Preferiram o opróbrio de Cristo a riquezas e ouros.
Moção de louvor...
Aos 47 mártires que com ardor se dedicaram ao trabalho evangélico com firme propósito e deram suas vidas para comunhão dos índios e humildes a estes nós dedicamos este livro para que seus nomes sejam lembrados e fiquem gravados como parceiros de Cristo levando em seus corações a epístola ardente da fé: “Por que buscais a tantos quando há só UM a ser encontrado?”
·
Padre
João Fuchs.
·
Padre
Pedro Sacilotti.
·
Coadjutor
Pelegrino.
·
Bispo
Dom Pedro Maria Casaldaliga Plá.
·
Padre
João Bosco Burnier.
·
Padre
Francisco Jaques Jentel.
·
Padre
Rodolfo Lukenbeim.
·
Padre
Dom Inácio de Azevedo*
·
Padre
Diogo de Andrade*
Mais
38 irmãos* jogados ao mar. pgs 85*.
Introdução...
OBRIGADO SENHOR...
Escrever este livro me parecia algo difícil e muito distante, mas agora ele está pronto. Durante este trabalho eu implorava a ajuda do Nosso Pai, e, em muitos momentos eu a senti me confortando especialmente nas horas mais difíceis afastando de mim o cansaço e o desanimo que tentavam me abater. Finalmente o terminei, não com meu único esforço, mas com o apoio de Deus. A Ti Meu Senhor, eu agradeço de coração.
O autor.
2 Timóteo 3.16.- “Toda escritura divinamente inspirada é proveitosa para ensinar, para redarguir, para corrigir, para instruir justiça”.
*
Revoltas Ambíguas
Baixo e médio rio Araguaia.
O eixo central Brasil se revolta.
Chacina no rio das Mortes -1934
Guerrilhado Araguaia 1967 a
1973.
História de Sta.Terezinha 1954 a 1974.
Assassinato em Meirure
MT.......05/07/1976.
Assassinato em Cascalheira MT.......
11/10/1976.
Assassinato
em Porto Alegre do Norte MT.17/12/1979.
Posto
da Mata –conflito e
violência 2012/2013/2014.
Quarenta Missionários Jesuítas foram assassinados e
jogados ao mar por corsários franceses
em 07-1570.
*
Conceito...teónaturalis...
*São três as etapas intercaladas a serem
percorridas pelo Espirito humano: “O teológico”-Agir com afeição e pensar
para agir; “O metafísico”- Deduzir
para Induzir a fim de instruir; e “O Positivo”-Saber, prever e prover
corretamente. (wdgh-2013).
...Navegando nas memórias...
É
essa é a minha missão.
B.G
20/02/2014 –Wolfgang Dankmar Gunther.
&
Recordando o histórico de cada
Padre, do Coadjutor e do Bispo, levamos em conta as suas vidas e suas missões.
São
estes, os mais humildes serviçais da fé que preferiram “o opróbrio de Cristo a
riquezas e ouros”, que deixaram escritos com sangue a sua trajetória, assim
como Cristo, a que vieram neste nosso
planeta terra;
Padre João Fuchs – Trucidado
pelos índios Xavantes em 1934.
Padre Pedro Sacilotti-Trucidado
pelos índios Xavantes em 1934.
Coadjutor José Pellegrino –
faleceu em Araguaiana 21.05.1934.
Padre Francisco Jentel– Morreu
vitima sangramento interno 1973.
Padre Rodolfo Lunkenbein -
Assassinado em Meirure em 1976.
Padre João Bosco Burnier –
Assassinado em Cascalheira em 1976.
Bispo D. Pedro M. Casaldaliga
Plá- faleceu S. F. Araguaia 2020.
Quarenta Jesuítas foram
assassinados e jogados ao mar em 1570.
§
BL 01...
Chacina no rio das Mortes-1934.
O Pe. João Fuchs
nasceu em 1880 em Plaffnau no Cantão de Lucerna na Suíça alemã, sendo filho de
Francisco e de Anna Meyer. Quase nada sabemos de sua primeira juventude, mas o
sentimento católico devia ser bem vivo na família se, além do filho missionário
todas as filhas nutriram para com as missões o mais profundo amor consagrando a
elas sua atividade e enviando anualmente valiosos auxílios espirituais e
materiais para os missionários.
Pe.
Pedro Sacilotti nascido em Cannes (S. Paulo) em 1898 era brasileiro, filho de
Antônio e de Genoveffa, vênetos, que transmitiram ao filho as qualidades
típicas da família italiana: fé profunda, amor ao trabalho e ao sacrifício, com
coragem indômita para arrostar as dificuldades. Em 1915 entrou no Aspirantado
de Lavrinhas e após o curso filosófico e o tirocínio prático foi enviado a
Turim (Crocetta) onde se ordenou Padre em 1925. De grande humildade e profundo
respeito para com os Superiores, receiava que o defeito da gaguice lhe
impedisse a realização do sonho de ser um dia sacerdote e missionário; nada
disso. Pois Deus lhe concedeu ser Padre salesiano e missionário, logo que ele
voltou ao Brasil.
Coadjutor
José Pellegrino nasceu em Benevagienna (Mondoví-Itália), filho de Giovanni e de
Caterina Gallo, a 20 de agosto de 1880. E faleceu em 1934.
Compilações....
O Pe. Sacilloti e o Pe. João Fuchs tinha suas desobrigas estendidas de Araguaiana no rio Araguaia por este abaixo até Mato Verde e depois subiam o rio até a embocadura com o rio da Mortes e por este adentro até Sta. Terezinha já no alto Rio da Mortes ou rio Manso e vice versa.
Mato Verde era uma pequena vila a beira rio que havia sido habitada por Lucio Pereira Luz e mais uma boa leva de lavradores e vaqueiros, em maio de 1934, a vila ficava apenas a uns dois mil metros do Morro dos Padres na mesma margem. Os dois padres tinham por companhia um Bororo Luiz que era o motorista e piloto de sua embarcação, e vez por outra a presença do Coadjutor Pellegrino. Que foi vitima de uma devastadora chaga que o vitimou. Lembro ainda que haja muitos anos atrás eu escutei por varias vezes e por vários índios Karajas da aldeia de Santa Izabel, contarem que não dormiam nas praias do rio das Mortes porque ela causava feridas nas peles como queimaduras e muitas bolhas nas costas e pernas. Por algumas vezes, anos depois, vinham aviões”Catalina” anfíbios de dois motores, da charqueada de Araguacema TO, e ali pousavam e enchiam sacos de areia e decolava para o exterior. Falava-se em areia monazítica.
“1934
— O primeiro mês de 1934 continuou com os nossos em Mato Verde na evangelização
dos Carajás da margem esquerda. Pelo fim
do mês por ordem dos Superiores, voltaram a Araguaiana para um descanso. Aos 30
de setembro decidiram descer até Mato Verde, na frente da ilha Bananal, onde
num alto barranco construíram um rancho e foi inaugurada a nova Missão de S.
Francisco Xavier assistindo à Missa um bom grupo de índios Carajás”. (o
grifo é nosso). Noticiaram-se, naquela oportunidade que 34 dias após as mortes
dos padres, outros salesianos vindos de Araguaiana oficiaram a nova Missão
dando assim prosseguimento aos trabalhos dos padres sacrificados.
RETROAGINDO..No tempo...
“Os
Xavantes depois da primeira pacificação pelo exercito ainda em Goiás, desde
1775 viram-se diminuindo a tal ponto que fugiram atravessando o rio Araguaia na barra do rio
das Mortes, onde se fixaram a esquerda
do rio das Mortes desde 1840
rejeitando qualquer tentativa de aproximação. Quando os Pe. João Fuchs e
Pedro Sacilotti, tentaram se aproximar
dos Xavantes foram trucidados”.
Assim se passaram os fatos:
* “01 de Novembro de 1934” — Festa de todos
os Santos foi o dia glorioso da morte dos nossos dois heróis. Na embarcação que
descia de Sta. Teresinha no rio das Mortes eram sete pessoas: os dois Padres, o
bororo Luis motorista, Militão Soares de Cocalinho, Nestor Coelho do Maranhão,
o garimpeiro holandês João Schiller e o moço Serafim Marques de Araguaiana.
Bordejando rio abaixo, eis que pelas 3 horas da tarde, o
moço Serafim entreviu na margem direita dois Xavantes parados, em observação.
Padre Sacilotti e o bororo Luis saltaram na ubá que levavam consigo e
encostaram, enquanto a lancha descia lenta no meio do rio com o motor apagado. O barranco da
margem era íngreme e muito alto: trepando com as mãos e pés chegaram em cima;
ninguém! Avançando um pouco subiram numa árvore e de lá descortinaram à
distância de cem metros na orla da floresta uns 50 Índios escondidos na
folhagem.
Pe. Sacilotti chamou então os demais que viessem. Avançaram
os dois Padres e o bororo; chegados bem perto. Pe. Sacilotti falou aos Índios
em Karajá, mas eles responderam em tom ameaçador. Então Pe. Sacilotti
virando-se pediu aos companheiros que trouxessem os presentes. Militão, Nestor,
e Luis voltaram à embarcação, enquanto o holandês, que não tinha entendido,
continuou a avançar.
Quase no mesmo instante ecoou o grito de P.
Sacilotti “Os Xavantes atacam!” O que aconteceu naqueles momentos ninguém viu,
mas é certo que os dois Padres desde muitos meses previam a hora do sacrifício
e serenamente o enfrentaram: sine sanguinis effusione non fit remissio!
Os camaradas fugiram desabaladamente,
enquanto entre os gritos dos selvagens sibilavam os cacetes e as bordunas.
Chegados à lancha, o holandês armou-se de sua “Winchester”automática e encostou
outra vez no barranco chamando forte “Padre Sacilotti, Padre Fuchs!”; fora do
éco, silêncio absoluto.
Não avançou por estar sozinho e porque
começava a anoitecer; chamou os demais, mas estes se recusaram pela escuridão.
Bem lembrado da recomendação do Padre, não atirou nem quando lhe pareceu que
passassem perto duas sombras; ficaram toda a noite ancorados no meio do rio; no
dia seguinte exploraram o terreno; a uns 500 metros do barranco encontraram os
dois cadáveres, um junto do outro, ambos com o crânio fraturado.
Transportados na margem, foram enterrados à
beira do rio a meio metro de distância e foi levantada uma cruz, sinal de nossa
redenção. Terminada a cerimônia, o bororo se ajoelhou imitado pelos demais, e
rezaram uma Ave Maria, para o descanso eterno dos dois Padres, imolados para a
conversão dos Índios Xavantes. “Meses depois os restos mortais foram
transportados a Araguaiana no cemitério que já acolhia os despojos de
Pellegrino: lá foi construída uma decorosa capela para lembrar aos fiéis os
heróicos missionários dos Xavantes”. Ainda hoje, no rio das Mortes, um pouco acima
de São Felix do Araguaia existe a barreira chamada “Barreira dos Padres”, e, em
Luciara, “Morro dos Padres”, Hoje a aldeia indígena Karaja.
José Pellegrino tinha nascido em Benevagienna (Mondoví-Itália),
filho de Giovanni e de Caterina Gallo, a 20 de agosto de 1880. Quando em 1903
Malan foi à Itália o nosso Pellegrino fez parte da comitiva que veiu naquele
ano a Mato Grosso; trabalhou em várias casas até que em 1916 foi destinado à
nova casa de Araguaiana como cozinheiro. Lá ficou todo o restante da vida por
17 anos, amando grandemente aquela casa que para ele era tudo.
Quem conheceu Pellegrino, dificilmente
refreia um sorriso pensando no seu temperamento tipicamente cômico, que
espalhou alegria não só no palco dos nossos teatrinhos, mas em toda parte.
Poderia estar na galeria das figuras mais expressivas dos “Fioretti di S.
Francesco”. Magro e pequeno, com boca larga e queixo pontudo, de frente era
ele; de perfil era outro: no palco era um cômico irresistível. Nunca teria
imaginado uma obediência para o rio das Mortes, mas quando partiu Pe.
Sacilotti, ele recebeu ordem de segui-lo.
De físico fraco e raquítico, ficou no momento perturbado e interdito, mas não hesitou em dar seu Fiat. Em Sta. Teresinha foi o factótum do humilde rancho: ele nas breves excursões acompanhou os Padres, apesar de que o caminhar fosse para ele um tormento pelo defeito dos pés chatos e muito longos (sesquipedes). Não tardaram a abrir-se úlceras e feridas que pela alimentação insuficiente e sempre a mesma, se alastraram, dando-lhe uma coceira contínua em todo o corpo. Queixava-se então “do prurido de reforma” que se sentia no rio das Mortes: o calor dilatou sempre mais as feridas e começaram a pulular os vermes; todavia ele continuou sereno seu trabalho caseiro, sempre fervoroso mortificado e alegre. A gangrena avançou e com ela o mau cheiro nauseante. A 19 de abril de 34 abandonou S.ta. Teresinha e foi a cavalo, mas pelos freqüentes desmaios foi transportado numa rede; de Cocalinho subiu de canoa até Araguaiana. Chuvas torrenciais de horas a fio ameaçaram sufocar a pequena comitiva. Mas a força indômita de Pe. Sacilotti fez com que, finalmente, a 4 de maio aportassem a Araguaiana. Pe. Sacilotti parecia um cadáver pelas longas e pesadas febres, mas recuperou em breve as forças; Pellegrino era uma só chaga, mas não lhe faltava a força do bom humor dizendo que “era tão simpático que o rio das Mortes o tinha repelido horrorizado”. Os vermes multiplicando-se, apesar de todos os curativos, roeram aquele corpo em decomposição, mas ele continuou sereno. Quando lhe anunciaram próximo o fim “Finalmente” exclamou, e morreu plácido, com os Santos Sacramentos, como morre o justo. Morreu a 21 de maio de 1934 em Araguaiana MT e foi enterrado e posteriormente juntou-se a ele, ao lado, o Pe. João Fuchs e Pe. Pedro Sacilotti.
BL 02 ... * Um Frances no Brasil. .
Padre François Jaques Jentel
.“Era apenas um homem comum dotado da sabedoria de Deus”. Conhecido pelos índios como Padre Pranxico.Raízes deste episódio 1910 a 1974.
Navegando nas memórias...
*Tudo começou em... 1910...26...35...47..50..52..54..64..até..1974..
...
com a penetração do rio Araguaia pelas frentes colonizadoras, em meados do
século XIX, pequenas cidades ribeirinhas foram sendo criadas e povoadas por
migrantes vindos do nordeste brasileiro. O rio Tapirape então passou a ser
explorado e uma expedição que estava à procura de caucho (um tipo de seringa)
chegou até aos Tapirapé por volta 1910
causando-lhes grandes perdas populacionais *Mas o que mais agravou a vida dos
Tapirape foram os ataques dos guerreiros Kaiapos contra a aldeia Tapirapé de Tapi-itãwa e raptavam as
crianças e as mulheres e lhes incendiavam as casas.
Em agosto de 1926 chegaram à barra do rio Tapirapé com o rio Araguaia, na divisa do Estado de Mato Grosso e Ilha do Bananal no Estado de Goiás (hoje Tocantins), o pioneiro Pio José Pinheiro e sua esposa dona Inês, com eles vieram Sebastião Pereira e outros, no inicio se instalaram junto ao morro da barra, mas a grande enchente do ano de um mil novecentos e vinte e seis fizeram com que na junção dos rios Tapirapés e Araguaia a água corresse entre os morros vazando por dentro e os obrigaram a se mudar e, então habitaram ás margens do lago Tapirapé.
Na
primeira visita em 1935 de Baldus (Herbert Baldus Antropólogo
teuto-brasileiro) a região os índios Tapirape somavam a 130 pessoas e, 12 anos mais tarde, em 1947 havia somente 59
Tapirape.
Depois de um destes ataques
ocorridos em 1947 pelos índios Kaiapós
a população Tapirapés se dispersou, uma parte dos sobreviventes foi acolhida
pelo pioneiro da região Lucio Pereira Luz. E posteriormente foram
recambiados pelo SPI para a aldeia “Orokotâwa”
(Aldeia do Urucum) dos Índios Tapirapés.
Onde mais tarde, em 1950 se
formou um grande mangueiral.
Anos de 1950 - Ali, no Estado de Mato Grosso, na barra do rio Tapirapé com
o rio Araguaia, entre dois morros ficavam as aldeias “Itxala” dos índios Karajás na margem do Araguaia e a aldeia
dos índios Tapirapé a beira do lago Tapirapé, distante uma da outra não mais do
que dois quilômetros.
Em 1952 chegaram as Irmãzinhas de Jesus e encontraram apenas 47 índios Tapirapés doentes de sarampo
e pneumonia.
*Em 1954 chegou o Padre François Jaques Jentel que ficou conhecido como
Padre Francisco, ou Chico ou ainda Pranxinko, como era chamado pelos índios
Tapirapé.
Contornando
o varjão da beira do lago chegava-se um vastíssimo mangueiral onde ficava a
aldeia dos índios Tapirapé e ali residia o Padre François Jaques Jentel, mais
conhecido por padre Chico, o Padre Focault que permaneceu por longo tempo e as
três freiras irmãzinhas de Jesus. Vez por outra, quase no final da história, aparecia
uma missionária francesinha de nome Denise.
Entre
as duas aldeias morava a já comentada pioneira e antiga moradora que ali havia
chegado com sua família em 1926 a Dona Inês Pinheiro e suas filhas Luciana e
Natividade, e seu marido Chico, e seus filhos João Pinheiro e Oleriano e a
filha mais velha Raimunda e o caçula da
família José Célio.
Entre as duas aldeias morava
a já comentada pioneira e antiga moradora que ali havia chegado com sua família
em 1926 a Dona Inês Pinheiro.
O nome era o Posto Indígena Heloisa Alberto Torres
e o negro Valentin Gomes e sua esposa Joaninha eram os encarregados. (eram dois
paus de bater em doido)-(muito ativos) - ditado popular.
. *
1972
a 1974 – períodos de conturbação social
* Foi na vigília de Natal de 1954 que o Pe. Francisco Jentel chegou, pela
primeira vez, ao pequeno povoado de Furo de Pedras, ás margens do rio Araguaia.
Apresentou-se discretamente àquela comunidade de pobres lavradores, na hora em
que estavam reunidos para celebrar a boa nova do nascimento de Jesus. Com eles
rezou a missa. No dia seguinte, 25 de dezembro, Pe. Chico chegou à aldeia
Tapirape. Os índios estavam muito reduzidos em numero, dizimados pelas doenças
e desnutrição. Com eles já estavam às irmãzinhas de Jesus, concretizando o
projeto de convivência na plena comunhão de vida e situação. O primeiro ato do
Pe. Jentel foi celebrar o Natal com os índios e as irmãzinhas. E lá ficou
morando e era chamado de Pranxiko e tinha 32 anos de idade e não falava nada em
português, mas cedo aprendeu ambas as línguas inclusive Tapirapé. Etc.etc.*
Aquele homem magro, de andar ligeiro, queimado de sol e simples como um peão do trecho era o Padre Chico e aquelas três mulheres, eram as irmãzinhas de Jesus, freiras abnegadas que dedicavam junto com os Padres suas vidas aos índios Tapirapés e Karajás, eram educadas como uma flor e humildes como só os simples sabem ser e na ajuda o pobre e bondoso Padre Focault.
As
três casas, duas, eram de pau a pique e outra de madeira, todas cobertas de
palha, eram a igreja e duas residências, sendo que uma servia de ambulatório e
dormida das irmãzinhas e da francesinha Denise, e a outra para os dois padres,
isto quando Focault ou outro aparecia. Nos fundos um galinheiro e dois
canteiros de verduras, destes feitos com forquilhas e suspensos.
No ar, uma tranqüilidade
incrível, parecia que o resto do mundo nunca existia ali tudo cheirava a amor,
carinho e abnegação, ali naquele saudoso recanto até os pássaros alegres viviam
a festejar aquela benção divina, nunca mais senti um torpor tão maravilhoso em
minha vida como aquele ali.
Como
eu havia dormido na casa de Dona Inês, ainda estava cedo para fazer uma visita
a meu amigo, mas, ali estava eu.
--Padre...
--Dankmar, que surpresa
agradável, vai entrando, irmãzinhas olhem quem esta aqui?
--Bom dia seu
Dankmar – cumprimentaram a três de uma só vez e muito alegres.
--Como vão às coisas por aqui
Padre?
--Com
exceção do caso da família do Valentim que quase morrem envenenados pela
própria filha, o resto esta bem, mas fiquei sabendo de algo de anormal lá por
”Saint Terezin”, mas vou lá hoje ver o que esta acontecendo.
--È,
eu fiquei sabendo o caso do Valentim, mas eles já estão recuperados graças a
Deus, eu vim aqui para conversar um pouco contigo sobre os acontecimentos em
Santa Terezinha e se possível irei junto.
--Esta
bem. Se não sairmos hoje, amanhã cedo o faremos, nos vamos por terra, e é
longe.
--Melhor, assim dá tempo de
conversarmos a vontade e eu queria falar com o Pranchui, sei que ele tem uma
historia bonita sobre a igreja de Pedra e eu quero ouvir dele mesmo.
--Denise chame o Pranchui - pediu
o Padre a uma francesinha de fazer inveja a qualquer top model – não era freira
era apenas uma agente pastoral, mas que agente!
--Enquanto
conversamos as irmãzinhas vão fazer um almoço bem cedo e você fica conosco.
Pranchui, o índio Tapirapés
acabava de chegar e nos cumprimentou.
--Agora que o índio chegou padre
eu tenho uma noticia para você, o Liton esteve voando lá por Santa Terezinha e
me disse que tem uns aviões grandes trazendo gente e falam que são os donos
daquelas terras?
--Então
é isto, mas é impossível aquela terra é da Prelazia de Conceição do Araguaia,
mas eu vou lá ver isto, Pranchui mostre ao Dankmar a sua pedra.
--Aqui esta seu Dequimá, veja que
beleza - disse o índio tirando uma pedra de cristal de sua sacola de couro de
anta junto com outros apetrechos, um pedaço de lima, uma ponta de chifre, cheia
de algodão queimado e a pequena pedra de cristal, admirei a beleza da mesma,
pura e sem uma rachadura, limpa mesmo.
--Aonde a encontrou – perguntei
--Lá no pé da Serra do Roncador, a serra desbarrancou e uma pedra muito grande rolou e enganchou em uma arvore, a pedra é da minha altura e muito bonita a gente pode ver a cara da gente dentro dela e eu peguei este pedaço pequeno que estava no chão, eu a uso para tirar fogo. Assim quer ver? Segurou a pedra entre os dedos da mão esquerda colocando por baixo o algodão dentro da palma da mão a ponta de chifre e com a mão direita riscou a pedra com o pedaço de lima, uma centelha de fogo caiu dentro do chumaço de algodão, soprou a seguir criando uma pequena brasa, que logo passou fogo para uma palha de milho seca.
--Muito bom mesmo, mas fica muito
longe daqui?
--Quatro dias de viajem é perto a
Igreja de Pedra.
--Conte
como é esta igreja de pedra eu quero ouvir de sua boca, o negro Valentim já me
a contou, mas por alto.
--Lá
na serra, existe um paredão cheio de buraco, lá aonde o vento assobia parece
janela e porta, e em cima de uma porta tem umas coisas escritas que eu não sei
o que é?
--Porque
chamam igreja de pedra?
--Porque o escrito de cima da
portas parece escrito de padre, um dia eu levo vocês lá, agora não os Caiapós
estão andando lá e tem roça deles lá perto, um dia eu levo vocês lá, agora não.
--Vamos
combinar para a minha próxima viagem? Está certo?
--Eu também irei – remendou o
padre.
Aproveitei
fui visitar a família do negro Valentim que estava muito fraca e se recuperando
da tragédia do envenenamento, João Pinheiro me emprestou uma égua arriada para
a viagem e voltei bem cedo do outro dia para a Aldeia Tapirapés.
O Padre Jentel já estava de pé.
--Vamos
tomar um lanche e seguir viajem Dankmar.
--Mas
aonde esta o seu animal? Você vai a pé?
--Vou
sim desça logo.
Desci,
tomei um lanche rápido e montei e o padre Chico já estava andando no rumo da
trilha e eu o segui e lá se fomos nós, o Padre ia à frente de mochila nas
costas e marcando o caminho e com sua sandália de látex ponteava o trilheiro.
Francamente nunca vi ninguém andar tão ligeiro, às vezes eu tinha que trotar a
égua para acompanhá-lo. Quase matou a égua de cansada. Chegamos a Santa
Terezinha já era tardinha, o Padre parecia que nem tinha andado e a égua quase
chega empurrada, afinal eram sete léguas ou 42 quilômetros como quiserem e no
meio de trilha e arbustos misturados com lagos, pantanais e areões um verdadeiro
rálly.
Mas estavam para começar as
modificações, e o Padre Chico viu isto assim que chegamos a Santa
Terezinha.
Ali
em cima daqueles morros de areia os casarões construídos pelos padres da então
Missão de Conceição do Araguaia impressionavam pela sua imponência realçando a
grandeza do rio Araguaia. A velha missão ficava junto ao rio, e pareciam
resistir às intempéries dos tempos, pois eram bem antigos. Um movimento
inusitado parecia ter transformado aquele monte de areia quente em algo inexplicável.
Durante a viagem fiz uma retrospectiva da vida do Padre Chico...
* “O Padre Chico, como era conhecido, morava a muitos anos junto da aldeia
dos índios Tapirapé, simples, humilde, e muito pobre, ele e as irmãzinhas se
dedicavam exclusivamente aos índios Tapirapé e Karajás cuja aldeia não distava
mais do que dois mil metros. Era o Posto Heloísa Torres, aonde o nego Valentim
e sua esposa Joaninha eram os encarregados, bem perto morava Dona Inês com sua
prole, eram toda uma só feliz família Nas noites limpas de lua cheia podia se
ouvir as índias Tapirapés ao redor de uma fogueira a cantarem lindas, suaves e
melodiosas cantigas indígenas nunca mais eu escutei nada igual, os índios Karajas
faziam suas festas Aruanã e com estes procedimentos aproximavam-se
culturalmente as duas raças, porque não dizer as três raças, eu mesmo aprendi a
fazer arco e flechas, Em nada parecia com as turbulentas cidades de pedra do
mundo lá de fora. O padre Focault tentando levantar um canteiro colocava três
forquilhas de cerne e uma de pau branco, eu e os índios o ensinamos que com uma
forquilha ruim o canteiro iria cair, ele entendeu foi até o mato e trouxe uma outra
nova e boa, era assim a vida, tudo harmonia”
Mas... Nem sempre tudo é harmonia
e o destino se encarregara de mudar a vida daquele Padre e dos habitantes
daquela região, assim sendo,para melhor assimilarmos o desenrolar desta
história,teremos que retroagir voltando no tempo... 1957...
A origem destas
mudanças:
“Conta a história que um
DC-3 da Nacional Transporte Aéreo, comandado pelo piloto Hilton Machado, fez um
pouso de emergência nas praias do Rio Araguaia, no local onde nasceria o
Vilarejo de Santa Terezinha. O passageiro Holck e o comandante – hoje
proprietário da Votec – ficaram encantados com o local e combinaram adquirir
terras a partir das margens do Araguaia e nelas implantar atividades pecuárias.
Um comerciante vindo de Campo Grande (MS) Michel Nasser, se associou ao projeto
e os três juntos requereram em 1957 terras do Estado e conseguiram uma gleba de
1,5 milhões de hectares [...] divisões sucessivas da gleba original terminaram
sendo a Confresa de Jose Augusto Leite Medeiros e Jose Carlos Pires Carneiro e
a Codeara do grupo financeiro e banqueiro BCN (BORGES, 1987:380)”
Deste pacote de hectares
venderam 72.000 hectares para a empresa Japonesa Yanmar do Brasil onde se
instalou o inicio de Porto Alegre do Norte MT sob o comando do Fiscal Plínio,
mas os conflitantes posseiros se revoltaram e o Fiscal foi baleado e a sede da
empresa passou a ser em Confresa. A Yanmar do Brasil cedeu ao INCRA para assentamento
dos posseiros uma área com 22.308.0000hectares nomeados como Projeto Piracicaba
que até hoje em 2017 se encontra em litigio Judiciário e o INCRA ainda não indenizou
seu credor. A maior parte foi removida para Codeara num total de 400 mil
hectares. Foram estes tumultuados episódios que vieram gerar semente que despertou
o povoado, depois vila e hoje cidade de Santa Terezinha. Relembrando que
estes títulos foram todos oriundos do Estado e averbados pelo Cartório Medeiros
na Capital de São Paulo. Ver manuscrito original e conferir. Venderam para Erico Ribeiro 51.004.0000hectares
que a intitulou como Vitoria do Araguaia.
Continuando...
Às quatro horas da tarde
fomos á casa de Napoleão que era o encarregado daquele conjunto de casarões da
Prelazia de Conceição do Araguaia para zelar a missão.
Batemos na porta, demoraram
a atender, finalmente Verônica a esposa de Napoleão aparece bocejando, estava
dormindo.
--Padre Chico!
--Estava
dormindo irmã?
--Deitada,
padre, cochilando.
--E
Napoleão esta? Sim, já se levantou, mas entrem - e continuou.
--Seu
Dankmar veio também! Á quanto tempo não lhe vejo.
--Boa
tarde padre, boa tarde Dankmar – falou Napoleão aparecendo.
--Mas
o que esta acontecendo Napoleão? Indagou Jentel.
--Padre...
– gaguejou Napoleão – Sua benção.
--Ulala,
me conte logo depois te abençoou.
--Chegaram
aqui uns homens dizendo que são os donos de todas estas terras e que vieram de
Conceição com uma ordem do Bispo, eles estão lá na casa grande.
--Vamos
até lá agora.
--Mas
o que esta acontecendo aqui? Tornou a se
impacientar o Padre-quase gritando.
O calor do meio dia a tarde
explodia sobre aquelas areias quente e as poucas árvores não faziam sombra
alguma. O rosto do Padre Chico se transformou como de água para o vinho, via-se
claramente a indignação à raiva e a revolta em seus olhos. Já não era mais o
pacifico Padre Chico, agora era o rebelde Padre François Jaques Jentel.
O
encontro inesperado com a civilização vinda sobre asas de aviões, o movimento
de gente estranhas em seu território acendeu-lhe na alma uma chama apagada há
muito tempo.
--Vamos ver o que esta
acontecendo – explodiu enquanto caminhava na areia quente rumo ao casarão.
No
casarão um homem alto e simpático muito bem vestido e com um sorriso no rosto
apareceu à porta cumprimentando
--Ola,
- estendendo a mão ao Padre que não correspondeu --Meu nome é Humberto Machado
e sou o proprietário da Linha Aérea Nacional.
--Tem
uma carta para mim – cortou o padre – por favor, me entregue logo quero vê-la.
--Aqui
está Padre.
Jentel
procurou uma cadeira leu a carta umas quatro vezes e parecia não acreditar.
--Como
é que vão chegando e se apossando da missão sem antes ter falado comigo, aqui
tinha muita coisa importante guardada – zangou.
--Eu tive ordens de chegar e me
arranchar com minhas coisas afinal as terras são minhas e eu não podia ficar no
tempo ou embaixo de uma arvore com tanto instrumento.
--Muito
bem veremos o que vai acontecer, - terminou o Padre virou as costas e
saiu.
No outro dia cedo, dois aviões Douglas sobrevoaram
e desceram na pista, com eles vieram muitos homens, e também Hilton Machado,
irmão de Humberto era um dos mais fortes proprietários da empresa e trouxeram
muitas ferramentas, começavam a colonizar.
Deste dia em diante o Padre
Jentel tumultuou a vida de todos, organizou cooperativas, associações e
promoveu uma pequena revolução. Lutou muito para defender os antigos pioneiros,
organizou grupo de posseiros fundou sindicatos e passou a congregar centenas de
trabalhadores rurais que chegavam de todos os cantos do país, estava declarada
a luta aberta pela terra que não era de ninguém.
Mas
o Padre era muito habilidoso e amigavelmente ele se infiltrou entre os
proprietários com a finalidade de saber quais seriam seus movimentos.
--Muito bem – dissera a Hilton
Machado - Já que o Bispo recomendou que lhes desse todo apoio assim eu o farei.
--Inicialmente só precisamos
desta casa, logo vamos construir dentro de nosso projeto. Discutiram por varias
horas, mostraram os mapas e falaram a vontade de tudo que o padre queria saber.
--E ai padre tudo bem –
perguntei.
--Nem
triste nem alegre - foi á resposta lacônica
--Agora o bicho vai pegar, o preço do progresso é muito alto, muita gente vai sofrer e que Deus tenha piedade.
--É
chegada a hora! Certamente agora começarão a chegar os grileiros, pistoleiros,
garimpeiros e mulheres vadias, isto aqui vai bagunçar a vida dos sertanejos, só
Deus para nos livrar desta.
Pouco tempo depois as terras mudavam de dono. Mas a minha maior preocupação era com Padre Jentel ou Padre Chico como queira, foi quando fiquei sabendo que a Linha Área Nacional já não eram mais as proprietárias daquela encrenca. E que a Codeara assumira o comando, fiquei apreensivo, pois sabia muito bem que Codeara, a Companhia do Desenvolvimento do Araguaia, o BCN – Banco de Crédito Nacional e o Cartório Medeiros da Capital de São Paulo eram intimamente ligados, ainda mais tendo adquirido certo volume de terras de Michel Nasser lá de Campo Grande, embora aquele houvesse reservado uma pequeníssima área, eram 5.935 hectares, para assentamento dos antigos posseiros. Foi à pólvora do barril explosivo chamado Jentel.
&
“CODEARA” X “Padre Chico”
A Codeara assume o comando, no lugar das Linhas Áreas Nacionais. Subsidiaria do Banco Nacional de Crédito –BCN - com sede em São Paulo, era regida sob a batuta de Armando Conde, e tinha na sua direção o Dr. Luiz Gonzaga Murat um extrovertido executivo e o Doutor Seixas, maleável como as rochas. Na fazenda quem manobrava era o capataz Silveira e o Salomão, homens violentos talhados para este difícil encargo que era dominar a região, só que tinham um espinho atravessado em suas gargantas, um simples padre chamado Padre Chico que era um osso duro de roer.
Jentel
organiza e cria a Cooperativa Mista do Araguaia, seu secretário particular o
jovem Reis passou a Presidente da mesma, novo, lutador líder incontestável da
nova geração era a medida certa para a luta que se iniciava.
A
Vila crescia assustadoramente, bares, armazéns, açougues, cabarés, e farmácias
se instalavam. A previsão do padre Chico se realizava.
Mulheres da vida fácil
chegavam a toda hora em barcos carregados de peões arrebanhados nos mais
longínquos recantos do nordeste era uma constante.
Estava satisfeito o ditado popular “Um lugar
para ser bom tem que ter cinco” P “= Padre – Peão – Policia - Puta e Pinga”
Surgiram
então os primeiros atritos entre Codeara e os peões / posseiros, e o Padre sempre
defendiam a estes últimos. Muitas
vezes a Policia Federal teve que intervir.
Os
“gatos” eram homens duros e sem regras eram os arrebanha dores de peões que
contratavam e os traziam para o sertão hostil e bruto e ali se embrenhavam mata
á dentro para as derrubadas, os que escapavam da maleita, não escapavam da faca
ou do tiro.
Naqueles
tempos assim eram qualificados os peões:
Peão do trecho.
1. – Peão Urutu
2. - Peão Pára-quedista
3. - Peão Macaco
4. – Peão Liso
5. - Peão Mambira
6. - Peão Gente
O
Peão Urutu (cobra),
normalmente bem vestido, chapéu Panamá na cabeça, botas de cano longo,
costeletas, cinturão largo e usava sempre um radiosinho a pilha. Sempre era
muito respeitado, gostava de andar armado com faca ou revolver, adorava frequentar cabarés e era sempre tido como valente, mas, se portava sempre bem
com as ‘mulheres’. Gosta de ficar devendo muito nas pensões em que se
hospedava, mas quando arrebanhado, paga as contas, depois de dar um belo tombo
no patrão, no mato bom trabalhador.
Peão
Pára-quedista,
normalmente é um homem solitário, só carrega uma mochila, não tem amigos, e
gosta de trabalhar sozinho, sempre ao ser arrebanhado pelos Gatos necessita de
dinheiro para mandar para a mãezinha que esta longe e doente e para pagar as
despesas na pensão e ainda comprar umas roupas, Sua especialidade é fugir dos
patrões quando são recambiados para as fazendas. Usam dentro da mochila uma ou
duas câmaras de ar de bicicleta dobradas e cheias de ar em meio às roupas.
Quando o carro que o transporta esta em alta velocidade e que a estrada seja em
meio a cerrado fechado ou mata, ele acrobaticamente pondo a mochila no peito
pula do carro e cai no chão sobre a mochila, daí num salto espetacular põe-se a
correr se embrenhando na mata. Quando o carro consegue parar ele já esta muito
longe.
Peão Macaco, e similar do peão pára-quedista, só usa uma mochila com poucas coisas, e nas costas, e, quando a viatura vai à alta velocidade em meio à mata ele, tal qual um Tarzan da um pulo agarra um galho de arvore que passa e malabarescamente cai de pé e foge mata adentro - Dizem que peão macaco não pode ver um galho que da vontade de pular.
Peão
Liso, este é o
mais difícil de todos, pois sempre anda em grupo de cinco ou seis, se hospedam
em boas pensões, gastam muito nos bares e com o mulherio. Gostam de pegar grandes
empreitadas, mas sempre querem muito dinheiro adiantado para pagarem suas
despesas e quando estão prontos para partir ai é um Deus nos acuda quando
aparecem quatro faltam dois, saem dois em busca dos outros e ai some os quatro,
o Gato faltava ficar louco para ajuntá-los, uns estão no bar bebendo, outros
enrolados com as mulheres, normalmente o Gato usa a policia para ajuntá-los
quando já estão bêbados.
Peão
Mambira, o mesmo
que tamanduá, que é conhecido por sua vagarosidade, mas ao entrar em uma moita de
mato sabe se esconder e fugir rapidamente. O Peão Mambira age assim mesmo,
sempre com o machado ou foice na mão entra para o mato e começa a trabalhar o
fiscal esta escutando o bater do machado, derrepente para, o fiscal vai até o
local do serviço e só encontra o machado no chão o peão já sumiu na mata, por
tal motivo são faceeis de arrebanhar e não são exigentes, os Gatos resolvem o
problema fazendo-os trabalharem com outros grupos, mas no fim sempre acontece o
mesmo. Tempos depois aparece em outra fazenda e diz que fugiu daquela porque
estava sendo ameaçado. E torna a dar o golpe. Muitos morrem por estes motivos.
Peão Gente, é o homem honesto e trabalhador.
Assim eram arrebanhados:
Caminhões cheios de homens,
mulheres e crianças, cruzam as estradas rumo ao sertão mato-grossense – eram os
Paus de Arara.
Sempre desviando o mais
possível dos grandes centros, para evitar a repressão por parte das
autoridades, os motoristas e os “gatos’ os conduzem de maneira mais rápida
possível, ao ponto mais próximo de sua meta final”.
Os “Gatos” são chamados os
empreiteiros, homens rudes e não raras vezes violentos, que são especialistas
no tráfico interno de pessoas, ou seja, o proxenetismo.
Munidos de boas quantidades
de dinheiro, estes homens saem por cidades nordestinas, aonde o desemprego é
uma constante realidade e ali faz o arrebanhamento de trabalhadores, como o
vaqueiro arrebanha o gado.
Seus
escritórios são os bares, sua clientela os peões.
Entre
uma pinga e a outra solta o engodo:
--Peguei
uma empreitada na Fazenda Marimba do Doutor Oscar lá em Mato Grosso que só
vendo, desta vez eu me aprumo mesmo, vou tirar a barriga da miséria.
--É
donde hei? – pergunta um peão.
--Lá
juntinho do rio Fontoura, é uma beleza, o
cheimm, o rio Suia passa perto também, bem dentro da terra do patrão, e tem
peixe pra da cum pau, até o pirosca passa o dia aboiando na fonte de lava
roupa. E a caça nem se fala, oia o compadre Cirso mato quatorze porco junto do
barraco dele, ele subiu num pau e jogou o gogó
em baixo e os porcos ficarão estraçaiando o carção dele e
enquanto isto ele ia matando um por um...
--Puxa
sô, e a maleita? Ouvi dize que dá até em macaco?
--Mentira danada sô,
oia cumo eu to forte mais que menino novo.
--E a cumo você pegou essa
empreitada companheiro? --Peguei a quatro mil o alqueirão, mas é mole, num tem
pau grosso e o patrão não deixa derrubar Jatobá.
--E
o broque? (roçagem)
--Broque
é serviço de menino, só vara fina o resto o fogo da derrubada queima tudo.
--Cumpanheiro– fala o peão
entusiasmado – ocê vai da uma boquinha
pra gente. Eu tenho mais três companheiros bons de serviço.
--É,
pode se né, eu vou pensar.
--Quanto da proce paga pra gente?
--Bom cumo ocê é um cumpanheiro
bom vo paga três mil por alqueire.
--Ta
feito vai o cumpadre Cirso u Doca e o Raimundo Parafuso, e vou leva a menina
Rosinha pra conzinhá pra gente, tem perigo não a bichinha não é muito
arisca não e é boa cozinheira.
--É
isso ai, companheiro bota a turma pra trabaia que a coisa vai.
O Peão pensa: ”Dá pra derrubá
vinte alqueirão por mês é isto sessenta
mil, dividido por quatro, a menina tem que ganhar também, da quinze mil para
cada um. Vigeeee é dinheiro demais num precisa nem fazê a conta”.
--Quanto
é que nois vamo saí?
--Nu
fim da semana num sabe? Estou hospedado na pensão da Ritinha aquela
Paraibana ajeitada, viúva nova, não dá pra saí ligeiro. E saiu cantando – Eta
Paraíba masculina mué macho sim sinhô...Eta
pau pereira...meu bodoque num quebro...
--Vo
precisa de um pouco de dinheiro pra deixa em casa e comprá umas traias.
--Num
tem problema, ocê passa amanha cedo lá na pensão que eu vo bate um
contratosinho atoa ocê sabe, só pra garanti, quem é vivo é mortal, ocê assina e
eu te arranjo um pouco da mufunfa.
--Entoncês vamo tomá a saideira –
termina alegre o peão
Muitos deste transportes os famosos Pau de
Arara vinham por roteiros diferentes, uns vinham pela Caseara no Estado do Pará
outros vinha pela Br. 158 que acabara de ser concluída, isto é até São Felix do
Araguaia.
§
Os Paus de Arara.
Os Paus de Araras eram sempre
velhos caminhões de carroceria cobertos com arcos de ferro que sustentavam uma
precaríssima lona, com tabuas que eram sustentadas nas tampas laterais, se que
bem travadas, serviam de banco para os migrantes que mesmo aos socos e trancos
nas péssimas rodovias, que apenas uns poucos quilômetros era asfalto o resto
era chão batido cheio de buraco e lama. Mesmo nestas condições os malversados
malabaristas se esbaldavam acreditavam na redenção dos lucros e para extravasar
uns tocavam violão outros cantavam enquanto o tempo passava e o sonho prometido
não tardaria a se aproximar.
Cinco dias depois o caminhão
cheio de gente, agora era o “pau de arara”, sai rumo ao sertão mato-grossense.
Oito a dez dias de viajem puxados, poeira e muito balanço, cansados chegam ao
ponto final a “Caseara” bem na margem do rio Araguaia, daí para frente a viajem
é feita de barco. Finalmente pega outro caminhão e chega á fazenda do destino.
Ali a coisa muda de figura, a mata é grossa, o broque é difícil, e a maleita da
até nas arvores, a morte campeia solta com um sorriso no rosto, mas não há mais
como voltar, já estão devendo muito. Rosinha passou a ser propriedade do patrão
agora serve de empregada domestica e é mandada, depois de muitos dias, para a
casa de Goiânia, ainda esta muito bonita, mas um pouco buchuda, a regra é esta,
pai pode ser qualquer um menos o patrão. Um o pesadelo transformado em realidade
dura e crua, era a vida e o destino dos mais fracos.
Lá no sertão de origem, os
mais sensatos que não quiseram ir conversam:
--Vi falá que matarão o Cirso,
que o cumpadre Raimundo ta trabaiando notra fazenda num sei quar, do cumpadre
Juca nem noticia, só sei que Rosinha se perdeu lá na cidade de Goiânia, us
outros devem tar pur lá, mais nem noticia, sarô tudo tomara que a Rosinha vorte
pra casa.
--Cumpadre
ocê teve noticia do nosso pessoal que foi para o Mato Grosso?
--Ta cuma saudade doida num ta cumpadre?
--Fiz até uns versos pra ela,
qué ouvi cumpadre?
--Quero, são estes versos cumpadre?
--São muito simples cumpadre,
pois eu não sei versar. --Ora fale com o
coração amigo véio.
--É o jeito, agora
não, mais adiante.
§
“Padre Francisco + Dom Thomas x IBRA”.
Jentel aprendera tudo sobre
a Codeara, sabia muito bem seu compromisso de compra e venda com Michel Nasser
dizia na Sexta clausula: “Fica reservada uma área de cinco mil e quinhentos e
noventa e dois hectares de terra para assentamento dos posseiros de Santa
Terezinha” e dizia mais que se caso a área fosse insuficiente o vendedor
indenizaria a compradora no excedente
O Bispo Don Thomas Balduino,
então prelado de Conceição do Araguaia, havia recorrido ao Presidente da
República que por sua vez passara a atribuição ao Ministério da Agricultura e
este encarregara o IBRA (Instituto Brasileiro de Reforma Agrária) para
resolver.
Começou ai uma luta que durou
mais de seis anos, Padre Jentel X Codeara. Um exigia que a área fosse demarcada
em determinado local, o outro não aceitava e o Padre só queria o que fosse bom
para os posseiros e a Codeara só queria o que fosse bom para ela. Estava
difícil de decidir.
O tempo passava e as
dissidências aumentavam.
Durante este período de
transição Jentel viajava muito e sempre pelo seu retorno trazia grandes
novidades. Recebia muito auxilio de fora e com isto os posseiros e os índios se
beneficiavam. Chegou até a ganhar um avião monomotor que ficou com a Prelazia
de Conceição. (Eu soube naquela época que Dom Thomas era o piloto e num certo
vôo o cilindro estourou e jogou óleo no pára-brisa do avião tampando quase
totalmente a visão, mas mesmo assim o habilidoso piloto voltou e pousou sem
maiores danos)
Uma nova era viria a
modificar muita coisa naquela região, Luciara ganha um novo prefeito José Liton
Luz filho do Cel. Lúcio Pereira Luz.
Uma das metas do prefeito
era resolver o problema dos posseiros do então distrito de Santa Terezinha, uma
reunião foi convocada e o padre Jentel participou ativamente trazendo mapas e
cartas aerofotogramétricas, documentos e fotos foram expostas abertamente e o
problema discutido chegando-se finalmente a uma conclusão “convocar a Codeara
para a uma reunião de cúpula”.
Como
Secretário Geral da Prefeitura, e assessor direto do Prefeito, eu fui incumbido
de representar a municipalidade e o Padre Jentel os posseiros, e, no dia
marcado lá se fomos nós, eu o Chico.
--Se com vocês dois juntos
não der certo, ao menos vai explodir – vaticinou o prefeito - E quase explode
mesmo.
Eu o Padre Chico e a cidade de
Rio de Janeiro.
O Padre Chico já velho viageiro para o Rio de Janeiro, tinha seu hotel preferido, o Hotel Gloria e lá nos hospedamos.
Na parte da tarde saímos
para darmos umas voltas pelo aterro da Gloria, a beira mar, Cinelândia e
praias, afinal a reunião fora marcada para nos encontramos na sede do IBRA no
dia seguinte pela manhã, fizemos uma boa caminhada e conversamos muito olhando
as beldades da cidade maravilhosa, era época que as mini-saias estavam no auge
da moda e de vez enquanto passava uma garota e eu aproveitava para mexer com o
padre.
--Olha padre que belezura.
--Bobagem, na Europa esta pior do
que aqui e na França nem se fala bom mesmo é nosso interior onde moramos porque
ainda ha respeito ao pudor e ao comportamento.
--Será?
--Bem, melhor do que aqui, é.
--E você só usa esta cruz na
lapela, ninguém vai saber que você é padre.
--O que faz as pessoas não é a
roupa, quero dizer não é o traje que faz o monge.
Eu costumava chamá-lo de
“Padre Francisco, ou Jentel”, nunca gostei de chamá-lo de Padre Chico, fomos
até o Cristo Redentor, e na volta passamos por um prédio chamado “Caritas”.
--É aqui que conseguimos o dinheiro
que precisamos e também muitas outras coisas. Temos muitos amigos na Europa que
nos ajudam e a “Caritas” distribui, espere aqui fora um pouquinho - e dito isto
entrou no prédio.
Então era ali a mina de ouro
do padre, aguardei um bocado de tempo, e quando voltou, não aguentando mais a
curiosidade eu perguntei:
--Como é que vem este dinheiro e as
outras coisas?
--De avião, de navio, outros os
trazem pessoalmente.
--Você viaja muito para o exterior?
--Já fui à Alemanha, França e até
na Argélia.
Não entendi porque ele disse
até na “Argélia”, também não perguntei, voltamos para o Hotel e após um banho
fomos jantar, vi que Jentel estava apreensivo.
--O que há Francisco?
--Oh, nada, não se aborreça, mas
não acredito que consigamos alguma coisa, já vim aqui tantas vezes e nunca deu
nada certo - respondeu tristemente o francês.
--Não vamos desanimar agora,
esperemos para ver o que acontece – e como queria mudar de assunto –
continuei...
--Escuta padre você não usa
batina?
--Uso, mas não estamos na missa
agora, estamos num restaurante.
--Gostei da bronca, assim esta
melhor, mas hoje você vai pagar a conta.
--Não tenho um centavo – respondeu
– não trouxe dinheiro, deixe no hotel.
--Mas eu também não trouxe.
--Pendure.
Tive que pagar e voltamos ao
hotel, mas o padre saiu em seguida, e pouco depois, atendi um telefonema que
era para ele:
--Quero falar com o Padre Jentel.
--Denise?- perguntei ao reconhecer
a voz da francesinha, louca de bonita que era a secretaria do padre em “Saint.
Terezin”.
--Sim, Jentel esta ai Dankmar?-
perguntou com um jeitinho bem danado.
--Não, foi visitar uns amigos, mas
disse que voltava logo. (tomara que o prendam por ai, aquele padre sortudo,).
--Informe a ele que cheguei hoje e
preciso lhe falar, ele sabe onde estou.
--Muito bem, mas apareça por aqui.
--Sim claro eu vou ai – desligou
aquele pedaço de mau caminho.
Deu vontade de entregar o
padre e não contar nada para ele, mas assim que chegou, com muita relutância,
babujei:
--Sabe quem ligou para você?
--Não, quem foi?
--Denise.
--Esta brincando.
--É talvez eu esteja, mas ela não,
e esta te esperando.
--É serio?
--Ela disse até que você sabia
aonde encontrá-la.
--Ulala – disse e já estava
saindo.
Chegou no outro dia às sete
horas da manhã quando eu já estava tomando o café.
--Passou bem à noite?
--Claro, na casa de uns amigos.
--Denise estava lá?
--Claro que estava – respondeu sem pestanejar.
Saímos
direto para o IBRA.
Fomos recebidos pelo Dr.
Mário um dos assessores do Presidente do órgão, que após nos anunciar retorna
dizendo:
--O General Sérgio quer falar com o
Senhor Dankmar, quanto ao Padre é favor esperar aqui e aguardar.
Meneei a cabeça, olhei para o
padre e entrei.
--Bom dia queira se sentar –
formalizou aquele homem atrás da mesa e continuou – o Senhor deve ser o
representante da Prefeitura Municipal Senhor Dankmar.
--Sim, respondi secamente – eu
represento a Prefeitura e o padre representa os posseiros.
--Muito bem, acredito que sua
viagem se prenda ao que o Doutor Murat me comunicou pelo telefone, mas
infelizmente ele não pode vir, mas o Doutor Seixas que é o Diretor Técnico da
Codeara veio em seu lugar.
--Muito bem, mas a que hora será a
reunião?
--A reunião será ás quatorze horas
de hoje, aqui mesmo no IBRA, mas o Padre Jentel é considerado “persona não
grata” e não poderá participar.
--Mas o Padre representa os posseiros
e não vejo como se chegar a um final sem a participação dele – protestei.
--Ele que passe uma procuração para
o Senhor e estará tudo certo.
--Vamos ver se ele concorda –
terminei levantei, me despedi prometendo voltar no horário marcado e falei com
Jentel:
--Jentel, eles querem que
você me substabeleça a procuração para eu representar também os posseiros.
--Não vai ser por isso que não vai
haver reunião, vamos a um Cartório agora.
Foi feito o que o General pedira, mas que o
padre gostou isto ele não gostou. No horário combinado lá se fomos os dois eu e
o Chico rumo ao IBRA, pouco depois fui chamado em uma ampla sala com uma mesa
muito grande no centro e lá estava o Doutor Seixas mais dois advogados, dois
engenheiros do IBRA e outro que não fiquei conhecendo, mas lá de casa eu estava
sozinho no meio daquelas feras, mas o padre Chico estava na sala ao lado,
certamente com o olho na fechadura e o ouvido na porta, lembrei dos posseiros e
resolvi enfrentá-los, lembrando um velho pensamento de Jentel: “não
vire as costas aos pobres, pois estará virando as costas para Deus”.
--Boa tarde para todos –
cumprimentei.
--Boas tarde – responderam alguns.
Após as apresentações o
General Sérgio, Presidente do IBRA tomou a palavra.
--Solicito às partes que sejam
coerentes e que este assunto tome uma solução definitiva - olhou para todos e
prosseguiu - Já que o padre não participa, creio haver uma viabilidade de
entendimentos – concluiu quase cansado.
--Sempre foi intenção de a Codeara
fazer esta doação, mas não víamos uma solução viável para o problema, mas
agora, com a interveniência da Prefeitura, o elo que faltava, estamos dispostos
a cumprir a nossa obrigação a Codeara fará a doação e a Prefeitura se
encarregara do assentamento dos posseiros – discursou o Diretor Técnico Doutor
Seixas - a seguir abriu um enorme mapa
em cima da mesa, era a planta do projeto agropecuário da Codeara, e mostrando
um canto em cima na planta - aqui esta o local que escolhemos para a área a ser
doada, é uma ótima posição, mata de primeira, muita água e estrada fácil –
concluiu.
Se ele conhecia pessoalmente
a área eu não sei, mas que eu conhecia isto eu sabia, por ai entendi o porquê
da resistência do padre, o pessoal da Codeara não era mole.
--É muito bom mesmo Doutor Seixas,
ótimo, mas, a que eu estou informado o IBRA fez um belo trabalho escolhendo uma
área, e eu gostaria de saber qual é esta área, talvez tenha mais condições do
que esta aqui tão longe e sem via de acesso, e, eu jamais me oporia à
capacidade de trabalho do IBRA, poderiam me mostrar à área?
--Claro eu mesmo fiz o trabalho
todo – interveio um dos engenheiros ali presente abrindo uma planta enorme e
mostrou o seu trabalho a área estava situada, bem aonde nos interessava.
--Muito bem, é uma ótima área, não
vejo porque não concordar com um trabalho como este afinal.
O IBRA é o órgão indicado para fazer o levantamento, não há o que contestar a não ser que a Codeara não considere o IBRA capacitado para este trabalho – perguntei ao Doutor Seixas. (jogando ele na fogueira).
--Absolutamente, achamos o IBRA
totalmente capacitado para este trabalho.
--Então, já que estamos todos de
acordo será aqui sugiro que se lavre uma minuta do acordo – terminei.
--Mas, temos um problema nesta área é a aguada –
interferiu o Diretor.
--Problema nenhum é só dividir as aguadas e os
senhores nos reporão a terra na margem acima, o que dizem? Mas terão que fazer
a demarcação e a mudança dos posseiros e ainda indenizá-los nas benfeitorias
que deixarem na outra área.
--Bem, por nós não há problemas – concordou a Codeara.
--Então vamos
fazer
a minuta do que ficou assentado e depois assinamos.
Feita a minuta do acordo,
lida e achada aprovada todos assinaram.
--Amanhã o Senhor Dankmar pode passar por aqui e pegar uma cópia e vamos marcar outra reunião para a escrituração da doação em São Paulo, creio que dia cinco de março estaria ótimo se todos concordarem? – perguntou o IBRA:
Todos concordaram. Disse adeus a
todos e sai, estava doido para respirar um pouco e me ver livre.
--Como foi?– perguntou Jentel.
--Tudo bem, a Codeara concordou em
doar a área que o IBRA demarcou e terá que indenizar os posseiros nas
benfeitorias remanescentes e abrir estradas e fazer as mudanças dos posseiros.
--Neste pau tem abelha – ironizou
Jentel acho que é bom demais para ser verdade.
No
outro dia cedo passamos pelo IBRA para pegar a cópia da minuta, o General
Sérgio havia viajado, mas o Doutor, Mário nos atendeu:
--Eu não sei como aconteceu, se o
Doutor Seixas ou o General levaram a minuta, só sei dizer que desapareceu lá de
cima da mesa, mas o que foi dito será mantido e a doação será feita no dia
cinco de março conforme o combinado.
O padre me olhou e sorriu e eu
entendi o que ele queria dizer.
Voltamos para Mato Grosso.
No
dia anterior ao marcado para a doação nos chegamos a São Paulo, eu, João Neton
irmão do Prefeito e o próprio.
A convite do Zezinho, dono da
empresa de ônibus Reunidas nos hospedamos em belíssimos apartamentos em sua
garagem.
Às duas horas da tarde fomos
para o escritório da Codeara que ficava no Edifício Francisco Conde no BCN da
Rua Boa Vista, subimos pelo elevador e logo nos anunciamos ao Dr. Luiz Gonzaga
Murat então Diretor Presidente da Codeara e genro do Armando Conde, ao nos
receber apresentei meus companheiros:
--Este é o nosso Prefeito José
Liton Luz e seu irmão João Neton Luz.
--Muito prazer – cumprimentou a
todos.
--O Senhor vai amanhã para a
reunião no Rio de Janeiro para doação da área?
--Mas que reunião é esta? Que
doação é esta? – perguntou quase colérico.
--Dr. Murat, o senhor sabe muito
bem que tivemos uma reunião no Rio com o IBRA e o Doutor Seixas e ficou
assentado que no dia cinco, amanhã, a Codeara faria a doação da área dos
posseiros para a Prefeitura – falei me contendo para não explodir.
--Em primeiro lugar o Doutor Seixas
não é a Codeara, nós temos centenas de acionistas que teremos que consultá-los,
portanto não vai haver reunião nenhuma e muito menos qualquer doação –
vociferou o branquelo Diretor.
--Não gostei do seu tom de voz
Doutor Murat – respondi – nesta história toda dizem que o padre está
embrulhando, mas o embrulhão aqui é o senhor, e de outra vez quando mandar
alguém representando a Codeara para uma reunião mande um homem que tenha
responsabilidade e não um elemento qualquer, e, eu não tenho mais nada para
conversar contigo – sai esquecendo meus amigos lá dentro e bati a porta com
bastante força.
Retornei para o apartamento e
esperei pelo
Liton,
já eram quase cinco horas da tarde quando chegou rindo:
--Sabe quem estava lá atrás da
porta no escritório?
--Não.
--O Salomão, o bate-pau lá da
fazenda e o Doutor Murat disse que você é muito atrevido em chamá-lo de
embrulhão e ainda mais dentro do escritório dele, é, mas não tem nada não,
amanhã vamos continuar a briga, voltamos todos
lá para o Rio de Janeiro e
veremos o que o General vai falar.
No outro dia quando chegamos
ao Rio fomos direto ao Hotel Gloria sabem quem estava lá? O padre Chico.
--Cheguei – disse ele.
--É, estamos vendo – respondi. Mas
fiquei alegre.
Fomos todos para o IBRA e o General Sérgio nos
recebeu a todos, inclusive Jentel.
--Lamento profundamente o
desaparecimento da minuta, mas tudo que ficou combinado aqui na minha presença
será cumprido, entrarei em contato com a Codeara e ela terá que manter o
estabelecido, logo eu me comunicarei com os senhores a data da última reunião
que faremos – terminou muito sério o Presidente do IBRA que estava visivelmente
aborrecido.
Retornamos ao Hotel e depois
bem mais tarde saímos para jantar, achamos um restaurante que era em uma adega,
ficava no subsolo. Conversamos e rimos muito naquele dia, restava voltar para
Mato Grosso e aguardar.
Foi uma longa espera, e a
resposta nunca veio e assim, decidimos voltar ao Rio de Janeiro, não poderíamos
deixar a coisa esfriar e lá se fomos nós de novo, eu e o Chico.
O General novamente nos
recebeu bem, mas olhava o padre sempre com reserva. Aconselhou-nos a ter
paciência e que aguardássemos os resultados das providências que ele estava
tomando. Saímos a perambular pelas dependências do IBRA e lá ficamos conhecendo
o Doutor Bertoni, Chefe do Cadastro do IBRA, e também Conselheiro da SUDAM,
explicamos a ele o pé em que se encontrava a situação e ele muito surpreso,
comentou:
--Como é que a Codeara no último
relatório que apresentou a SUDAM ela pediu a liberação das verbas atestando já
terem feito a doação inclusive declararam que já abriram as estradas de acessos
à área e outros benefícios.
--Mentira, muita mentira – delirou
Jentel raivoso.
--Não é verdade Doutor Bertoni,
nada disto aconteceu até agora – garanti.
--Mas então façam uma carta ao
General Bandeira de Melo que é o Presidente da SUDAM, e expliquem a atual
situação sugerindo a retenção das verbas como medida acauteladora até que se
concretize a doação e eu garanto a vocês que farei a leitura na próxima reunião
que é no fim desta semana - nos confidenciou aquele cidadão.
--Só me falta uma maquina de
escrever, pois papel timbrado da prefeitura eu tenho.
--E nos sabemos escrever – ajudou o
padre.
E assim fizemos, escrevi a
carta, assinei e a entreguei ao Conselheiro Bertoni, do jeitinho que ele nos
ensinou.
--Agora eu sei que a coisa vai
ferver – vaticinou o clérigo.
Não havia outro meio a não
ser pressionar a Codeara, e havíamos arranjado um grande aliado.
Começamos a mexer os pauzinhos.
Retornamos
ao Hotel.
--Vamos sair um pouco?– perguntou o
padre.
--Vamos, mas, aonde quer ir? (será
que a Denise esta aqui?). Desta vez ele não respondeu só fez um sinal com a
mão como a dizer (aguarde).
*
A Bela Mansão
“Sem Fim”
Este era seu nome,
Pegamos um táxi e lá se fomos
nós rumo a Petrópolis, embora fosse noite, podia-se notar o esplendor daquela
mansão em que havíamos chegado com
grandes jardins cercados de grades de ferro, fonte luminosa e
iluminações artísticas realçavam num jogo místico a beleza do conjunto, e no
portão de entrada sob um arco florido de plantas o nome em bronze polido “Sem
Fim”. E um pouco ao lado umas casinhas a guisa de guarita abrigavam dois
religiosos, possivelmente padres, que fiscalizavam as entradas e ao verem
Jentel o saudaram exaustivamente.
Entramos em um enorme
corredor que nos levou ao que parecia ser um salão de refeição, dezenas de
enormes mesas e muitas cadeiras, junto a uma enorme cozinha com muitas pias e
bancadas de mármore, fogões embutidos, armários e varias geladeiras e freezer,
dali saímos em uma sala que parecia uma grande biblioteca, escutava-se a
confusão de muitas vozes conversando ao mesmo tempo, fomos nos aproximando,
passando por muita gente nos corredores e portas, e finalmente entramos em um
salão onde estavam reunidas pelo menos umas duzentas pessoas, ao lado uma porta
ondulada em forma côncava dava entrada a um grande auditório onde estavam na
maioria reunidos os ali presentes.
O salão estava repleto, a frente
um palco e um quadro negro, aonde faziam inúmeras anotações, vários
conferencistas sentados aguardavam sua vez de se pronunciarem, ao que pareciaA
coisa ia longe. Dr. Bertoni era um deles que explicava a forma de distribuição
das verbas arrecadadas pelo IBRA e repassadas pelo governo federal a CONTAG e
outras entidades.
O padre Francisco me
apresentou para varias pessoas, era gente que entrava e gente que saia, que
resolvi sentar perto de um grupo enquanto Chico se entrosava com os outros,
eram todos religiosos de todas as categorias e espécies e de todo os lugares do
planeta, ali estavam alemães, italianos, espanhóis, holandeses, e muitos outros
a discutirem não sei o que, foi quando um deles em um péssimo português me
perguntou:
--Você esta aonde?
--Eu vim com Padre Jentel
e estamos no Araguaia.
--Mas que ótimo, quero conhecer
Jentel.
--Já ele aparece por aqui e você de
onde veio?
--Da Itália.
--Tem visto permanente – perguntei
meio desconfiado.
--Não padre, nós padres não precisamos,
eu vim fazer um curso de doenças tropicais e espero ficar por aqui para sempre,
ninguém pede documento para padre não é verdade?
--Sim até hoje, não ouvi ninguém
nem perguntar de onde vêm os padres.
--Pois então não há perigo.
--Claro que não – seria melhor me
comportar como um deles antes que desconfiassem.
--Dankmar – me chamou o padre
Jentel chegando junto com outros homens -- este aqui é o nosso encarregado na
“Caritas” ele foi muito perseguido pela revolução, esteve preso e foi muito
torturado, mas agora esta bem.
--Espero que continue tudo bem
contigo – respondi apertando a mão do homem.
Outros me foram apresentadas eram as natas que a revolução andara atrás, a maioria era lideres sindical do nordeste. Fiquei preocupado afinal o que fazia aquele povo ali todo reunido? Jentel me deixou em outra saleta pequena e perto de uma geladeira cheia de cerveja, era o que me estava faltando e logo fiz companhia para outros dois ali sentados quando chegou um terceiro procurando:
--Sabe-me dizer onde estão fazendo vales?
--Não, não sei. - mas a idéia não era de todo má.
--Amigo de Jentel? – procurou um
deles.
--Sim, estamos juntos. (afinal meu
padre era famoso mesmo) e vocês são daqui do Rio?
--Não eu sou Búlgaro e este é
italiano, mas já estamos no Brasil a mais de dez anos.
--E daqui vão para aonde?
--Não sabemos ainda, mas tanto faz.
--Com licença vou procurar Jentel.
– me desculpei e sai achei Jentel conversando com Bertoni que nos procurava
para dar uma carona de volta ao Rio.
--Dr. Bertoni vai nos levar até o
Hotel, vamos?
--Porque não – respondi afinal eu
estava doido para sair dali.
Logo seguíamos de volta ao
Rio de Janeiro, íamos a um carro grande, nunca mais esquecerei aquela experiência.
Voltamos para Mato Grosso,
eu e o Chico.
Os resultados não se fizeram esperar.
E numa tarde chuvosa um avião monomotor sobrevoou Luciara, no intimo eu sabia que era a Codeara.
Meia hora mais tarde entrou na Prefeitura o
Dr.Olímpio Jaime, advogado de Goiânia e muito amigo de Liton e meu conhecido,
não se fez de rogado foi entrando direto gabinete adentro, aonde eu conversava
com o prefeito.
--Boa Tarde meus amigos como vão
passando?
--Muito bem doutor, que bons ventos
o empurram para Luciara?
--Bons ventos nada Liton, o pessoal
da Codeara estão fulo de raiva com vocês porque fizeram aquela carta para a
SUDAM.
--Mas porque doutor?
--Vocês embananaram a vida deles
agora estão com todas as verbas suspensas e me mandaram aqui para acertar a
doação e levar um ofício seu dizendo que aquela carta foi um equivoco ou um mal
entendido.
--Você tem que acertar com o
Dankmar, ele quem fez a carta, só ele resolve, quem começou isto tudo foi ele e
só a ele cabe a resposta.- sintetizou Liton.
--Marque o dia da doação o mais
rápido possível e eu levo a carta em mão assim que receber a escritura eu a
assino e entrego para eles - respondi.
Dr. Olímpio Jaime olhou para
o Liton como a perguntar e agora? Como fica? Liton simplesmente abriu os braços
como a dizer eu não sei fica do jeito que está.
--Tudo bem – interveio o advogado –
de hoje a quinze dias a reunião será em São Paulo na sede da Codeara e o Doutor
Murat exige que o prefeito vá pessoalmente.
--Nada feito, eu não vou ele vai –
terminou Liton apontando para mim.
A conversa se prolongou até
bem tarde da noite e ficou tudo acertado, dia e hora para doação e a entrega da
carta. No outro dia cedo o advogado voou rumo a Capital de Goiás.
Finalmente
a doação.
No
dia anterior ao marcado eu já estava em São Paulo, e como não tinha boas
recordações do escritório da Codeara, ligue para o IBRA e pedi a interveniência
do Dr. Roberto Canot de Arruda, então supervisor do IBRA para que arrastasse a
reunião para sua esfera, lá no IBRA eu estaria seguro e assim foi feito e ficou
marcada para as 14.00 do dia seguinte.
Cheguei ao IBRA exatamente
na hora aprazada, quando Dr. Roberto me procurou:
--E o prefeito não veio?
--Não, eu mesmo é que vou resolver
isto.
--O Doutor Murat hoje vai perder a
criança.
--Farei tudo para ajudá-lo –
respondi – vamos lá.
--Chegaram todos, já estão
esperando.
A porta se abriu e eu entrei
de pasta na mão, cumprimentando todos os presentes.
--Boa tarde senhores. – achei uma
cadeira vazia bem longe do Murat e me sentei.
--Mas, e o prefeito? Porque não veio?
--Infelizmente são muitos os
afazeres e ele me delegou, desde o inicio, poderes para representá-lo como o Senhor
já sabe Doutor Murat. Mas se o senhor insistir em brigar eu posso me retirar e
fazer meia volta para Mato Grosso – terminei secamente.
--Nada disto, já que estamos todos
reunidos vamos terminar esta história, o General esta ansioso esperando o
resultado no Rio e eu tenho que ligar para ele.
--Por mim esta tudo bem peço apenas
que leiam a minuta e em seguida a escritura se estiver tudo de acordo
terminamos em um segundo - enfatizei.
--Se me permitem vou ler o conteúdo
da minuta e do livro de registro, não é muita coisa – falou um simpático senhor
de boa idade, sentado em frente a um monte de livros. E fez a leitura por duas vezes. Era
exatamente o combinado no IBRA - Rio agora eu sabia quem estava com a minuta e
terminou dizendo – é isto senhores e esta pronta para ser assinado, primeiro a
Codeara assinaria, depois a Prefeitura e a seguir o representante dos posseiros
e demais da diretoria do IBRA e CODEARA. – terminou e ficou olhando como a
pensar “quem vai ser o primeiro?”.
O Doutor Murat mostrou
intenção de relutância foi quando Doutor Seixas interveio:
--Se você quiser, eu assino primeiro.
--Ora bola – resmungou o Diretor
Presidente e pegando
.sua
caneta assinou e empurrou o livro para o tabelião que passou para mim que
assinei duas vezes, por mim e por Jentel e a seguir todos assinaram - está
terminado, agora queremos o oficio insistiu Murat.
--Mas, eu quero a escritura, só vou
lhe dar o oficio depois que me entregarem a escritura - respondi.
--Nós vamos mandar a escritura pelo
correio – insistiu o nervoso Doutor.
--Não é preciso, Senhor Dankmar o
senhor vem comigo até o Cartório eu lhe entrego a escritura ainda hoje, posso
lhe garantir – amenizava o cartorário.
--Eu confio no senhor – dizendo
isto tirei o envelope da pasta, abri e assinei embaixo da assinatura do
prefeito e entreguei ao avexado Dr. Luiz Gonzaga Murat.
--Tudo bem – dizendo isto, levantou-se e saiu sem se despedir de ninguém.
Agradeci
a todos, especialmente o Dr. Roberto, um grande homem e fui com o simpático
senhor rumo ao cartório Medeiros e pouco depois de duas horas e meia recebia a
escritura pronta. Agora era só voltar para Mato Grosso, mas desta vez eu ia só,
mas com a missão cumprida.
Passei por Barra do Garças e
registrei a escritura no Cartório de Imóveis e fui para Luciara
Finalmente estava tudo
sacramentado, mas, comecei a pensar em Jentel “já que esta briga acabou logo
ele vai arranjar outra, e arrumou mesmo”.
Missão cumprida o resto agora
era com o prefeito.
Ao chegar a Luciara a noticia
correu “a doação fora feita”, no mesmo dia o Padre chegou e só acreditou depois
de ver a escritura e o registro o padre deu um suspiro profundo que eu nunca
pude entender, seria alivio ou uma decepção por uma briga que acabava, mas ele
como que adivinhando meus pensamentos disse:
--Se você pensa que a briga acabou
está muito enganado ainda faltam doar a área da cidade de “Saint Terezin”. E lá
em baixo no Araguaia a coisa esta esquentando, o Padre Pedro, já está lá.
--Calma padre, da uma folga, deixa
esta briga lá pra longe.
--É, mas não vai ser fácil você vai
ver... - e virando as costas lá se foi o padre rumo a “Saint Terezin” ou Saint
Denise “sei lá”.
A cabeça do padre já ia maquinando
novas encrencas e isto fez com movimentasse a sua massa conscientizada, Santa
Terezinha parecia um formigueiro humano.
Os associados se reuniam constantemente em
assembleias e deliberavam muitas melhorias. A força da união os mantinha
coesos. Estavam bem “conscientizados
O processo de desapropriação da
cidade de Santa Terezinha tramitava na sua fase final e a Codeara já havia
elaborado um plano urbanístico da futura cidade, nos traçados velhos, pouca
coisa seria respeitada. O Padre Jentel, também elaborou um projeto urbanístico
da nova cidade respeitando os velhos traçados para não prejudicar os moradores
antigos e este tramitava na Câmara de Vereadores de Luciara.
Só que ai não se sabia mais
qual prevaleceria, o que o Padre apoiava que respeitava o velho traçado ou o
que a Codeara apoiava e que não respeitava quase nada.
Nestas alturas dos acontecimentos o
padre Francisco resolve construir um ambulatório para os pobres, e escolhe um
local que pertencia ao velho traçado da cidade, isto é, ficava em uma esquina
na divisa dos dois traçados. Para a Codeara a construção ficava no meio de uma
rua nova, para o Padre Chico não ficava e para a Prefeitura tanto fazia, estava
armada a confusão.
Teimoso, sem escutar as
advertências da Codeara que já queria mandar na cidade, pois julgavam que as
terras eram suas, enquanto que o Chico achava que aquilo pertencia ao povo, e
não deu ouvido e mandou começar a construção.
Novas advertências foram
feitas e não ouvidas, o que o padre queria era fazer a obra e os alicerces
subiam.
Um dia a Codeara mandou um monte de homens e
um trator de esteiras, derrubaram tudo, abriram um buraco no chão e enterraram
os escombros, cobriram de terra e alisaram o chão não ficou nem sinal do
ambulatório. Nada restou.
Manoel Quitandeiro, um dono
de venda em Santa Terezinha, havia trazido de Anápolis – GO. Um construtor para
fazer os serviços, era crente, e com ele vieram vários parentes. Roberto era
seu nome.
--Seu Manoel – dizia o crente – a
coisa parece que vai ferver e eu sou crente e não posso me meter em confusão,
acho que vou largar tudo e dar no pé.
--Que nada seu Roberto, isto ai num
dá nada, vá ganhar o dinheiro do padre, homem...
--Mas pelo o que eu estou vendo vai
sair chumbo voando por ai e este bichinho não tem endereço certo...
O Padre estava revoltado,
neste mesmo dia convocou uma reunião geral. Era em 11 de fevereiro o dia da
Grande Reunião.
O velho casarão fervilhava
de posseiros, estavam em “Assembléia” era cerca de quatorze horas quando
começaram:
--Estávamos
construindo um ambulatório para vocês, e este dinheiro gasto era de vocês
mesmo, resultados da Cooperativa, mas a toda poderosa Codeara não deixou e
destruiu tudo, vocês sabem muito bem, agora eu pergunto: Fazer o que? Construir
de novo?
--Sim vamos construir de novo – era
a voz geral.
--Mas agora há o risco de uma
agressão maior e vamos ser necessários nós reagirmos, vocês estão de acordo?
--Sim estamos todos de acordo vamos
prosseguir e resistir.
--Então amanhã cedo, todos com as
ferramentas que tiverem pás, enxadas, picaretas e vamos trabalhar para nos
preparar para recebê-los.
E assim, no outro dia quase
cem homens trabalhavam sob a orientação de Jentel, uns abriam as valetas que
serviriam de trincheiras, outros enchiam sacos de areia e os empilhavam fazendo
um muro, alguns preferiram abrir buracos nas paredes das casas vizinhas cujos
proprietários se evadiram, a noticia correu ligeira e a Codeara tomou
conhecimento do que o padre estava fazendo e solicitou em Barra do Garças a
vinda de policiais militares. Enquanto isto os candidatos a guerrilheiros
também levantavam as paredes do ambulatório, os crentes ficavam com um olho na
colher e outra na entrada da rua. As mulheres preparavam a comida e levavam
para os homens nas trincheiras e assim ficaram por vários dias e nada da
policia aparecer. Até que numa quinta feira o vigia lá do campo deu o aviso “A
Policia chegou”, mas nestas alturas muitos dos posseiros tinham saído, mas
chegavam os índios Tapirapés para ajudar. O Povo de Santa Terezinha torcia pelo
Padre.
--Vamos aguardar até chegarem bem
perto e deixem-nos começarem.
Não demorou muito a apareceram duas
caminhonetes cheias de soldados e trabalhadores da Codeara e vinha também um
trator de pneus com uma lamina na frente, quando chegaram junto da construção
pararam a comitiva e o capataz Silveira pulando de cima do trator no chão,
gritou.
--Estão escondidos ali atrás vamos
pegá-los.
Foi
a conta para começar o tiroteio, armas de todos os calibres e marcas de
fabricação caseira começaram a cuspir chumbo, o primeiro atingido foi o
Silveira bem no dedo da mão, o segundo foi o tratorista, ambos
desapareceram num instante. Na
caminhonete da frente vinha o Capitão Moacir comandante da Policia Militar que
diante da surpresa de tanta bala teve que abandonar a viatura escorando no
soldado Amaro e nos dois crentes, mas deixou dentro do carro sua bolsa e sua
arma Bereta.
Foi uma debandada doida a
Policia não pode reagir porque não via ninguém em que atirar e tentaram ir
buscar a caminhonete do Comandante que ainda funcionava, mas quando um pretenso
herói se aproximava uma chuva de bala o fazia voltar. O carro apagou porque
acabou a gasolina e com a vinda da noite á coisa se complicou.
Resolveu
esperar o dia amanhecer.
E
no outro dia quando a policia voltou não encontrou mais ninguém e nem o Padre
Jentel que tinha fugido para Goiânia.
O
Padre Jentel foi preso e posteriormente expulso do Brasil, e quando da busca
que o exercito deu na Prelazia de São Félix do Araguaia, por estar o Bispo
envolvido com os guerrilheiros de Xambioa, acharam a arma do Capitão Moacyr
pendurada na parede com etiqueta. “Lembranças da guerra de Santa Terezinha”
O Padre François Jaques
Jentel, nasceu a 29 de agosto de 1932 na cidade de Meriel, na França e já
estava com 32 anos quando chegou como padre na aldeia Tapirapés no encontro das
águas do rio Tapirapés com Araguaia.
Fiquei sabendo depois que o
Padre François Jaques Jentel, ou Padre Chico ou ainda Padre Francisco, ou Padre
Pranxiko, foi preso acusado de subversão, e conduzido para o Quartel Militar em
Campo Grande, levado a julgamento no dia 21 de maio de 1974 foi absolvido pelo
Superior Tribunal Militar. Já em liberdade voltou à França para visitar sua
família ao retornar para o Brasil em 19 de dezembro de 1975 foi novamente preso
amarrado pelos testículos (assim me contaram) foi deportado para a França num
decreto assinado pelo Presidente Geisel e o Ministro Amando Falcão isto em
Janeiro de 1976. Morreu na sua terra natal de hemorragia interna no dia 01 de
janeiro de 1979, três anos depois de sua expulsão no seu exílio onde sempre
sonhava voltar ao Brasil.
Boas lembranças e muitas saudades de um
matreiro rebelde e simples padre e grande amigo que viveu para os pobres e
índios entre e eles como um deles, era a sua vida, ali guardava a sua alma e
seu coração...
Um dia na sua humildade ele me disse:
”Cristo veio ao mundo porem muito pobre,
pequenino e aparentemente fraco, mas tinha em seus olhos a Luz do Céu”. Virar as
costas aos pobres é... o mesmo que virar as costas para Deus”.
Boa caminhada Pranxiko, vá com
Deus...
Breve nos
encontraremos...
&
BL 03....
Anos de conturbações sociais 1967 a 1973. No baixo rio Araguaia.
*A Guerrilha do Araguaia e o Padre Pedro.
Um processo lento de
amadurecimento político-social começava a se instalar em nosso país, mas
estavam apenas no inicio, muitos ainda iriam tombar para manter vivo o direito
de igualdade, liberdade e democracia, tão pretendida por aqueles jovens. A
igreja teve um papel fundamental na evolução destes processos.
Padres foram presos por
participarem desta revolução como mentores dos Guerrilheiros do Araguaia: O
Bispo de Marabá Don Estevão, Frei Gil, Padre Roberto, Irmã Maria, Pedro Casaldaliga e Padre Canuto,
inclusive Adauta Baptista Luz, de Luciara MT, por que estava levando comida
para os Padres
O Padre Pedro Casaldaliga teve participação ativa em favor da população ribeirinha sofrida, foi detido e preso varias vezes pelo exercito, mas solto seguidamente continuava sua luta incansavelmente que durou três anos da qual participaram muitos jovens, mulheres e homens experientes. Eles tinham um objetivo e se regiam pela sigla ULDP – União pela Liberdade e pelos Direitos do Povo, a organização que dirigia politicamente o movimento guerrilheiro, e o regulamento das Forças Guerrilheiras do Araguaia. Era a época da ditadura.
Eles começaram a chegar vindos pelo rio
Araguaia no dia 25 de dezembro de 1967,
rio cheio, o estirão do cinzeiro misturava água e céu, não se via as margens,
parecia o oceano, um barco encosta-se à margem esquerda no local conhecido por
Faveiro, três pessoas ali ficaram Mário, uma mulher chamada Maria, e um jovem
de nome Joca. Depois vieram o Zé Carlos, Alice, Beto e Luiz. Osvaldo morava
mais acima um pouco, negro sabido era oficial da reserva, mudou-se depois para
perto da cachoeira de Santa Izabel, ele mais outros amigos Cid, Zeca, Glenio,
Geraldo e Sueli. Paulo Rodrigues morava em Leopoldina (Aruanã) GO. Fazia
viagens em barco vendendo mercadoria tendo por companheira uma mecânica chamada
Doca, seu barco tinha o nome de “Carajás” e sua rota se estendia entre
Leopoldina até Conceição do Araguaia, certa feita mudou-se para o Caiano.
Outros foram chegando Pedro, Ari, Áurea, Diná e seu marido Antônio e também o
médico João Carlos Haas Sobrinho, Elvira, Sônia, João Carlos, Chaves, Victor,
Nunes, Zezinho, Landins, Piauí, Victor, Kleber, Bérgson, Tuca, Janete,
Mariadina, Lia, Cristina, Rosa, Zélia, Angelina, Idalicio, Alfredo, Nelito,
Gil, Maria Lúcia, Flávio, Amauri, Valquiria, Manoel - todos se transformaram em
lavradores e fizeram suas roças vivendo e aprendendo com os sertanejos.
Na época da ditadura a
repressão era violenta, e a policia militar abusava dos ribeirinhos e junto com
os coletores de impostos extorquiam-nos até ultima gota, maltratavam-nos, e
muitas vezes ao prendê-los os matavam. O povo sofria muito. Não bastasse isto
os grileiros de terras que começaram a chegar trazendo seus pistoleiros e
capangas tirando o sossego de todos e vinham dispostos a expulsarem os velhos
moradores de suas posses dentro do seu pretenso latifúndio, milhares de
hectares de terras eram grilados e tal um rolo compressor esmagavam todos a sua
frente e ainda tinham o apoio das autoridades, estes empreendimentos eram
financiados pelo incentivo fiscal. Da
mesma maneira ocorreram em outras regiões os posseiros se viram obrigados a se
transformarem em rebeldes numa marginalização imposta pela própria sociedade,
eram eles o “Barril de pólvora a espera da mecha ardente”. E a igreja os
amparou. “Uma nova era de ajuste social teve começo, mas num país aonde o fiel
da balança tendia em pender a favor dos mais afortunados em detrimento dos
menos favorecidos mostrando o lado dos que tudo tem e dos que nada possuem”, e
estes últimos eram a mecha ardente esperada, começaram-se então as
manifestações daqueles que logo se intitulariam “Guerrilheiros do Araguaia”, e desencadeou-se uma luta desigual
entre as forças armadas e os rebeldes. Foram sacrificadas muitas pessoas, civis
e militares, até uma filha do Cel. Lúcio foi presa quando levava comida para os
padres. Adauta foi recambiada para Campo Grande e lá ficou por vários meses.
Natal de 1973, após três anos
de vitórias e derrotas, a situação se modificava, as Forças Guerrilheiras do
Araguaia espalharam-se por recônditos caminhos, para outros lugares muito além
das selvas, ninguém mais poderia aniquilá-los, mas deixou escrito com sangue a
busca por uma liberdade quase evangélica. As autoridades atentaram um pouco
tarde para a realidade o vírus de uma nação democrática e livre já estava
disseminado, não havia mais retorno e o futuro estava implantado.
§
Choveu Hoje...
Caíram sobre Seu rebanho desgarrado,
Sem omitir detentos dos presídios,
Que se curvam, de joelhos, ao terminar o dia.
Por traz de hediondas fechaduras:
Será que Ele despreza, por serem condenados?!...
Aos presos, lá dentro, Suas flores se abrem!
Lá, dos Céus, dos arcanos, a todos vê Deus.
Nos dias chuvosos, de céus bem nublados,
E a memória turbada, e a mente cansada,
Nossos olhos divisam espinhos temíveis,
Crescendo no campo do coração triste.
E os sonhos confundem o ser abatido,
E, ao nos queixarmos, perdidos da sorte,
O trovão mansamente ribomba e, assim,
Ressoando, qual tambor na batalha, se ouve,
Transmitindo a mensagem: “ Vem, tu, também,
Distraído que estás entre muitos milhares;”
Pois, é certo, que noventa e nove se perderão,
E lá não chegarão, lá na Terra feliz!
Para que o rebanho se salve, e prossiga;
Para o indolente, ocioso, insolente,
Se volte ao redil, Deus chorou. Suas lagrimas
De amor. Foi por isso que hoje choveu,
Autor B.B.B. Prisioneiro do Presídio de San Quentin. .
§
BL O4...
O Padre João Bosco P. Burnier
Assassinato em Cascalheira. 11/12-10- 1976.
O padre João Bosco Penido
Burnier, nasceu no dia 11 de junho de 1917, em Juiz
de Fora, MG. Tinha 59 anos de idade. Na tarde de 11 de outubro de 1976, foi
baleado, em Ribeirão Cascalheira, MT, Faleceu no dia 12 de outubro, em Goiânia,
GO. Jesuíta, missionário entre os índios Bakairi, estava de passagem por Ribeirão Cascalheira
MT. (Ribeirão Bonito) junto com o Bispo
Casaldaliga. Não sabia ele o que o destino lhe reservava.
Assim começou esta triste história, uma tragédia que abalou o Brasil. Eram 23,30 horas do dia 10 de outubro de 1976, um jovem rapaz, filho do posseiro Jovino, morador em Ribeirão Cascalheira, se divertia a valer. Ali, na zona do baixo meretrício, ao lado do parco ribeirão dos porcos, naquele enorme barracão de madeira as sombras da noite prenunciavam algo diferente. O ar estava carregado, lá fora um cachorro uivava quebrando a tranqüilidade dos mais sensatos, sem duvida alguma era um sinal de mau agouro que inquietava a alma dos notívagos.
Alegre, já fora de si, o jovem bebia e tanto
jogava fora como dava para os outros, gritava e cantava, tinha passado dos
limites, estava completamente bêbado.
--Manda
uma galinha assada aqui prô bichão e desce duas cervejas e uma pinga. – exigia
A galinha demorava, mas as
bebidas vinham logo. Já eram altas horas da noite, os habituais já se
retiravam, o dono do cabaré pede para o jovem acertar as contas.
--Por
hoje já chega, tenho que fechar, vai acertar a conta?
Mas
acertar como? O rapaz estava mais duro que beirada de sino. O soldado Félix ali
presente resolve intervir e prende o bêbado, o batuta dorme na cadeia.
Abraão o bate pau da policia
instiga o soldado para no outro dia cedo irem cobrar do velho posseiro Jovino,
pai do preso.
--Amanhã
cedo vamos dar um arrocho no Jovino que ele paga a conta do filho.
--É, mas o Jovino não é mole não, é preciso ter cuidado.
--Brabo
eu sei que ele não é eu nunca vi uma bagunça dele - interfere Abraão.
--É isto
ai, mas vou levar o fuzil, você vai comigo Abraão?
--Claro
que vou.
Jovino o pai do desastrado
rapaz aguarda em sua casa o retorno do filho, não quer ir a delegacia pedir por
ele, mas pede a terceiros para intervirem, mas todos tinham medo da policia.
Na rua naquela manhã
fatídica, andando juntos lá vão Felix levando seu fuzil e Abraão o bate-pau,
rumo à casa do posseiro, entram na casa e começam a pressionar o velho Jovino:
--Seu
filho está preso e está devendo uma nota lá no Cabaré, e viemos aqui para você
pagar a conta e entregar o revolver dele – intimou o soldado.
--Mas,
não tenho dinheiro e ele nunca teve nenhuma arma e eu não tenho culpa disto –
respondeu calmamente Jovino.
--È, mas
ou você paga ou vamos prendê-lo junto com seu filho, disse o soldado - e ato
seguido levantando o fuzil o manobrou jogando a bala na agulha.
Um só estampido foi ouvido, Jovino a se ver
ameaçado e sabendo que Félix ia matá-lo sacou de uma garrucha de um tiro que
trazia na cinta e disparou o único projétil acertando a testa do militar que
caiu com o fuzil na mão, a esta altura dos acontecimentos Abraão apavorado
corre pelas ruas gritando:
--Jovino matou o Félix.
Jovino
foge para as matas e vai aparecer, tempos depois, muito longe dali, em
Canabrava do Norte onde faleceu de morte natural.
Comunicado
o fato para a sede da Comarca de Barra do Garças, vem um pelotão da PM
comandada pelo tenente Costa Neto. O tenente Lepesrteurs vem também. Abrem-se o
inquérito e buscam pelo Jovino, mas não consegue o encontrar.
Testemunhas foram ouvidas chegando-se à
conclusão que fora Abraão quem gerara os acontecimentos.
Os oficiais regressam para Barra do Garças, ficando em Cascalheira o Cabo Juracy, Cabo Messias e vários soldados e estes resolveram continuar as investigações e a prenderem Jovino a qualquer custo, duas mulheres são detidas, são elas a Santana e Margarida já idosas, eram irmã e nora do foragido.
--Elas
sabem onde ele esta, estão levando comida para ele lá no mato, vão ter que
contar – era a ordem geral entre os PMS.
Retidas na cadeia as duas
mulheres são barbaramente seviciadas, agulhas são enfiadas em seus seios,
embaixo das unhas, braços abertos em cruz e fuzis enfiados em suas orelhas, e
batem em seus rostos, estavam ajoelhadas e em baixo de seus joelhos tampinhas
de cerveja viradas para cima. Uma delas havia dado a luz a uma criança a menos
de um mês e menino estava no chão da cela chorando, a mãe pedia:
--Deixe
meu filho mamar, pelo amor de Deus!!!
--Então fale onde está o bandido,
senão!!!
O dia fatídico havia chegado... Era de 11 para 12 de outubro de 1976.
Cai à noite e todos têm medo de chegar perto da cadeia, tudo cheirava a álcool. Tarcísio Dairrel um agente pastoral que residia em Ribeirão foi levar água para as duas mulheres. Nesta mesma tarde prendem também um oleiro sob suspeita que tenha ajudado o criminoso a fugir. Tarcísio ao chegar junto da cadeia escutou os gritos das mulheres e não teve coragem de chegar mais perto, volta à casa paroquial e conta para o bispo Don Pedro o que estava se passando. O Bispo resolve ir até a cadeia interceder pelas mulheres, o padre João Bosco resolve:
--Pedro
eu vou também.
--Deixe
que eu vá só – insistiu o Bispo.
Mas João Bosco estava decidido
a ir.
Na porta da cadeia naquela
noite escura, estavam quatro PMs, o cachorro ainda uivava tudo era prenuncio do
mal, e o calor era intenso.
Pedro chega e fala ao Cabo
Messias que ali estava junto com o soldado Ezy Ramalho Feitosa, outros dois
soldado se retiram para dentro da
delegacia e cadeia, não queriam participar.
--Soltem
as mulheres, não podem judiar tanto delas assim.
--Olha
bispo comuna você é um crápula saia já daqui senão...
João Bosco tentava
argumentar, uma tapa explode em seu rosto, gritos e xingos acompanham um
pavoroso estampido que espanta a noite, o cão se calara, já não uivava mais, só
a voz do criminoso.
--Foi
só pra assustar...
João Bosco recebeu a bala na
cabeça que lhe rasga o cérebro e quis soltar a vida.
Pedro o ampara e reza por
ele, ali não havia medo e nem ódio, só silêncio, tristeza e muito calor humano,
levado para a casa se deu conta da gravidade, veio a falecer já no dia seguinte
em Goiânia era 12 de outubro de 1976.
Estava
escrito que deveria morrer no lugar de Casaldaliga.
Suas últimas palavras: ”Terminei minha Tarefa” .
Aquele padre, como toda
estrela que risca o céu foi mais uma a se encravar nas maravilhas do Criador, o
Padre João Bosco Burnier foi riscado da terra para cair no céu, morreu como só
os heróis morrem dando a própria vida por tentar ajudar quem dele precisava.
A cadeia foi derrubada pelo
povo e em seu lugar ergueram uma igreja em louvor aos “mártires da grande
caminhada” e uma placa grava o acontecido “aqui mataram o Padre João Bosco
Burnier, morto pela Policia de Mato Grosso”.
De cinco em cinco anos
grandes romarias relembram este episódio brutal, desta triste pagina da
história de nosso Mato Grosso.
Quando a coisa aperta...
Eu estava em casa quando
recebi o chamado do Juiz Dr. Flávio José Bertin, e ainda mais naquela hora da
manhã? Fiquei desconfiado, devia ser algum rabo de foguete, mas como sempre nas
horas de aperto eu sempre levava chumbo, como Oficial de Justiça da Comarca de
Barra do Garças eu já estava acostumado, assim fui direto ao gabinete do Juiz
lá no Fórum e quando abri a porta fiquei surpreso, nunca esperei ver tanta
autoridade reunida. Estava ali todo o alto comando da PM de Mato Grosso.
--Exatamente, pelo o que se sabe até agora, um policial matou o padre João Bosco Burnier e a situação lá esta melindrosa e não temos jeito de mandar buscar as vitimas que pelo se conta foram seviciadas por elementos da nossa corporação, que já se encontram recolhidos no quartel aqui em Barra do Garças, mas há necessidade de instalarmos urgentemente um IPM e necessário se faz ouvir as testemunhas, mas não queremos mandar um destacamento para lá no momento seria uma imprudência, pois não queremos tumultuar mais a situação, mandar um Oficial seria contraproducente face ao sentimento de revolta em que o povo de lá se encontram, mas uma pessoa como o Senhor familiarizado com o pessoal da Cascalheira poderia ser bem recebido e trazer as três testemunhas que queremos ouvir.
--Só isto
– perguntei, é muito fácil, eles arranjam a encrenca e me põe no fogo, mas...
--Você
deve trazer de lá estas pessoas, e como o avião do Estado só tem lugar para
mais dois, traga primeiro as duas mulheres e depois traga o homem – falou o
Juiz.
--Mas
doutor se eu trouxer estas mulheres quem vai me garantir que elas serão
recambiadas de volta?
--O mesmo
avião que as trouxer as levará e têm mais, as mulheres ficarão sob nossa
custódia o tempo que permanecerem aqui você as acompanhara durante todo tempo.
--E quem
é o piloto do Estado?
--O
Milton já esta te esperando no campo.
--Então
até mais tarde senhores – me despedi e sai para o campo.
No campo Milton já estava
com o avião pronto e como era cedo do dia dava tempo de ir e voltar.
--Outro
abacaxi hein? Vamos descer direto ou vamos sobrevoar primeiro?
--Vamos
fazer um rasante para alguém ir buscar nós lá no campo.
--Não se
incomode com isto, lá vai ter gente demais.
Sobrevoamos o Ribeirão
Cascalheira, um corre... corre danado lá
em baixo, será...
Descemos no campo da Betumarco, era o
campo em uso, quando o Milton rolou o avião o campo estava cheio de gente junto
à entrada de estacionamento. Mas quando desci do avião ouvi um Ohhhhh...bem
comprido realmente eu acho que para aquele povo foi uma decepção esperavam
algum graúdo e chego eu, Acho que estavam esperando pelo Governador do Estado. Vieram todos ao meu encontro, estavam
meio frustrados, mas não fazia mal eram meus amigos de longas datas.
--Só
vieram vocês – perguntou o Fritz que era o dono do Posto e dono do caminhão.
--Só nós,
porque estavam esperando a Vera Fischer? Brinquei com o amigo.
--Vamos
descer e conversar sobre o que vim fazer aqui – Milton já havia fechado o
avião, juntos fomos para a cidade. Ao passar pelo bar do Isidoro, não tinha
jeito não, tinha que parar para tomar uma cerveja e dar satisfações a uma
dezena de amigos, mas o Milton estava impaciente:
--Rapaz
isto não é campanha política não viemos buscar as mulheres.
Acabei de tomar a cerveja e
pedi ao Fritz para me levar até onde estavam a Santana e a Margarida. Elas
estavam do outro lado do Ribeirão, paramos o caminhão bem na porta da Santana
que me reconheceu:
--Seu
Dequimá foi o Senhor que chegou naquele avião?
--Foi
Santana, eu vim lhe buscar.
--Vão
prende a gente de novo? Seu Dequimá eu num aguento estou muito fraca.
--Ninguém
vai lhe prender Santana, o Juiz da Barra quer falar contigo e com a Margarida,
os soldados já estão presos e devem ser punidos.
--Depois
eles se vingam da gente Dequimá, aqui num tem justiça não.
--Ué
então vamos deixar estes homens soltos? Nada disto você vai comigo e a
Margarida também e eu garanto trazer vocês de volta.
Nisto a Margarida já vem
chegando com uma sacolinha em baixo do braço.
--Falaram
que o Senhor veio nos buscar para dar depoimento lá no Juiz da Barra do Garças?
--Isto
mesmo Margarida.
--Comadre
– disse a Margarida para a Santana – nos temos que ir hoje e amanhã a gente
volta, o Juiz ta chamando a gente e nos vamos, podemos confiar no Juiz e no
Dequimá.
--Então
vamos.
Depois das duas mulheres
subirem no caminhão do Fritz e eu íamos subindo também quando outra mulher me
agarrou pela camisa e puxando falou:
--Seu
Dequimá eu preciso falar contigo, é urgente,
Era a Iolanda a mulher do Penalva, um aventureiro metido a tudo que havia sumido de Ribeirão de tanta encrenca que arrumara.
Pedi para o Fritz me esperar
um pouco enquanto ia à casa de Iolanda e lá chegando ela me mostrou duas
latinhas que mais pareciam latas de cervejas, só que eram diferentes.
--O
Senhor sabe o que é isto aqui – perguntou
--Sei,
são duas bombas de gás lacrimogêneas não detonadas tentei explicar.
--Foi o
que eu pensei - disse a mulher e continuou - no dia que a policia chegou aqui
eu estava em casa sozinha com meus dois filhos, o Penalva desde há muito se
foi, e acredito que contaram para a Policia que o criminoso estava aqui em
casa, assim ele jogaram estas duas latinhas pela janela e correram e eu me apavorei e sai correndo levando meus dois
filhos comigo, não sei como não atiraram em nós, ai eles invadiram a minha casa
e não acharam nada e me largaram de mão e eu voltei e fui tirar água do poço
quando uma das latinhas saiu no balde ai eu tirei a outra e enterrei as duas
que agora estou te mostrando.
--Me de
estas duas latas, eu vou levá-las e entregá-las para o Juiz.
--Seu Dequimá não dá para o Senhor me tirar daqui? -
--Esta bem Iolanda, manhã eu venho trazer estas mulheres e levar outra testemunha, na ida acho que da para você ir.
Sai direto e fui para o
campo o Milton e as duas mulheres já estavam esperando.
--Pronto,
podemos voltar.
--Espere
ai que isto ai?
--Só duas
latinhas que estou ajuntando
--Desde
quando?
--Ora piloteiro
- respondi as agasalhando em baixo do banco - vamos embora.
Depois que decolamos fiquei
apreensivo e se estas latas estourarem com a pressão? Mas já não havia o que fazer agora era só
rezar para que nada acontecesse. Quando chegamos a Barra do Garças foi um
alivio, desci do avião e tirei as latinhas foi quando o Milton se deu conta do
que eram:
--Você é
doido, trazendo duas bombas dentro do avião?
--É, mas
não aconteceu nada.
--Mas podia ter acontecido e nos
iríamos morrer.
Como já era de tardinha,
passei pelo Fórum deixei as duas bombas entregando-as para o Juiz comentei:
--As duas
mulheres estão lá fora no carro.
--Leve-as para uma pensão bem
isolada, não diga a ninguém onde estão e fique de plantão o tempo todo e amanhã
bem cedo as traga aqui para serem ouvidas.
--Tudo
bem.
Deixei as duas mulheres na
pensão da Ingrace, uma amiga minha e as recomendei ao máximo, no outro dia bem
cedo as levei para o Fórum e as introduzi no Gabinete do Juiz que ainda não
havia chegado.
--Trouxe as vitimas?
--Vamos
ouvir as duas mulheres, primeiro a Santana, depois a outra. Vamos fazer uma
acareação para que elas reconheçam e indiquem seus agressores.
--Façam
uma fila aqui e só respondam o que lhes for perguntado – ordenou o comando para
os soldados.
--Santana
qual destes homens a agrediu?
--Aquele ali – mostrou Santana – me bateu e ameaçou matar o neném e espetou agulha no meu seio e aquele outro também. As duas identificaram oito soldados junto com os cabos, e contaram tudo os que lhes fizeram, alguns soldados a despeito de estarem presentes seus superiores ainda ameaçaram as vitimas precisando o Juiz corrigi-los.As mulheres foram liberadas e eu voltei com elas para o Ribeirão no outro dia trouxe a ultima vitima, que depois de ouvido foi liberado, arranjamos uma passagem de volta e dinheiro para as despesas. O soldado foram todos expulsos e Ezy foi preso para ser processado civilmente, mas transferiram sua prisão para a cadeia de Aragarças - GO, sob o pretexto de que a cadeia da Barra seria reformada e colocaram o soldado Milhomem de plantão à noite Ezy abriu um buraco na parede e fugiu para nunca mais ser encontrado. Também ninguém foi atrás dele.
Deste rolo danado quem levou
a pior foi o Padre João Bosco Burnier que morreu inocentemente no lugar do
Bispo “como Ezy dissera ao atirar - Cala a boca Bispo comuna”.
O Sargento Abdias e soldado
Carlinhos não estavam lá, mas foram punidos e expulsos também, pouco tempos
depois, quando a poeira abaixou todos foram readmitidos na policia e ainda
estão por ai.
O Dr. Flavio mandou chamar o
Tenente Costa Neto e mostrou-lhes as duas bombas que eles haviam jogado em uma
casa que só tinha mulher e crianças e repreendeu severamente esta medida.
Dei carona para a Iolanda
que se mudou para sempre de Ribeirão Cascalheira.
À época era ditado comum em
Cascalheira MT:
“Criminoso é quem morre porque já está preso para sempre”– “Aqui se mata um hoje e se amarra outro para matar amanhã.
*
BL 05...
O Bispo Dom Pedro.
A
Raposa do Araguaia lidera reunião...
*Porto Alegre do Norte
MT – 18 de dezembro de 1979
Assassinato em Porto
Alegre do Norte MT
“No dia 17 de dezembro de 1979, sob a orientação do Presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Porto Alegre do Norte MT, se reuniram quinze homens, entre eles o agente pastoral Rudolfo Alexandre Inattio, mais conhecido por “Cascão”“. Combinavam irem ao dia seguinte até onde a Fazenda Piraguassú estava construindo uma cerca e paralisarem os serviços da mesma. E assim o fizeram, e, na hora aprazada, 10 horas da manhã de 18 de dezembro, ali chegaram todos de arma em punho e determinaram que o empreiteiro Lauderino Evangelista paralisasse os serviços, no que foram atendidos, em face de coação exercida. Mas, não satisfeitos, coagiram também o fiscal “capixaba” a embarcar no carro que os conduzira afim de que o mesmo se entendesse com “muriçoca”, que era o presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais. O fiscal se negou a acompanhá-los foi quando um dos “posseiros” gritou peguem o “homem” e num ato continuo “capixaba” recuou instintivamente em atitude de defesa, mas Joacyr o “posseiro” estronda sua cartucheira calibre vinte e o balote criminoso rasga a carne do empregado da fazenda e quer lhe soltar a vida. “Capixaba” tomba ferido, e querem enfeitar a tragédia, para tanto vão até o corpo agonizante do capataz e tiram de sua cintura o revolver que não puxara, e, com ele atiram dentro da boca do moribundo dizendo:
--Não
gosto de ver ninguém estrebuchando.
Outro
empregado da fazenda, o menino Raimundo chora amparado pelo velho posseiro
Izidio, mas o matador não se contenta e
quer matar mais:
--Você
também seu moleque vai morrer – e enfia o revolver no menino.
--Deixa-o
em paz, é só um menino – interfere o velho posseiro.
Todos embarcaram na
caminhonete e rumam para o povoado a fim de festejar o crime, mas no caminho,
combinaram irem direto para o Sindicato bater uma declaração:
--Precisamos
todos testemunhar que agimos em legitima defesa que o “Capixaba” quis nos
atirar e nós nos defendemos – ensinava o mestre “Cascão”. E de fato, ao
chegarem ao povoado, foram até o Sindicato e lá redigiram a tal declaração:
“SINDICATO
DOS TRABALHADORES RURAIS DE PORTO ALEGRE”. 18/12/1979. DECLARAÇÃO A QUEM DE DIREITO
Após terem assinados sob coação os funcionários da fazenda foram liberados. A Policia de Luciara fora avisada.
Chega a Porto Alegre o Delegado de Policia acompanhado de dois policiais militares. Cascão um dos indiciados é preso e também Moacyr irmão de Joacyr, o resto dos posseiros envolvidos se encontram foragidos, fogem para a mata.
O Bispo Don Pedro Casaldaliga Plá da Prelazia de São Félix do Araguaia MT. É avisado e não tarda a chegar ao povoado, já vem acompanhado do Bispo de Porto Nacional, do Deputado Estadual Dante de Oliveira e ainda do advogado da Comissão de Justiça e Paz da Prelazia de São Paulo Dr. José Roberto Leal.
E ali estavam eles mais de duzentos homens, todos camponeses, reunidos à espera da palavra do clérigo. Ali estava a sua “Massa conscientizada” e Porto Alegre do Norte, no fim do Estado de Mato Grosso, quase na Divisa com o Estado do Pará, bem às margens do lendário rio Tapirapés, estavam em “festa” uns sorriam, outros choravam, um homem fora morto, seu nome era apenas “Capixaba”.
O
vilarejo se remoça com inusitado movimento de aviões, caminhões, carros
pequenos, a cavalo, a pé de todas as formas começam a chegar sua massa
conscientizada por ele Bispo, convocada, cozinhas foram organizadas, muitas
vacas mortas, sacos de arroz e feijão empilhados, uma organização quase
perfeita.
A
versão apresentada por Cascão corre de boca em boca, mentira para seu líder o
Bispo, e agora o martelar constante a transformava em realidade.
Em frente da cadeia, mai s de duzentos homens armados de foice, facão, machados, espingardas exigiam a
libertação dos dois prisioneiros. O Delegado estava coagido ante a massa
convulsionada e não teve alternativa a não ser soltar os indiciados que estavam
presos. Para depois abandonar a cidade e ir à busca de reforços e assim o fez.
Chega outro grupo de policiais
militares vindos da sede da comarca, o inquérito foi instaurado e a testemunhas
e vários indiciados são ouvidos.
Centenas
de posseiro acompanharam o desenrolar dos depoimentos. Os indiciados na maioria
continuavam foragidos.
Acalmada a situação todos
regressam a suas origens e o cadáver foi sepultado.
Ali estava à famosa e astuta Raposa do Araguaia, carregando um peso incomensurável de amor e de dignidade, o lendário Bispo da Prelazia de São Félix do Araguaia, Don Pedro Maria Casaldaliga Plá, como que a evocar a sua própria alocução:
...“Morrerei
de pé como as arvores (me matarão de pé) de golpe, com minha morte, minha vida
se fará verdade”.
Retrocedendo a sua infância:...”Quando ainda
menino, aos doze anos de idade, Pedro já anunciava aos quatro ventos o desejo
de ser missionário, estudou no seminário La Gleva, na cidade de Vic, na
Catalunha. Em 1952, aos 24 anos, em Barcelona, Casaldaliga foi ordenado Padre.
Perambulou pelo mundo através do continente Africano para vir cair finalmente
no Brasil, tinha então 40 anos quando desembarcou no Rio de Janeiro, em 26 de
janeiro de 1968. Depois de sete dias de caminhão, cruzando, pontes e estradas
precárias, e atoleiros, Casaldaliga chegou a São Felix do Araguaia e se deparou
com os conflitos fundiários e a absoluta ausência do Estado”). (Wdgh- 2005-
Terras Bravias).
Dom Pedro Maria Casaldaliga Plá.
BL 06...
A Raposa do Araguaia, o Latifúndio e
"O
Posto da Mata".
Introdução
ao problema Posto da Mata...
Histórico...
Fundação
Brasil Central na Ilha do Bananal em 1960/FBC
O autor
deste trabalho, Wolfgang Dankmar Gunther foi designado em 09/10/1960 como
encarregado do Posto da barreira Bem Vinda na Operação Bananal e a 19/09/1961
designado para exercer a função de chefe do Posto da Ilha do Bananal. E pela
Portaria 143/ 66 foi designado para exercer a função de chefe do Centro de
Atividade da Ilha do Bananal.
*
No inicio de 1960 a FBC –
Ilha do Bananal, recebeu um telegrama da Presidência da FBC em Brasília a qual
informava a vinda, pelo avião DC3 Douglas da FBC, - de um cidadão cujo nome era
Ariosto da Riva, proprietário de uma extensa área de terras no lado mato-grossense
e que deveríamos apoiá-lo nos seus trabalhos de pesquisas, levantamento,
transporte etc.
A finalidade da FBC era o
desbravamento dos sertões e para isto contava com equipes especializadas como
os sertanistas Claudio, Orlando, Leonardo, Enzo, o autor, e mais uma dezenas de
auxiliares e de tiracolo tínhamos um pequeno avião monomotor Cesna 170 cujo
piloto era o Adolfo Rolim Amaro e tínhamos ainda amigos agrimensores como
Francisco Telles que residia em São Felix do Araguaia que a nosso pedido, logo
passou a pertencer à equipe de Ariosto
Com a chegada de Ariosto ele
foi devidamente hospedado e, seu objetivo já estava em franco desenvolvimento.
.
O Dr. Luiz Carlos Lima
Militão Advogado, residente em Goiânia, já falecido, assim me contou: certa feita: “As terras que Ariosto estava sendo
proprietário, então já denominada Suia Missú, e isto como referencia ao rio que
corta a região, haviam sido adquiridos do governo do Estado de Mato Grosso no
governo de Ponce de Arruda, pelo seu pai conhecido como Militão (Francisco do
Amaral Militão) advogado, economista, funcionário publico, cronista e escritor,
em aproximadamente 695 mil hectares”.
(695.000 HECTARES).
Assim foi dividida esta
enorme área...
Uma equipe de homens liderados pelo agrimensor
Telles fizeram o serviço e assim Ariosto pode dispor parte da área para
diversos grupos. E assim ficou a divisão: o INCRA utilizou aproximadamente 217.774
mil hectares para reforma agrária com os assentamentos “Mãe Maria” “Pedro
Casaldaliga”, “Bandeirantes”, “Roncador” e “Serra Nova”; A Liquifarm
Agropecuária Suia Missu, (empresa da AGIP
subsidiara Italiana) 165,241 hectares; Romão Flores da Fazenda
Rio Preto adquiriu 171.985 mil hectares; Fazenda Vale do Boi de Mario Quirino adquiriu por compra 90 mil hectares; Fazenda Morumbi do Grupo Olivetti ficou com 50 mil
hectares; Perfazendo o total de 695.000 hectares de terras então
pertencente a Ariosto da Riva.
O resultado final após das
vendas particulares incluindo as destinadas pelo INCRA para assentamento foram 357.773
hectares.
Restavam da área de 695.000
hectares um total 337.226 hectares, que foram remanejados
Faz.
Rio Preto...51% capital nacional.. 337.226 x 51% = 171.985 hectares.
Liquifarm..49%
Capital estrangeiro.......337.226 x 49% = 165.241 hectares.
O que não ficou esclarecido
foi uma compra, muito ventilada naquela época, do Grupo Garavelo de Goiânia
estimada em 250.000 hectares. Neste caso a área de Ariosto não seria apenas
695.000 hectares e sim 945.000 hectares.
&
Naquela oportunidade o
Estado, no Governo de Ponce de Arruda, vendia as terras em lotes de 10.000
hectares, bastava arranjar os interessados e o titulo saia, depois era só fazer
a transferência e registrar em Cartório.
Para localizar e levantar o
perímetro desta enorme área teve que se deslocar para o oeste rumo a Porto
Alegre do Norte e de lá iniciaram o levantamento via satélites da área em
questão (Lembro-me que se comentava naquela época que um dos trabalhadores do
agrimensor garimpando no rio Tapirapé encontrou um diamante bem grande naquelas
paragens.). Fato este que ficamos sabendo da equipe de medição naquela
localidade e assim também me segredou Telles.
Os Salesianos iriam instalar
uma Missão na Suia, mas não levaram adiante a idéia. Todavia comentava-se em
altos investimentos do Banco do Vaticano e da SUDAM nas terras da Liquigás com
projetos mirabolantes entre estes figurava a implantação de uma enorme
agropecuária e até que iniciou muito bem, casas para funcionários, escritórios,
ambulatório, um aparente hospital, deposito, sistema de abastecimento de
combustível, pista de pouso com hangar para aviões pequenos, derrubadas para
plantio de grãos e forrageiras e pastos, etc.. e muito movimento, mas
paulatinamente foi diminuindo...
Os índios Xavantes, um grupo
isolado passou a frequentar as redondezas das terras da Suia Missú, sempre
pelos varjões, campos e cerrados, vinham de uma modesta aldeia provisória
situada no campo limpo bem na margem do rio Xavantinho a cerca de 20
quilômetros da sede da fazenda, mais ao menos ao rumo de povoado de
Pontinopolis. Devo esclarecer que eram índios remanescentes da antiga *Aldeia
de Marãiwatséde da região do Couto Magalhães, junto ao rio das Mortes, que em
24 de fevereiro de 1957 se evadiram da região para buscar abrigo junto aos missionários de Sangradouro pedindo acolhida e ali perto
fixaram a sua aldeia que ainda hoje leva
o nome de “São José”, o segundo grupo destes remanescentes também se evadiram
da região e chegaram ao Meirure em 02 de agosto de 1958 pedindo acolhimento,
para traz ficaram apenas estes últimos remanescentes eram aproximadamente
cinqüenta índios ou um pouco mais. Acredito que, hoje existem aproximadamente 31 aldeias Xavantes em
Mato Grosso.
O índio Xavante é nômade por
natureza, suas praças mudam constantemente de lugar assim que as caças se
tornam escassas eles partem sempre a procura de novos campos. Por habito tribal
não gostam de frequentar lugares fechados, seus arcos grandes e flechas
compridas são um grande empecilho e embaraço nas matas, e ainda temem os
“espíritos da mata”. O Xavante é um índio do Cerrado e do Campo, e assim
demonstram nas suas pinturas corporais que matizam o vermelho com o marrom se
identificando com a cor ambiente do cerrado e desta forma estão a cultuar seus
modos vivendis.
Voltando ao Posto da Mata...
Em 13 e 15 de agosto de 1966,
por solicitação dos que se diziam donos das terras e autores dos projetos com a
anuência do SPI ou FUNAI resolveram transferir
“O último grupo de Xavantes
remanescentes da aldeia Marãiwatséde em virtude o dos índios terem sidos acometidos de doenças havendo já morrido 10 a 12 deles em um ano, os administradores e
fazendeiros motivados por essas mortes e
pelas doenças e pelo péssimo estado de vivencia em que se
encontravam, entabularam um acordo com o cacique Tiburcio que aceitou
remove-los para São Marcos” um Posto
para índios Xavante inserido dentro da
Missão Salesiana onde já se achavam, há vários anos, instalados os parentes dos mesmos vindos da aldeia mãe
Marãiwatséde junto à região de Couto Magalhães, nas margens do rio das Morte,
nos vastos campos de São Felix do Araguaia;
Em 1966 a ordem veio de Brasília, era época do Regime Militar, a FBC era um órgão subordinado diretamente ao Gabinete do Presidente da Republica e passou a ser vinculada ao Ministério do Interior.
Um avião Douglas da FBC,
pilotado por oficiais da FAB veio de Brasília para Santa Izabel na Ilha do
Bananal e depois pousou em Suia Missú e fez estas transferências. Eu,
pessoalmente, assisti uma destas e não
foram mais do que três ou quatro vôos e em dias bem alternados. O Douglas DC-3
ou C-47 levava no Maximo vinte passageiros. Ou 1400 quilos de carga útil.
Lembro que o pessoal comentava a guisa
de admiração que quando da ultima viagem um índio que teria ido ao primeiro voo já tinha voltado a pé.
Os projetos mirabolantes desmanchavam por traz das cortinas dos desentendimentos internos próprio dos
grandes latifúndios e isto fez gerar o descontentamento e um incomodo de
caráter internacional entre Vaticano e Itamarati e SUDAM e a AGIP-Petroli a
tiracolo – sanado com a intromissão do ECO 92 – e a saída seria devolver o
domínio da terra ao Brasil. O Presidente
da ENI (Órgão controlador da AGIP)
anunciou que iria doar as terras aos Xavantes, a que a AGIP do Brasil
não concordou e concluiu“Se o Governo Brasileiro quer as terras às comprem ou
então as desapropriem”.
Enquanto isto acontecia varios políticos daquela época, falando-se em crias regionais, amasiados aos interesses do grupo remanescente ficou com os 51%% da terra e que certamente não queriam ter os índios como vizinhos proclamaram aos quatros ventos “Podem invadir que o João garante” Quando da invasão o Clero na sua cumplicidade se quedou calado: (Afinal a área em questão era do Vaticano) Nem que sim – nem que não, mas o que poderia ter sido feito para impedir?
Trinta anos se passaram o povo continuava chegando ansiosos por um pedaço de terra e o Posto da Mata se transformara em uma pequena e prospera cidade com mais de 2.500 famílias com núcleos residências urbanos e periféricos, mais de 1.550 eram produtores rurais, Luz elétrica na sede e rural,, varias Igrejas, Armazéns, Supermercados, Padarias Escolas, oficinas, Restaurantes, hospedagem, Postos de abastecimentos de combustível, três maquinas de beneficiar arroz, linha de ônibus intermunicipal executiva, transporte escolar com atendimento municipal, etc.
Enquanto todos dormiam na
desatenção dos desenrolar dos acontecimentos que se avolumavam por baixo do pano, os mais espertos
tramando se valendo do potencial das ONGS estrangeiras, em surdina impuseram
que a FUNAI interviesse e destinasse a terra aos índios retornando os migrados
e agregando a estes dezenas de outros, dai nasceu a verdadeira contenda.
A FUNAI se assenhoreou das
terras numa abocanhada de 165 mil hectares de mata e as destinou, com a batuta
do clero, para apenas um punhado de índios que nada tinha a ver com elas.
Finalmente os Clubes
Internacionais, ONGs nac. ONGs ext.,
o Clero e uma leva de interessados no Proagro e outras oferendas se
posicionaram a favor dos índios e pela expulsão dos vilarejos, na maioria
família de roceiros pobres, pequenos criadores e lavradores e sem outras
moradias, mas para dar sustentação a seus pretensos direitos adquiridos os
índios assessorados por malfazejos que se intitularam de assessores beneméritos
elaboraram uma carta a Presidência da Republica com dizeres um tanto
perniciosos assinada pelo cacique Xavante Damião que a protocolou na sede do
Ministério Público Federal, em Cuiabá e ali ele derrama seu linguajar num
verdadeiro verborrágico acusando:
Analisemos os textos em que
acusam...
“*Os fazendeiros de assassinos por terem
mortos a tiro cinco de seus parentes e que não iriam trair os espíritos deles e
que...
“São Felix do Araguaia em 1960 só tinha
duas casas”.
*Vejamos a seguir o que diz o
livro “Terras Bravias” (de Wdgh) publicado na internet em 2005 ao que parece
vem esclarecer estas duas declarações:
Pagina seguinte...
“Willy Aurelli fora levado
para a casa de Severiano Neves o piauiense que fundou aquela vila que veio a se
chamar São Felix do Araguaia, pois tinham muito que conversar, afora os
problemas existia o lapso de tempo de ausência, mas uma pequena multidão os
acompanhou. Realmente o Chefe da Bandeira Piratininga era muito querido por
aqueles sertanejos e uma vez instalados, tomaram um cafezinho que a esposa de
Severiano a Dona Edilia havia feito e iniciou-se uma longa conversação e eu
sempre entrosado estava ali presente notei o semblante abatido e senti que
Willy internamente remoía lembrando a distancia de quatro anos que volvia sobre
o mesmo roteiro e pisava novamente a terra que tantas lagrimas soubera. Logo
adiante o tumulo de seu irmão e os farrapos de recordações dolorosas.
Acolhida amiga.
*Recordações afluindo, Azafama alegre dos primeiros momentos de
desembarque. Lugar apropriado para instalação de um bom acampamento. Sombra e
água fresca (porto da manga).
Foi logo
depois que veio ter conhecimento das graves novidades. Os Xavantes estavam
depredando tudo, vindo das brenhas, aterrorizando os moradores, muitos dos
quais já tinham debandado à margem oposta do rio, pondo a largura da imensa via
fluvial de permeio aos índios agressores. Os remanescentes viviam dentro da
incomensurável angustia da eterna ameaça. Os retirantes da localidade de
Caracol, lá estavam seminus por terem perdido tudo quanto possuíam, olhos
ansiosos e interrogadores rolando as órbitas escancaradas.
Com essa
delicadeza comovedora própria dos sertanejos, nada me foi dito logo ao
desembarcar. Todos se desdobraram em gentilezas e auxílios. Foi ao tomar o café
na residência de Severiano que a coisa me foi narrada e sem rebuços me foi dito
ser eu, naquele momento, o salvador enviado por Deus, graças às preces que
diariamente eram feitas!
Saímos
juntos daquela parafernália de problemas, e agora o que fazer? Eu ia
monologando quando Willy se voltando me disse:
--Leve
os barcos para acamparem no Porto da Manga e peça ao Darcy para vir até mim.
A
primeira etapa fora bastante dura e complicada, mas certamente nosso comandante
acharia uma solução plausível, agora era ter paciência e aguardar os
acontecimentos.
Já estávamos na cidade há quatro
dias e o comandante Willy já havia nos apresentado a quase todos os moradores,
passei a conhecê-los, na primeira casa o Zé Martins, depois seu irmão Leócadio,
Lupercio, Maria Dias, Severiano Souza Neves que era o chefe fundador da vila,
seu genro Ateneu, Sindô, Bento de Abreu Luz, Tertuliano, Piaçaba, João
Vermelho, João da Luz, Anicetro Oliveira, Juvenal, Pedro Brito, Raimundo, Zé
Rocha, Zé Ferreira, Anselmo Alves, Tertuliano e muitos outros eram mais ou
menos treze casas a beira rio e umas seis casas na beira da lagoa. “Ali
residiam o Zé Lagoa, José Martins da Lagoa, Amâncio de Melo e outros”.
*Nos anos de 1948, São Felix
do Araguaia já tinha 20 moradias construídas as margens do rio, (13 eram casas
solidas e 07 eram ranchos anexados) e mais 06 casas no Recanto da Lagoa, que
ficava retirado da vila em apenas uns dois quilômetros. E uma população
estimada em 202 habitantes.
Passei a morar em São Felix
do Araguaia a partir do retorno da Bandeira Piratininga em fins de 1948.
Em 03 de Março de 1953, eu o autor me casei com Maria Paciente Gunther, foi o primeiro casamento oficial registrado em Cartório em São Felix e o escrivão era Guilherme Luz.
Em 1960 quando ingressei na
FBC, na Ilha do Bananal em Santa Izabel do Morro, São Felix era a nossa base de
suprimentos, a cidade já tinha mais de 80 casas, e no recanto da lagoa cerca de
20 casas solidas e uns 02 ranchos e varias chácaras e uma boa centena de gente
morando nas posses esparramadas pelo sertão afora e muito movimento beira rio
por embarcações e o progresso caminhava franco e aberto com vários mercados e
lojas, pista de pouso para aviões, escolas, pensões, botequins, bares,
Cartórios, Delegacia de Policia, Destacamento Policial etc.
Começava a se movimentar a
famosa Operação JK.
“Também já afloravam os problemas que naquelas épocas já vinham acavalados ao progresso Ditado Popular uma cidade para ser boa tinha que ter cinco: “P” Padre- Peão- Pinga- Policia e Puta”.
Como pode o Cacique Damião
categoricamente afirmar que São Felix em 1960 só tinha duas casas? Isto é uma
aberração inacreditável.
Voltemos a Agosto de 1948/1949/1950.
1948...
“Os índios Xavantes entram
pela primeira vez pacificamente em São Felix do Araguaia”.
Logo que cheguei a São Félix
as mulas de carga entraram no curral aberto do Severiano, seguidamente
despejamos a carga no chão, em seguida avisei ao Chefe que junto com Weber já
haviam notado a minha preocupação.
--Os índios estão chegando, são uns trinta ou mais não tivemos
tempo de contar.
--Muito bem Dankmar soltem os animais e vamos nos preparar para
recebê-lo – disse o Willy bem contente, afinal tudo dera certo até agora,
estava apreensivo, pois João Irineu ficará para traz.
Os moradores da Lagoa
chegavam apressadamente trazendo verdadeiras mudanças em suas costas, pois
tinham medo dos índios Xavantes, mas o Chefe os acalmou.
Depois de seis dias em São
Félix do Araguaia os índios voltaram para a aldeia levando muitos presentes e a
certeza de que os toris e Carajás eram amigos.
Mas como em toda a família
sempre tem uma ovelha negra assim os tinham os Xavantes, ela se chamava
“Camilo” e seus quatro seguidores, tinham sido expulsos de seus convívios
passando a vagarem sozinhos, eram cinco rebeldes, como veremos a seguir.
Naquela oportunidade eu não
regressei a São Paulo...
Este contato com os índios
Xavantes não foi de todo proveitoso ao menos para algumas pessoas. Como em
todas as famílias, os índios também tinham suas ovelhas negras e o líder destas
tinha o nome cristão de Camilo. Soubemos que o grande chefe Terezaçu os havia
expulsado de sua comunidade.
Camilo era um índio novo,
mas muito irrequieto, gostava de aparecer de supetão vindo sempre por de trás
das pessoas e assobiando entre os dentes o que fazia todos sentirem um
friozinho na nuca. Sempre aparecia em um
lugar qualquer e quando menos se esperava, e com ele, outros quatro índios.
Ali pelo mês de outubro de
1949, Camilo apareceu na fazenda Caracol do João Irineu e ele, Camilo, estava
doente, os quatro outros índios estavam com ele.
--Camilo você esta doente?
--Doe muito o peito e as costas e tem febre.
--Pode ser pneumonia, eu vou tratar de você, mas vai ter que ficar
quieto e deitado um bocado de dia.
--João homem bom Camilo fica.
João Irineu foi a São Félix
comprou penicilina e aplicou em Camilo por vários dias até ele ficar bom e isto
demorou quase um mês, durante este período João estava moendo cana e fazendo
rapadura. O tacho estava cheio de melado quente que ao apurar soltam bolhas que
explode jogando caldo quente longe, Camilo já bom ficava rodeando o tacho e
João sempre avisando para não encostar muito, foi quando o melado explodiu e
apenas chamuscou a barriga de Camilo que gritou e se afastou, chamando os
companheiros foi-se embora com muita raiva, João ainda tentou amenizar, mas não
adiantou. O que João não sabia era que Camilo voltaria mais breve do que ele
jamais poderia imaginar. Pouco tempo depois se tinham noticias dele e seus
companheiros, e eram más noticias.
Mal havia passado o mês de
agosto, ainda inicio de setembro, o tempo se encontrava quente e nubloso,
ameaçava chover, quando eu tive a noticia senti um grande arrepio, os índios
tinham atacado a fazenda do Pedro Tapirapé e matado sua irmã e as duas
crianças.
Poucas horas depois um grupo
de homens armados chegava ao local do morticínio, era uma fazendinha de um
humilde posseiro que só tinha duas taperas, uma para moradia, e uma oficina de
fazer farinha, e ali em cima do monte de mandioca que descascava a mulher Maria Tapirapé estava morta com a cabeça
arrebentada a bordunadas, o sangue rubro manchava a alvura das raízes, mais ao
lado, embaixo de uma cocha de colocar massa, estava o corpo ensanguentado de
uma menina. No terreiro os porcos disputavam o que sobrara do corpo de uma
criancinha de colo, na travessa de madeira da casa o testemunho da brutalidade,
a mancha de sangue indicava onde tinham quebrado a cabeça do neném antes
jogá-lo aos porcos. Mas a menina que estava embaixo da cocha estava viva e dois
dias depois quando abriu os olhos foi para dizer:
--Titio... Foi o Camilo.
Na cena do crime, uma borduna
de índio caiapó,
Camilo tentava
enganar.
Impossível
esquecer uma chacina como esta.
Vinte dias depois, ainda no
mês de setembro, eles atacaram de novo, desta feita foi na fazenda Caracol do
meu amigo João Irineu, o homem que havia tratado deles por quase um mês com
alimentos e remédios.
Dona Rita, mulher de João
chegou a São Felix a pé já noite, havia corrido quase mais de quatro léguas,
estava exausta e quase em estado de choque. Com muito custo quando conseguimos
reanimá-la, o dia já vinha amanhecendo.
--Vão até a minha casa gente, os índios mataram o João e os meninos
- e entrava em crise de choro Eu estava fazendo almoço quando ouvi um grito
longe, parecia vir lá da roça onde o João estava trabalhando, eu fiquei
preocupada e fui até a janela para ver se via alguma coisa, pois sabia por
noticia o que o Camilo andava aprontando eu sempre tive cisma dele, foi quando
vi os índios virem correndo no rumo de minha casa, e vinham com as borduna na
mão, fiquei com medo e corri para o fundo quintal e me escondi na moita de
banana, ai eles entraram na casa e me procuraram, saíram até o quintal, mas não
me viram, voltaram para dentro da casa e começaram a quebrar tudo e carregaram
um bocado das coisas, quando eles foram embora eu corri para cá. Sei que meus
filhos estão mortos e João também vão lá pelo amor de Deus.
Logo, formaram um grupo de
homens revoltados e se puseram a caminho. A
tragédia se repetira. Na casa, em uma rede atada na sala rústica estava um
corpo ensangüentado. Era Luciano um dos filhos do velho guia, mesmo com a
cabeça quebrada ainda vivia, Na roça, tombados sobre a terra que trabalhava
estavam os dois corpos pai e do filho Augusto, suas cabeças quebradas e no
pescoço os enfeites Xavantes. O sobrevivente foi transportado para São Félix em
uma rede e assim que se tornou lúcido contou o ocorrido:
--Eu
e o papai estávamos trabalhando na roça carpindo, era ainda cedo quando vimos
os índios chegarem, não vimos nenhuma arma com eles, eram cinco e o Camilo, ele
chegou perto do papai e o cumprimentou:
--Ta
bom João?
--Olá
seu sumido, por onde andava?
--Eu
estava na aldeia, olhe o que eu trouxe para você - disse Camilo mostrando um
colar destes de cordão com umas penas de gavião e foi colocando no pescoço do
papai, e aquele outro índio baixo também me deu um, e como é costumes deles
porem no pescoço da gente ninguém desconfiou. Ai aconteceu que Camilo deu um
grito e eles começaram enforcar a gente com o cordão, eu lutei muito para tirar
o revolver, mas ele estava embrulhado em um lenço e eu não dei conta, só sei
que eles bateram em nós com o olho de nossas enxadas. Ai então eu não vi mais
nada, me lembro de estar doido andando no rumo da casa e depois eu não sei o
que aconteceu.
O mesmo aconteceu com o
filho mais moço que trabalhava meio afastado quando ouviu os gritos foi ver o
que estava acontecendo e já encontrou os índios pelo caminho que o mataram do
mesmo jeito.
João Irineu e seu filho mais
moço morreram em cima da terra que amavam e trabalhavam pelas mãos de quem
ajudara.
Mas a revide não demorou a
chegar.
Para Camilo não houve
sobreviventes nos massacres, achavam que todos tinham morrido e que pensariam
terem sido os índios Caiapós os autores, estavam tranquilos.
Pouco tempo depois (assim me
contaram) um grupo de cinco vaqueiros ia para o campo quando avistaram os cinco
índios na tapera do João Velho, bem junto da estrada que levava ao limpo
grande, um dos vaqueiros chama a atenção dos outros:
--Olha quem estão ali - disse - mostrando a velha tapera.
--São
os índios Xavantes, é o Camilo e seus companheiros, vamos até lá agora chegou a
nossa vez.
Calmamente os vaqueiros
foram rumo à tapera e os índios nem se moveram, faziam de conta que não queriam
nada, chegaram rindo e desceram dos seus cavalos e cercaram rapidamente a
tapera entraram na casa e antes de começarem a atirar um deles disse:
--Muito
bem Camilo você que é o matador de crianças, agora é a sua vez de morrer.
Camilo o mais desconfiado
pulou a janela correu para dentro de um capão de mato que beirava a casa, os
outros quatro índios morreram dentro da tapera, os vaqueiros a cavalo cercaram
o pequeno capão e quando conseguiram encontrar Camilo o mataram e ajuntando os
corpos os enterraram ali mesmo.
Tudo parecia ter voltado á
normalidade, mas não por muito tempo.
*Os cinco índios tão
decantados pelo Cacique Damião como seus parentes, se forem estes os narrados,
eram cinco renegados que foram expulsos de sua própria comunidade tribal eis
que haviam matado quatro pessoas inocentes em São Felix do Araguaia e certamente
matariam muito mais.
Agora tentam justificar a
tomada das terras com declarações pretensamente parcimoniosas, mas inverídicas
e sem base estrutural para dar ênfase a uma decisão tão importante como à de
espoliar centenas de famílias jogando-as ao desabrigo. Há que se rever esta
lacuna que mancha o pudor democrático de uma nação que se diz livre e
justiceira. A mancha desta impudica atitude não se apagará tão facilmente
alguns de nossos dirigentes, os aliciadores da malversada Lei a carregarão para
sempre, não será a lei dos homens que ao final cumprir-se-á, mas sim a Lei que
rege o Universo de Deus.
Neste país a lugar para
todos, não é justos sacrificar os menos afortunados baseando-se em Leis
absoletas e serviçais. (2005-Wdgh)
(Foi o episódio acima o único registro
encontrado nas vozes populares sobre mortes de índios na região de São Felix do
Araguaia e foram narradas no livro “Terras Bravias” - Publicado Internet em 2005 Wdgh).
&
Mapas, dados e texto transcritos na integra anexados coletados na palestra proferida pelo Dr. Afonso Dalberto – Presidente do Instituto de Terras de Mato Grosso INTERMAT– 19 de agosto de 2009. Cuiabá.
DESAFIOS
DA REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA EM MATO GROSSO. (ver a seguir}...
“A atual situação fundiária
do Estado de Mato Grosso advém de uma história repleta de choques de
competências, com diversas regiões regularizadas por diversos órgãos,
autarquias e colonizadoras, resultando numa miscelânea de títulos, sesmarias,
glebas, e áreas indígenas.
Vejamos a historia:
O problema fundiário de Mato
Grosso remonta ao ano de 1530, com a criação das capitanias hereditárias e do
sistema de SESMARIAS, que consistiam em grandes glebas distribuídas pela Coroa
portuguesa. A sesmaria era uma subdivisão da capitania hereditária com objetivo
de que essa terra fosse aproveitada
Outro
problema é a sobreposição por encadeamento de títulos, como por exemplo, a
região norte do Vale do Araguaia, em que numa época foram emitidos títulos
encadeados partindo do rio Xingu para o leste e em outra partindo do Rio
Araguaia para o oeste criando uma faixa de ruptura em que dentro desta faixa há
uma sobreposição de títulos-.··.
O
outro problema é a questão dos pontos de amarração, ou seja, o mesmo titulo
dependendo do ponto de amarração e do encadeamento de títulos pode ser
deslocado.
Na sequência..
“Vejamos
o mapa ilustrativo onde, há casos comprovados de deslocamento do mesmo titulo
de aproximadamente 30 km conforme ponto de amarração”.
Analisemos os ilustrativos:
Demonstrativo área 01.
Demonstrativo área 02
São as mesmas áreas em diferentes posicionamento.
Recordo-me vagamente que naqueles tempos se falavam em ações na justiça de proprietários defendendo seus territórios sobrepostos e que haviam chegado à última instância, mas ao que parece tudo se quedou calado e no esquecimento. Finalmente o velho adágio.
“O tempo continua ser ainda o melhor amigo do
homem”.
Boa sorte
amigos.
§
Carta Poema dedicada ao Bispo da Terra.
Mas vim para este mundo.
Disse Pedro Maria:
Morrerei em pé como as arvores,
Com a minha morte,
Minha vida se fará verdade.
Não Pedro Maria...
Sua vida sempre foi amor e verdade,
Mas, ainda há muito que fazer,
È glorioso descobrir que há luz em nosso caminho,
Eu também não sou deste mundo,
Sou seu irmão, foi o nosso PAI quem me criou.
Viemos para aprender e ensinar,
Olhe para o céu, vejas as estrelas,
A beleza das Plêiades e sua família,
Acompanhe o andarilho fujão Arcturus,
A ciumenta postura de Beteljeuse,
E a inveja de Rigel que expele treze mil vezes,
tanta luz e calor como o nosso Sol,
O conglomerado de Hercules,
e seus milhões de diamantes a faiscar,
A grandiosidade de Orion e Roseta,
Os distantes Alfa-Centauro, Vega e Capela,
Os planetas, os satélites e suas vinte Luas,
Terra, Marte, Júpiter, Urano Saturno, Netuno,
Vênus, Plutão e Mercúrio.
São miríades de hostes e galáxias,
Obras incomensuráveis de um Só PAI e CRIADOR.
Acreditas Pedro Maria, que só há seres inteligentes,
Aqui neste pequeno e empoeirado mundinho nosso?
Não Pedro Maria, há muito mais vida, mais alem,
São milhões de mundo que não conhecem o pecado,
Portanto, aventuremo-nos pelas avenidas estelares,
Buscando o descanso tão decantado por ti! Pedro Maria...
A paz da instrução espiritual está inserida no
Trono de Deus, junto à poderosa fonte,
Que supre o poder e Luz que opera este,
Magnífico mecanismo que é o Universo!
O montante de energia é incalculável.
Para o nosso pequeno recanto empoeirado,
O nosso carente sol só fornece um fluxo regular
de energia, igual a quatro centilhões de H.P.
È apenas um entre dez bilhões de sois.
Pedro Maria,
Calcule então, qual é a prodigiosa energia
Que deve ser usada, para conservar e manter,
O mecanismo do Universo em movimento.
Como deve ser o poder daquela Mão!
Que dá corda à tremenda fonte! Num Universo todo,
Que nunca teve começo e nem fim!
È um paraíso vivo, em que tudo nele tem vida.
Não se podem afrouxar os laços de Orion.
E nem manter unidas as três estrelas,
As irmãs Mintaka, Alnilan e Alnitak,
As duas, das três primeiras andam juntas,
Mas pode se vir a olho nu a rebelde Alnitak,
Distanciar-se para o leste a ponto de deformar
o triangulo perfeito, mas ela se autogoverna,
Vede Pedro Maria... Até as estrelas tem vida própria.
Deus escreveu a historia da criação e da onipotência,
Nas maravilhosas obras naturais com que nos rodeou,
Vá Pedro Maria,
Vá ardilosa Raposa do Araguaia,
Vá para uma praia do teu rio, numa noite escura,
Poderás ver a grandiosa obra do Pai,
Ao vislumbrar as maravilhosas hostes celestiais, e frio é coração que não se extasiar,
E obscuros serão os olhos que não as verem,
E encontraras em ti o teu verdadeiro valor,
Tens muito a fazer na luta a que viestes,
Para se conseguir paz, justiça, amor e liberdade,
Afinal, somos todos irmãos filhos de um só Criador,
Levante sua voz, clame aos quatro ventos,
Não se quede calado e impotente, pois amigo...
Pedro Maria... Lembre-se que...
“O espaço e o tempo assim como a onipotência,
Portanto, levanta-te Pedro Maria, e vá à luta,
Há muita gente precisando de ti...
Jesus está contigo... E... Eu também..
O Bispo da Terra ou a Raposa do Araguaia.
Wdgh. 2014.
Padre Rodolfo Lunkenbein
Assassinado em Meirure MT.
Nasceu no dia 1° de abril de
1939, em Doringstardt, perto de Bamberga, na Alemanha. Seus pais João e Maria Lunkenbein, eram pequenos agricultores.
Um dia – Rodolfo estava na 5ª série primária – caíram em suas mãos
alguns números dos Boletins Salesianos: foi a descoberta de um mundo
novo. O vigário deu-lhe de presente uma
vida de Dom Bosco. A figura do santo impressionou-o de tal forma que o
pequeno Rodolfo decidiu ser padre
salesiano.
Em
1958 chegava a Mato Grosso o novo inspetor salesiano, Pe. João Greiner, alemão,
trazendo de sua terra uma levada de jovens
missionários , seminaristas e
irmãos leigos. Com ele vinha também o jovem Rodolfo Lunkenbein. Nem salesiano
era ainda: vinha fazer o noviciado no Brasil. A ótima saúde, a grande força
física, a inteligência prática, a humanidade, a alegria e a disposição para o
serviço, eram as ferramentas que trazia
para o seu primeiro e definitivo campo de trabalho missionário: Meirure, era
uma missão complexa onde, além de reduzido grupo indígenas Bororo, havia um
internato para meninos brancos das
fazendas e cidades que estava surgindo
na região .
“Necessário
se torna retroagir para que a “historia
de baixo venha a contribuir na complementação da veracidade dos fatos da
historia da elite”
Assim sendo naveguemos na
memória...
*Missão Salesiana.
A Missão Salesiana em Mato Grosso foi fundada em 18 de janeiro de 1902, inicialmente, na região dos Tachos, e depois em 1920 transferida para Meirure. Durante o Governo de Dom Aquino o Estado de Mato Grosso dou aos Salesianos dois lotes de terras com 25.000 hectares cada um com o pressuposto que cuidassem dos índios, mas Governos posteriores, no entanto, permitiram a venda dessas terras, quando de um conflito violento com arrendatários o Diretor Pe. Cesar Albisetti desgostoso vendeu uma boa parte das terras. Os índios até então não tinham direito a terras. Em 1975 o governo federal criou a reserva indígena do Meirure o que veio a causar grande impacto entre os já proprietários das terras também adquiridas por compra do estado e outras de terceiros, posses e por compra também aos próprios Salesianos, via cadeia dominial, que as venderam em lotes menores. Esta inusitada situação gerou o conflito que custou a vida do Padre Rodolfo e do Índio Simão e de outros feridos gravemente.
Desafios da Regularização Fundiária em Mato Grosso.
O problema Fundiário em Mato
Grosso remonta ao ano de 1530, com a criação das capitanias hereditárias e do
sistema de SESMARIAS, que consistiam em grandes glebas distribuídas pela Coroa
Portuguesa. As sesmarias era uma subdivisão da capitania hereditária com
objetivo de que essa terra fosse aproveitada.
“A
atual situação fundiária do Estado de Mato Grosso advém de uma história repleta
de choques de competências, por diversos órgãos, autarquias e colonizadoras,
resultando numa miscelânea de títulos, doações, sesmaria, glebas, e áreas
indígenas.”
A colônia e Missão Salesiana
indígena do Meirure não era uma exceção desta regra.
No dizer dos índios: “O
abacaxi já estava plantado quando o Padre chegou.
Na região leste Mato-grossense as
sesmarias mais conhecidas maiores eram a da região do Dumbasinho, no médio
Araguaia na região de Cocalinho e região de Meirure e em torno, presumia-se que
eram de origem e domínio da Igreja e os clérigos, dentro deste pressuposto,
assim agiam reivindicando os quinhões, pois o registro era feito nas Paróquias
das Capitanias, mas apenas 50.000 hectares divididos em dois lotes, doados pelo
então governador do Estado de Mato Grosso realmente pertenciam aos Salesianos
que aos pouco, por motivos já atrás mencionados, foram por ordem do Diretor
Salesiano vendidos. Restaram para a Missão em 1960 alguns pequenos lotes onde
ainda hoje estão instalados, graças ao peso e freio da mão e o pulso forte do
Pe. Bruno Mariano, que os segurou, “aos quatro ventos”.
Como
acontecia em todas as regiões interioranas do país os pequenos colonos se
instalavam aleatoriamente sem ter conhecimento de quem eram as terras, se do
governo, se sesmaria, se particular ou do Estado e ali plantaram seu suor e
suas lagrimas e viveram por muitos anos.
No caso do Meirure ali se achavam
instalados uma dezena de pequenos fazendeiros ou colonos e porque não os chamar
de simplesmente Retireiros? Alguns
destes eram o Alaor da Barbearia, o Migueis, o João Mineiro, e outros. Havia espaço para todos, mas o Governo, em
1975, resolveu criar uma reserva para os índios Bororo do Meirure e com isto
implantou-se a semente da discórdia e o Pe. Rodolfo arcou com a culpa deste
dissídio. Os índios invadiram a chácara do Alaor e carregaram tudo, porco,
galinha, utensílios, roupas, mantimentos nada deixando e assim foram agindo nas
outras posses causando temor e pânico
entre os sertanejos mais modestos que tiveram que fugir abandonando tudo como
no caso do dono da barbearia o Alaor.
O Pe. Rodolfo mandou alguns homens
fazer a demarcação da divisa e os colonos não gostaram de ver suas terras
invadidas sem um mandado oficial, enquanto isto acontecia fui chamado pelo Juiz
de Direito em seu Gabinete para uma conversa:
--A situação no Meirure esta tensa,
eu quero que você vá lá e fale com o Pe. Rodolfo para devolver a junta de Bois
Carreiros que os índios tomaram do Migueis e se ele se negar diga-lhe que eu
autorizarei a sua de prisão. Aja com cautela. A Policia Federal já deve estar
por lá, vá e aguarde minhas instruções.
Uma vez
lá em Meirure fui direto a casa do Pe. Rodolfo e isto poucos dias antes dos
acontecimentos se precipitarem a situação, já estavam tensos e um tanto
nervosos em virtude que os índios estavam invadindo as casas dos
posseiros, mas a minha finalidade ali
naquela aldeia era para intimar o
Padre para que devolvesse os bois
carreiros do Migueis, ou ele seria
preso. Fui bem recebido por ele e
uma orla de índios que ficaram na porta da casa do Padre pelo lado de fora
esperando para ver o que poderia acontecer.
Após
cumprimentá-lo me identifiquei como Oficial de Justiça (embora ele já me
conhecesse) abri a pasta, tirei o revolver (que sempre carregava dentro da
mesma) e o coloquei sob a mesa para dar busca aos papeis para intimar o Padre e
ele os assinar, o alemão não se fez de rogado a guisa de busca duma caneta
dentro da pasta dele tirou uma Bereta tipo Luger 9mm e também a colocou em cima
da mesa, mas virada para a parede e meio longe do alcance da mão, notei que ele
não tinha más intenções e assim também o fiz afastei o meu para um lado e
começamos a conversar amigavelmente, estávamos empatados, e ele
simplesmente, após ler, anuiu em atender a
ordem judicial e deu ciente na
papelada. – Menos mal – porque se não cumprisse o mandado judicial eu deveria
levá-lo preso. E certamente a guerrinha começaria ali mesmo, mas tudo terminou
bem com um largo sorriso. Até que eu
gostei do jeito do alemão. Ao menos era muito sincero e gentil. Conversamos
amigavelmente outros assuntos até a trazida dos bois e a entrega dos mesmos ao
caseiro do Migueis que os levou para sua propriedade, agradeci e sai da Missão
Salesiana do Meirure, mas dentro de mim uma péssima impressão gravada em minha
alma o ambiente cheirava tragédia.
Deu tudo certo e eu voltei para
casa, mas no dia 15 de julho de 1976 eu recebi a triste noticia do desfecho
desta história:
“Mataram
o Padre Rodolfo Lunkenbein”.
Vejamos o que se passou:
“No dia 15 de julho de 1976, ás dez horas e
trinta minutos, no pátio da Missão Salesiana de Meirure, Estado de Mato Grosso,
o Padre Rodolfo Lunkenbein foi assassinado a tiros por defender a comunidade
indígena Bororo no processo de demarcação do seu território”.
João
Mineiro e mais companheiros haviam tomado o pátio da Missão Salesiana do
Meirure e traziam, junto com eles, um integrante do grupo que estava fazendo a
demarcação da área.
O Pe. Rodolfo chamado as pressas
chega à Missão e vê diante dele aqueles que o havia jurado de morte, já não
tinha mais volta, e procurou acalmar os ânimos, mas o problema explodiu em
violência, João Mineiro o líder dos malversores, estava disposto a tudo, e sem
mais opções sacando sua arma atira varias vezes, mas ante a interferência do
capitão Bororo que queria livrar o Pe., recebe uma bala nas costa e cai, Rodolfo já atingido no estomago pede
calma mas é novamente baleado no braço e
depois no coração. O índio Bororo Simão teve suas entranhas rasgadas à faca e a
sua mãe que o socorria recebeu um tiro no Peito. O Pe. Rodolfo faleceu em
seguida e também o índio Simão.
Os Atacantes se evadiram, mas
foram presos poucos dias depois.Na seqüência dos acontecimentos eu voltei ao
Meirure para junto com Policia Federal darmos cobertura aos colonos para
retirada de seus pertences e assim evitar novas tragédias.
A Reserva indígena do
Meirure foi implantada, e a casa mudou de dono, antes os índios eram hospedes
dos Salesianos, hoje os Salesianos são hospedes dos índios.O internato passou a
ser só para a índia em face de tumultuada desinteligência gerada pelos decretos
expropriatórios.
Quebrava assim o magnífico e
precioso elo tão pretendido e decantado pelos Salesianos num sonho que sempre
avençaram: Um Internato para os dois,
índios e não índios, e, este sonho se esvaiu como uma fumaça.
“Índios e não índios podem coexistir juntos como irmãos.”
A grande verdade é que somos todos filhos do mesmo Pai.
. Quem pagou com a vida foram dois seres humanos.
Que Deus os tenha.
BL 08...
“Im memorem”.
Quarenta Mártires do Brasil. Nome por que
ficaram conhecidos na História do Brasil os quarenta missionários jesuítas que
sob a direção do Padre Inacio de Azevedo embarcaram para o Brasil a bordo da nau
Santiago, não chegaram a desembarcar, tendo sido mortos pelos-++corsários
franceses do capitão huguenote Jaques Sourie (1570). Compõe um grupo
de 40 jovens da Companhia de Jesus (entre 20 e 30 anos), 32 portugueses
e 8 espanhóis, destinados ás missões no Brasil em 1570.Durante a viagem, sua
nau foi interceptada nas ilhas Canárias por navios de huguenotes calvinistas
franceses. Ao saberem que os tripulantes
eram missionários católicos, atiraram-no ao mar a 15 de julho de 1570. Foram
beatificados a 11 de maio de 1854 pelo Papa Pio IX. A festa litúrgica destes
mártires católicos é celebrada no dia 17 de julho.
O momento do Martírio
Antes da sua partida em missão para o Brasil, os sacerdotes, irmãos e estudantes reuniram-se na Quinta de Vale do Rosal, situada na Charneca de Caparica, Portugal, e foi aí que se preparam espiritualmente, durante cinco meses, para a missão de evangelização desses tão grandes território que era o território brasileiro, todos quantos tinham aderido ao projeto do padre Dom Inácio de Azevedo. Nessa propriedade os jovens jesuítas subiam freqüentemente para rezar junto a um cruzeiro de madeira onde cerca de 1659 foi levantado por iniciativa do Padre Procurador-Geral do Brasil um cruzeiro de pedra numa brenha da Quinta de Vale de Rosal em memória dos "40 Mártires do Brasil". No dia da sua partida, seguiu na expedição um total de 86 pessoas: 70 eram religiosos jesuítas, os restantes assalariados. Depois de aportarem na Ilha da Madeira, a 12 de Junho de 1570, para consertar a embarcação, descansar e recolher mantimentos prosseguiu viagem, na nau Santiago, apenas Inácio de Azevedo com 39 companheiros. A pouca distância de Tazacorte (em La Palma, Ilhas Canárias), a 15 de Julho de 1570, foram surpreendidos por um navio francês comandado pelo calvinista Jacques Sourie. Os calvinistas abordaram a nau com enorme alarido, praguejando e ameaçando de morte os missionários. O Padre Inácio de Azevedo apressou-se, então, a reunir todos os missionários no convés do navio e dirigiu-lhes as palavras de encorajamento: “Irmãos, preparemo-nos todos, porque hoje vamos povoar o Céu. Ponhamo-nos todos em oração e façamos de conta que esta é a última hora que temos de vida”. Dos lábios de cada um acabaram por irromper, em alta voz, entregas pessoais à vontade de Deus, enquanto os hereges os cobriam de injúrias. Inácio de Azevedo desaconselhou os seus companheiros a combaterem os inimigos com armas como o capitão português lhes pediu, mas apenas por meio de um quadro com um ícone da Santíssima Virgem Maria, o qual trouxe agarrado em exposição solene junto ao seu peito, e a todos gritou: “Irmãos, defendei a fé de Cristo! Pela fé católica e pela Igreja Romana!”. Mesmo depois de ferido na cabeça, o líder da expedição missionária exclamou: “Filhos, não temais, esforçai-vos! Ó meus filhos: que grande mercê é esta de Deus! Ninguém tenha medo, nem fraqueza”. Os missionários foram todos mortos e feridos, excepto o irmão João Sanches a quem os calvinistas guardaram para seu cozinheiro. No entanto, apareceu João Adaucto, sobrinho do capitão da nau, que decidiu vestir o hábito de religioso jesuíta para o tomarem por tal (uma vez que tanto desejava pertencer à Companhia de Jesus) e acabou por ser morto pela fé junto aos restantes mártires. Todos foram lançados ao mar, uns já mortos, outros em agonia e outros ainda vivos..
Textos
originais...
Os Mártires...na seqüência...os nomes...
Diogo de Andrade, padre (n. Pedrógão) Grande, Portugal
Bento de Castro, irmão, estudante (n. Chacim, Macedo de Cavaleiros, Portugal)
António Soares, irmão, estudante (n. Trancoso da Beira, Portugal)
Manuel Álvares, irmão, coadjutor (n. Estremoz, Portual
Domingos Fernandes, irmão, estudante (n. Borba, Portu
António Correia, irmão, estudante (n. Porto, Portugal)
Francisco de Magalhães, irmão, estudante (n. Alcácer do Sal, Portugal
Amaro Vaz, irmão, coadjutor (n. Benviver, Marco de Canavezes, Portugal)
Juan de Mayorga, irmão, coadjutor (n. Saint-Jean-Pied-de-Port, Navarra, hoje França)
Alonso de Baena, irmão, coadjutor (n. Villatobas, Toledo, Espanha)
Esteban de Zuraire, irmão, coadjutor (n. Amescoa, Biscaia, Espanha)
Juan de San Martín, irmão, estudante (n. Yuncos, Toledo, Espanha)
Juan de Zafra, irmão, coadjutor (n. Jerez de Badajoz, Espanha)
Francisco Pérez Godói, irmão, estudante (n. Torrijos, Toledo, Espanha)
Escribano, irmão, coadjutor (n. Viguera, Logroño, Espanha)
Fernán Sanchez, irmão, estudante (n. Castela-a-Velha, Espanha)
Gonçalo Henriques, irmão, estudante (n. Porto, Portugal)
Manuel Rodrigues, irmão, estudante (n. Alcochete, Portugal)
Nicolau Diniz, irmão, estudante (n. Bragança, Portugal)
Luís Correia, irmão, estudante (n. Évora, Portugal)
Diogo Pires Mimoso, irmão, estudante (n. Nisa, Portugal)
Aleixo Delgado, irmão, estudante (n. Elvas, Portugal)
Brás Ribeiro, irmão, coadjutor (n. Braga, Portugal)
Luís Rodrigues, irmão, estudante (n. Évora, Portugal)
André Gonçalves, irmão, estudante (n. Viana do Alentejo, Portugal)
Gaspar Álvares, irmão, estudante (n. Porto, Portugal)
Manuel Fernandes, irmão, estudante (n. Celorico da Beira, Portugal)
Manuel Pacheco, irmão, estudante (n. Ceuta, Portugal, hoje Espanha)
Pedro Fontoura, irmão, coadjutor (n. Chaves, Portugal)
António Fernandes, irmão, coadjutor (n. Montemor-o-Novo, Portugal)
Simão da Costa, irmão, coadjutor (n. Porto, Portugal)
Simão Lopes, irmão, estudante (n. Ourém, Portugal)
Agradecimento...
Presença de DEUS.
Eu
canto ao Todo poderoso Deus,
Que
fez com que aparecessem montes,
Que
espalhou oceanos amplamente,
Construiu
de vez os altos Céus;
Eu
canto a sabedoria que ordenou
Que
o sol ao dia presidisse;
Que
a Lua mandou também brilhar;
E
as estrelas, que obedeçam a Sua voz;
Eu
canto a bondade do Senhor,
Que
encheu a Terra de alimento,
E
formou as criaturas, como quis.
E
achou que estava tudo bom!
Senhor,
como expostas estão as Tuas obras!
Por
onde quer que dirija os olhos meus,
Quer
contemple o chão que piso,
Ou
olhe para s céus, no espaço em cima,...
Não
há planta, ou flor, aqui em baixo,
Que
não a revele as tuas Glorias, Deus!
E
as nuvens se elevam; as tempestades surgem,
Por
ordem do Teu trono, ò poderoso Pai!
As
criaturas todas, por Ti vivem, Senhor,
O objeto são do Teu cuidado eterno.
Não
há lugar algum, de esconderijo,
Onde
Deus não esteja: Ele em toda parte está!
Isaac Watts
BL 09...
Deus em “OS
Mártires do Araguaia”
A Missão Salesiana atendia índios e não índios para tanto tinham um orfanato para meninos e meninas, fossem negros, brancos ou índios, e era considerado o melhor Educandário da região. Mas a interferência abrupta do governo federal ao decretarem aleatoriamente Reservas indígenas sem ver a quem estaria ferindo ou prejudicando, e, assim sem medir as conseqüências de seus atos acabou de vez com este sonho dos Missionários, pois em vez de união promoveram e implantaram nas mentes de uns e de outros, de brancos e índios, a discórdia, o ódio e o separativismo que pouco a pouco foram se avolumando, mas os grandes culpados são os nosso representantes do Senado e Câmara Federal que não atentaram para a gravidade do problema, pois dia a dia estão a virar as costas e deixar que mentes perturbadas aboletadas de improbidades manuseie a vontade de alienígenas e distorçam as verdades para no final se locupletarem com os resultados de suas manobras, pois os índios nada mais são para eles do que “cabide de emprego e lucro” Então porque não considerar os índios aculturados e os em fase de aculturação como cidadãos comuns? Seus filhos teriam os mesmos direitos e prerrogativas iguais a todos os filhos desta terra? As famílias se entrosariam na sociedade no mesmo grau de igualdade? Pois se existem negros, branco e índios todos são iguais perante a lei e nem por isto vão deixar de serem negros ou índios. Façam uma proposta as nações indígenas se aceitam serem enquadrados na lei como todo ou qualquer outro cidadão brasileiro desde o nascimento e arcando com todos os direitos, obrigações e deveres, e aguardem. Outra injustiça cometida pela Ditadura foi à expulsão do Padre François Jaques Jentel, ele nada fez de errado a não ser defender os posseiros contra as esmagadoras ganâncias de latifundiários, a que se rever esta triste e vergonhosa lacuna da história brasileira lançando-o nos anais da nossa história contemporânea. Quanto ao Bispo Casaldaliga, que Deus o tenha, seu espírito valoroso continua sendo o expoente protetor dos índios, dos posseiros e dos humildes. O povo o respeita e o ama. Não importa se Bispo ou Padre importa sim que sua memória não se apague e vibre sempre como e famosa, ardilosa e amorosa: “Raposa do Araguaia, um fiel servo de Deus”.
...sempre pronta para
defender suas crias.
Bibliografia...
*Ocomeço de tudo de 1910 a 2016 –Livro
Terras Bravias.pg 14
*Chacina
no rio das Mortes – Boletim Missão Salesiana e vida de Pe. João Fuchs, Pe. Pedro
Sacilotti e Coad. José Pellegrino
e Histórico
dos índios Xavantes - folhas 06 a 10
-Texto de boletim da Missão Salesiana
13.01.14 .
*Histórico
de Jentel.. Folhas de 11 a 52.. livro Raízes do mesmo autor.
.*Guerrilha
Araguaiapg. folhas 53 a 55. - Livro
“Terras Bravias”, do mesmo autor.
*Assassinato
em Cascalheira folhas 56 a 67– Livro
“Terras Bravias” do mesmo autor
*
Assassinato em Porto Alegre do Norte- e *Posto da Mata ..do livro “Terras
Bravias” do mesmo autor folhas 68 a 90.
.*Pe
Rodolfo Lunkenbein seu histórico ás folhas 91 a 96.... Foram extraída do Texto
original do Livro do Pe Gonçalo Ochoa: Rodolfo : uma vida pelos índios de Mato
Grosso, publicado na Internet “ PARABOLICA
p/Marcelodb.
*Mapas
da área Suia Missu- folhas 89 e 90 -
Internet - Palestra Proferida pelo Presidente do Intermat em 19 de
agosto de 2009
*Os
Quarenta Mártires. Biografias e curiosidades. “Histórias do Brasil” Internet
Autor:
Wolfgang Dankmar Gunther Hornschuch.
Avenida
Piraguassú 1415 – Porto Alegre do Norte MT.
CEP
78655000 – Cel. - 66 984071193
F I M
*
“Todos os livros da serie “Os Pioneiros” são
baseados em fatos históricos reais, contos e ou lendas os quais são frutos da
natureza humana que se deleita em amalgamá-los e os moldar intrinsecamente
transformando o nosso folclore em uma relíquia literária ao alcance de todos, é
a historia vista de “baixo”, mormente quando o autor, no dizer dos
historiadores romanos, ao tempo e ao fato estava presente: “sine ra et studio”
o que justifica, constrói e consolida a história da Elite”.
(WDGH-ADLINE-2005)








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