que ali ficamos
só matei uma onça pintada muito grande, ela havia passado a noite esturrando do
outro lado do rio e foi quando o negro Horacio que era casado com uma irmã de
minha esposa me convidou:
--Vamos
matar aquela onça?
--Vamos,
o cachorro Javali esta comigo aqui.- (Javali era um cachorro novo, mas acostumado à
caça de onças, meu cunhado que era o dono do cachorro, já havia matado umas
vinte com ele).
Um índio Carajás que morava na aldeia da
barreira de pedra insistiu para levarmos um cachorro dele para aprender a acuar
onças e, lá se fomos rumo à outra margem, (quando encostamos a canoa no
barranco os dois cachorros pularam para terra firme e Javali começou a balrroar
tipo de latido diferente parecido com um uivado surdo), andamos pelas trilhas o
cachorro mestre cada vez mais se manifestava, vinha até onde eu e o negro
Horacio estava e voltava em frente:
--Ele
esta farejando o rastro da onça, ele vem e volta para não pegar o rastro ao
contrario – finalizou.
Antes de chegarmos até onde à
fera estava acuada. O cachorro do Carajás passou por nos e igual a uma bala e
ganindo assustado morrendo de medo, agora Javali estava sozinho e finalmente
chegamos ao local e vimos à onça em cima de uma arvore olhando para o cachorro
no chão, Horacio apontou o revolver 38 para atirar e eu destravei a carabina
Winchester calibre 44 jogando uma bala na agulha, ato continuo um tiro de
revolver e a onça armou o pulo para fugir ou brigar eu não titubeie apontei na
cabeça e atirei na bicha em pleno salto, ela caiu ao chão estatelado estava
morta, a levamos para o pequeno povoado e lá tiramos o couro, à bala de 38
havia acertado em cima da pá, mas não trespassou, ficou entre o couro e o osso
e o tiro de minha carabina 44 atingiu o pescoço um palmo atrás da cabeça, mas
quebrou-lhe a espinha junto à nuca, o tiro fora mortal. O cachorro do Carajás atravessou o rio de
volta à aldeia e se escondeu atrás de um balaio.
A estadia durou pouco e depois
de arrumar tudo o que tínhamos colocamos dentro do pequeno barco e lá se fomos
para outra aventura, eu, Maria, Aleixo, Ruth e Paulo, duas cabras e cinco
porcos e mais um bocado de galinha, diziam os moradores por onde passávamos que
as galinhas nossas já estavam acostumada a viajarem embarcadas e que bastava
dar um grito para que elas caíssem de perna para cima ficando no jeito de serem
amarradas, e as duas cabras embarcavam sem ninguém mandar e os cinco porquinhos
sempre se agasalhavam.
Descemos por quase três dias o
rio Araguaia, passamos por São Felix do Araguaia, aldeia Carajás do Fontoura,
Luciara rumo rio abaixo até chegarmos à ilha Grande que ficava junto à barra do
rio Tapirapés, bem no meio do Araguaia, nos primeiros dois dias nos arranchamos
na margem direita do rio em uma barreira bem limpa do lado da Ilha do Bananal
em frente à grande ilha.
&
Novas aventuras...junho de 1957
Ilha Grande, rio Araguaia...
Durante a estadia na Ilha
Grande que ficava bem no meio do rio Araguaia junto da aldeia Carajás e fazia
barra com o rio Tapirapés e aldeia destes índios. Mais distante ficavam os vilarejos
beira rio que se chamavam Santa Terezinha e Furo das Pedras aproximadamente
quinze léguas rio abaixo.
Para ganhar dinheiro eu pescava
toda espécie de peixe e ia colocando em pequenas bacias ou poças de água que se
formavam nas praias, muitas vezes eu ia pescar meio fora da beira rio, isto é
no interior da ilha e minha esposa sempre ia comigo e os meninos também, eu ia
à frente com o facão abrindo picada no emaranhado de cipó e tiririca e ela
vinha atrás junto com as crianças, muitas vezes as carregando nos trechos mais
longos, era uma judiação fazer aquilo com eles, mas ela nunca reclamou e nem
eles, era mais seguro estarmos juntos, pois aquela ilha era infestada de onças
e cobras, assim com eles perto de mim eu me sentia mais seguro, e, ela, era a
maior pescadora enquanto eu fisgava um peixe ela pegava dois ou três, e até os
meninos todos de linha na mão pegavam muitos peixes, só que nos tínhamos que os
tratar e salgar, pois não dava para levá-los vivos e os colocar nas poças
d’água que se formavam nas praias onde eu colocava os outros, muitas vezes
passávamos o dia socado dentro das Empuca nas beiras dos lagos pescando e
assando peixe e comendo com farinha de puba, era um grupo familiar notável,
parece que eram feitos de granito e ferro.
Numa pescaria que eu meu amigo Célio
Pinheiro fomos fazer em uma praia rio abaixo, vejam só o que aconteceu:
Chegamos cedo da tarde naquela praia junto ao rebojo do morro dos
Carajás e tratamos de armar um espinhel que consistia de uma linha forte
amarrada em uma poita (bóia de madeira) com pedras amarradas na outra ponta que
serviriam de ancora para sustentar a força da água e distribuímos oito anzóis
grandes e fortes cada um com uma isca de peixe pacu e junto da outra ponta que
amarramos em terra firme colocamos um chocalho (tipo de Polaco usado para colocar nos pescoço dos animais) para acusar se
algum peixe pegasse no anzol ele balançaria a linha e daria o sinal.
Ascendemos uma fogueira na
praia enquanto assávamos uns peixes e conversávamos uma novilha se aproximou de
nos e ficou a uma distancia prudente parada e olhando para a fogueira, ela
estava com o pescoço arranhado e o Célio observou:
--Esta
novilha vaca esta fugindo de onça, olha o pescoço dela as arranhaduras ainda
estão sangrando.
--É
por isso que ela veio para cá, veio procurar proteção.
--È,
mas vamos tomar cuidados.
Enquanto conversamos o chocalho
bateu duro, era um barulho infernal e nos fez correr para a linha e escutamos o
bater do peixe fisgado, parecia ser muito grande. Começamos a puxar a linha,
foi um trabalho árduo e difícil, mas o trouxemos para fora da água, era uma
enorme Piratinga, ou mais conhecido como filhote, só que não tinha
nada de filhote, pois devia pesar uns noventa quilos e tinha aproximadamente
dois metros de comprimento. Foi o único peixe que pegamos naquela noite e a
novilha continuava ali parada nos olhando, ativamos a fogueira, rearmamos o
espinhel e nos deitamos junto do calor do fogo e acabamos adormecendo, mas o
dia já vinha raiando e ao acordarmos não vimos mais à novilha, só rastro dela
indo embora, mas em compensação as pisadas da onça estavam em nossa volta há
uma boa distancia.Voltamos para casa.
O autor e os filhos Aleixo e Ruth
nos braços da mãe, e o peixe ( Piraiba ou Filhote) capturado com Célio Pinheiro-julho 1957
Quando chegava o dia de entregar os peixes em Santa Terezinha eu tinha que ao clarear do dia juntá-los, colocá-los nas caixas de isopor e descer até a vila onde e quando chegaria o avião Douglas da Linha Nacional que levaria os peixes para Goiânia. Mas a volta era difícil, pois subir o rio era muito demorado pois o motor Penta de quatro cavalos andava muito devagar e só poderia vir em um dia e voltar no outro e assim minha família teria que passar a noite sozinha só a minha esposa e as crianças e isto era uma temeridade, tendo em vista a quantidade de onças que perambulavam por aquela região, eu mesmo um dia antes vi três onças pintadas nadando o rio rumo à ilha e nada pude fazer, pois tinha emprestado o meu rifle para um índio Carajás e isto me preocupou muito e resolvi sair bem de madrugada para chegar cedo a minha morada, se é que posso chamar de morada um barraco feito de forquilhas e uma lona grande jogada por cima. Quando cheguei a casa vi que a patroa estava alarmada, mas uma companhia havia chegado era um primo dela de nome Antonio filho da dona Jacinta lá de Luciara.
--Meu velho, entrecortou a minha
patroa – Pensei que ontem íamos nos acabar quase que você não nos encontrasse
mais com vida.
--O
que aconteceu?
--Ontem
ao escurecer primeiro uma onça esturrou em nossa volta e botou as cabras, os
porcos e as galinhas para correram para dentro de casa, o chão tremia com o
esturro e as cabras berravam e os meninos se danaram a chorar, e, eu agarrei o
facão, e pensei, se ela viesse estaria disposta a defender a vida de meus
filhos e a cortaria em pedaços, nem me lembrei da carabina 44 e para melhorar
as coisas o céu se escureceu e os relâmpagos nos assombravam, foi quando o
Antonio chegou, ele viu o nosso fogo e veio para nos ajudar, o vento veio com
tudo o que tinha de direito, tivemos que sair do barraco e ir para a praia,
pois o vento assoviava e arrancava os galhos das arvores jogando em cima de
nos, na praia estávamos mais seguros, mas a areia pareciam querer nos furar,
felizmente não demorou muito para passar, quando vento se acalmou voltamos para
o barraco e arrumamos a lona e ai a chuva veio para valer, eu tinha colocado a
Ruth na rede e vi que ela esta chorando meio engasgada quando cheguei até ela
vi que estava se afogando, pois havia um furo na lona e uma forte goteira
despejava água diretamente sobre o rostinho da menina, se eu não chego lá ela teria
morrido afogada. Por favor, não me deixe mais sozinha aqui nesta ilha foi muito
difícil para mim.
Ao tomar conhecimento da
terrível noite, eu não tive duvidas abandonei a ilha deixando ali uns cinco
porcos e algumas galinhas e me mudei para Furo das Pedras.
Leonardo Vilas Boas também
passou a morar uns dias em Furo de Pedra, havíamos descido o rio Araguaia até
Barreirinha para entregarmos umas mercadorias e posto isto resolvemos subir o
rio rumo a Santa Izabel do Morro passando primeiro pelo Furo de Pedra e eu
assim acionamos o barco Brigadeiro Aboim.
Recordei que já fazia cinco
anos que estava casado e me comprometi comigo mesmo de fazer uma analise de
minha vida, do comportamento de meus familiares, de meu comportamento, enfim
uma retrospectiva de todos os últimos dez anos e assim o faria daí para diante:
Em
20 de julho de 1958 nasceu em Luciara a minha filha Miriam. Já eram quatro
filhos duas mulheres e dois homens.
Retrospectiva.
“Do conceito e convivência familiar entre 1953 a 1963”.
Quando me casei em 1953 à vida
a dois foi uma maravilha nos primeiros dois anos, Maria embora muito rude em
certos aspectos, pois fora criada nos sertões por outro lado era compreensiva e
decidida e gostava de ser atendida pelo nome de “Cunhã” que quer dizer índia moça. .
Naquele tempo eu não era
chegado a bebidas, apenas fumava e sempre fui um pouco namorador, não podia ver
um rabo de saia que eu não arriscasse uma cantada, ai e que a porca torcia o
rabo, quando a dona desconfiava vinha com tição de fogo para cima e ai se eu não
escapulisse, era uma fera nos momentos de raiva foi quando eu entendi o que era
amar e preservar este amor ela certamente o sabia como fazer isto muito bem,
meio agressiva, mas era o jeito dela. Certa feita eu tinha arranjado um
desentendimento com um morador vizinho dono de uma chácara a beira rio, e
estávamos de turra e acontece que um cavalo meu sumiu e me deram noticias que
estava na chácara do tal encrencado e quando eu falei para minha esposa:
--Maria eu tenho que ir
até lá buscar meu cavalo.
--Cuidado, não se
descuide e não vá desarmado, leve o revolver, nunca se sabe o que pode
acontecer “o coitado já morreu e o desconfiado vive até hoje”.
Sinceramente fiquei com a pulga
atrás da orelha a dona era mais decidida e mais “baguala” do que eu imaginava.
Mas era uma cozinheira
inigualável e ótima mãe para os filhos, zelava da molecada igual uma onça vigia
seus filhotes.
Nesta altura já eram quatro, a
saber, Aleixo, Ruth, Paulo e Miriam todos nascidos em Mato Verde ou Luciara, a
exceção de Aleixo que nasceu na Ilha do Bananal na Fazenda São Pedro.
O difícil foi convencê-la a não
comer com os dedos e sim usar habitualmente o garfo, mas me parecia que a
comida era mais gostosa quando manipulada pelos dedos. Fizemos amizade com três
americanos que também moravam em Mato Verde eram os missionários. Esteel Ray e
as irmãs Violeta e Paulina da Congregação Igreja Cristã Evangélica, fomos batizados
nas águas do rio Araguaia e assim nos tornamos Crentes Evangélicos. Foi uma benção
para nossa família e eu rapidamente aprendi a língua Inglesa embora já soubesse
algumas palavras.
Resumindo
Começava
a iniciar as fusões de caráter entre duas personalidades tão distintas, a minha
vinda de alemães e criado no estado de São Paulo com uma cultura já bem
avançada a dela nascida no estado de Goiás hoje Tocantins, vinda de uma família
sertaneja, o pai quase negro, era vaqueiro de fazenda e caçador de onças e
tinha ainda um pequeno tino comercial, a mãe era bem morena e ambos
descendentes de tribo indígenas, a avó era índia, mas Maria já assimilava uma
cultura um pouco mais avançada para o seu mundo, lia corretamente chegando a
ser até professora do primeiro grau escolar, mas no intimo, lá dentro aonde os
gêneses se escondem, ela ainda era rude como as raízes, mas estava em um
estagio primário evolutivo chegando-se à conclusão que esta miscigenação
deveria gerar espécies fisicamente “naturalis”, altamente resistentes e
repletas de anticorpos, mas quanto às qualidades intelectuais... “Só esperando
para ver e isto só será possível daqui a dez anos, isto em 1963 se eu ainda
estiver vivo”.
O Barco Brigadeiro Aboim.
Naquela manhã de agosto de 1958, a bordo do barco “Brigadeiro Aboim” ia três homens, Leonardo Villas Boas, Enzo Francisco Pisano e a minha pessoa. O rio Araguaia estava muito seco, era por ai, mês de outubro, e, aquele barco de calado fundo começava a raspar seu caso na areia. No leme do barco eu fazia de tudo para não encalhar, bem a minha frente um enorme banco de areia anunciava cuidados, bati na campainha pedindo para reduzir a marcha do motor, mas os gritos de um e outro, não deixavam se ouvir nada, nem escutaram a campainha bater nem viam o enorme banco de areia se aproximando. Os dois companheiros discutiam calorosamente, Enzo descendente de italiano, tanto gesticulava como gritava, Leonardo já rouco e muito enfezado parecia estar em outras terras, mas eu não me incomodava com isso, já estava bem acostumado, aconteciam todos os dias e os dois eram grandes amigos dizem que fundaram a Fundação Brasil Central. (FBC).
Discutiam sobre qualquer coisa,
tinha que haver motivação para beberem uma caipirinha feita da boa Ypioca, e
desta feita era sobre suas atuações quando da abertura da estrada rumo Roncador
- Xingu e estavam na altura de Vale dos Sonhos ao passarem por uma grota Enzo
ia à frente abrindo a picada e Leonardo mais atrás rematando o serviço foi
quando Leonardo com um golpe de facão cortou uma grande volta de um cipó que
balançou, atravessou a grota, e foi pegar bem na nuca do italiano que caiu
estatelado e sem fôlego.
--Você aquela vez quase
me mata.
--Você é muito mole
italiano burro - Retrucou Leonardo depois de uma bebericada.
--Estou te falando para
largar mão desta idéia de comprar terras, isto aqui vai virar um tumultuo só
com tanto picareta se dizendo dono.
--Mas se nós compramos
não tem picareta bom para tomar, precisamos garantir nosso futuro e não vai ser
com este barco e o emprego da FBC, que vamos conseguir sobreviver.
--Você vai arranjar é uma
terra com sete palmos de fundura.
--Não seja idiota
italiano burro.
--Burro é a tua avó. -
E dizendo isto Enzo pulou para dentro do rio.
Para sorte dele estávamos junto
do banco de areia e estava raso.
--Entre logo cretino.
--Não entro, podem ir
embora e me larguem aqui.
Diminuí o motor e fiquei
segurando o barco bem encostado nele.
--Deixe-o aqui, e vamos
embora. Está ficando doido Enzo? Entre logo se não vamos encalhar e ai sim é
que vamos passar um bocado de dias preso na areia e fazendo muita força.
--Só entro se ele me
pedir desculpa.
--Está bem italiano você
ganhou, desculpe e entre logo.
Mas o barco havia se afastado
um pouco e Enzo teve que caminhar uns cinco metros para poder entrar, nisto um
grito violento do italiano nos colocou em polvorosa. Leonardo ia pular na água,
mas Enzo o impediu.
--Não
entre, espere – Enzo estava branco feito um papel.
--O
que foi?
--Pisei numa concha
(galho) de espinhos - dizendo isto se encostou ao barco vimos que ele estava
para desmaiar, nos o puxamos para dentro enquanto o barco descia nas águas sem
rumo. O colocamos em cima da mesa do centro e quando vi o pé direito do mesmo
todo cravado de espinhos de tucum, alguns deles estavam apontando pelo lado de
cima no pé junto aos dedos, Leonardo deu um bom gole de Ypioca para o enfermo e
pegando um alicate jogou pinga nos lugares mais expostos e começou a arrancar
espinhos com a ponta do alicate, no começo cada espinho arrancado era um berro
depois foi se acostumando, acredito que o pé ficou dormente, já no piloto
apontei o barco para uma praia alta e encalhei só a proa. O barco se prendeu e
fui ajudar na tíração dos espinhos que ficou mais dolorosa quando os que
estavam de fora se acabaram começamos a esgravatar a pele procurando outros.
Tiramos aproximadamente uns setenta espinhos grandes. Ele havia pisado em cima
de uma palha de Tucum que estava no fundo do rio, só não fez mais estragos
porque deve Ter pisado na ponta aonde os espinhos são mais curtos, os do meio
chegam a ter cinco a oito centímetros de comprimento. Começamos a viajar e
pouco depois estávamos chegando à barreira do Pacifico que fica um pouco abaixo
do Furo das Pedras. O italiano estava dormindo em uma rede e totalmente bêbado.
--Vamos
parar no Pacifico por uns instantes – pediu Leonardo.
--Já vamos encostar, vá
lá para a proa - pelo comando abaixei a aceleração do Caterpillar e o coloquei
em ponto morto, tínhamos impulso suficiente para encostarmos-se ao porto.
--Está
amarrada, vai descer um pouco.
Subimos a ladeira do porto até
onde estava a pequena casa do velho Pacifico e sua mulher, ele nos recebeu.
--Leonardo,
Dankmar entrem a mulher esta doente.
--Vamos
lá ver o que ela tem - disse Leonardo e eu comecei a ficar com medo, será que
ele vai querer receitar a doente?
--Como
vai a senhora dona.
--Vou mal seu Leonardo, estou com
dor no corpo todo, acho que é reumatismo.
--O
que a senhora esta tomando?
--Me ensinaram que
raspasse a caninana e pusesse na pinga que era muito bom,
--Eu assim o fiz, mas
parece que piorei.
--Mas é lógico, pinga só pura nada
de mistura, mas eu vou lhe dar umas pílulas que tenho lá no barco, tome uma de
manhã outra ao meio dia e outra à noite durante uma semana e estará curada.
--Obrigado seu Leonardo, mas será
que é só reumatismo?
--Você
esta com a “arca caída” peça a alguém que sabe benzer, e não pegue em coisas
pesadas.
Depois de medicar a velha nos
despedimos e eu fui com Leonardo para a casa dele em Furo de Pedra depois
iríamos para Mato Verde, mas quando estávamos contornando a praia da curva
grande, abaixo da vila, passamos pelo barco Frei Chico que ia lavando com água
o passeio de tão carregado. A família do italiano morava em Xavantina.
Eu admirava Leonardo em quase
tudo, era dinâmico, trabalhador, muito inteligente afável e bom amigo, só não o
invejava em uma coisa na mulher que tinha como esposa, ou melhor, como sua
mulher, ela podia estar rindo a vontade, lá do porto quando chegávamos
escutávamos as risadas, mas quando Leonardo entrava em casa era outra coisa a
mulher brigava demais, era muito nervosa, mas os filhos que ele tinha com ela
que eram a Marisa, Marina e Álvaro, prendiam o velho amigo.
A minha esposa também se
chamava Maria, Maria Paciente, filha de sertanejo, eu a conheci na barreira de
São Pedro na ilha do Bananal, talvez um pouco impetuosa, e de idade nova. Dias
felizes, ao menos para mim se passaram. Enzo ficava mais no barco do que na
casa em breve viajaríamos rumo a São Félix do Araguaia e ali cada um tomaria
seu destino.
Bem perto de Furo das Pedras, cerca de uma légua, ficava Santa Terezinha
aonde o padre Jentel era o ator principal de uma guerrinha particular que se
aproximava. A Linha Aérea Nacional, com seus aviões Douglas DC3 faziam a linha
para Goiânia via Cristalândia ou Gurupi, estavam instalando um grande projeto
agropecuário. Tanto eu como Leonardo éramos constantemente procurados pelos
moradores daquela região que agora viam chegar os que se diziam donos daquelas
terras e sentiam medo do futuro.
Sebastião Barbeiro era um deles,
posseiro, dono de barco e comércio também morava na pequena vila. Aldenor
Milhomem e sua grande família eram todos pequenos produtores e moravam por ali,
fundaram aquele lugar.
Um dia nos reunimos e sob o
tema “terra e posse” iniciamos um bom debate, muita gente estava presente em
meio à rua que ficava na beira do rio, só Aldenor discordava de quase tudo e
resumia:
--É só meter umas balas nestes
vagabundos que eles nunca mais voltam para atentar a vida da gente.
--Mas
Aldenor – moderava Sebastião que era outro violento não vamos poder matar a
todos eles, vamos ouvir a opinião do Leonardo e do Cavalcante.
Cavalcante era um sujeito já de
idade, maçom, e muito moderado e também muito conceituado, sua esposa também se
chamava Maria, e, como veremos, não foi muito feliz.
--Bem,
o que eu tenho a dizer que é assim mesmo, sempre foi e sempre será – comentava
Cavalcante – sabíamos que estas terras sempre tiveram donos, quando não o
Estado, algum particular e como nunca nos interessamos em comprar, agora os
donos as reclamam e a violência não vai adiantar, só se resolverem vender lotes
pequenos ou doar.
--Nada
disto acontecera – interrompeu Leonardo – eu conversei com um dos donos e ele
me informou que há um projeto enorme sendo instalado e não vão poder modificar,
mas alegam que vão dar emprego para muita gente.
--Vamos
falar com os donos, acho bom ir eu o Leonardo e o Sebastião – finalizou o
maçom.
--Porque
não, vamos sim – concordaram em ir ao dia seguinte a Santa Terezinha, mas o
destino haveria de intervir e traçava outros rumos.
Naquele mesmo dia eu soube pela
esposa de Cavalcante que ele havia adoecido e estava acamado com febre, ele
tivera uma discussão com o cunhado sobre problemas financeiros da loja que o
jovem tomava conta e que estava desviando muita coisa da mesma, inclusive o
dinheiro, mas pouco depois ele chamou a esposa e o cunhado e os perdoou pedindo
que esquecessem tudo e começassem uma vida nova. Maria chorou de alegria vendo
tudo terminar bem entre o marido e o irmão.
--Vou
matar uma leitoa para comemorar a paz que voltou a esta casa - arrematou a
esposa.
Cavalcante já estava muito
fraco, mas dentro daquele jovem um ódio inédito tomava conta. Aproveitando-se
da saída da irmã ele de posse de uma faca peixeira cuja lamina tinha trinta
centímetros, volta ao quarto e sufoca com a mão o velho e desfere um golpe
mortal na garganta e a seguir muito outros que impiedosamente furavam o corpo e
atingiam o colchão.
Cavalcante morreu sem dar um
grito. O cunhado deixa a casa e foge rumo a Santa Terezinha, é a única saída
por terra.
Dado o alarme, todos se
revoltam e procuram o assassino, mas tem-se noticias que teria fugido para
Santa Terezinha, vários motores foram acionados, mas todos entram em pane e
custaram a pô-los em movimento quando chegaram em Santa Terezinha o bandido
tinha se evadido, ninguém soube para aonde.
Eu os vi muitos anos depois e
estavam juntos Maria e seu irmão, soube também que ela fora quem custeara e
promovera pessoalmente a fuga do assassino. Cavalcante fora enterrado. Restava
esquecer.
Dias depois funcionamos o motor
Caterpillar do barco Brigadeiro Aboim e seguimos rumo rio acima, só que desta
vez Maria Villas Boas ia também.
Por volta do meio dia tornamos
a passar pelo barco Frei Chico do Tônico Bosaipo que voltava chapadinho de
mercadorias e gente, era uma visão empolgante escutar o martelar daquele Bolinder
de um cilindro e a alegria dos passageiros acenando as mãos. Neste dia dormimos
em uma ilha em meio ao rio numa praia muito branca e grande, junto ao lago do
Jatobá. Ao nosso lado a aldeia Carajás do Crisostis (Crisóstomos) e chegamos a
Mato Verde antes do almoço, fizemos uma pequena parada e seguimos rumo a São
Félix aonde chegamos às cinco horas da tarde.
Leonardo Villas Boas já meu
bastante amigo aportou com seu barco o Brigadeiro Aboim e, ele e o amigo Enzo,
formalmente me convidaram para ir trabalhar na Fundação Brasil Central em Santa
Izabel do Morro na Ilha do Bananal.
Regressei a Mato Verde que já
se chamava LUCIARA e após acertar com minha esposa resolvi aceitar a oferta,
afinal eu já estava com cinco anos de casado tinha quatro filhos e a vida continuava
muito irregular e ali na FBC eu poderia dar mais conforto a família e assim o
fiz.
Estávamos em 1959 e eu ainda morava em
Luciara
A 22 de setembro de 1959 nasceu em Luciara a
minha filha Enilda, já eram cinco ao todo.
Voltei para o meu serviço na FBC.
Foi por apresentação de
Leonardo, ao então Presidente da FBC o jornalista Jorge Ferreira que era dono
da Revista “O Cruzeiro”.
Comecei a trabalhar na Fundação Brasil
Central - FBC no Centro de Atividades da Ilha do Bananal, meu primeiro serviço
seria na administração. E ali fiquei e, em 09 de outubro de 1960 fui nomeado
encarregado do Posto Bem-vinda.
Naquela época se começou construir
o Hotel JK na Ilha do Bananal uma grande obra do Presidente Juscelino.
O material da construção do
hotel vinha de Goiânia, Brasília e de outros lugares, por caminhões, para o
Porto da Bem-vinda e de lá era transportados em balsas que suportavam até setenta
e duas toneladas para o porto de Santa Izabel.
Depois com entrar o período da
seca mudamos o porto de desembarque para Luiz Alves, mas antes tivemos que
fazer um aterro na estrada até barranca do rio. Assumi o transporte via balsas
que já eram três e voltei a morar em Santa Izabel onde minha família estava e sempre
íamos a Brasília pelos Aviões da FBC que de inicio eram três Douglas C 47.
Havíamos nos mudamos definitivamente para
Santa Izabel do Morro na Ilha do Bananal em 1960 e ali permanecemos por longos
nove anos até 1972, excluindo-se um bom período de licença sem vencimentos,
neste meio tempo fui até fazendeiro na Ilha, eu tinha uma pequena fazenda ás
margens do rio 23 e não mais do umas cento e cinqüenta cabeças de gado. Certa
feita eu havia comprado um bezerro do Raimundo Açougueiro que tinha uma posse
também nas margens do rio 23, mas sua morada era uns quinze quilômetros acima,
fui até lá para receber o bezerro, não encontrei ninguém na casa e tendo que
voltar eu fui dar água ao cavalo e quando cheguei à beira do rio encontrei uma
garrafa flutuando, estava arrolhada e cheia de alguma coisa, tomando-a em
minhas mãos vi que tinha dentro duas buchas de “Paulistinha” (bucha que da em
rama que é um remédio muito forte e usado para curar “mal de escancho”. em
animais, uma dose forte, ou um quarto da bucha ao natural certamente poderá
matar até um elefante) destampei a garrafa e cheirei era preparado com cachaça
pura, resolvi provar e senti um gosto bem amargo, tomei um pequeno trago e
resolvi seguir viajem de volta, fui quando passando por outro posseiro o França
que tinha uma venda resolvi apear e comprar uma garrafa de pinga para preparar
aquela mistura agora só faltava à buchinha o que logo encontrei na cerca ao
sair da venda, apanhei duas delas, pequenas, e esmagando-as com as mão as
coloquei dentro da garrafa que já tinha uma rolha e coloquei dentro de um
embornal que levava na cabeça do areio. Era já por volta do meio dia e eu ia
sempre beirando o rio quando resolvi tomar um gole da mistura e assim o fiz e
despejei uma pequena dose dentro da boca e tentei engolir amargava que só
barbaridade, e não agüentei tomar outro gole, mas fiquei encabulado e resolvi
molhar a boca, destampei e sorvi uma pequeníssima porção, foi o suficiente
quase caio do cavalo, pequei a garrafa e a atirei bem longe não quis mais saber
daquele inferno engarrafado.
Comecei a me sentir mal e a suar, o suor
corria pelo meu rosto e pelo corpo enchendo a botina de água, apeei do cavalo e
entrei na água do rio até o pescoço ficando sós com a cabeça de fora. Mas o
suor não parava de escorrer pelos cabelos e pelo rosto, lavava seguidamente com
muita água, mas de nada adiantava e para meu susto um enorme peixe Tucunaré
passou junto a mim e virou de barriga para cima eu acredito que estava
envenenado. Ai sim eu fiquei preocupado achando que ia morrer também. Faltavam
ainda uma hora de viajem para chegar e minha casa, sai da água, e montando no cavalo
sai em direção a meu rancho, mas o suor continuava mais intenso e tive que
voltar para dentro do rio e assim o fiz por mais algumas vezes até avistar
minha morada, cheguei a casa quase desmaiando cai do cavalo e acordei numa
rede, minha esposa e um monte de gente do meu lado, inclusive o Raimundo
Açougueiro que foi logo perguntando o que acontecera e u relatei tudo
minuciosamente.
--Vige...
Está louco Dankmar? – gaguejou Raimundo – as duas buchinhas a gente tem que
deixar de molho por sessenta dias e depois lavá-las uma dez vezes antes de
colocá-la na pinga, um quarto daquela buchinha mata um cavalo, você não morreu
por causa da água do rio se não fosse por ele nem chegaria aqui, agora vamos de
dar um remédio para cortar o efeito dela.
Foi a vez que quase morri, passei vários dias
na cama, mas me sai bem.
A 06
de novembro daquele ano de 1961 nasceu em Brasília o meu sexto filho Daniel.
Passei a comandar a sede do
Posto da FBC em Santa Izabel do Morro, Leonardo e Enzo estavam sempre ausentes
em viagens a serviço e uma delas seria a ida via rio das Mortes, acima, até
Xavantina para trazer um caminhão pelo rio e nesta eu tive que ir afinal éramos
a elite da FBC na região.
Rio Manso ou Rio das Mortes
Era mês de outubro de 1961, o rio Manso ou rio das
Mortes rio tem sua barra com o rio Araguaia três léguas acima de São Félix. Já
esperávamos as primeiras chuvas do ano o que viria a facilitar a nossa missão
que era trazer um Caminhão GMC 1948 em cima de dois barcos ajoujados de
Xavantina a São Félix do Araguaia, não havia estradas naquele tempo o rio era a
única alternativa, mas para isto teríamos que enfrentar vários travessões de pedras.
Meus colegas de viajem eram o Clarismundo e varias mulheres que queriam uma
carona até Xavantina.
No dia marcado para a viagem
levantei cedo e fui para o barco pronto para partir, Leonardo estava lá de mala
pronta e também o Juvêncio um amigo e grande piloto fluvial.
--Nos vamos também –
afirmou Leonardo – Eu e o Juvêncio.
--Ótimo
e estas mulheres? O barco não tem toldo se chover vão se molhar.
--Elas
estão sabendo – respondeu Juvêncio olhando para Tônica que era sua esposa.
--Vamos
sair às dez horas tenho que providenciar mais comida - terminou Leonardo –
estas mulheres também vão, elas fazem as próprias despesas.
Às dez horas eu já estava
pronto, o Juvêncio não aparecia e as mulheres já tinham embarcado meia hora
depois chegaram os dois e demos inicio a viajem.
Naquele dia fomos dormir muito
longe dentro do rio das Mortes em uma praia muito bonita. À noite conversando
com Juvêncio perguntei:
--Porque
chamam este rio de Rio das Mortes?
Uma triste historia...
“Faz muitos anos, um batelão dos padres, cheio de gente, vinha descendo o rio que estava muito cheio e correndo, o batelão se desgovernou e batendo em um tronco virou jogando os passageiros nas águas turbulentas e cheias de piranhas vermelhas. Vários padres morreram afogados. Duas mulheres e dois homens e um padre se salvaram subindo em arvores”.
“Uma das mulheres estava
grávida e nos dias de dar a luz e seu marido que também havia se salvado
resolve entrar na água e nadar até encontrar terra seca e ir à busca de
socorro, mas foi infeliz porque as piranhas o devoraram bem a vista dos outros
e sua mulher não suportando abortou o menino que caiu na água e também foi
devorado. Outro homem, mais cauteloso, esperou a noite e entrando bem devagar
na água conseguiu sair em busca de ajuda e esta só chegou três dias depois Os
que sobreviveram passaram quatro dias sem comer e dormindo nos galhos das
arvores. Daí a origem do nome “Rio das Mortes” – finalizou.
--É
eu conheci esta mulher – disse uma das viajantes.
--Água não tem cabelo para se
agarrar – completou Clarismundo.
--Temos
uma longa viagem pela frente, eu vou dormir – disse Leonardo.
--Amanhã
passaremos por uma vila chamada Santo Antônio.
Fomos todos dormir.
Capivaras passeavam pela praia
e gritavam ao sentir a nossa presença, peixes pulavam a noite toda, enfim era o
sertão. Só a luz do fogo que denunciava a vida.
Mal clareava o dia já havíamos
partido. Ainda cedo avistamos as casas da vila Santo Antônio, fizemos uma
rápida parada e seguimos viajem rumo ao travessão “Capitariquara”.
No terceiro dia de viajem de
longe escutávamos o ronco das águas no travessão que era um amontoado de pedras
em meio do rio que deixava apenas um canal estreito e violento entre duas
grandes rochas. Eu ia ao piloto do barco e Juvêncio ao meu lado, Clarismundo
cuidava do motor de popa Arquimedes de 12 HP.
--Joga
para o remanso e encoste-se àquela pedra, vamos ter que passar no cabo –
afirmou Juvêncio.
As
águas agora puxavam ao contrario e o barco tomou um rumo violento contra as
pedras, quase me apavorei, dei uma guinada raspando outras pedras, diminui a
velocidade e fui encostando-se à pedra maior que ficava logo abaixo do canal,
ela é quem tumultuava a águas. O barco sobe a proa na pedra e para. As mulheres
rezavam e pediam por todas as virgens santíssimas.
Leonardo havia descido e
amarrado à corda em uma pedra menor.
--Ficou
com medo Dankmar? – perguntou Leonardo.
--Pra
falar a verdade fiquei sim, com muito medo.
--Isto
é bom, é sinal de responsabilidade, vamos passar para aquelas pedras mais acima
e puxar, você funciona o motor e sobe.
--As
mulheres que fiquem quietas – asseverei.
Clarismundo funcionou o motor e
a estas alturas Leonardo e Juvêncio já puxavam o comprido cabo ajudando o barco
a vencer a corredeira. Quando joguei o barco no canal a água entrou pela proa,
o motor disparou ao ser levantado à popa, mas logo a mesma se estabilizou e
ouvi o estalo, mais parecia um tiro de rifle 44, o leme se quebrou sobrando só
o cabo que estava segurando e rodou rio abaixo, só restava o leme do motor, com
o estrondo as mulheres gritaram apavoradas. As duas enormes pedras formavam
aquele canal violento, mas as forças concentrada das águas o trazia de volta ao
leito. O motor foi acelerado ao máximo e agora agarrado apenas no timão tentava
equilibrar e manter o rumo.
Nunca na minha vida ouvi tanto nome
de santo:
--Valha-me
Nossa Senhora do Bom Parto.
--Nos
acuda mãe Santíssima.
--Nossa
Santa Luzia da Fumaça nos proteja e assim por diante.
Entre as lamurias e o tumulto
das águas a força de vontade vencia e o barco subia polegada por polegada, mas
subia.
Não demorou muito começávamos a
sair daquele corredor da morte e o travessão Capitariquara, começava a ser
vencido.
De súbito entramos em um
remanso superior que nos impulsionou para um lado, quase em cima de outra
pedra, mas a etapa pior já havia vencido. Finalmente conseguimos ultrapassar e
o motor pode ser reduzido e encostamos o barco em uma praia junto da ressaca.
Mal paramos as mulheres se atiraram barco o fora e tremiam não por estarem
molhadas, mas de susto. Leonardo começou a rir dizendo:
--Esta
foi boa tomara que seja a última.
--Ainda
temos o travessão dos Macacos, mas ele é bem mais fácil - confirmou
Clarismundo.
--Para
mim chega – gritou Tônica a mulher de Juvêncio – o resto da viajem eu vou a pé.
– seu marido a repreendeu com um olhar severo.
Fizemos um rápido almoço cuja
especialidade do dia era carne assada com farinha de puba e rapadura. Naquele
dia pousamos em uma praia um pouco acima e ao clarear já estávamos viajando.
Passamos bem pelo travessão e chegamos à noite em Xavantina. Foram cinco dias
de viajem
Leonardo como velho servidor da
Fundação Brasil Central e era tido como um dos sertanistas mais atuante me
apresentou a seus irmãos Orlando e Cláudio.
Tiramos aquele dia de folga e aproveitamos para tomarmos umas biritas e apreciamos o belíssimo GMC 1948 que deveríamos levar para São Félix. A maioria dos moradores daquela região nunca tinha visto antes um caminhão ou outro veiculo de roda, movido a motor. Ia ser um Deus nos acuda.
Cinco dias depois já havíamos
preparado o ajoujo atrelando dois barcos, um distante do outro aproximadamente
em dois e meio metros.
Colocamos o caminhão em cima.
Era uma verdadeira arapuca, mas estava feito. No outro dia cedo desceríamos o
rio rumo a nossa origem, São Felix do Araguaia.
Para nossa sorte o rio tinha
enchido bastante e os travessões se alisaram somente uma ponta de pedra ficou
de fora no travessão do Capitariquara, passamos entre ela, jogamos os dois barcos
na corredeira e a ponta de pedra deslizou pelo meio, foi um susto danado, pois
a corredeira era violenta, mas saímos ilesos e com o caminhão firme em
cima.
Com quatro dias de viajem chegávamos
a São Felix por volta do meio dia.
Foi uma parada, uma loucura o povo
todo na beira do rio esperando tirarmos o caminhão preparamos duas grandes
pranchas e o motorista improvisado que era o Clarismundo se arrancou de dentro
do barco, quando o pessoal viu o caminhão avançar correram de perto e o chofer
pensando que as pranchas estavam caindo se arrancou com fogo no rabo jogando
tudo para traz, mas saiu ileso. Finalmente a fera GMC 1948 estava roncando em
terra firme e virgem, pois até então era o primeiro veiculo de pneu a pisar por
aquelas bandas, a não ser, é claro, as bicicletas.
Foi um dia de festa, muita
festa e passeio de caminhão e de muita pergunta.
Mas muita coisa estava por acontecer...
Era época de eleição e eu fui a
Luciara com o caminhão para ajudar no transporte de eleitores, mas o pior era
que ao chegar em uma tapera naquele mundo de campos e varjões muito grande eu
buzinava na frente da casa, mas os moradores saiam correndo pelo fundo até que
um criasse coragem e chegasse perto do caminhão depois iam se familiarizando
com o veiculo e se atreviam a subir na carroceria do mesmo o pior era que as
famílias queriam ir todas e a dificuldade era colocar os meninos na carroceria,
era um Deus nos acuda, a bichada esperneava e gritava, mas acabava entrando e
depois de juntar um bocado de gente eu ia para a cidade para despejá-los em
frente ao grupo escolar aonde se realizavam as votações, mas ninguém queria
descer e pediam para dar mais uma voltinha. Foi duro convencer aquela gente.
Era um mundo diferente que chegava sobre rodas e motor de fogo como
diziam os índios “beureotu”. (Fogo).
Parque Nacional do Xingu.
Durante o período de permanência na FBC eu tive que trabalhar uns tempos no posto Diauarun na margem do rio Xingu, foram quatro meses em substituição ao Cláudio Vilas Boas que teve que ir para São Paulo tratar da saúde, e seguidamente fomos convocados eu e Valentin para passarmos uma temporada no alto Tatuari.com a finalidade de construirmos um Posto que tivesse o nome Posto Leonardo Villas Boas dedicado ao meu especial amigo.
Era um posto no Parque Nacional
do Xingu que operava junto com a Fundação Brasil Central e era composto por
varias tribos que moravam no mesmo espaço físico, cada um em seu lugar. Mas
sempre se entrosando, e não eram hostis entre eles: Kuikuros, Kalapalo,
Nafukuá, Matipú, Meináku, Aweti, Waurã, Iawalapiti, Kamaiurá, Trumai, Suia,
Juruna, Txikão, Kayabi, Metoktire, Menragnonti, e Kreen-Akôre, e, o único
“tori” ou “karaiba” entre aquele monte de gente pelada era eu, foi uma
experiência inesquecível começando pelos nossos cozinheiros.
O cozinheiro, ou os cozinheiros
que uma hora era um Kayabi e o outro um Kalapalo, eram uma farra, trabalhavam
na cozinha e no fogão completamente nu e, eu lhes dei um calção para vestirem o
que fizeram rindo, horas mais tarde eu fui a é a cozinha e lá estava um deles
com o calção nas costas:
--Pionin,
já que quer ser o cozinheiro tem que usar o calção.
--Ele faz muita cócega, agora eu
vou lava panela lá no rio.
E lá se foi ele com uma bruta
panela com quase dois dedos de arroz pregado no fundo, ele enfiou a panela
dentro da água, esfregou a mão dentro e sacudiu tudo e voltou para a cozinha,
bem, pelo menos um dedo do arroz havia saído, neste momento ouvimos um
estampido de arma de fogo vindo de longe.
--È
índio brabo que vem para cá, é o Raoni.
--Chucarramãe,
mas ele é assim mesmo quando Orlando ou o Cláudio estão aqui ele faz isto pra
amedrontá-los, mas eles não ligam e só dão coisas que ele precisa.
Não demorou muito tempo o tal
Raoni entrou na aldeia e trazia nas costas um veado morto com a barriga inchada
a ponto de estourar e jogando a meus pés foi dizendo:
--Raoni, eu, - mostrando-se - trouxe pra você comê, eu qué muita coisa, eu qué bala, cartucho, facão, roupa, pano e sal.
--Vamos
ver o que eu posso arrumar para você.
--Eu
índio brabo quando qué, qué mesmo.
--Eu tori brabo muito, só dou o que
quero dar.
Lá se fomos nós e eu arranjei para ele uns
vinte cartuchos calibre dose, um facão, umas duas camisetas dois calções e uns
panos, era pouca coisa tendo em vista o que existia estocado naquele galpão,
Orlando era prevenido. O índio simplesmente sumiu, ninguém viu quando ele saiu
e nem por onde, deixando uma impressão de que estava escondido, mas era assim
que sempre agiam e sabíamos que ele já deveria estar bem longe.
Foi ali que vi um papagaio
completamente dourado, bem amarelado, e falando com Pionin ele me explicou que
era porque ele colocava banha de peixe Pirara na comida do papagaio, de fato a
cor do pássaro era a mesma cor da banha daquele peixe.
As índias tanto novas com
velhas andavam todas nuas e nem estavam ai por causa disto, de uma coisa eles
gostava era de tomar injeção, quando uma aparecia aparentemente gripada vinham
sempre umas cinco ou seis moças com ela, todas exigiam ser picadas e depois
saiam rindo a valer.
Devo ainda catalogar as espécies
segundo meu entendimento duas nações que se sobressaíram avantajosamente demonstrando
aprendizado expressivo no aspecto cultural.
Eram estes:
Os índios da Tribo Trumains e
os Jurunas.
As índias Trumains
eram possuidoras de um alto senso de assimilação e adaptação, pude chegar a
esta conclusão quando tendo tirado oito maquinas de costuras manuais do
deposito de Orlando comecei a organizá-las e elas, ali estavam observando cada
movimento e cochichando entre si, quando uma das maquinas ficou pronta me
dispus a escolher uma daquelas mulheres e convidei para costurar um pedaço de
pano que já estava no ponto preparado restava apenas acionar a maquina.
E assim o fizemos, a
coloquei na cadeira, ensinei-a a movimentar a maquina com o pé e a segurar o
pano que ia sendo costurado, e tive que trabalhar a tarde toda ensinando as
outras mulheres. Para meu espanto no outro dia lá estavam elas com pedaços de
panos e dentro de uma semana já eram costureiras.
Os índios Jurunas, tanto os homens como as mulheres tinham o cabelo em forma
de um V invertido, em suas testas um artefato em forma de uma pequena roda
vermelha recheada de cor púrpura idêntico ao sol, lembravam os Incas, os Maias,
ou os Astecas, eram taciturnos, prestimosos, mas de pouca conversa. Notava-se
neles o mesmo poder de assimilação dos Trumains.
Suas medidas antropométricas
avaliadas a vista tinham todas as características do povo andino, muito
diferente de nossos índios de origem tupis-guaranis ou grupos isolados.
Posto
“Leonardo Villas Boas”.
No alto Kuluene, dentro do Parque Nacional do Xingu, ás margens do rio Tatuari, está localizado uma "grande aldeia dos índios Kamaiurá" junto à lagoa do mesmo nome.
Sariroa e Canato eram, então, os Caciques e os Grandes pajés, uma dupla de fazer inveja.
A Beleza das índias Xinguanas.
Por solicitação oficial de Orlando Villas Boas, eu fui junto com o velho amigo Negro Valentim montar um posto avançado, dentro do Parque Nacional do Xingu, ali na aldeia Kamaiurá que passou a se chamar: Posto Leonardo Villas Boas.
Eu havia estado no Posto
Diauarun substituindo temporariamente o Cláudio Villas Boas que fora para São
Paulo tratar da saúde e assim que retornou atendi ao pedido do Orlando e de lá
segui direto para Alto Tatuari, ou melhor, para a aldeia Kamaiurá.
O rio Tatuari era de uma água
límpida de fazer inveja a qualquer cristal, podiam-se ver os enormes cardumes
se arrastando vagarosamente, e também a abundância de poraquês (peixes elétricos),
em torno à aldeia á mata do Xingu nos advertia de sua maculidade e do lado
norte havíamos reconstruído e melhorado uma pista para pouso de aviões fora
disto só às saídas espirituais.
O Tenente Haroldo da FAB fazia
seus vôos quinzenais em seu NA (North Americam) para inspecionar o
abastecimento de gasolina naquela região, era um habilidoso piloto e, em uma
desta suas viagens sua esposa Lídia veio para passar alguns tempos no Posto.
Eu e Valentim pusemos a mão à
obra e fomos instalando tudo que se fazia necessário, encanamentos, rede
elétrica do motor de luz, material que era ali deixado pelo Avião Búfalo da
FAB. Fiz um velho trator à gasolina de dois pistões e que ainda usava magneto,
e que parecia ter vindo de muitos séculos atrás, funcionar, cuspiu carvão e
sujeira por todos os lados logo o apelidamos de Cadilac, foi mais uma mão na
roda, e por falar em rodas as dele eram de ferro com pontas de tração.
Foram dois meses que passamos
dentro daquela enorme aldeia indígena, aonde tudo era paz e tranqüilidade, mas
exigia habilidade para se viver harmoniosamente entre eles, era preciso
aprender e a respeitar seus costumes, pois eram extremamente sensíveis, mas
quando se entrosava em seu meio social nada mais faltava, eram muito amorosos,
mas muito radicais, e, a minha família também estava por radicalizar com a
minha demorada ausência, enquanto isso só curtia as belezas do rio Araguaia em
São Felix ou Santa Isabel, mas a patroa estava uma pilha de nervosa e logo mais
vocês vão saber por quê...
A comida preferida dos índios
Kamaiurá eram os peixes e os beijus (feito de massa de mandioca) que eram
assados em cima de uma pedra grande sustentada sobre um tripé de pequenas
pedras e o fogo era posto embaixo, quando a pedra esquentava assava-se muitos
beijus. Os peixes eram cosidos em panelas de barro e depois com as mãos tiravam
toda espinha transformando a carne em uma pasta que depois era colocada
esparramada em cima dos beijus e a seguir o enrolavam e finalmente o amarravam
com um tira de buriti, e assim eram distribuídos.
Todos ali andavam nus e as
jovens, igualmente ás do Posto Diauarun, gostavam de tomar injeção, era uma
loucura, tanta gente pelada, e nós os Caraíbas (Homem branco) éramos motivo de
muita curiosidade especialmente das mulheres jovens, algumas muito bonitas.
Banhávamos na lagoa ou no rio Tatuari todos juntos e as mocinhas se comportavam
completamente descontraídas e muito chegadas a inocentes brincadeiras que
esquentavam os ânimos de qualquer ser vivente Nos primeiros dias, embora tivéssemos
uma cozinha para nos, sempre eles nos agradavam com alguns “enroladinhos” e eu
sempre os aceitava e agradecia e levava-os para a nossa cozinha e ali, dava
sumiço neles, isto nos primeiros dias, depois fui me acostumando que já chegava
a andar atrás pedindo e isto os agradava muito, o mesmo não acontecia com a esposa
do Capitão Haroldo, que um dia, enquanto eu aceitava uns “enroladinhos” ele se
negou a receber dizendo que “não dou conta de comer”, foi o suficiente para
começarem a marcá-la.
Numa noite estrelada de julho
me juntei a algumas dezenas de índios ao pé de uma grande fogueira, eram noites
de “Pajelança” e os pajés Canato e Sariroa estavam a postos fumando seus
cigarros ou charutos de folha de cafezinho e como não eram de boa combustão
segurava em suas mãos um tição sempre acesso, e puxava uma grande tragada e já
estava bem “tomado”, Canato balançava o corpo, não demorou muito o índio deu um
grito que acordou a mata toda e disparou em uma vertiginosa carreira mata
adentro. Algum tempo depois pudemos ouvir os seus gritos muito dentro da mata
rumo rio acima, depois ainda correndo passou pela cabeceira da pista e deu
outro grito e sumiu mata adentro rumo rio abaixo sempre gritando. Duas horas
depois de ter corrido ele volta á aldeia ofegando acentuadamente indo cair
junto à fogueira quando foi segurado pelo seu companheiro Sariroa que ficara a
sua espera, seguidamente começaram a dialogar no qual o pajé contava que andara
por mundos distantes e estivera com índios que morreram, e estes mandavam
recados para seus familiares e falavam sobre as doenças e as curas que poderiam
fazer, e num súbito repente, ainda sentado no chão, ele se virou para a Lídia,
que estava bem ao seu lado, agarrou sofregamente pela cintura e encostou sua
cabeça na altura do estômago da mulher e numa mistura de grumexe e mordida
cuspiu sobre a mão uma masca de capim que estava em sua boca e disse olhando
para a jovem espantada:
--Aqui
não é bom para você comida de índio faz mal, é bom ir embora, olha -disse
mostrado em sua mão a masca de capim - olha o que eu tirei de dentro de você.
Saímos de junto da fogueira e
meio afastados comentei:
--Foi
por causa daquele “enroladinho” que você não aceitou.
--Sim,
foi isto mesmo, mas de qualquer forma o Haroldo só vem daqui a oito dias, eu já
estava ficando cansada desta vida aqui, e você quando vai voltar?
--Dentro
de um mês no máximo, já esta fazendo muito tempo que estou fora de casa, mas
amanhã eu vou falar no radio com Santa Isabel e avisarei Leonardo que já
estamos terminando os serviços e se deverei voltar para o Posto Diauarun ou
para São Felix do Araguaia onde minha esposa e filhos me aguardavam.
O radio movido à bateria
funcionou, ela ainda tinha uma boa carga, quando chamei Santa Izabel no radio
da FBC minha esposa estava presente e eu não sabia, a primeira a falar foi a
Lídia mulher do Tenente Haroldo:
--Por
favor, passem uma mensagem para o Haroldo vir me buscar aqui no Posto, eu
preciso voltar para casa, digam a ele que estou bem, e que aqui tem um alemão
que me trata com muita gentileza.
Eu falei solicitando
autorização para voltar também, foi quando me interromperam:
--Dona
Maria está aqui e quer lhe falar, vou passar o microfone para ela.
--Alo
Dankmar parece que a coisa ai esta muito boa para o teu lado você sempre foi um
“Alemão muito gentil”, mas lembre-se de voltar depois nos conversaremos
pessoalmente.
A Lídia quase morre de rir,
mas ficou tudo bem, só não muito bom, pois a patroa estava com a espingarda
carregada me esperando. Já vinha amanhecendo o dia foi descansar um pouco, mas
não demorou nada Valentim me chamava:
--Acorda paulista, veja se funciona o Cadillac
para carregarmos umas pedras.
Dois meses depois havíamos terminado
nossos serviços, fizemos a casa do Posto, um ambulatório e uma casa tipo
barracão para agasalhar os chegantes e inclusive melhoramos a cozinha.
Eu peguei uma carona com o
Tenente Haroldo no NA, era um avião militar para duas pessoas, o piloto e o
mecânico, mas como não tinha eu fui em seu lugar. Passamos pelo Posto Pimentel
Barbosa dos Índios Xavantes, na margem do rio das Mortes onde Ismael Leitão e a
sua esposa Dona Sara Leitão eram os encarregados, duas pessoas maravilhosas, de
lá seguimos para Santa Isabel, naquela mesma tarde eu estava em minha casa em
ainda meio tonto, com tanta pirueta, subidas e descidas e todo ralado de tanto
me segurar na ferragem apertada do banco de traz.
Valentim havia
seguido em outro avião para Santa Isabel e de lá seguiu viagem de barco até sua
casa na barra do rio Tapirapés eram apenas 35 léguas, mas nestes dias que
passamos juntos, quase seis meses pude gravar muitas de suas histórias e
lendas, o velho negro era de uma subtilidade incrível, os verbos saiam espontaneamente
e as sequências se alinhavam e as histórias iam chegando, embora tenha perdido
muitos detalhes um dia tentarei recompô-las em outro livro.
O meu grande inesquecível amigo
Valentim e sua esposa foram aposentados, velhos e cansados, se mudaram para
Goiânia. Eu o visitei, num casebre muito pobre vivendo miseravelmente com um
pequeno salário para sustentar a sua esposa e dileta companheira de tantos anos
de lutas e sacrifícios, que estava magra, e paralítica em uma cama morrendo a
míngua, e ele ao seu lado olhava e chorava, simplesmente chorava como uma
criança, meu coração se entristeceu era a paga dos homens para dois heróis que
dedicaram suas vidas aos índios e aos seus semelhantes. Aos seus então chefes,
se ainda estiverem vivos e chegarem a ler este livro, eu dedico uma leitura
bíblica “Mateus 23 de 1o em diante”. Pois tenho certeza que eles
estão muito bem no posto que agora ocupam. Que Deus os guarde. “E a Grande
Águia voou das nuvens, desceu a terra, lutou pela sua amada e um dia voltarão
juntos para os verdes campos na Grande Caminhada. Ainda hoje pode se ver voando
muito alto, em uma enorme planície, na Austrália, por dezenas de quilômetros, o
desenho de uma grande águia com suas asas abertas
”Boa caminhada meu amigo e minha
amiga, vão com Kananchue”.
.
Anos de 1962
Voltei para casa e para as atividades
da FBC.
Eu morava em uma casa junto ao Alvoradinha aonde o Presidente Jango e sua família se hospedavam quase toda semana, Ele vinha de Brasília na sexta Feira com sua esposa Maria Tereza e seus filho e o negrinho Avelar de tiracolo. Só voltava na segunda feira de manhã e isto se repetia pelo menos uma a duas vezes todo mês. Neste ínterim saiamos para pescar e caçar e nas horas vagas cozinhávamos macarrão. Conforme narraremos mais adiante.
Eu já tinha criado uma profunda
amizade e respeito com aquele homem simples e bom.
Naquela casa junto ao
Alvoradinha passamos por noites incríveis, pois acreditem que todas as noites
durante muito tempo uma alma ou coisa parecida nos visitava, andava pela casa
toda arrastando seu chinelo, vinha e ia por todos os cômodos e arrastava cadeiras
na sala, batia porta, abria as torneiras na cozinha, mexia com os pratos e
panelas. E lá se vinha ela de novo e parava bem na porta do meu quarto como se
estivesse a nos olhar.
Minha patroa e eu já estávamos
acostumadas com aqueles passeios noturnos e muitas vezes eu levantei de
lanterna em punho, pois a luz era de motor gerador eu desligava cedo da noite,
mas nunca encontrei nada mexido, voltava e me deitava e lá se vinha de novo,
Dormíamos tranqüilos e os meninos nunca se manifestaram a este respeito não sei
se por medo ou desinteresse.
&
Foi quando aconteceu o acidente em Brasília.
Era junho de
1962...
Maria tinha ido para Brasília para tratar da saúde de nosso filho Daniel que estava com anemia profunda levou a minha filha Ruth que estava com sete anos de idade, depois foram as minhas filha Miriam e Enilda, ela ficara hospedada em casa de um amigo Silvio Rodrigues Maia que tinha um apartamento em um conjunto da W3 Sul.
Na noite do acidente eu estava dirigindo
um caminhão da FBC e ia com meu filho Aleixo de companhia, nos dirigíamos a uma
fazendinha que eu tinha na margem do rio 23, lá pelas sete a oito horas da
noite, já na metade do caminho, fui acometido por uma premonição, se é que se
pode chamar isto deste nome, algo me avisava que havia ocorrido um acidente
grave com minha família em Brasília, frei bruscamente o caminhão que derrapou
no capim molhado do varjão a que meu filho atarantado perguntou:
--O que foi pai?
--Vamos
voltar, aconteceu alguma coisa com sua mãe lá em Brasília, eu tive um aviso.
Voltamos para nossa casa no
Posto e mal passei a noite esperando o dia clarear para ir ao posto da FAB para
usar o radio e falar com Brasília.
Assim que amanheceu
eu saia de minha casa para ir até a FAB quando avistei o Jipe do Sub Oficial
Tabagira que vinha em meu rumo e quando ele se aproximou, desceu do Jipe e foi
me dizendo:
--Dankmar,
eu tenho noticias para você.
--Quem
aconteceu lá em Brasília? Foi minha esposa? ---
--Alguém
morreu?
--Como
é que você sabe? Acabei de receber o radio não faz cinco minutos?
--Fale
logo o que aconteceu?
--Sua
filha Ruth foi atropelada ontem à noite e esta internada em estado do grave,
mas o Presidente já mandou um avião vir te buscar, está para chegar, se arrume
logo.
Uma hora depois eu já estava
voando para Brasília e o piloto, Chico Doido, meu amigo lamentava o acontecido.
Do aeroporto fui direto para o
Hospital Distrital
Quando cheguei ao apartamento
em que minha filha estava internada fui encontrando logo a minha esposa, mas
fui direto para a cama, eu queria ver minha filha. Ela estava deitada, imóvel,
e com tubos enfiados na boca e nas narinas, fiquei profundamente abalado.
--Como
esta ela? Perguntei a minha esposa.
--Esta
em coma.
--Como aconteceu?
Após ter me narrado todos os
fatos ainda tentando me manter equilibrado, ela afirmou.
--Dankmar,
o Presidente Jango Goulart ficou sabendo do acidente ontem à noite e veio
pessoalmente aqui no Hospital, viu a Ruth e recomendou o tratamento da nossa
filha e me disse que ia mandar te buscar na ilha e que não nos preocupasse com
outras coisas que ele providenciaria tudo e pediu para você falar com ele e que
o Chico Doido entraria em contato contigo. Mas ao sair do Hospital foi multado
por um guarda por ter encostado o carro no estacionamento para ambulâncias,
quando o guarda o reconheceu deu uma titubeada, mas o Presidente lhe falou:
--Muito
correto, me de a multa que eu a vou pagar, obrigado senhor guarda – deu partida
e se arrancou deixando o guarda sem fala.
Silvio Maia nos deu toda a assistência
pessoal possível e nunca me faltou nada até casa me foi arrumada com mobílias e
tudo mais e eu fui convidado para ficar trabalhando temporariamente na sede da
FBC, ali em Brasília, aonde eu tinha
muitos amigos.
Um dia, enquanto eu estava no
hospital olhando minha filha me lembrei que ela sempre me pedia “Pai largue de
fumar” e então fiz uma promessa diretamente com Deus.
--“De
vida a minha filha e eu nunca mais fumarei”– e dizendo isto dei ao Silvio Maia,
ali presente, duas carteiras de cigarros que eu carregava nos bolsos, eu estava
tão viciado que fumava até três carteiras por dia, daquela hora em diante, ate
hoje, quarenta e sete anos depois nunca mais fumei.
Foi uma longa e árdua luta, já
estava com quarenta dias em coma quando uma surpresa modificou a nossa vida. O
Doutor Antunes que era um médico ortopedista estava à beira da cama, sentado em
uma cadeira e comendo um bolo, quando a menina abriu os olhos, viu o médico e o
bolo avançou e tomou o bolo da mão do medico que entre estarrecido e surpreso
não reagiu e ela levou o bolo à boca de uma vez e começou a se engasgar tamanha
era fome, mas uma equipe veio em socorro e a arrancou o bolo aos pedaços de
dentro da boca e garganta.
Daí para frente ela foi
melhorando progressivamente e eu cada vez mais apurado em relação aos pedidos
que muita gente fazia lá dentro do
Hospital Distrital de Brasília:
--O
Presidente é muito ligado ao senhor e poderia me fazer um favor veja se
consegue com ele uma casa popular para minha família, estamos morando em um
casebre e muito mal. E assim por diante eram muitos os pedidos e eu levando
todo mundo com jeito afinal estava precisando deles que davam toda assistência
a minha filha, mas consegui muitas coisas para eles com o Presidente.
Durante sua convalescença dois
fatos foram muito relevantes na vida daquela menina o primeiro foi sobre sua
perna quebrada em que o médico ortopedista Dr. Antunes me informou:
--Vou
ter que operar a perna quebrada para que os ossos se emendem mais rapidamente,
mas vou cortar um pedaço do fêmur e esta perna direita vai ficar mais curta uns
dez centímetros que a outra, acontece que a perna esquerda está com paralisia e
vai demorar a se desenvolver e isto compensara a perna direita que dentro de
algum tempo estarão iguais. E assim aconteceu. O segundo foi quando decidiram
fazer uma operação na cabeça para remover um pequeno coagulo. No dia marcado
para a operação eu estava lá de prontidão. Cheguei ás cinco horas da tarde e a
operação deveria se realizar às sete horas daquela mesma tarde. O tempo passava
e já era ali pelas oito horas da noite quando o Dr. Veloso me procurou na sala
e me falou:
--Não
vamos mais operar a sua filha, não há necessidade ela vai se recuperar sozinha.
--Por
qual razão?
--Hoje
aconteceu um fato inédito na historia deste hospital, nos estávamos preparando
a sua filha para operar e aguardávamos o anestesista quando a luz se apagou e o
motor do plantão do hospital demorou a funcionar, neste meio tempo estávamos
parados nos os cirurgiões e o anestesista, até que a luz começou a se
restabelecer quando uma mosca vinda não se sabe de onde, posou bem na testa da
menina que levantou a mão do lado até então paralisado e espantou a mosca, nos
todos testemunhamos esta reação e chegamos à conclusão que a paciente reagira
espontaneamente. Não justificaria mais uma operação se é que o senhor quer
chamar isto de milagre pode chamar, amanhã mesmo daremos alta para ela pode
levá-la para sua casa que é sem duvidas sempre o melhor lugar para se recuperar
um doente, ela estará melhor com a família e qualquer alteração me ligue.
E assim fizemos nos mudamos
para um apartamento na W3 Norte e depois para Taguatinga aonde permanecemos por
seis meses. Nossa filha já estava bastante recuperada. Teve que aprender tudo
de novo desde caminhar.
Seis meses depois fui à granja
do Torto e falei com o Dr. Jango que autorizou a minha volta e mandou um avião
nos levar.
Fiquei muito grato com o Presidente.
Na ilha voltei a minha
atividade, mas o mundo lá fora esquentava e a política se tornava incerta,
falavam em extinguir a Fundação Brasil Central.
Voltando a minha fazendinha
cuja viagem fora interrompida no dia do acidente.
Fomos todos da família passar
um fim de semana, saímos na sexta de manhã ficaríamos sexta, sábado e domingo e
na segunda cedo retornaríamos.
Eu era um exímio pescador de
arco e flecha, já tinha aprendido e fabricava artesanalmente o arco e as
flechas.
Tanto o ribeirão 23 como o
ribeirão 24 eram ricos em peixe e patos selvagens que freqüentavam as águas as
centenas deles podia se ver em alguns pontos do rio cuja água era quase parada,
nos grandes poções, dezenas e dezenas deles banhando, era um mundo animal rico
e livre, ali a natureza prevalecia, peixes podia se ver as dezenas deles, os
tucunarés são peixes da superfície e passavam ostensivamente a frente da gente,
ali quase que se podia aplicar a mentira mais gostosa que ouvi sobre pescadores
“Meu lugar é tão bom para pescar que para se colocar minhoca no anzol tem que
se virar de costas para o rio.” No sábado bem cedo, mal o sol apontara eu fui
chamei a patroa e a convidei para irmos a um lugar beira rio matar uns patos,
eu tinha feito uma chocha de palha para me esconder, assim ficava mais
emocionante e só levei um revolver TA 22 com seis balas. Quando chegamos à
chocha nos agasalhamos dentro e endireitamos as palhas para não sermos notados
pelos patos e, não demorou muito tempo uma patinha veio assentou-se na junto da
água e começou a banhar, apontei a arma cautelosamente e atirei, ela continuou
batendo as asas, foi quando rindo Maria disse:
--Errou
o tiro.
--Errei
nada – e sai da chocha e fui até a patinha que estava acabando de morrer,
coloquei ela de asa bem aberta e uma forquilha levantando a sua cabeça e voltei
para a chocha.
Poucos minutos depois veio um
pato grande pousou junto da outra, tornei a mirar e atirei, ficou quieto no
lugar antes de acabar de se mexer já sentava mais uns oito patos todos grandes
e eu atirei novamente e matei o terceiro, foi quando minha patroa interveio:
--Já
chega três patos já são o suficiente para estes dias que vamos ficar aqui,
vamos embora.
Ela era assim mesmo, não
gostava que se matasse nada para desperdiçar exigia que o necessário fosse o
suficiente, ai dos meninos se ela os pegasse com um estilingue na mão.
Ela havia feito uma garrafada
de umas raízes que ela conhecia, dizia que era boa para limpar o sangue, se era
eu não sei, mas que era gostosa isto era, parecia vinho e eu um dia depois estava
sozinho lá na chácara a tomei ela todinha seguidamente. Enquanto ela preparava
um pato eu resolvi pescar uns peixes de flecha, eu não perdi uma flechada
facilmente e assim fui para a beira rio flechar alguns tucunarés para a janta,
o rio estava bem cheio a as águas invadiam os varjões e bem na frente de minha
casa havia uma grande extensão de água límpida própria para flechar, entrei na
água ate os joelhos e logo avistei um belíssimo exemplar de tucunaré, apontei e
flechei-o, o peixe era grande se sacudiu muito e a flecha se soltou, usei outra
e flechei novamente enquanto a segunda e ultimas das flechas que eu tinha
jogado estava aboiando e indo vagarosamente água abaixo, pedi a meu filho que
estava um tanto afastado de mim:
--Paulo,
pegue a flecha e jogue-a para mim.
Foi quando senti a flecha me
atingir na curva do joelho por traz, não suportei a dor e cai de joelhos, mas
ela não entrou na carne apenas furou a pele, menos mal, mas para mim a pescaria
estava encerrada, também pudera um peixe grande foi flechado era um belíssimo
tucunaré que depois de assado deu para todo mundo se satisfazer, não que meus
filhos não quisessem pescar outros de anzol, mas havia o impedimento da dona
Maria que não gostava de exagero. Dias depois matei um pato selvagem com
belíssimo tiro ao vôo, eles passavam grandes bandos voando por cima de nós, mas
usei uma espingarda calibre doze. O que mais eu admirava era a destreza de
minha esposa para tirar leite, mal o dia raiava e ela já estava no curral e
conversando com as vacas, chamava cada uma pelo nome e assim também os bezerros
ouviam-se apenas o remoer das vacas, era um silencio absoluto, mas quando eu ou
outra pessoa chegava perto às vacas se agitavam e escondiam o leite, e ela Maria
mandava a gente cair fora, mas os meninos ela chamava e enchia os copos de
leite com espuma tirado quentinho e misturado com um pouco de farinha de puba e
a guisa de colher usavam folhas de caju que davam um sabor todo especial ao
leite, e as vacas continuavam calmas, parece que elas não gostavam muito de
mim. Ela era uma laçadora de primeira
linha, dificilmente errava uma laçada, mas ela preferia chegar perto das vacas
e dos bezerros conversando e colocava a corda na cabeça.
No domingo matamos um bode novo
para levarmos carne para nossa casa em Santa Izabel e Maria fez uma “Buchada”
que deu o que falar nunca mais alguém degustou uma comida boa igual aquela até
hoje. (sinto muita saudade dos bons pratos que ela sabia fazer).
Voltamos para Santa Izabel na segunda
feira cedo, outros problemas me fizeram perder noites de sono:
Naquele tempo nós estávamos
fazendo muito serviço na Fundação e eu tinha montado uma olaria que trabalhavam
cerca de trinta homens, e um deles ficou doente com malaria e eu mandei
interná-lo. O nosso hospital funcionava só com duas enfermeiras e umas
auxiliares, o médico vinha a cada quinze dias de Brasília nos vôos regulares
dos aviões Douglas da FBC. O estoque de medicamento era pouco, mas o
necessário.
Na tarde de segunda feira eu
fui ao hospital visitá-lo e o enfermo estava vestido com um pijama branco que
usávamos pra os internados, estava de cama dormindo.
Na terça feira cedo eu passei
por ele que estava encostado na porta do hospital recebendo um pouco de sol,
ele me acenou com a mão e eu respondi.
Naquela mesma tarde por volta das 14.00 horas a enfermeira foi até o
escritório de a FBC falar comigo:
--Seu Dankmar, o senhor porventura
pode me dizer para onde foi o Paulo José?
--Paulo
José? Quem é este?
--E
o rapaz que estava internado no hospital ele sumiu de lá depois do almoço e não
conseguimos achá-lo e ninguém sabe para onde se foi, o pessoal do hospital
ficou muito apreensivo já deram várias buscas ao redor e ninguém o viu sair,
simplesmente desapareceu.
Mobilizei quase todos os
funcionários disponíveis e os índios Carajás que se dispusera a ajudar
procurá-lo. Foram uns dois dias de buscas e não encontramos nem um rastro dele
e ninguém o viu e não se tinha uma idéia do que teria acontecido simplesmente
se evaporou.
Nunca tivemos noticias dele, a
mala do desaparecido foi levada por um parente. Nunca entendi como uma pessoa
pode simplesmente ao meio do dia desaparecer sem deixar o menor vestígio.
Naquela semana, na sexta feira
cedo, pelas 10.00 horas, o Presidente Jango chegou com sua família, ele, a
esposa, dois filhos e o Avelar que era um negrinho da confiança dele.
Hospedaram-se na casa do Alvoradinha ali junto do Hotel JK.
No dia seguinte saímos para ir
pescar como sempre o fazíamos, fomos eu, o Presidente e o negro Antonio um
primo não sei de que distancia da minha patroa, deve ser destes que o pai de
ambos trabalhava junto na roça espantando periquito, bastava isto para se
tornarem parentes íntimos, e o Antonio não seria a exceção da regra e
trabalhava comigo na FBC, era um grande pescador.
Quando chegamos à beira do rio 23
depois termos iniciado a pescaria, o Antonio se virando para o Presidente
falou:
--Presidente
o Senhor podia fazer uma coisa para me ajudar.
--O que posso fazer Antonio?
--O
José Dedinho, aquele motorista que o senhor já conhece ele trabalhava na balsa,
a prancha cortou um pedaço do dedo dele e o promoveram de nível 8 foi
para o nível 10 o Senhor não podia também melhorar o meu nível que ainda
é oito?
--Posso
sim, basta você cortar um dedo na prancha e eu o promovo.
--Não
deixa ficar como está – foi resposta desiludida do negro Antonio.
No domingo fomos caçar e na
volta para a casa o Presidente matou um veado, que foi fotografado pelo
Repórter Jader Neves da Revista “O Cruzeiro” e o Presidente ambos segurando o
veado pelas mãos eu ainda tenho esta fotografia que esta gravada na pagina
seguinte.
Quando cheguei a casa eu fui
tratar do veado e o Dr. Jango foi para a minha casa que ficava bem ao lado da
dele e foi para a cozinha junto com Maria para fazerem macarrão e ele foi o
cozinheiro.
Ele fez o macarrão em casa e
ali mesmo o comeu. O Presidente gostava muito de meus filhos e da patroa. Seus
dois filhos e sua esposa eram um pouco mais arredios a exceção do Avelar. Jango
era um homem muito simples e humano
.
Retrospectiva - anos de 1963 a 1973
Completando 20 anos de casado, seis filhos. Aleixo, Ruth, Paulo, Miriam, Enilda e Daniel.
Tivemos vários impasses durante
este período e considerados difíceis pela impulsividade de minha esposa Maria,
que parecia crescer com os anos e não mudava sua maneira irredutível de
compreender e analisar os meus deslizes que vez por outra se juntava há um
pouco de pequenas farras e parcas bebedeiras, nunca tão acintosa e nem tão
exageradas, mas fora dos moldes do comportamento normal, afinal eu parecia ter
esquecido a igreja, o Pastor Esteel, a irmã Paulina e Violeta que voltaram para
sua terra natal e as ovelhas de sua igreja ficaram a larga.
Uma força sempre superou nossas
pendengas e esta virtude, se é que se pode chamar assim, era à vontade e a
responsabilidade em criar os nossos filhos juntos.
O progresso intelectual se
apossava não mui rápido, mas progressivamente aprimorava o comportamento de
minha esposa, que ainda era um osso duro de roer e bastante rude por dentro,
era mui difícil de manuseá-la parecendo que era feita de aço temperado e
inquebrantável, ao mesmo tempo flexível, era como se tentássemos impor uma
cultura super avançada na simplicidade de elementos primários era uma tarefa
difícil, teríamos que ter paciência, mas era possível e valia a pena tentar,
mas o que mais me espantava era o carisma herdado por aquelas crianças e que me
confundia e me colocava num mundo aleatório que nem eu conseguia entender ou
assimilar, notava-se um desenvolvimento um tanto estóico por que não dizer
exótico em relação ao aprendizado familiar que deixava transparecer algures a
cultura de seus antepassados por parte da mãe e na convivência com os seres
humanos nativos da região, e ao mesmo tempo deixavam transparecer uma evolução
de cem anos à frente nas suas ações, decisões e surpresas de entendimento e nas
rápidas assimilações e um notável conhecimento avançado, era a miscigenação das
raças tentando saírem e se acomodarem e certamente cabia a eles decidirem qual
adotar, mas ainda não cabia a mim sentenciar, eram ainda muito jovens.
Até então tudo ia bem, a
esposa era um pouco agressiva, mas eu não a trocaria por nada neste nosso
mundo, “ruim com ela pior sem ela”. Uma
coisa começou a pesar em nossa vida, minha esposa apresentava constantemente
uma pressão arterial muito alta chegando a 22, tive que buscar por várias vezes
recursos médicos e hospitais, rondamos por Brasília, São Paulo, Uberlândia,
Goiânia Cuiabá e Barra do Garças, lembro que o medico de Uberlândia disse que
ela tinha era “síndrome hospitalar” isto porque quando ela entrava no hospital
a pressão aumentava para 18/20 ou 22 e quando ela chegava a casa
a pressão caia para 16/15/14. Fizemos teste por várias vezes sem ela
saber e o resultado foram confirmados, era realmente medo de hospitais que
fazia a pressão aumentarem muito.
Esperemos num futuro próximo para ver como as coisas vão se sucedendo, daqui a dez anos quando já estarão mais maduros e começarem a se manifestar ai então se terá mais profundidade para analisarmos. Inté lá.
Daí em diante...
De 1960 a 1973 foram dez anos de muita aventura e também tivemos a felicidade de vermos nascimento de mais dois filhos, Joel nascido a 25 de fevereiro de 1965 em São Felix do Araguaia e a caçula Maria Aracy, nasceu em Brasília a 23 de julho de 1968 completamos um total de oito filhos, quatro homens e quatro mulheres e destes, quatro vieram ao mundo via: Victor Queiroz do Nascimento (Um herói à parte)
Paraense, vindo das bandas da “maré”, Victor trazia consigo marcas indeléveis da sua origem. Era desbocado ao extremo, bebedor de pinga, cauteloso, mas bem ativo surpreendentemente inteligente e um enfermeiro para ninguém botar defeito.
Trabalhou por muitos anos em
Santa Izabel do Morro, na Ilha do Bananal junto à aldeia dos índios Carajás,
isto se não me engano entre os anos de 1958 a 1972, sua maior especialidade era
ser parteiro. Comenta-se que todos os nascidos na região do médio Araguaia, e
isto compreendiam Mato Verde (depois Luciara), São Felix do Araguaia, Aldeia do
Fontoura, Santa Izabel, Barreirinha e toda a população ribeirinha tinham sempre
algo a ver com Vitor.
Na minha família os meus filhos
que nasceram naquelas bandas num total de quatro deles o parteiro foi o Victor,
os outros quatros nasceram: o primeiro na Fazenda São Pedro na Ilha do Bananal,
dois em Brasília e um em Luciara.
Lembro-me bem da confiança que
minha esposa tinha nele, tanto é que no ultimo parto que fez para minha família
foi em São Felix do Araguaia e a minha patroa sempre me admoestava:
--Vá
atrás do Victor, eu só confio nele.
E, eu fui a Santa Izabel
buscá-lo. Já quase na hora do parto ele me pediu:
--Vá
comprar duas garrafas de “Praianinha”
Ele sempre bebia antes de fazer
o parto, mas todos se conformavam, pois acreditava nas mãos santas do mestre
Victor, uma vez ele me disse que já tinha feito mais de duzentos partos e
nenhum teve qualquer problema e o menino tomou o nome de Joel e sempre foi um
jovem muito sadio.
Por uns tempos ele ficou como
encarregado do Posto Indígena de Santa Izabel do Morro, e, em uma destas
oportunidades em que eu ainda era o chefe do Centro de Atividades da Fundação
Brasil Central na Ilha em que constantemente os dois aviões Douglas DC3 da FBC,
vinham de Brasília para Santa Izabel e com este vinha um monte de gente para
conhecer a Ilha, os índios, pescar ou caçar, o avião sempre permanecia por dois
dias parado na Ilha para na volta recambiar os visitantes.
Numa destas feitas eu recebi um
radio de que o avião havia saído de Brasília para Santa Izabel e que levava a
bordo oito pessoas para serem atendidas diretamente pelo Victor e isto por
determinação da Chefia do SPI na Capital, era um negocio sério, recebi o radio
e peguei meu jipe e fui correndo a casa do Mestre para avisá-lo e eu o
encontrei jogando baralho e já bem “calibrado”. Vestido em uma enorme bermuda
já que o homem era gordo e barrigudo e por baixo da mesa podia se ver os ovos
pendurados e balançando livres pela perna da bermuda.
Victor chegou este radio para
você e o avião esta chegando, vem um pessoal de Brasília para você atendê-los
são oito pessoas ao todo.
--Que
saco, logo hoje, mas eu já vou buscá-los.
E assim fez, levantou-se da
mesa, virou na goela o resto da pinga que ainda estava pelo meio do copo,
cuspiu no chão e saiu cambaleando, E o vi entrar no Jipe Toyota do SPI,
funcionou o mesmo e saiu às cotoveladas e quase bate no meu carro. Eu segui no
trajeto do Victor que se dirigia em zigzag para a pista de pouso, pois o avião
havia acabado de chegar e o pessoal já estava todo pelo lado de fora
aguardando.
O Victor não diminuiu a marcha
do veiculo e ao chegar junto da cerca do campo para não bater nela e ele deu
uma guinada no volante carro de quase noventa graus e só conseguiu parar depois
de bater numa das colunas de uma enorme a alta caixa d’água que balançou
jogando um bom volume do liquido para fora molhando o motorista adoidado, mas a
caixa não caiu.
Seguidamente ele desceu do
carro levantando a folgada vestimenta que passou a exibir os bagos ainda
balançando e foi dizendo para os passageiros que chegaram:
--Quem
são os que vieram para eu possa servir de guia pela Ilha e nas pescarias? Ninguém
se apresentou, todos ficaram calados, uns olhavam desconfiados e balançavam o
dedo como a dizer “eu não sou”. Nunca
soubemos que seriam estes, também pudera!
Victor mudou-se para Goiânia e
depois para Cuiabá, morreu adoidado como sempre, seu filho Roberto se tornou um
agente Policial e foi morto por marginais, seu filho Carlos se formou em
medicina e se tornou num famoso medico, os outros eu os vi há muitos tempos
atrás devem estar por ai.
Nada nunca apagará o nome do
grande enfermeiro pelo menos nos corações das centenas de pessoas que ele
ajudou a nascer.
Foi um brilhante trabalho de
dedicação e amor a vida.
Victor Queiroz do Nascimento e
Roberto sejam felizes nas suas grandes
caminhadas.
Família do Victor: Carlos –
Miriam - Roberto – Victor Jr. - Messias – Marlene e a esposa Dona Raimunda.
A bruxa estava à solta,
Um dos nossos melhores motoristas de nome e apelido “Pisca” porque ele tinha o cacoete de piscar muito foi assassinado em São Felix do Araguaia.
Um dia eu fui fazer uma visita
na Fazenda SPI que ficava uma légua beira rio acima e quando lá cheguei escutei
um tiro e alguém chorando, desci do veiculo e entrei na casa, vi uma mocinha
soluçando abraçada a um homem morto no chão, havia lhe dado um tiro em baixo do
braço que entrara peito adentro, a menina era só sangue e choro e eu perguntei
quem tinha feito aquilo ela muito nervosa, tremendo e gaguejando me disse que
fora o Sebastião da Bem-vinda.
Voltei rapidamente para o Jipe
e segui rumo a Santa Izabel quando avistei dois homens descendo ladeira abaixo
rumo a uma canoa e um deles levava uma trouxa de roupa, reconheci que eram o
Sebastião e um tio dele de nome Emenergildo, gritei que parassem e de revolver
na mão prendi o criminoso que também era meu amigo e o encaminhei para o
responsável pela FAB em Santa Izabel que o transferiu para São Felix aos
cuidados da Policia Militar e nunca aconteceu nada, logo foi solto, não sabiam
o que fazer com ele. O rapaz matara o pai da moça porque ao lhe pedir para
namorar com sua filha o pai negou a
permissão a que ele apontando um revolver para o velho que levantou o braço que
chegou a pedir “não faça isto”, ele atirou ferindo-o mortalmente.
&
Leonardo
Villas Boas, um sertanista leal...
Neste meio tempo meu amigo de
luta e sertão Leonardo Villas Boas estava bastante adoentado e foi para São
Paulo para se tratar, e de lá me escreveu uma carta, que eu a guardei por
longos anos, mas estas andanças me a fizeram extraviar, me recordo palavra por
palavra com os seguintes dizeres:
“Meu amigo Dankmar”,
“Minha querida amiga Maria, e meninos”.
Sigo
para São Paulo para operar o coração, mas sinto que não voltarei, já estou
sentindo muitas saudades de vocês todos, não se apoquentem comigo eu estarei
bem, se cuidem, vocês ainda tem muitas coisas para fazer. .
Adeus e abraços do amigo de
sempre.
Leonardo
Leonardo Villas Boas morreu em São Paulo na mesa de operação, seu médico o Dr. Zerbini fez de tudo para salvá-lo, mas Deus tinha outros planos para ele em 1966. Eu fui até lá, mas já o haviam sepultado.
Boa caminhada amigo Leonardo,
vá com Kananchue.
A extinção da Fundação Brasil Central
Foi durante este período trabalhando na Ilha do Bananal, que a situação começou a se complicar lá fora e a Fundação Brasil Central foi extinta e seus funcionários distribuídos para outros órgãos.
Fui transferido para Policia
Federal. Em janeiro de 1969.
Fiz vários cursos intensivos na
Academia Nacional de Policia Federal cujo Diretor Doutor Lapagesse era uma figura
proeminente. Destaquei-me em Organização Judiciária. Organização. E
Competência. Do DPF, Geografia Econômica e Política, Relações Humanas,
Merceologia, Legislação. Especial. De Contrabando e Descaminho, Legislação.
Especial. De Polícia Fazendária, Escrituração Fiscal, Técnica. Operacional. De
Polícia Fazendária e Técnica. Operacional. De Contrabando e Descaminho.
Um ano, após os concluído os
estudos falaram em me transferir para servir no Gabinete da Presidência da
Republica em Cuiabá, mas antes que eu fosse transferido resolvi vender o gado
que tinha na ilha e que estava apascentada no retiro a margem do rio 23, eram
cento e cinqüenta cabeças e eu já tinha autorizado meu cunhado Mariano para
vender, e ele vendeu para o Leonardo Pereira Barros que havia juntado os trapos
com minha sogra Dona Joaninha, ele rapaz novo e ela de boa idade, isto não
importa porque o tempo em que estiveram juntos fora felizes até ele fugir com o
dinheiro da Prefeitura.
Na realidade eu nem sei o que
foi feito com o dinheiro apurado no gado, só me lembro que para acabar, ou para
receber eu tive que aceitar uma Rural Willis Overland ano 1963 sem documentos.
Leonardo, era um fogoió (ruivo)
todo falante e parecia que nunca descarregava a bateria, estava sempre mexendo
com alguma coisa e o Lucio da Luz gostou do jeito do jovem e o convidou para se
candidatar Prefeito e ele aceitou e ganhou as eleições.
Leonardo do jeito que chegou
sem ninguém saber nada a seu respeito sumiu do mesmo jeito deixando a viúva,
minha sogra desolada, mas sempre esperançosa “ele vai voltar”,
Como Prefeito foi um fracasso
porque ele meteu a mão no dinheiro e muitas vezes ele chegava a sua casa
trazendo sacos com dinheiro em notas puras, pois não havia banco na região toda
e ele jogava o dinheiro no meio da sala e dizia para os dois netinhos que minha
sogra criava:
--Ronaldo,
Pretinho, brinque a vontade. E os meninos deitavam e rolavam em cima das notas.
Minha sogra não gostava, mas fazer o que?
Um dia resolveram caçar o
mandato do Prefeito Leonardo e a Câmara Municipal reunida sob o comando da
filha do Coronel Lucio, que não tinha o menor amor pelo pai porque ele abandonara
sua mãe e queimara o cartório destruindo os documentos em Barreira de Santana
no Pará. E sob a batuta de Adauta Batista Luz, caçaram oficialmente o Prefeito
só que nunca o encontraram sumiu com o dinheiro que se apossou e nem a policia
o encontrou, ao menos até esta data, mas deixou a Willis Rural que eu mandei
vender e também não tenho a menor idéia se cheguei a receber o resto do
dinheiro, simplesmente não me recordo.
Quem ficou contente com o sumiço dele foi o
velho Felício um homem meio abobalhado que minha sogra o mantinha como um bom
amigo. Felício odiava o Galego porque sabia que ele não prestava. E tinha toda
razão.
Isto se passou em 1968.
Uma decisão difícil...
Na difícil decisão optei pelo que já estava pautado era largar tudo e ir para o sertão, pois me faltou coragem por enfrentar este novo desafio e o que mais pesava era a família numerosa, a mudança, aluguel de casa, adaptação ao novo lugar tendo em vista o salário muito irrisório que eu recebia. Meu concunhado havia sido eleito Prefeito em Luciara e me convidou para assumir a Secretaria de Planejamento tomei uma decisão que veio a mudar radicalmente a minha vida e de todos de minha família, resolvi vender a casa em Brasília e voltar para o sertão.
Voltamos a morar em Luciara se
bem que eu só vivia viajando a serviço da Prefeitura, minha verdadeira função
era entrosar com os políticos, conseguir verbas e benfeitorias para nosso
município, enfim, era mais parecido com um procurador do que um secretário, mas
como resultado minha família recebia um salário regular o que dava para viver
tranquilamente, sempre foi assim eu nunca parei de trabalhar.
O meu espírito de aventureiro sobrepôs
às razões se bem que minha esposa ficasse muito feliz porque sempre quis voltar
para junto de seus familiares. Estava decidido.
Aceitei o cargo e com isto
vieram as encrencas:
De 1972 a 1973.
02 anos de dedicação a Prefeitura.
Para trabalhar na Prefeitura eu
tirei duas licenças que somaram a quatrocentos e sete dias sem vencimentos,
isto para também não perder o emprego na FBC.
Como Secretário Geral da
Prefeitura, e assessor direto do Prefeito especialmente na já velha e
amadurecida questão fundiária que estávamos movendo contra a poderosa Codeara
ou o Banco de Credito Nacional o BCN, que deveria entregar aos posseiros de
Santa Terezinha 5.395 hectares de terra para assentamento dos mesmos conforme
rezava o contrato de compra e venda feito por aquela empresa ao adquirir as terras
de Michel Nasser, fui incumbido de representar a municipalidade e o Padre
Jentel os posseiros e no dia marcado lá se fomos nós, eu o Chico, rumo a
Copacabana.
--Se com vocês dois juntos não der certo, ao menos vai explodir-vaticinou o Prefeito. E quase explode mesmo.
Foram quase seis meses de
viagens e lutas, fomos eu e o Padre até o Rio de Janeiro por duas vezes quando
então tivemos reuniões no INCRA, na sede da Codeara em São Paulo que ficava no
Edifício Armando Conde do BCN, tivemos discussões séria com o Dr. Luiz Carlos
Murat, que era a cabeça deste intrincado problema, mas ao final ganhamos uma
ajuda do Dr. Bertoni cuja esposa era Conselheira da SUDAM, que por uma missiva
nossa “Trancou” as liberações de créditos
da toda poderosa Codeara e isto fez com que ela se chegasse a Prefeitura
e finalmente doasse a terra prometida.
Missão cumprida o resto agora
era com o prefeito.
Ao chegar a Luciara a noticia
correu “a doação fora feita”, no mesmo dia o Padre chegou e só acreditou depois
de ver a escritura e o registro o padre deu um suspiro profundo que eu nunca
pude entender, seria alivio ou uma decepção por uma briga que acabava... Mas
ele como que adivinhando meus pensamentos disse:
--Se você pensa que a
briga acabou está muito enganado ainda faltam doar a área da cidade de “Saint
Terezin”.
--Fique calmo padre, da
uma folga. OK.
--É,
mas não vai ser fácil você vai ver - e virando as costas lá se foi o padre ao
rumo de “Saint Terezin” ou Saint Denise “sei lá”.
Eu senti que o padre Jentel
estava maquinando mais alguma encrenca, vi isto em seus olhos, e ele tinha
pressa será que era por causa da Denise?
E realmente armou muita
encrenca, até uma pequena guerrinha com muitos tiros e gente ferida ele começou
contra a Codeara e a Policia Militar e acabou fugindo para Goiânia e lá foi
preso e deportado, mas voltou ao Brasil e foi novamente expulso, fala-se que ao
ser preso a ultima vez foi torturado tendo sido pendurado pelos testículos,
morreu no seu país de origem, mas eu acredito que não por doença ou mau trato,
mas de saudade pela terra que ele tinha adotado.
O tempo passava, Sebastião se
elegeu Prefeito e as rusgas e perseguições aumentaram. Certa feita Liton havia
deixado um carro seu quebrado e encostado no meio fio da calçada de sua casa,
mas o prefeito mandou o trator arrastá-lo e jogá-lo longe da cidade. A tensão
entre Liton e Sebastião Gomes ou o Sebastiãozinho aumentavam chegando ao ponto
deste alardear que só ficaria em paz quando a “Língua branca”, (Liton)
estivesse com a boca cheia de formiga, eu mesmo o aconselhei a deixar estes
pensamentos e tentar viver em paz, mas ele me respondeu que não teria paz
enquanto a Língua Branca vivesse.
Retrospectiva... De 1973 a 1983
Passaram-se trinta anos de casado, e bem casado, o meu filho mais velho Aleixo estava com vinte e nove anos de idade, o resto dos filhos na escada de idades e todos bem de saúde com exceção da Ruth que ainda capengava resultado do acidente em Brasília e Daniel que tivera um olho vazado numa cerca de arame farpado e ele tem carregado este estigma por toda a sua vida, quanto a minha patroa a mudança foi espantosa rapidamente se habituou aos costumes mais sofisticados a ponto de freqüentar com destaque requintadas festa e reuniões sociais em Brasília.
Chegou a ponto de muitas vezes
me corrigir quando pronunciava quaisquer palavras em palestras que não se
alinhavam.
Na vida de casal ela continuava
com aquela fibra irredutível e uma tanto autoritária e ai de mim se eu fizesse
qualquer deslize, e ela soubesse, mas este comportamento fez muito bem para
nossos filhos que foram criados de uma maneira familiarmente correta, justa e
equilibrada, mas dotados de dois extremos, quando estavam calmos eram de uma
educação sem par, mas quando a situação exigia energia eles a sabiam como
usá-la, eu que o diga, neste detalhe não sei por quem eles puxaram.
Atravessamos muitos percalços,
mas ao que parece a minha patroa era uma crente muito fervorosa e acredito que
o Pai lá de cima dava uma ajudazinha para nós.
O meu serviço fazia com que eu
ficasse muito tempo fora de casa até que um dia ela me deu um ultimato “Ou você
fica casado com a Fundação ou fica casado comigo, agora você vai escolher”, eu
resolvi passar mais tempo em casa afinal ela estava certa.
Nossos filhos eram ótimos na escola e até minha esposa passou uns tempos como professora primária. Estava tudo dentro dos conformes – Vejamos daqui a dez anos em 1993. .
Comarca de Barra do Garças MT.
Entre
1973 a 1983.
Foram 09 anos dedicados ao Tribunal de Justiça MT.
Anos cheios de altos e baixos e muito aborrecimentos.
Com a minha saída da Prefeitura
resolvi me mudar de Luciara, fiquei muito aborrecido com a inoperância do então
Prefeito Sebastião eu senti que as perseguições apenas haviam começado, me
mudei para Barra do Garças e me apresentei no Fórum de Justiça da Comarca
pleiteando uma vaga de Oficial de justiça e a consegui graças a alguns amigos.
Era fevereiro de 1973 me apresentei ao Doutor Fernando Leopoldino Mesquita Maia, Juiz de Direito da Comarca de Barra do Garças MT.
Anos de 1973.
Historias do F
--É Zé, num vai dar não - foi à resposta lacônica de um dos primeiros Juízes da Comarca (Dr. José Damásio) - este seu amigo num vai ganhar a questão, eu não posso fazer, ele está muito errado. (falando para “Cacique”) que era marido da Renildes do Cartório de Registro Civil, durante um almoço a que fora convidado, o anfitrião, aproveitando a oportunidade “cantou”. O Magistrado Dr. José Damásio em favor de um amigo seu.
Despacho em um processo antigo:
“Determino que peguem este processo e o enterrem bem longe daqui e se possível
lá no alto do morro para nunca mais ser visto ou encontrado”.
Dois advogados discutindo
(Doutor Flores e Doutor Almiro) na sala do Juiz Dr. Fernando Leopoldino
Mesquita Maia que se indignou e sentenciou: “Podem se acalmar já está decidido,
eu vou fazer igual um Juiz na Paraíba, empatar a questão e condenar o escrivão
nas custas”.
Os Juízes viam e iam muito
depressa, finalmente chegou à vez do Doutor Flávio José Bertin, este veio para
demorar e ficou.
Nos primeiros meses de trabalho
abriu concurso publico para Oficial de Justiça, apenas uma vaga para a Comarca,
afinal ela não era tão grande assim ia apenas da divisa do Estado Pará (Lago
Grande) até Araguaina em apenas um mil e duzentos quilômetros de distancia por
quase trezentos de largura, sem estradas e maior parte das vezes, quando o Jipe
não dava mais para prosseguir, tinha que usar barco, cavalo ou avião. Acho que a Comarca de Barra do Garças era
maior do que o Estado de Sergipe, e quem ganhou em primeiro lugar fui eu que já
era oficial de Justiça concursado.
Foram anos de muito trabalho e
viagens, inicialmente eu ganhava muito bem como o Oficial e Justiça, pois era o
que mais viajava o outro Oficial, o Tertuliano, já de idade bem avançada sob
fazia os serviços de intimação por perto da sede.
Comprei dois lotes juntos em
uma área até então considerada deserta e construí um muro e uma boa casa, a
minha patroa tinha verdadeira alergia por pagar aluguel.
Muitas coisas boas aconteceram
naturalmente mescladas de dissabores e coisas ruins.
A minha família era e sempre
foi muito unida e os meus filhos criados junto a nos até quando casavam, mas
apenas as filhas tinham vontade de estudar, os filhos nunca foram amantes das escolas
e sempre inventavam alguma coisa para escapulir, mas todos concluíram ao menos
a fase primaria.
Durante este período o que mais
abalou a estrutura familiar e funcional oram “A doença de minha esposa no
Hospital do Doutor Kleide e o caso da Fazenda Piraguassú ou Yanmar do Brasil”.
O
milagre da cura...
Eu estava viajando cumprindo diligencias e quando retornei notando a ausência de minha esposa e pelos rostos contrariados de meus filhos notei que algo estava errado quando me deram a noticia que Maria estava internada no Hospital do Dr. Kleide e bem doente. Fui ate ela e a encontrei acamada.
--O
que aconteceu Maria?
--Ontem
eu comecei a passar mal e vomitei muito sangue e vim para o hospital.
--Mas...
O que é afinal?
Nesta hora o Doutor Kleide
apareceu no quarto e em conversa comigo declarou:
--Sua
esposa esta com tuberculose bem adiantada, eu já fiz uma lista de remédios para
ela tomar e você vai ter que isolá-la.
--O
senhor fez todos os testes?
--Todos,
inclusive uma radiografia do pulmão.
Para mim foi o fim da picada,
por esta eu não esperava, lembrei a minha casa com oito crianças e a mulher
naquele estado. Quando o Doutor Kleide deixou-nos á sós ela me disse:
--Meu
velho não vá comprar nenhum remédio, pois eu não vou tomar seu sei que não
tenho nada eu estou sadia.
Mas eu nem quis ouvi-la e sai
para comprar aquele absurdo de remédios caros, quando voltei com o pacote na
mão ela tornou a falar:
--Eu
te avisei que não vou tomar estes remédios.
--Mas,
você esta doente e precisa tomá-los!
--Meu
velho ontem umas irmãs da minha igreja estiveram me visitando e oraram por mim
e uma delas disse que viu uma mão sobre a minha cabeça e que eu estava curada.
Antes que ela acabasse de falar
o Doutor Kleide entrou e eu pedi:
--Doutor
eu quero que o senhor repita todos os exames!
--Você
vai gastar dinheiro atoa, mas vou mandar repetir todos eles agora mesmo.
E assim foi feito.
Horas depois o médico veio a
nossa presença trazendo o bioquímico Zezão e um monte de chapas na mão.
--Francamente
eu não sei o que aconteceu, mas os novos exames não acusaram nada ela esta
perfeitamente sadia.
--Não
entendo, eu mesmo fiz todos os testes até de saliva e pele e tudo deu positivo
e agora deram negativo.
--Pode
levar a sua mulher para casa, mas se é que existe milagre eu não acredito em milagres, mas este foi um deles.
Foi um caso muito comentado na
esfera médica de Barra do Garças.
O médico não me cobrou nada e eu dei um monte de remédio para ele e lá se fomos s de volta para a nossa casa. Deus havia cuidado dela.
Uma briga muito antiga...
A Yanmar do Brasil com sede em São Paulo pertencente a um grupo japonês
encabeçado pelo Doutor Goto e pelo Doutor Vicente Hayaschida, adquiriam por
compra da então FRENOVA, cria do BCN – Banco de Crédito Nacional na Capital de
São Paulo, tendo a testa o Doutor Murat e Armando Conde uma área de terra com
72.000 hectares, nascida no Cartório Meneses da cidade de São Paulo, encravada
a margem direita da Rodovia BR 158 na altura do quilometro 700, mais
precisamente na região de Porto Alegre do Norte bem a margem do rio Tapirapés,
e com esta aquisição vieram muitas encrencas, que ao final veio sobrar para
mim.
A Yanmar quando recebeu a terra
foi que tomou conhecimento que havia cerca de 130 invasões, especialmente na
área central e rio Tapirapé, seus comandados fizeram um levantamento detalhado
de todos os posseiros e a cúpula dos Japoneses achou que a melhor solução seria
doar uma pequena parcela a cada um, só não contavam com a appositione
da Raposa do
Araguaia como era gentilmente conhecido o bispo Dom Pedro Maria
Casaldaliga Plá.
Pela primeira vez na historia
do médio Araguaia alguém não tirava e sim dava de presente e sem ônus algum,
titulada, um pedaço de terra a posseiros.
Muitos mandados foram
expedidos. Eu suei a camisa a procura dos sorteados enquanto que o advogado
Doutor Hans Norman Joestyng, representando os doadores que também veio ao miolo
da lide para tratar diretamente com os beneficiados e tinha poderes para fazer
acordo outorgando a titulação definitiva da terra ao seu pressuposto
proprietário, mas o Bispo os havia instruído a não receberem os títulos.
Se tal acontecesse sua fabrica
de marginalizados desmoronaria, pois eram estas estirpes humanas, sem
conhecimento da nossa historia social, marginalizada pela sociedade que se enquadravam
dentro do histórico movimento intitulado “Conscientizações das massas”.
Mas os posseiros, boa parte
deles, optaram por receber a titulação, pois passariam de simples invasores a
proprietários. Foi uma luta difícil que no final deu na minha moleira.
Como Oficial de Justiça da Comarca
de Barra do Garças, eu ali estava entregando os mandados judiciais.
Uma cria do Bispo que se
intitulava Cascão era um Agente Pastoral de nome Alexandre Rodolfo Inattio
(restolho da guerrilha do Araguaia.) e para tumultuar a situação ele veio até a
sede da Comarca e em Juízo denunciou que um “alemão” se fazia passar por
Advogado e estava enganando os posseiros pressupondo que seria eu e não o
Advogado Dr. Norman que é também de origem alemã.
O Juiz daquela época Doutor
Ataíde não tinha as faculdades mentais em perfeita ordem e já havia feito muita
besteira na Comarca. Ele acatou a denuncia e mandou me prender a mim um Oficial
de Justiça que ali estava cumprindo suas determinações, não atentou ele que o
advogado que foi sub-repticiamente denunciado era o Doutor Norman, também filho
de alemães, mas trocou as bolas como sempre o fazia o que lhe veio render
muitos dissabores.
Cheguei tarde da noite em minha
casa e sem desconfiar de nada, pois para mim estava tudo normal, o que durou
poucas horas e logo ai pelo amanhecer, na penumbra do dia, um movimente
inusitado se acercou de nos, a casa estava toda cercada por policiais
militares, eu os vi entrando pelo portão se postaram ao pé da escada foi
quando, sem meu consentimento e antes que eu pudesse as segurar, duas filhas
minha uma com apenas quinze anos a outra com treze os impediu de subirem a
escada e invadirem minha casa, Miriam resoluta portava uma espingarda
cartucheira de calibre dose do cano duplo e Enilda ao seu lado de lanterna na
mão.
--Podem parar onde estão, nem um passo a mais, tem criança dentro desta casa e meu pai vai depois falar com o Juiz, saiam já e se quiserem esperem lá fora da casa, vocês não vão levar ele, agora foraaaa.!!!! O sargento que comandava os policiais militares entendeu bem o recado e não se arriscou a cartucheira apontava para ele, deu ordem para todos dar meia volta e se retirarem, saiu e encostou o portão que fechou ao bater.
Liguei ao Doutor Dercy Gomes da
Silva um bom advogado e muito amigo que veio até minha casa e conversou comigo
e eu fui com ele até a Delegacia.
O Juiz sumiu da Comarca e tive
que ficar detido por seis dias quando chegou à ordem de liberação, o Juiz
abusará de seu poder, mas ele teria que conversar comigo.
No dia seguinte eu estava no Banco do
Brasil quando alguém me tocou por traz, era ele o magistrado.
--Me
desculpe o erro, você não vai me matar, vai?
--Bem
que o senhor merece, mas agora já esta tudo bem.
--Obrigado
pela sua compreensão – e saiu rapidinho.
O Doutor Ataíde foi removido anestesiado para
Cuiabá, havia ameaçado uma dona de uma lanchonete a qual chamava aos gritos de
“minha amante”, cheguei a ficar com dó dele. Coitado, com tantos problemas
familiares que não vou enumerar em respeito a sua família, foi preso em Cuiabá
sob a acusação de participar de falcatruas, mas, mesmo preso requereu um
Habeas-corpus que escreveu em um pedaço de papel higiênico e o Tribunal acatou
e concedeu sua liberdade, foi aposentado e nunca mais ouvi falar dele, espero
que tenha acertado o caminho de sua vida e hoje esteja em paz. Eu fui preso sem
dever e ele também foi preso, mas se devia ou não eu não sei, sua prisão em
Cuiabá foi amplamente divulgada pela mídia nos noticiários do dia.
A balança da justiça tarou os
lados. Ele fez errado e pagou, mais do
que eu, pois um juiz preso por falcatruas é muito mais doloroso.
Deixei o cargo de Oficial de
Justiça em 1980
Um novo começo de vida
desatrelado de tanta confusão.
Minha ultima mudança
Porto Alegre do Norte MT.
Anos de 1981. Meu retorno a Prefeitura de Luciara.
Mudei-me para Porto Alegre do
Norte, vendi minha casa em Barra do Garças, comprei um caminhão FORD 1978
e arrastei toda minha a minha mudança.Um fato digno de registro foi quando eu
ia dirigindo na viagem de volta, a noite. Eu tinha dado carona a uns quatro
homens que iam a cima da carga, o Aleixo ia na cabine comigo, a estrada nova
oferecia vontade de correr e quando me aproximei da ponte na passagem do Berocai
ela tinha uma entrada fechada de mato que não deixava antever a ponte
que era construída em quatro longos dormentes, dois lado a
lado, no meio tinha uma coluna de cimento e a ponte fazia um ângulo de
mais ou menos uns quinze graus do meio da coluna central para o outro lado e
era da altura mais ou menos de seis metro e se completava com outros quatro
longos dormentes era um risco altamente perigoso, eu vinha a oitenta
quilômetros por hora quando vi a ponte não dava mais para segurar e passei nela
a toda velocidade foi quando escutei os gritos de admiração dos caronas, o
Aleixo só disse:
--Puxa pai... Levei um
susto danado.
--É foi uma temeridade,
mas vou tomar mais cuidado
Comprei casas fiz uma firma de
material de Construção comprei a chácara e trabalhei na Prefeitura
Meu primeiro grande trabalho
foi o de construir um Hospital Regional em Luciara e para tanto parti para
Brasília e comecei a mexer os pauzinhos e a me entrosar com os políticos.
Problemas de saúde.
A
pressão da Maria não se estabilizava e os médicos da região já não sabiam o que
fazer, eu, resolvi a levar de avião com meu sobrinho Leopoldo direto para a Cuiabá
e sendo ali a encaminhei para o Hospital do Coração que fica na Avenida Getúlio
Vargas ali perto do Banco Bemat. Todos os exames foram feitos e resulto-se no
internamento dela que se agravou e foi para a UTI. Foram quinze dias de
tratamento intensivo, mas finalmente controlaram a pressão e ela melhorou,
neste meio tempo aproveitei e fiz o meu Checkup geral, mas nada foi encontrado
estava tudo dentro dos conformes. O médico me chamou e fui a presença dos dois
e ele me disse que dentro de mais dois dias ela teria alta e poderia voltar
para casa, tomar uns remédio e usar muita moderação na comida e no sal. Notei
que ela estava muito fanhosa e quase eu não entendi o que ela falava, foi
quando perguntando ao medico ele me respondeu que aquela sensação era por causa
do sedativos que havia tomada, mas que logo tudo voltaria ao normal e eu
vendo-a mais alegre brinquei com o medico dizendo que a voz daquele jeito
estava boa e que podia ficar assim mesmo foi quando recebi um beliscão nas
costelas que me dói até hoje, ela não gostou da brincadeira e reclamou muito a
minha ausência no hospital, mas não lembrava que na UTI não se pode entrar a
qualquer hora. Voltamos para casa de avião e ela seguiu o tratamento por bom
tempo, mas a coisa ainda voltaria a engrossar...
&
Resolvi
viajarmos para o Litoral.
Para descansar a cachola resolvi
tirar um mês de férias e fazer uma viajem e queria realizar o sonho de minha
esposa que era “conhecer o mar” e isto eu devia a ela Eu tinha comprado um Fiat, novo, modelo 147 naquela
oportunidade era um veiculo moderno, convidei algumas pessoas de minha família
como a Edemildes que levou um filho de dois anos o Cesar, a Ruth eu e a Maria e
nossa tralha e saímos de Barra do Garças ás 03 horas da manhã e tomamos rumo de
Jataí daí para a ilha solteira e São Paulo. Chegamos à casa de minha irmã em
Vila Formosa ás 12.00 da noite do mesmo dia, foram vinte e uma horas de viagem,
mas só parávamos para abastecer e lanchar alguma coisa.
Em São Paulo, junto da casa de
minha irmã Aracy morava um corretor de lotes chamado Jerson e acabamos nos
entrosando com ele e negociamos dois lotes a beira mar na Ilha Comprida e a
viajem então tomou um destino: conhecer os lotes e lá se fomos. Eu havia
trocado os pneus do Fiat colocando outros um pouco mais altos, acredito que
eram de Volkswagen, mas dava menos estabilidade no carro, pois quando
passávamos por um veiculo grande como uma carreta ou um ônibus a Fiat balançava
todo.
Chegamos ao Vale do Ribeira e
seguidamente a uma cidade a beira mar, atravessamos o nosso carro em uma balsa
para a Ilha Comprida, pois entre o continente e a Ilha tem um braço de mar
conhecido como “mar pequeno”. Paramos num restaurante, lanchamos bem, tomamos
informações e alugamos um chalé bem a beira da praia só por quatro dias, e nos
arranchamos.
Naquela inesquecível primeira
noite eu e Maria fomos para a beira do mar que não distava mais do que
quinhentos metros de nosso chalé e calados, sentados na areia, ficamos a olhar
o mar, sentíamos o cheiro da água salgada e os contínuos barulhos das ondas a
quebrar junto a nossos pés eram como uma suave melodia em uma noite sem lua, mas
muito contagiante e calma com centenas de estrelas a piscarem para nós ali
juntinhos naquela praia, sentíamos a presença do Criador e intimamente
agradecíamos, ao longe vimos luzes de um grande navio passando como em uma
linha entre o mar e o céu, e talvez para nos cumprimentar escutamos o seu
silvar por três vezes curtas e uma vez longas, parecia uma canção, era como se
fosse um conto de fada, talvez até fosse.
Essas noites maravilhosas se
repetiram pelos dias seguintes. Todos estavam muito alegres e satisfeitos, até
então fora uma viajem maravilhosa cheia de amor e carinho.
Assim que iniciamos a volta ao
chegar ao ponto em que teríamos que atravessar para o continente o carro deu um
“prego”, o motor perdera a compressão. Levei a uma oficina e o diagnóstico fora
o mesmo que eu imaginava, a correia dentada havia saído da posição por uma
interferência de um corpo estranho, seja um pedregulho em meio as seus dentes e
assim fazem as válvulas se chocar com a parte superior do cabeçote e empenam
causando a falta de compressão. Tivemos que pedir as válvulas novas, correia dentada
e fazer a troca, demorou mais um dia e seguimos nosso curso de volta. O carro
não estava bem, não tinha a força que deveria ter, suspeitei que o mecânico o
houvesse colocado fora do tempo, isto é um pouco atrasado, e assim resolvi
passar por Belo Horizonte aonde era a concessionária da Fiat e regularizar o
funcionamento do motor. Fui muito bem atendido, a própria Fiat nos hospedou e
no dia seguinte estava tudo pronto, não cobraram um centavo, pagaram as
despesas em BH e ainda pediram às notas que eu havia gastado anteriormente
afirmando que depositariam o dinheiro em minha conta. Justificaram esta atitude com o seguinte
esclarecimento:
--Reconhecemos que estes
novos carros da Fiat saíram com um problema de válvulas e motor, o que não mais
se sucederá, pois afundamos o cabeçote no local de encontro com as válvulas
assim elas não alcançam mais o bloco.
Retornamos feliz e com um
carro em perfeita condições, passamos por Goiânia e oito horas depois estávamos
em casa e o dinheiro da Fiat já estava no Banco, foram muito atenciosos e
leais.
Eu fiquei muito feliz em ter cumprido o desejo de minha esposa que de quebra comprou muitos presentes para os meninos e roupa para ela.
Mesmo trabalhando na Prefeitura de Luciara continuávamos
morando em Porto Alegre do Norte.
Assim que o prefeito eleito José
Liton tomou posse eu parti para o trabalho como Secretário de Planejamento cuja
nova meta era construirmos um hospital moderno de âmbito regional, como já
mencionamos anteriormente.
Teria
que ser um Hospital que tivesse capacidade para atender toda a região do médio
Araguaia, não seria fácil planejar uma estrutura tão grande assim.
Procurei um arquiteto para “bolar” a planta
inicial, mas departamento responsável no Ministério da Saúde não concordava
nunca com a planta, ou o corredor era estreito ou muito largo, ou o espaço
entre um leito e o outro era pequeno, ou altura do pé direito da sala estava
baixo, ou a ventilação via janelas e vitrôs não estavam dentro dos padrões,
sempre tinha alguma coisa errada e eu voltava para o arquiteto modificar e ele
passou a ir comigo nas consultas com a Engenheira arquiteta do Ministério, mas
não deram certo, fiquei sabendo, por baixo do pano, depois de tomar uns uísques
com um dos funcionários envolvidos no assunto de aprovação de planta que ela
tinha um irmão que era arquiteto então eu fui direto ao assunto com dita cujo:
--A Senhora tem um irmão
dono de uma firma de arquitetura?
--Tenho.
--Ele deve ser mais
especializado nestes tipos de plantas.
--Certamente ele poderá
elaborar esta planta com sucesso, vou lhe dar novo endereço dele.
--Não seria mais fácil,
inicialmente, a senhora pedir para ele vir aqui no Hotel se encontrar comigo,
aqui tem um belíssimo salão para tratar destes tipos de assuntos e trabalho.
--Tudo bem, me de o telefone
de seu hotel e eu falo para ele lhe ligar hoje à tarde depois que ele sair do
trabalho.
--Ficarei aguardando.
Despedi-me e fui para o Hotel,
sabia que a coisa agora estava no rumo certo, fiquei aguardando.
Eu estava no living do Hotel
quando ali pelas dezenove horas ele apareceu, era um senhor de boa aparência e
muito educado, cumprimentei-o e fui direto ao assunto explicando das dificuldades
que até então tinha encontrado na elaboração da planta do futuro hospital e gostaria
de saber se a firma dele poderia fazer este trabalho para a Prefeitura de
Luciara.
Após umas duas horas de acertos
chegamos finalmente a um acordo, ele faria a planta e levaria pessoalmente para
conferencia e depois iríamos juntos para recebermos a aprovação do departamento
competente, isto é o de sua irmã.
Assim, tomamos mais alguns
uísques acompanhados com rã ao ponto que estava muito boa, daí para frente, nos
próximos cinco dias nos comunicávamos e nos encontrávamos diariamente,
finalmente chegou o dia e ele já trouxe a planta devidamente aprovada com toda
a documentação.
Restava agora arranjar verba
para a construção.
Quase fiquei careca de vez, mas
uns deputados amigos incluindo o Ricardo Correa intervieram a nosso favor e a
Caixa Econômica Federal que tinha verba para esta finalidade acabaram cedendo,
restava agora descobrir qual a firma que deveria assumir a construção, fizemos
uma licitação e acabou ganhando uma firma de Belo Horizonte de propriedade do
engenheiro arquiteto Mario Oscar.
Chamado a Brasília fomos à
Caixa e ele, Mario Oscar, assumiu toda responsabilidade da primeira etapa da construção, isto é toda a estrutura básica com
cobertura, mas sem acabamento, que o estaria destinados a segunda etapa. Teria que deixar o prédio levantado as duas alas e
coberto. Entendemos que ele receberia as verbas em acordo com as etapas que
fossem concluindo e seria responsável pela prestação de contas. A Caixa
Econômica Federal e a Prefeitura fariam apenas a fiscalização da obra. Assim o
dinheiro não passaria pela Prefeitura.
Assim foi feito e a primeira
etapa da Obra foi concluída com sucesso, era uma construção digna de louvores,
a Prefeitura estava orgulhosa do seu trabalho.
Restavam ainda alguns meses
para terminar o mandato de Liton e eu aproveitei para ver se conseguia o
instrumental cirúrgico para o hospital. O Ministério da Saúde havia me dado um
livro que enunciava todo o material cirúrgico e mobiliário para um hospital com
vinte e cinco leitos, sala pré-natal com cinco berços, apartamento para
isolamentos de doenças contagiosas, sala de operação, oito gabinetes médicos,
pronto socorro, pequenas cirurgias, farmácia e leitos, enfim tudo que era
necessário para um bom funcionamento e eu descobri que uma entidade na Alemanha
denominada Miseror tinha como
finalidade doar materiais para os Hospitais em zonas carentes e sem recursos.
Não titubeei e escrevi para a
Alemanha, mandei toda a documentação inclusive o pedido formalizado, e
acreditem a Miseror foi favorável ao pedido e respondeu que doariam todo o
pedido, mas teríamos que mandar dois médicos para a Alemanha para estagiarem e
assim entrosarem com o novo e moderno instrumental e equipamento cirúrgico.
Eleito, Nagib teve por praxe
não continuar as obras do Prefeito anterior e assim o prédio foi legado ao
esquecimento, mas resistiu ao tempo e agora quase vinte anos depois resolveram
dar continuidade à obra e a Prefeita Noely filha de Liton assumiu e terminou
uma das alas do Hospital e ao deixar seu mandato o novamente Prefeito Nagib
pressionado pelo povo teve que dar continuidade e terminou o que ainda faltava
fazer em uma das alas, mas ainda falta à outra ala. Meu sonho é ver aquele
Hospital pronto servindo a comunidade, eu lutei quase dois para que ele
existisse e ele não morreu. Nunca consegui entender se o Bispo Don Pedro Maria
Casaldaliga aconselhou a Miseror para cancelar a doação, será que era porque não
confiava no Nagib e se o Prefeito eleito não deu continuidade à obra acredito
que foi por não querer assumir responsabilidade pela continuidade da mesma e
assim fazendo a verba para a segunda etapa que já estava liberada, não se sabe
se foi cancelado ou sacado motivo pelo qual Bispo ficou sem uma base firme para
dar o aceite.
Com Don Pedro de um lado e o
Nagib do outro a coisa não fica fácil, Que Deus perdoe a ignorância
administrativa espero que o Dr. Nagib abra seu coração, e que venham a trabalhar
para a comunidade mais necessitada e que tem direito essencialmente no
atendimento a saúde.
Eu fiz a minha parte, mas muita
coisa ainda estava por acontecer.
&
Retornei
ao meu Lar para ficar...
Retornei
ao meu lar em Porto Alegre do Norte, precisava me aquietar e esquecer tantas
furupas, e viver mais aconchegado a minha família. Era começo de 1981.
E assim o fiz. Mudei-me para
minha chácara e fomos viver da lavoura e das criações e, lógico, de meu
trabalho na prestação de serviços,
Maria se adaptou rapidamente a
nossa nova casa que era muito grande e com um quintal enorme, eu comprei
galinhas de raça, plantei arvores e a remodelei. Éramos muitos felizes. Nossos
filhos continuaram a estudar, eu sempre supria a casa com fartura, e sempre
comparava roupas novas para todos e minha esposa quase sempre tinha uma
empregada domestica para cuidar da casa,
A voz do povo era que
“quando
um de nos morresse o outro morreria também, éramos e sempre fomos muito
felizes” Ela ia quase todas as noites para a sua igreja, freqüentavas
os cultos diurnos e visitava as irmãs, ela estava completa, mas parecia
adivinhar que seus dias estavam contados e assim se propôs a viajar para visitar
todos os filhos ausentes e Deus assim permitiu, pois ela os visitou a todos, e
ainda de vez em quando me falava:
--Meu velho eu não vou me
demorar muito para partir, mas cuide bem de nossos filhos e vá para a igreja,
você precisa se encontrar com Deus.
E os dias foram
passando...passando...
Num encontro com meu amigo
Célio Pinheiro que em 1986 havíamos fundado o Sindicato Rural de Porto Alegre
do Norte ele me convidou para trabalhar como Secretário do Sindicato, eu iria
ganhar o serviço que pudesse prestar. E assim passei a ser um membro efetivo da
Diretoria do Sindicato: Secretário Geral entre 1995 e 1997, Presidente Lourenço
Pereira Luz – Fui eleito Presidente do Sindicato Rural de Porto Alegre para o
período de abril de 1997 a abril de 1999; reeleito Presidente para o período de
abril de abril de 1999 a abril de 2002; novamente reeleito Presidente para o
período de abril de 2002 a abril de 2005; finalmente reeleito Presidente do
Sindicato Rural de Porto Alegre do Norte para o período de abril de 2006 a
abril de 2009. Em Dezembro de 2008 convoquei reunião geral e, em Ata renunciamos
coletivamente restringindo o período para Dezembro de 2008 Fizemos uma nova
eleição dentro do mais rigoroso critério tendo sido eleito um novo Presidente,
meu filho Joel Paciente Gunther para o
período de janeiro de 2009 a janeiro a janeiro de 2012.
Mas o primeiro ato foi mandar
pintar a parte externa do Sindicato e o meu nome como fundador se afogou na
tinta do esquecimento, simplesmente sumiu, mas é assim mesmo os grande feitos se tornam em defeitos visuais, mas
ficam gravado nos corações, ali nunca se apagam.
Na Ata da Assembléia Geral
ficou assentado que o Salão de Reuniões do Sindicato Rural de Porto Alegre do
Norte MT. Deve levar o nome “Maria Paciente Gunther – Uma notável ruralista.”
Mas até esta data ainda não inscreveram,
mas agora, no próximo 2012 vão escrever..
Eu fiquei como Delegado do
Sindicato para representá-lo junto a FAMATO e a outras Instituições nos casos
de Eventos, Eleições etc.
Então passei a escrever
livros sobre tudo que vi, vivi, ouvi, aprendi e conheci, e já tenho uma série de 12 livretos prontos artesanalmente manufaturados por mim. Vejamos o que diz o futuro. Quem viver vera
Um salto no passado mesclando com o futuro. .
Saindo desta vida.t
A perdemos.
Minha esposa foi vitima de uma embolia pulmonar, noite de
domingo no dia 30 de dezembro de 2007,
ás 22.40.
Sei que
daqui para a frente eu não terei
mais nada o que fazer, os meus livros talvez
nem os termine, minhas poesias não serão
conhecidas, minha dor é oculta, mas já apodreci por dentro, Filhos? Filhas?
Quem agora se importa comigo? Apenas alguns deles quando lhes sobra tempo.
Bens? Pouco importa, pois nem Deus se importou comigo.
Assim, devo partir para ir me encontrar
com ela, sairei pobre como nasci e sem ninguém aqui neste mundo, hoje ela se
foi amanhã será a minha vez de ir.
“Ela esta com Deus em sua morada, em
breve estaremos juntos novamente”.
Vivemos
juntos por 53 anos, 09 meses, 22 horas e 40 minutos.
Estou saído desta vida.
MEMORIAS
Uma
pessoa um dia me disse:
“ Não sofra tanto, pois ela esta com Deus e
ELE a emprestou e agora a tomou de volta, você que é ruim para devolver o que
toma emprestado. Mas.não me serviu de
consolo. É na velhice que mais precisamos
um do outro, sinto muito a sua falta.
Sinceramente eu não gostei. Vendi minha casa em Porto Alegre do Norte e com o mesmo dinheiro construí uma nova em Barra do Garça, vendi porque não iria agüentas ficar dentro de uma casa cheia de recordações, mas me arrependi, prefiro as recordações ao esquecimento o que eu nunca conseguirei. Voltei para Porto Alegre do Norte em março de 2010. Pelo menos fico mais perto dela, conclui a troca das casas só agora em agosto de 2011. Reformei a minha nova moradia e não me mudo mais. Terminei o difícil e caro inventário, mas me comprometi muito financeiramente, mas um dia eu estarei livres destes compromissos.
Vivo só, mas cheio de
saudades.
Entre 1953 e 1959 novas vidas começaram...
Éramos dois (2)
hoje somos quase 90 ou mais é só esperar mais um pouco...
Durante este período
celebramos casamentos, uniões e títulos que assim se sucederam.
A 14 de março de 1953 foi celebrado o casamento de Wolfgang Dankmar Gunther e Maria Paciente Gunther, o primeiro registrado no Cartório Civil de São Felix do Araguaia, que tiveram os filhos: Aleixo, Ruth, Miriam, Paulo, Enilda, Daniel, Joel e Aracy.
A 11 de março de 1978, celebramos o casamento de Paulo
com Edemildes que tiveram os filhos Cesar, Paulo Junior,Fabiana e Mischadai;
A 01 de agosto
de 1978 celebramos a união de Aleixo e Onofra
que tiveram uma filha de nome Nubia;
A 14 de outubro
de 1978, celebramos o casamento de Ruth e João Moreira que tiveram os filhos Wagner, Válber
e Valeria;
A 08 de Fevereiro
de 1981, celebramos o casamento de
Enilda e Leopoldino que tiveram os filhos Shaday, Sergisval, Adline, Leonara e Osvaldo
Henrique;
A 06 de março de
1982 celebramos o casamento de Miriam e Dauto que tiveram os filhos Andre Luiz
e Ana Vitoria;
A 16 de junho de
1983 celebramos o casamento de Daniel e Aurinete que tiveram os filhos Rolf, Aleixo,
Danilo e Atos;
A 25 de fevereiro
de 1985 celebramos o casamento de Joel e Cleidemar que tiveram os filhos Karina
e Maxwel;
A 19 de agosto
de 1986 celebramos o casamento de Aracy e Carlão que tiveram os filhos Tiago,
Aline e Pablo;
A 25 de maio de
1988 celebramos o casamento de Aleixo e
Maria Zilda que tiveram os filhos, Agta e Jeissy;
A 30 de junho de 1999 celebramos a nova união
de Daniel e Mauricia que tiveram os
filhos Wolfgang, Daniela e Daniele, e
como filhos da esposa Inocêncio e Naiara;
Como resultado a
união de Joel e Cristiane tiveram os filhos Pedro e Marina;
Como resultado
da união de Joel e Raimunda tiveram um filho de nome Lucas;
A 10 de outubro
de 1999 celebramos a união de Aracy e
Lusemar que tiveram os filhos Mariana e João Victor;
A 23 de março de 2001 celebramos o casamento de
Miriam e Vilmar que tiveram os filhos Vilmar Jr e João Henrique;
A 17 de dezembro
de 2005 celebramos o casamento de Shaday e Nésio que tiveram um filho de
nome Leopoldino;
A 05 de Janeiro
de 2007 celebramos a união Paulo Jr. e Estefany que tiveram uma filha de nome Evelym
e outro filho de nome Murilo;
Como resultado
da união de Joel e Lucia tiveram um filho de nome João Pedro;
A 06 de outubro
de 2008 celebramos o casamento de Agta e Juliano que tiveram os ilhós Alberto
Henrique e Victor Hugo;
A 10 de outubro
de 2008 celebramos o casamento de Jeisse e Edimarcio que tiveram os filhos Grazieli e ..........?
A 16 de outubro
de 2008 celebramos o casamento de Fabiana e Amilton que tiveram os filhos Gabriel,
Gabriela e João Paulo;
Em 2006
celebramos o casamento de Rolf e Keissy que tiveram um filho de nome Gabriel;
Como resultado
da união de Sergisval e Elizangela tiveram
um filho de nome Gabriel;
A 06 de junho de 2009 celebramos o casamento de
Adline e Alan;
A 08 de setembro
de 2009 celebramos a nova união de Cesar e Elivam que tiveram uma filha de nome
Maria Vitoria;
Em Janeiro de
2009 celebramos a união de Válber e Maria
que tiveram um filho Carlos Eduardo;
Em novembro de 2009 celebramos a união de
Danilo e Rosie que tiveram os filhos Marco
Antonio......
Resultado; 02 –Dankmar e Maria- 08 (oito) filhos
24 noras e genros, w 37 netos (Recontar), Quase todos Mato-grossenses, Aleixo
Goiano (Ilha do Bananal) Aracy e Daniel
nasceram em Brasilia.
TITULOS
Wolfgang
Dankmar Gunther foi eleito Presidente
Seccional da Academia Municipal de Letras do Brasil para o Estado de Mato Grosso entre 20 de janeiro de
1988 a 31 de dezembro de 1988.
Wolfgang Dankmar
Gunther foi agraciado pela Assembléia Legislativa do Estado de Mato Grosso a 08
de maio de 2002 com o honroso titulo de “Cidadão Mato-grossense”. Pelos serviços
prestados ao Estado.
Wolfgang Dankmar
Gunther foi agraciado a 15 de dezembro de 2005, pela Assembléia Legislativa de
Mato Grosso com o titulo de “Monção de Louvor” pelos serviços prestados ao
Estado de Mato Grosso.
Wolfgang Dankmar
Gunther foi agraciado pela Câmara Municipal de
“Porto Alegre do Norte com o titulo de “Cidadão Porto-alegrensse’.
Maria Paciente Gunther foi agraciada a 07 de março de 2003 pela Câmara Municia de Porto Alegre com o titulo de “Cidadã Porto-alegrensse".
RAIZES...
Família de Eduardo Gomes Porto.
Pelos anos de 1930, nela estão meus avós com os filhos, e nora Da esquerda para direita:, Aracy Dias Porto, Maria José Pinheiro Porto, Olimpyo Dias Porto, Anagê Dias Porto, Marianna Dias Porto, Eduardo Gomes Porto, Eduardo ias Porto e Oscar Dias Porto. (Fonte: arquivo pessoal Márcio Eduardo). Blog da família de Roberto Sandoval
Reunião da Família Gunther
Agora, em Março de 2021 todos meus oito filhos ainda estão todos vivos, a saber:
Aleixo continua casado com Maria Zilda e suas duas filhas se casaram e têm três netos, ela é Professora e ele Corretor de Imóveis, vivem razoavelmente bem.
Ruth se recuperou parcialmente do acidente em Brasília, é funcionária publica na administração escolar aposentada, ele João Moreira, aposentado, pedreiro e carpinteiro, continuam casados, tem três filhos e quatro netos e vivem razoavelmente bem.
Paulo trabalha em serviços gerais sua especialidade é caminhões trucados com carretas continua casado com Edemildes e tem três filhos todos casados que lhes deram seis netos.
Miriam se formou em Letras e é Missionária Evangélica da Assembléia de Deus e seu esposo é Professor de Letras e sargento aposentado da aeronáutica e Advogado, tem um filho, André, formado em dentista cirurgião, e uma linda filha chamada Vitoria, os dois têm um bom patrimônio e vivem consideravelmente bem.
Enilda Aposentou-se como funcionária publica exercendo o cargo de Escrivã de Policia, quatro filhos todos casados e cinco netos, 2 filhos estudando e em véspera de se formarem para Advocacia, uma filha é doutora em enfermagem e outra é concursada na Justiça, vivem relativamente bem, Atualmente reside em Luciara e pretende ser fazendeira;
Daniel é o mais humilde o mais sofredor, mas também o mais Feliz de todos, ultimamente casado com Mauricia tem ao todo quatro filhos seus e dois de sua mulher, dois de seus filhos, a saber, Atos o mais novo morreu atropelado por um caminhão e um dos mais velhos o Aleixo foi barbaramente assassinado sem motivo algum, mas continua como pescador profissional, adora a vida simples que leva, mora em Luciara onde é pastor de uma igreja, tem uma boa casa, um barco com motor e uma caminhonete, vive regularmente bem;
Joel A vários anos se encontra casado com Lucia que é proprietária de uma Loja de Material para construção e de uma Universidade UNOPAR, tem um filho de nome João Pedro vivem regularmente bem. Do primeiro casamento com Cleide Moura tem dois filhos de nomes Maxwell e Karina que vivem em Uberlândia. Com outra mulher de nome Cristiane teve dois filhos de nomes Pedro e Marina, que moram em Monte Negro RS. Finalmente teve algures mais um filho com o nome de Lucas. Foi Presidente do Sindicato Rural de Porto Alegre do Norte MT e também Vereador com segundo mandato, tem propriedades e ranchos de pescaria e vivem relativamente muito bem;
Maria Aracy: Seu primeiro casamento foi com Antonio Carlos da Silva Arantes, teve três filhos de nomes Thiago, Aline e Pablo já formados em Agronomia, Dentista e Engenharia Elétrica, Carlão tem um emprego solido e vivem razoavelmente bem. Divorciou-se e casou-se com Lusemar que era repórter de TV, adotou uma filha com apenas quatro anos de nome Mariana. Ela é formada em Administração de Empresa. Seu casamento pouco durou, se divorciou. Atualmente se encontra casada com Wendel Oliveira empresario no ramo de Ar condicionado, tem residencia fixa na cidade de Agua Boa, vivem razoavelmente bem. Eventualmente passam pequenas temporadas em Porto Alegre do Norte.
Dankmar, Há quatorze anos vivo sozinho amargurando e remoendo minha tristeza, não fosse pelos filhos, netas ou netos que vêm me visitar, as filhas são mais assíduas de quando em vez uma aparece, tanto a Miriam, como a Aracy, a Ruth e a Enilda periodicamente me dão a alegria de vê-las, mas as minhas netas quase todas estão casadas e tem suas casas e suas obrigações, o que dificulta me visitarem, Leonara nunca deixou de me visitar ou ligar , mas ultimamente não tem aparecido, mas quando vem traz sempre a sua agradável presença e com muito carinho. Os filhos homens? Eu estou só um pouco triste com eles, o Joel o por ser caçula dos homens o que eu mais gostava entre eles, hoje, dificilmente vem conversar comigo, mas ele sempre foi assim, ele é destes que gosta calado, a esposa dele é muito gentil, o Aleixo por ser o mais velho e com menos recurso ao menos não se esquece de me ligar e perguntar como eu estou e sempre me oferece a casa dele para morar.e me liga todo dia “Vem almoçar” O Daniel mora em Luciara e nem telefone lá tinha, mas é o mais humilde deles, a mesma coisa acontece com o Paulo que tem problemas de todos os tamanhos, mas não ligam em me procurar, e, eu que fui amigo de Presidentes da Republica, de Senadores e Deputados, fui agraciado pela Assembléia Legislativa do Estado de Mato Grosso com o Titulo de “Cidadão Mato-grossense” Servi nove anos na Fundação Brasil Central, junto com meus amigos Villas Boas, servi por oito anos a Justiça do Estado de Mato Grosso e por doze anos na Prefeitura Municipal de Luciara em MT. Não consegui me aposentar pelos meus anos de serviços prestados, apenas me aposentei como “Por idade” com um salário mínimo, finalmente virei escritor e já escrevi cerca de quatorze livretos e livros, inclusive este. Continuo prestando serviços de declarações rurais a muitos proprietários e isto me dá uma margem de vida melhor. Eu e minha esposa pensávamos em nos mudar para a minha terra natal São Jose do Rio Pardo no Estado de São Paulo, mas não daria certo ela morreria de saudades dos filhos e agora é que não dá mais. O jeito é amargar minha solidão que vem empurrada pela saudade que ainda traz de tiracolo a tristeza. Agora para passar o tempo enquanto aguardo a minha partida estou me alternando entre a paleontologia e escritor.
É...Deus só fez uma Maria Paciente, o jeito é aguentar o tranco.
&
Aos meus filhos, netos e netas, bisnetos, bisnetas, tataranetos e tataranetas, noras e genros, muito agradecido por estarem cuidando de mim, todos sem diferença tem sido bons, humildes e atenciosos. Que Deus lhes proporcione uma vida justa em acordo com os seus méritos. –
Obrigado. 25 de novembro de 2011.
Dankmar
Á minha família... E a meus amigos...
Eu Dedico este livro...
Aos meus familiares: aos meus avôs Otto Hornschuch e Maria Wulfing Hornschuch, Eduardo Gomes Porto e Mariana Dias Porto, meu sogro Aleixo Paciente da Silva e sua esposa Joaninha da Silva Leite, meu pai Rolf e minha mãe Aracy, meu irmão Rolf e sua esposa Gersina e filha, minha mana Aracy e seu esposo Artur, seus filhos Eunice, Eduardo e Artur, e, especialmente a minha saudosa e falecida esposa Maria Paciente e meus filhos Aleixo, Ruth, Paulo, Miriam, Enilda, Daniel, Joel e Aracy, Mariano Paciente e sua esposa e filhos, aos meus especiais amigos Lucio Pereira Luz, Jose Liton, José Célio Pinheiro Luz, Osvaldo Guimarães (o paulista), Senador Jonas Pinheiro, os irmãos Villas Boas, Ismael Leitão e sua esposa Dona Sara, Wilson Adão Pereira das Neves (Tampinha), João Ferreira dos Santos, Pastor Natanael, Olentino Martins Fontes, Omar Fontes, Dr. Amaury Fontes, Flavio José Bertin, Ismael Ferreira Martins, Edi Escorsin e sua esposa Joaninha e seus filhos, Antonio Boca Rica, Rubens Badaró, Jose Pina Ferreira Sobrinho e aos meus amigos na infância: Sergio, Flavinho, Toninho, Batata, e meus companheiros:. Da Federação da Agricultura: Zeca D’Ávila, Antonio Carlos Carvalho de Souza, Eduardo A. Ferreira Neto, Edson Andrade, Miguel Chamas, Rui Otoni Prado, Normando, Dr. Luiz Alfeu, Doutor (as) Elizete e Nani, Benedito, Zelma, Helen, Cícero, João, Rosangela, Diana, Natalina e filha, e todos demais servidores; Meus netos e netas: Miriam, Wagner, Válber, Valeria, Chaday, Sergisval, Adline, Leonara, André, Henrique, Pablo, Tiago, Aline, Karina, Maxwell, Agta, Núbia, Jeissy, Fabiana, César, Paulo Jr., Rolf, Aleixo, Danilo, Atos, Wolfgang, Daniela, Inocêncio, Naiara, Lucas, Pedro e Marina, Mariana, João Pedro. Minhas noras, cunhadas (os) e genros: Artur, Lucia, Aurinete, Maria Zilda, Cleidemar, Cristiane, Mauricia, Edemildes, Noemi (e seus filhos Noely, Leopoldo, Leodilce, Leonilda, Liton jr. e Welignton) e Raimunda, Geronima e Horacio; Mariano e Antonia e seus filhos Juscelino, Edivon, Waldyr, Florismom e Joaninha; Dauto, João Moreira, Carlão, Lusemar e Leopoldino, Vilmar Aquino, A meus. Bisnetos e bisnetas... (Bia) Gabriel, Gabriela e João Paulo; (Mirian) Wilmar Filho e João Henrique; (Wagner) Julio César; (Válber) Carlos Eduardo, (César) Natiele; (Junior) Evelyn e Murilo, (Sergisval) Gabriel; (Núbia) Victor, Aleixo e Monique; (Agta) Alberto Henrique e Victor Hugo, (Jeissy) Grazielly Antonia; (Rolf) Paula Eduarda; (Shaday) Leopoldino; A meus primos (as) e sobrinhos (as): Nadir, Nilton (o infante caçador de jacarés), Lucy, Lourdinha, Adelaide, Eduardo, Artur, Eunice, Elizabeth, Cacaio, Batista, Duda, Totó, Walter, Zezé, Terezinha; Meus consangüíneos e relativos por parte de meu Pai: Os meus tios e tias, primos e primas: Max e Elfriede tiveram os filhos Ricardo, Manfred e Liliana; Maria e Lucio não tiveram filhos; Teodoro casou-se com Greta e tiveram os filhos Teodoro, Erica e Ingrid; Rolf casou-se com Aracy e tiveram os filhos Rolf, Wolfgang Dankmar e Aracy; Elizabeth casou-se com Castro Torres e tiveram os filhos Nadir, Blanchard Elizinha e Nilton, Nadir teve dois filhos, Maria das Graças, Manfred casou-se com Luiza a sua primeira esposa e tiveram os filhos Samantha e Christian, e com a segunda esposa Nancy teve três filhos Thomas, Oliver e Nicolas; Lilian casou-se com Andrés e tiveram um filho Alan; Ricardo casou-se com Maura e tiveram um filho Leandro; Elizinha teve três filhos: Sandra, Marcos e Soraya e estão todos casados; Nilton, ainda solteiro, teve uma filha, casou-se e atualmente vive com a esposa no Rio de Janeiro. Meus consangüíneos e relativos por parte de minha mãe: Tios, tias, primos e primas: Manoel Alcindo Porto casou-se com Cacilda e tiveram os filhos Milton, Maria Cecília, Maria Helena, Dulce, Adelaide, Guiomar; Alfredo Dias Porto nasceu em 1886;; João Dias Porto (Joãozinho) casou-se com Olímpia e não tiveram filhos; Olimpio Dias Porto casou-se com e Maria Pinheiro e tiveram os filhos Luiz Antonio (Totó) e Eduardo (Duda), Jovita Dias Porto casou-se com Jose Junqueira e tiveram os filhos: Maria de Lourdes, Odila, Walfrido e Jovita; Doutor Oscar Dias Porto teve duas filhas Lourdes e Regina Helena e depois no segundo casamento teve os filhos, Clodoaldo, Elba, Eduardo, Oscar, Mariana, Caio, João Neves, Oxforde, Amilcar e Ana Amélia; José Dias Porto, casou-se com Maria José de Andrade (Tia Sinhá) teve filhos: Maria Aparecida, Walter, Eduardo, Doroty, José, Ruth e Geni; Eudoxia Dias Porto teve os seguintes filhos: Maria Carolina, José, João, Pedro José, Viridiana, Jacy, Otacílio, Zelinda, Antonio de Pádua e Sibel; Celisa Dias Porto (solitária, morreu assassinada em sua casa em São Paulo); Maria Dias Porto teve os filhos Teresinha, Vicente Luiz, João Batista e Jose Carlos; Vital Dias Porto teve um casal de filhos, Marina e Antonio; Nagib Dias Porto; Eduardo Dias Porto (Dadinho) teve s filhos:Adelaide e Vera Lucia; Jacy; Anagê; Aristides; Minha mãe Aracy Dias (Gomes) Porto casou-se com Rolf Hornschuch e tiveram os filhos Rolf, Dankmar e Aracy...
Aos que já se foram e aos que ainda todos estão por ai, e a aqueles que estão por vir, eu dedico com amor esta história de vida é Ele e são estes as principais peças neste jogo maravilhoso em que nosso parceiro é Jesus Cristo o Filho de Deus como parte integrante de nossa família.
* “Deus abençoe a todos”.*
Wolfgang Dankmar Gunther Hornschuch
Bibliografia. Blog Família Gomes Porto-Roberto Sandoval.
Pgs. 164, 166 e 169 ..pesquisas Internet
Outras fotos de arquivo próprio
Fotos / Histórico da família Hornschuch elaborado por Ricardo Fuchs
Autor: Wolfgang Dankmar Gunther Hornschuch
Porto Alegre do Norte MT. Em 25 de novembro de 2011
Cel. 66 84 07 11 93
FIM
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